Nas semanas que se seguiram à implementação da política de "tolerância zero" do governo Trump, relatos fragmentados começaram a emergir dos centros de detenção. Indicavam que crianças migrantes estavam sendo arrancadas de seus pais por autoridades de imigração. Um caso emblemático ganhou repercussão em 14 de junho, quando uma mãe hondurenha relatou à CNN que agentes federais lhe tiraram a filha dos braços enquanto ela a amamentava, em um centro de detenção no Texas.

Apesar das negativas iniciais por parte da administração, no dia seguinte, um porta-voz do Departamento de Segurança Interna reconheceu que, entre 19 de abril e 31 de maio, 1.995 crianças haviam sido separadas de 1.940 supostos responsáveis. A reação pública foi imediata: indignação generalizada, protestos em massa e um clamor moral vindo de todos os setores da sociedade americana.

As imagens de crianças chorando, separadas à força dos pais, confinadas em ambientes superlotados e insalubres, geraram uma crise de credibilidade e legitimidade para a administração Trump. O clamor foi tanto que Laura Bush, ex-primeira-dama, comparou a separação forçada de famílias à internação de nipo-americanos durante a Segunda Guerra Mundial. Líderes de ambos os partidos condenaram a medida. John McCain a classificou como uma afronta aos valores fundamentais da nação; Will Hurd afirmou que separar crianças de suas mães não contribui em nada para combater o tráfico de drogas ou o terrorismo.

As manifestações se multiplicaram. O deputado Beto O’Rourke organizou um protesto no Dia dos Pais em frente a um centro de detenção em Tornillo, Texas. A coalizão “Families Belong Together” organizou mais de 600 manifestações em todos os 50 estados. Até mesmo líderes religiosos conservadores, tradicionalmente aliados de Trump, romperam o silêncio. O evangelista Franklin Graham, por exemplo, declarou que a separação de famílias era “vergonhosa” e “terrível”.

Em resposta às críticas, o então procurador-geral Jeff Sessions invocou a Bíblia para justificar a obediência às leis de imigração, citando Romanos 13: “as autoridades foram instituídas por Deus para manter a ordem.” No entanto, o cinismo da declaração apenas ampliou a revolta pública. Enquanto isso, as autoridades faziam declarações contraditórias. Kirstjen Nielsen, secretária do DHS, afirmou inicialmente que separações só ocorriam em casos de suspeita sobre o vínculo parental ou risco à criança. Pouco depois, admitiu que a prática era rotineira, culpando leis de administrações anteriores.

Muitos críticos identificaram na política uma tática de chantagem legislativa. O próprio Sessions declarou que, se o Congresso aprovasse leis mais duras e o muro fronteiriço fosse construído, essas “terríveis escolhas” não seriam mais necessárias. Trump, por sua vez, insistia — falsamente — que a separação de famílias era resultado de uma “lei dos democratas”, embora seu partido controlasse ambas as casas do Congresso na época. Rejeitou propostas que não incluíam financiamento para o muro e culpou a oposição pela crise que ele mesmo instaurara.

Com a pressão política e social crescendo, Trump assinou a Ordem Executiva 13841 em 20 de junho de 2018, revogando formalmente a política de tolerância zero. A medida visava manter a unidade familiar, expandindo centros de detenção capazes de abrigar pais e filhos juntos, e acelerando a tramitação de pedidos de asilo. No entanto, a ordem não abordava a situação das mais de 2.000 crianças já separadas, nem oferecia garantias claras sobre a proteção futura dessas famílias.

Ativistas de direitos humanos criticaram duramente a ordem. Michelle Brané, da Women’s Refugee Commission, apontou que a política apenas transformava a separação em encarceramento familiar: prisões disfarçadas para crianças. A administração ainda tentou desafiar judicialmente os limites impostos pelo Acordo Flores, que restringia o tempo de detenção de menores. A juíza Dolly Gee recusou a proposta, classificando-a como uma tentativa cínica de transferir à justiça a responsabilidade por décadas de omissão legislativa e ações executivas mal concebidas.

A crise revelou não apenas a brutalidade da política de separação, mas também as falácias retóricas que tentaram justificá-la. O governo utilizou crianças como instrumento político, promovendo sofrimento deliberado como mecanismo de dissuasão. Tentou inverter a responsabilidade, encobrir a autoria e manipular o discurso público com falsidades, ao mesmo tempo em que mascarava sua estratégia com uma linguagem de “ordem” e “lei”.

É essencial compreender que a política de separação de famílias não foi um erro técnico ou um subproduto administrativo. Ela foi o resultado direto de uma doutrina política que buscou transformar a crueldade em método e o trauma em dissuasão. A dor das crianças não foi uma consequência colateral, mas sim uma tática deliberada — um cálculo feito à custa da dignidade humana.

A compreensão desse episódio exige mais do que uma análise legal ou política. Ela requer um mergulho ético naquilo que uma sociedade está disposta a aceitar em nome da segurança. A fronteira não é apenas uma linha no mapa — ela é um espelho que reflete os limites morais de uma nação. E, diante dele, o mundo viu um governo disposto a romper laços de sangue para marcar território.

Como o governo dos EUA justificou a separação de famílias migrantes e por que isso continua relevante

A política de separação de famílias na fronteira entre os Estados Unidos e o México, amplamente associada ao governo de Donald Trump, não surgiu de forma repentina nem terminou com a assinatura de uma ordem executiva. Ela representa uma política deliberada de dissuasão migratória que, embora travestida de cumprimento rigoroso da lei, resultou em violações sistemáticas de direitos humanos e constitucionais.

Em junho de 2018, a assinatura da Ordem Executiva 13841 por Trump foi interpretada por muitos como o fim de uma política brutal. No entanto, apenas seis dias depois, um tribunal federal ordenou, no caso Ms. L v. ICE, a reunião forçada de 2.648 crianças migrantes com os responsáveis dos quais foram separadas. A decisão expôs a completa ausência de um sistema de rastreamento ou coordenação entre as agências federais envolvidas: o ICE, responsável pelos adultos, e o ORR, que mantinha as crianças sob custódia. As instituições não compartilhavam informações nem dispunham de uma base de dados comum — restava aos pais um número de telefone gratuito, incapaz de responder com precisão ao paradeiro de seus filhos.

Essa desorganização não foi acidental, mas reveladora da lógica estrutural por trás da política. Autoridades sabiam que estavam separando famílias bem antes da oficialização da política de "tolerância zero" em maio de 2018. A precariedade nos registros administrativos dificultou a mensuração do número real de afetados, mas evidências apontam que milhares de famílias foram atingidas silenciosamente. A falta de controle, de metodologia padronizada e de transparência indicava não um erro de execução, mas uma estratégia de coerção emocional como forma de dissuasão.

O caso emblemático que deu origem ao processo coletivo foi o de Ms. L, uma mãe congolesa que fugia de violência sexual sistêmica e chegou legalmente a um porto de entrada pedindo asilo — um direito previsto pela legislação internacional. Apesar de ter sido considerada elegível para solicitar asilo, sua filha de sete anos foi retirada à força poucos dias depois, sem explicações, sendo transferida a mais de 3.000 km de distância. A mãe permaneceu detida em San Diego, enquanto a filha foi levada a um abrigo em Chicago. Ambas ficaram separadas e sem qualquer tipo de comunicação por quatro meses, até que a pressão judicial e pública levou à libertação de Ms. L.

O argumento jurídico da ACLU no caso Ms. L v. ICE foi incisivo: não havia qualquer interesse legítimo do Estado em separar famílias. A prática infringia direitos constitucionais, em especial o devido processo legal, e violava os princípios mínimos de proteção a solicitantes de asilo. Com a ampliação da causa para uma ação coletiva, milhares de famílias foram incluídas no processo, escancarando a dimensão da tragédia.

A retórica oficial sustentava que a separação servia como elemento dissuasivo, mas a realidade mostrou o custo humano da medida: trauma psicológico profundo, perda de vínculos familiares e desumanização institucionalizada. Mesmo após a ordem judicial de reunificação, muitos pais continuaram sem acesso aos filhos, e alguns foram deportados sem sequer saber o destino das crianças. Advogados, ativistas e organizações internacionais denunciaram a política como forma de tortura emocional e punição coletiva.

O episódio revela um padrão recorrente de práticas administrativas que transformam procedimentos legais em mecanismos de exclusão e violência. Quando o aparato burocrático do Estado é usado para infligir sofrimento — não como efeito colateral, mas como objetivo — ultrapassa-se a fronteira entre o cumprimento da lei e a violação dos direitos mais básicos.

Além disso, o caso deixa claro como as decisões políticas são sustentadas não apenas por decretos, mas por redes complexas de omissões, falta de supervisão, silêncio institucional e manipulação de dados. O uso de crianças como ferramenta de política migratória demonstra um colapso ético do sistema que ultrapassa governos e ciclos eleitorais.

É essencial entender que a crise não terminou. A reestruturação dos sistemas de acolhimento, rastreamento e reunificação segue sendo um desafio, e milhares de crianças continuam sem conexão com suas famílias. A ausência de responsabilização legal pelos autores dessa política e a continuidade de práticas similares em outras formas indicam que o problema está longe de ser resolvido.

A gravidade da separação familiar como política de Estado reside não apenas no número de afetados, mas na mensagem que transmite: a de que a proteção legal, mesmo garantida por tratados e constituições, pode ser descartada quando o alvo são os mais vulneráveis. O caso Ms. L não é exceção, mas símbolo de uma lógica de desumanização que ainda persiste.

Quais as Condições de Detenção nas Fronteiras Americanas e os Efeitos sobre as Crianças Migrantes?

A situação das crianças migrantes detidas nos centros de imigração dos Estados Unidos tem sido alvo de intensas críticas e investigações, especialmente durante a administração Trump. Relatos de condições de detenção precárias e inumanas colocam em questão a eficácia e a humanidade das políticas migratórias adotadas pelo governo. Em julho de 2019, a pediatra Dolly Lucio Sevier, após examinar 38 crianças migrantes no centro de detenção da CBP em McAllen, Texas, descreveu as condições como semelhantes a “instalações de tortura”. Os relatos das crianças eram alarmantes: temperaturas extremamente baixas, luzes acesas 24 horas por dia, falta de acesso adequado a cuidados médicos, higiene básica, água e comida suficientes. Esses fatores culminaram em sintomas de desidratação, desnutrição, privação de sono e trauma psicológico. A maioria das crianças examinadas por Sevier sofria de doenças respiratórias, e a falta de higiene básica nos centros de detenção foi apontada como a principal causa dessas condições. A pediatra ainda afirmou que essa negligência era equivalente a “intencionalmente causar a propagação de doenças”.

Advogados dos direitos dos imigrantes acusaram a administração Trump de ser responsável pelas mortes de pelo menos sete crianças em um ano, um número alarmante, especialmente considerando que nenhum óbito de criança foi registrado em detenções de imigração nos dez anos anteriores à sua presidência. Defensores do governo, por outro lado, argumentaram que as crianças migrantes já enfrentavam condições adversas como pobreza, desnutrição e jornadas extenuantes antes de chegar à fronteira dos EUA, o que as tornava mais vulneráveis a doenças e a complicações de saúde. Segundo eles, as instalações de detenção, muitas vezes superlotadas, não eram projetadas para abrigar populações vulneráveis, como crianças pequenas.

Além disso, em julho de 2019, a deputada Alexandria Ocasio-Cortez e outros legisladores progressistas realizaram uma visita aos centros de detenção em Texas. Lá, ouviram relatos de detidos que não tinham permissão para tomar banho por mais de duas semanas, foram forçados a beber água de sanitários e sofreram abusos psicológicos e físicos por parte dos guardas. Pouco depois, um grupo no Facebook com mais de 9.500 membros, composto por funcionários da CBP, foi descoberto, no qual se compartilhavam piadas sobre as mortes de migrantes e memes vulgares sobre Ocasio-Cortez e outros críticos. Para os advogados de direitos humanos, esses episódios indicavam uma cultura disfuncional dentro das agências federais de imigração, o que explicava o tratamento desumano dispensado aos migrantes.

A administração Trump defendeu suas políticas, alegando que a melhoria nas condições de detenção dependia de uma maior alocação de recursos e que a maioria das mortes de crianças poderia ser atribuída à política de imigração da oposição, especialmente os Democratas, que não aprovaram fundos adicionais para lidar com a crise. Durante esse período, houve discussões no Congresso sobre a necessidade de um financiamento mais robusto para melhorar as condições nos centros de detenção, enquanto os legisladores progressistas se opunham à liberação de mais recursos, defendendo que a verdadeira solução estava em mudar as políticas migratórias, especialmente aquelas que envolviam a separação de famílias e o tratamento cruel nos centros de detenção.

Ao longo dessa crise, surgiram discussões sobre o que constitui uma detenção “segura e sanitária”, um conceito relacionado ao Acordo Flores, que estabelece padrões mínimos para o tratamento de crianças migrantes não acompanhadas nos Estados Unidos. Durante a administração Trump, houve tentativas de reinterpretar ou até mesmo anular esse acordo, alegando que ele incentivava a imigração ilegal ao proporcionar uma "fuga" para os imigrantes que traziam crianças. O Departamento de Justiça, sob a liderança do governo, desafiou uma decisão de 2017 que havia redefinido o que seria considerado “seguro e sanitário”, baseando-se no argumento de que o acordo não exigia explicitamente a provisão de itens básicos como sabão, escovas de dente ou cobertores.

Porém, a argumentação do governo encontrou resistência no sistema judicial, que reiterou que a falta desses itens essenciais não poderia ser justificada. Em uma audiência no Tribunal de Apelações do Nono Circuito, o juiz A. Wallace Tashima, que foi internado em um campo de concentração durante a Segunda Guerra Mundial, questionou duramente os representantes do governo, apontando que a maioria das pessoas entende que, sem escova de dentes ou sabão, as condições não poderiam ser consideradas “seguras e sanitárias”.

Esses episódios expõem uma crise humanitária que vai além da simples questão de segurança nas fronteiras. O tratamento desumano e as condições precárias nos centros de detenção são, em grande parte, uma consequência de políticas imigratórias que priorizam a dissuasão de imigrantes através do sofrimento e da humilhação. Essas políticas, que buscam causar medo nos migrantes, não só colocam em risco a saúde e o bem-estar das crianças, como também representam um desafio significativo para a integridade moral e legal dos Estados Unidos enquanto nação.

Além disso, é crucial compreender que, embora os desafios logísticos e a sobrecarga dos centros de detenção sejam reais, a falta de responsabilidade do governo em relação aos direitos humanos das crianças migrantes revela uma falha sistêmica que afeta diretamente as comunidades mais vulneráveis. A verdadeira solução para a crise não reside em expandir a capacidade de detenção, mas sim em repensar e reformar as políticas migratórias de maneira que priorizem a dignidade, os direitos e o bem-estar de todos os indivíduos, independentemente de sua nacionalidade ou status imigratório.

Como a Detenção de Crianças Migrantes se Torna um Reflexo da Política de Separação Familiar nos EUA

Em 2019, a pediatra Dolly Lucio Sevier foi chamada a examinar um bebê em uma das instalações de detenção de imigrantes na fronteira dos Estados Unidos. O bebê, cujos pais não estavam presentes, sofria de diarreia. A mãe de 17 anos da criança relatou que os guardas se recusaram a fornecer roupas limpas, levando-a a improvisar, enrolando o filho em lençóis plásticos de hospital. O relato de Sevier e os documentos enviados pelos advogados de imigração rapidamente atraíram a atenção da mídia, gerando indignação pública. Os detalhes das condições de detenção – descritas como insalubres e perigosas – expuseram a verdadeira extensão da crise humanitária nas instalações da Patrulha de Fronteira (CBP), tornando o episódio um ponto de inflexão na percepção da sociedade americana sobre a questão migratória.

Relatórios subsequentes de inspetores do Departamento de Segurança Interna dos EUA apontaram superlotação perigosa e condições sanitárias precárias em várias outras instalações da CBP. No entanto, apesar das denúncias, a resposta do governo federal foi contida. Funcionários da CBP afirmaram que suas instalações de "detenção de curto prazo" não foram projetadas para abrigar populações vulneráveis, como crianças, e garantiram que os esforços da agência visavam oferecer o melhor cuidado possível dentro das circunstâncias. O ex-presidente Donald Trump, em resposta à crescente pressão pública, culpou os democratas do Congresso por não aprovarem o financiamento humanitário necessário para lidar com o aumento de menores desacompanhados cruzando a fronteira. Ao mesmo tempo, seus advogados argumentaram em tribunais federais que o tratamento dado às crianças migrantes estava em conformidade com a cláusula de "condições seguras e sanitárias" do Acordo Flores (FSA), uma lei de 1997 que estabelece os padrões para o tratamento de crianças em instalações de detenção.

A discrepância entre a retórica governamental e as realidades observadas nas instalações de detenção foi um tema central da crise humanitária. A indignação pública gerada pelas imagens e relatos de crianças em condições desumanas foi amplificada por médicos como Dolly Sevier, que se posicionaram não apenas como profissionais da saúde, mas também como defensores das crianças que estavam sendo privadas de suas liberdades e dignidade. Para Sevier, sua missão não era apenas fornecer cuidados médicos em ambientes carentes, mas também chamar a atenção para a vulnerabilidade extrema dessas crianças, muitas das quais estavam desacompanhadas ou separadas de suas famílias. Ao refletir sobre sua experiência, Sevier afirmou: “Imagine seus próprios filhos lá, como você reagiria? Não consigo imaginar meu filho lá sem ser quebrado.” Suas palavras ressoaram com muitos, sendo um convite à empatia e à reflexão sobre a violência estrutural que permeia as políticas de imigração.

Essa perspectiva médica também se entrelaça com as políticas de separação familiar implementadas sob a administração Trump. A política, que visava separar crianças de seus pais como forma de dissuadir a imigração ilegal, tornou-se um símbolo de crueldade em uma era onde a política de imigração dos EUA se tornava cada vez mais punitiva. Embora o governo argumentasse que essas ações eram necessárias para garantir a segurança nacional e combater o tráfico de seres humanos, a prática expôs a falência ética de uma abordagem que colocava crianças em um sistema sem proteção adequada.

O impacto dessas políticas é ainda mais grave quando se considera a situação das crianças que chegam sozinhas à fronteira. Muitos dessas crianças, ao serem detidas em centros como os de McAllen, no Texas, enfrentam não apenas a privação de liberdade, mas também condições que comprometem sua saúde física e mental. Os relatos de doenças, superlotação, alimentação inadequada e até mesmo abusos físicos e psicológicos geraram um amplo debate sobre a legitimidade e a moralidade dessas práticas.

Além disso, é importante destacar que, apesar das promessas de melhorias por parte do governo, o financiamento aprovado pelo Congresso para as instalações de detenção, no valor de US$ 4,6 bilhões, não foi suficiente para garantir que as condições de detenção fossem humanizadas. Mesmo com esse investimento, houve críticos que argumentaram que o dinheiro não foi direcionado de maneira eficaz para proteger as crianças e garantir que seus direitos fossem respeitados.

Essas circunstâncias revelam a complexidade e a profundidade da crise migratória, que não pode ser dissociada das políticas de separação familiar e do tratamento desumano dos menores. Embora a legislação, como o Acordo Flores, forneça um mínimo de proteção para as crianças, as lacunas na implementação e as falhas sistêmicas nas práticas de detenção demonstram a necessidade urgente de uma reforma abrangente e humanitária no sistema de imigração dos EUA. A questão não é apenas o cumprimento das leis existentes, mas a criação de um sistema de acolhimento e tratamento digno para aqueles que mais precisam de proteção.

É fundamental, ao abordar este tema, que se considere não só a importância do cuidado imediato com as crianças em centros de detenção, mas também a responsabilidade do governo em garantir que todos os aspectos de suas políticas de imigração respeitem os direitos humanos. A abordagem não pode ser apenas paliativa, mas deve buscar uma mudança estrutural que previna a violação dos direitos das populações mais vulneráveis. Além disso, a reflexão sobre as políticas de imigração deve ser acompanhada por um compromisso coletivo com a justiça social, que transcenda os interesses políticos e econômicos, colocando sempre as crianças e suas necessidades em primeiro plano.

Como a Imigração e as Políticas de Fronteira de Trump Remodelaram o Debate Público nos Estados Unidos

Durante sua presidência, Donald Trump implementou políticas que rapidamente se tornaram um ponto de intenso debate nos Estados Unidos, particularmente no que diz respeito à imigração e ao tratamento de migrantes na fronteira sul do país. As decisões e ações de seu governo geraram uma forte reação tanto no nível nacional quanto internacional, com divisões ideológicas profundas sobre a eficácia, a moralidade e a justiça dessas políticas. A construção do muro na fronteira com o México, a redução no número de refugiados aceitos no país e a polêmica separação de famílias marcaram momentos críticos no seu governo, refletindo tensões mais amplas sobre imigração e identidade nacional.

Logo após assumir o cargo, Trump implementou o Executive Order 13769, também conhecido como o "travel ban", que impôs restrições de entrada nos Estados Unidos para cidadãos de sete países de maioria muçulmana, argumentando que era uma medida necessária para evitar o ingresso de possíveis terroristas. A medida foi amplamente criticada como uma forma de discriminação religiosa, enquanto defensores argumentavam que a segurança nacional deveria ser priorizada. A separação entre os que apoiavam e os que se opunham a tais políticas se tornou ainda mais pronunciada.

A retórica de Trump em relação aos imigrantes, particularmente aqueles que atravessavam a fronteira sul do país, foi repleta de termos inflamatórios, como a caracterização de migrantes mexicanos como "criminals, drug dealers, and rapists" ("criminosos, traficantes de drogas e estupradores"). Esse tipo de discurso alimentou um clima de hostilidade contra imigrantes e gerou fortes reações, tanto entre os defensores dos direitos humanos quanto entre os que viam essas medidas como necessárias para garantir a segurança e a soberania do país. Ao mesmo tempo, a ideia de um "invasão" migratória serviu como base para a proposta de construção de um muro na fronteira, o qual se tornou um símbolo de sua política de imigração.

Um dos momentos mais polêmicos de sua presidência foi a implementação da política de "tolerância zero" em 2018, que resultou na separação de milhares de crianças migrantes de seus pais. Essa política determinava que todos os que fossem pegos cruzando a fronteira ilegalmente, incluindo aqueles que buscavam asilo, seriam processados criminalmente. Como as crianças não podem ser mantidas em instalações de detenção para adultos, elas foram separadas de seus pais, levando a cenas de crianças em gaiolas e condições desumanas em centros de detenção. A indignação gerada por essa situação foi global, com protestos em massa e uma crescente pressão sobre a administração Trump para reverter essa medida.

O governo Trump, no entanto, tentou desviar a responsabilidade, afirmando que a separação de famílias era uma consequência da política de imigração existente, a qual, segundo ele, precisava ser alterada pelo Congresso. Em um movimento inesperado, o presidente assinou uma ordem executiva em 20 de junho de 2018, encerrando a política de separação familiar. Porém, as consequências desse episódio continuaram a reverberar, com dificuldades em reunir as crianças separadas com seus pais. Em muitos casos, os pais foram deportados sem poderem recuperar seus filhos, que permaneciam nos Estados Unidos em condições precárias.

Além disso, o governo Trump continuou a adotar medidas agressivas contra imigrantes, especialmente aqueles de origem centro-americana, que buscavam refúgio nos Estados Unidos. A questão dos "Dreamers", pessoas que foram trazidas ilegalmente para o país ainda crianças e que se beneficiavam do programa DACA, tornou-se uma das questões mais divisivas de sua presidência. Trump ameaçou terminar com o DACA, o que teria afetado cerca de 800.000 jovens imigrantes que haviam crescido nos Estados Unidos e, para muitos, não conheciam outro país senão aquele. O temor de deportação iminente para esse grupo gerou uma onda de protestos e ações legais, com defensores do programa argumentando que esses indivíduos representavam uma contribuição valiosa para a sociedade americana.

Em resposta a essas questões, muitos advogados, jornalistas e defensores dos direitos humanos destacaram as condições desumanas nas quais os migrantes estavam sendo mantidos, especialmente crianças não acompanhadas. Relatos de instalações superlotadas, falta de acesso a alimentos e cuidados médicos, e a ausência de um sistema eficaz de reunificação familiar foram amplamente divulgados. Isso provocou uma crescente indignação tanto dentro quanto fora dos Estados Unidos, com uma parte significativa da população criticando o governo por sua abordagem desumana e violadora dos direitos humanos.

Embora as políticas de imigração de Trump tenham sido defendidas por muitos como medidas necessárias para proteger os interesses e a segurança do país, elas também expuseram profundas divisões na sociedade americana sobre questões de raça, identidade e direitos humanos. A ideia de que os Estados Unidos deveriam ser mais seletivos em relação a quem pode entrar no país ressoou com uma base eleitoral conservadora, enquanto, por outro lado, aqueles que defendem uma abordagem mais inclusiva para com os imigrantes viram essas políticas como um ataque direto aos valores fundamentais de diversidade e acolhimento que, historicamente, caracterizaram a nação.

Além disso, os debates sobre imigração durante a presidência de Trump também trouxeram à tona questões mais amplas sobre globalização, desigualdade econômica e as causas subjacentes das migrações em massa. É importante compreender que as políticas de imigração não podem ser analisadas isoladamente, sem considerar as realidades complexas que motivam as migrações, como guerras, mudanças climáticas e desigualdade social. Uma abordagem eficaz para a imigração precisa não apenas lidar com a segurança nas fronteiras, mas também com as causas que impulsionam os fluxos migratórios, oferecendo soluções que possam equilibrar a proteção da segurança nacional com a preservação dos direitos humanos e a dignidade dos migrantes.