O avanço da nanotecnologia mediada por microrganismos representa uma virada de paradigma no tratamento de feridas e no controle de infecções. A síntese biológica de nanopartículas metálicas — como prata, óxido de zinco, titânio e ferro — mediada por bactérias, fungos, microalgas e outros microrganismos, demonstra propriedades antimicrobianas, antioxidantes e cicatrizantes que excedem em eficácia os métodos convencionais.

Estudos demonstram que bactérias como Lactobacillus plantarum, Aeromonas hydrophila e espécies de Actinobacteria conseguem sintetizar nanopartículas com alta biocompatibilidade e atividade bactericida. Esses nanomateriais, quando aplicados topicamente sobre feridas, promovem não apenas a eliminação de patógenos resistentes, mas também aceleram o processo de regeneração tecidual. A ação sinérgica entre as propriedades físicas das nanopartículas — como forma, tamanho e carga de superfície — e seus mecanismos bioquímicos, como a geração de espécies reativas de oxigênio, alteram de forma letal a integridade da parede celular bacteriana.

A prata, por exemplo, tem sido extensivamente estudada devido ao seu amplo espectro antimicrobiano. A forma e o tamanho das nanopartículas de prata sintetizadas biologicamente impactam diretamente sua eficácia. Estruturas esféricas menores, geralmente abaixo de 10 nm, demonstram maior penetração e interação com micro-organismos, resultando em ação bactericida mais pronunciada, inclusive contra cepas multirresistentes como Acinetobacter baumannii. A preocupação emergente com o desenvolvimento de resistência bacteriana às nanopartículas de prata evidencia, no entanto, a necessidade de estratégias integrativas, como o uso combinado com polímeros naturais, quitosana ou fármacos convencionais.

O uso de óxidos metálicos, como ZnO e TiO₂, tem se mostrado igualmente eficaz. Dressings à base de compósitos microporosos contendo ZnO e quitosana, por exemplo, apresentaram simultaneamente efeito antimicrobiano e capacidade de estimular angiogênese e epitelização. Essas formulações oferecem vantagens adicionais como estabilidade química, facilidade de produção em larga escala e menor toxicidade sistêmica.

A síntese microbiana também permite a funcionalização das superfícies das nanopartículas com biomoléculas ativas produzidas durante o metabolismo dos microrganismos, o que resulta em aumento da atividade terapêutica e redução de efeitos adversos. Essa abordagem ecológica, frequentemente denominada "green synthesis", elimina a necessidade de reagentes químicos agressivos, reforçando o caráter sustentável e translacional da nanomedicina de base microbiana.

Adicionalmente, estudos in vivo em modelos animais demonstram que nanopartículas biogênicas, particularmente aquelas de prata e ouro, não apenas aceleram a cicatrização, mas também modulam respostas inflamatórias locais, regulando citocinas e promovendo a organização da matriz extracelular. A regeneração ocorre com menor formação de tecido cicatricial e maior vascularização, especialmente quando as nanopartículas são integradas a hidrogéis ou membranas biodegradáveis.

Ainda assim, a compreensão mecanística da interação entre nanopartículas e tecidos biológicos permanece em desenvolvimento. Embora diversos artigos descrevam efeitos promissores, o potencial imunotóxico e a estabilidade das nanopartículas em meio biológico exigem investigação aprofundada. A transição desses materiais para aplicações clínicas demanda protocolos padronizados de biossíntese, caracterização físico-química rigorosa, estudos de farmacocinética e validação toxicológica.

É importante reconhecer que a heterogeneidade dos microrganismos utilizados na síntese resulta em variabilidade significativa nas propriedades finais das nanopartículas. Parâmetros como pH do meio, temperatura, tempo de incubação e concentração do precursor metálico influenciam diretamente o rendimento e a funcionalidade das nanopartículas obtidas. Nesse contexto, o desenvolvimento de sistemas de produção controlada em biorreatores e a engenharia genética de cepas microbianas surgem como caminhos promissores para otimização da produção.

Além disso, a integração da nanotecnologia microbiana com dispositivos médicos, como curativos inteligentes e sistemas de liberação controlada de fármacos, abre uma nova fronteira para terapias personalizadas e responsivas. A funcionalização das nanopartículas com ligantes específicos pode permitir a liberação seletiva de antimicrobianos em resposta a estímulos locais, como pH, temperatura ou presença de enzimas bacterianas.

O futuro da nanotecnologia microbiana em cicatrização de feridas depende, portanto, da articulação entre biotecnologia, engenharia de materiais e medicina translacional. Seu sucesso clínico exigirá não apenas comprovação de eficácia terapêutica, mas também segurança, reprodutibilidade e custo-efetividade. A convergência entre sustentabilidade, inovação tecnológica e demanda clínica urgente frente à resistência antimicrobiana posiciona as nanopartículas microbianas como protagonistas emergentes na medicina regenerativa.

Como os Nanocompósitos de Polímeros Baseados em Biopolímeros Microbianos Estão Transformando a Indústria de Alimentos?

A aplicação de nanocompósitos de polímeros baseados em biopolímeros microbianos está ganhando grande destaque, especialmente na indústria de alimentos, devido ao crescente interesse por soluções sustentáveis e eficientes. Esses materiais, como o poli-hidroxibutirato (PHB), a celulose bacteriana (BC), o xantano e outros, são utilizados para desenvolver embalagens biodegradáveis, imobilização de enzimas, liberação de compostos bioativos e detecção de contaminação microbiana por nanosensores. Os nanomateriais, por sua vez, podem ser divididos em várias categorias, como nanopartículas, nanotubos, nanocápsulas, nanoclays, nanofibras, nanoemulsões e nanolaminados.

Os nanomateriais podem ser classificados em três tipos principais: materiais naturais (como poeira do solo, poeira vulcânica e evaporação de água do mar), materiais incidentais (ou antropogênicos, resultantes de atividades humanas como fumaças de soldagem), e materiais especificamente engenheirados (sintetizados pelo homem em formas distintas para aplicações específicas). Dentre essas classificações, destacam-se os biopolímeros microbianos como os mais promissores para a indústria alimentícia, devido às suas propriedades únicas e renováveis.

Hoje em dia, as modificações nos estilos de vida humanos têm impulsionado a demanda por alimentos prontos para consumo com o mínimo de processamento. Esses alimentos exigem soluções que garantam não só a segurança e a saúde, mas também a preservação de sua qualidade, sabor, textura, cor e vida útil prolongada. A tecnologia de nanomateriais tem se mostrado eficaz no combate à contaminação por patógenos alimentares, como bactérias e toxinas microbianas, sem comprometer as qualidades nutricionais dos produtos. Estudos apontam que, em 2013, mais de 800 surtos de doenças transmitidas por alimentos foram registrados nos Estados Unidos, resultando em mais de 13.000 doenças, 1.000 hospitalizações e 16 mortes. O uso de nanocompósitos pode ajudar a evitar a contaminação durante os processos de manipulação, corte e embalagem dos alimentos.

Embora os métodos convencionais de detecção de patógenos alimentares sejam demorados, caros e exigem grande esforço, a nanotecnologia oferece uma abordagem mais precisa, rápida e custo-efetiva para identificar contaminantes em várias etapas da produção de alimentos. O uso de nanocompósitos biodegradáveis, oriundos de biomassa ecológica, como polinucleotídeos, polissacarídeos e polipeptídeos, tem mostrado grande potencial. Além disso, esses materiais biocompatíveis são compostos por monômeros produzidos por microorganismos, como o PHB e a celulose bacteriana, que possuem características vantajosas em relação aos polímeros sintéticos.

A introdução de nanocompósitos de polímeros na indústria de embalagens de alimentos remonta aos anos 1980, quando a nanotecnologia foi incorporada ao setor de polímeros. Um exemplo emblemático desse avanço ocorreu na década de 1990, quando a Toyota utilizou nanocompósitos de polímero (argila/nylon-6) em componentes de carros, como tampas de correia, substituindo peças metálicas. Esse desenvolvimento revelou as propriedades imiscíveis dos nanomateriais, como barreiras mecânicas com pequenas quantidades de material, o que culminou na popularização dos polímeros nanocompósitos em várias aplicações, inclusive no setor de embalagens alimentícias.

No caso das embalagens, os polímeros sintéticos apresentam propriedades versáteis como resistência mecânica e química contra a degradação microbiana, leveza, baixo custo e facilidade de processamento. No entanto, o uso exacerbado desses materiais derivados do petróleo tem gerado sérios problemas ambientais, como o acúmulo de resíduos plásticos e a liberação de grandes quantidades de CO2 durante o processo de incineração. Em contraste, os biopolímeros microbianos, como o PHB e o PLA, vêm ganhando espaço como alternativas sustentáveis, pois são biodegradáveis e não deixam resíduos tóxicos após a degradação.

Diversos tipos de biopolímeros, como os polihidroxialcanoatos (PHA), o PHB e o polilactídeo (PLA), estão sendo cada vez mais empregados na indústria de embalagens alimentícias. Embora esses biopolímeros apresentem custos de produção mais elevados, resistência térmica limitada e propriedades mecânicas inferiores quando comparados aos polímeros sintéticos, a aplicação da nanotecnologia tem sido um meio eficaz de melhorar essas características, tornando-os mais competitivos. O avanço da biotecnologia tem permitido o desenvolvimento de biopolímeros microbianos, como o PHB, que podem ser sintetizados por bactérias em condições específicas de excesso de carbono e carência de nitrogênio e fósforo.

Além das vantagens ambientais, os biopolímeros também oferecem benefícios econômicos ao substituírem os polímeros derivados do petróleo. A utilização desses materiais renováveis tem como objetivo principal a redução das emissões de gases de efeito estufa e a mitigação da poluição causada pelos plásticos convencionais. Os polímeros microbiológicos, como o PHA e o PLA, têm sido cada vez mais adotados para resolver problemas relacionados à poluição da água e do solo, sendo uma solução viável para a indústria alimentícia que visa práticas mais responsáveis e sustentáveis.

Como as Nanopartículas Biossintetizadas Estão Transformando o Tratamento e Diagnóstico do Câncer

O uso de nanopartículas no tratamento e diagnóstico do câncer está em estágios iniciais ou ainda não totalmente desenvolvido, mas já apresenta perspectivas promissoras. Essas nanopartículas, que podem ser biossintetizadas por organismos vivos, têm a capacidade de atravessar barreiras biológicas e realizar interações moleculares cruciais para a terapêutica e diagnóstico de várias doenças, incluindo o câncer.

Pesquisas indicam que organismos como Cryptococcus laurentii, ao serem transformados em nanopartículas de prata, demonstram efeitos anticancerígenos desejáveis, especialmente contra células de câncer de mama. Outro exemplo notável vem da Saccharomyces boulardii, que, ao sintetizar nanopartículas de platina, mostrou atividade anticancerígena in vitro contra células de câncer cervical e de mama. Essas nanopartículas de prata biossintetizadas têm se mostrado eficazes na promoção de apoptose, morte celular e endocitose de células cancerígenas. Além disso, a bactéria Streptomyces bikiniensis, com a adição de selênio — um elemento com atividades anticancerígenas conhecidas —, induziu apoptose em linhagens celulares de câncer de mama (MCF-7) e fígado (Hep-G2) através da mobilização da cromatina e do estresse oxidativo.

Organismos fúngicos, como a Candida albicans, também têm se destacado na síntese de nanopartículas de ouro, que agem como sondas, ligando-se a marcadores específicos nas membranas das células tumorais. Essas nanopartículas, quando conjugadas com anticorpos, têm a capacidade de se ligar diretamente aos antígenos na superfície das células cancerígenas, sem afetar as células normais. A utilização de Bacillus cereus para a síntese de nanopartículas de óxido de ferro demonstrou um potencial anticancerígeno contra células de câncer de mama (MCF-7) e fibroblastos (3T3). A produção de formulações bimetálicas (Ag-Au) a partir de diferentes cepas bacterianas também se mostrou promissora na área de terapias anticâncer, com algumas partículas de prata apresentando atividade antimicrobiana e anticancerígena contra células de câncer de mama.

As algas marinhas, como o Sargassum muticum, têm demonstrado um papel relevante na biossíntese de nanopartículas como as de ZnO, que induzem a apoptose e reduzem a angiogênese em células de câncer hepático (HepG2). Outras algas, como Gelidium amansii, ao sintetizarem nanopartículas de prata (AgNPs), exibem atividades antimicrobianas e formam biofilmes eficazes contra diversas cepas bacterianas. O uso de algas como o Sargassum crassifolium também tem se mostrado eficiente na produção de nanopartículas de ouro que, ao interagir com a luz UV, apresentam características inovadoras, como a diminuição do tamanho das nanoformulações devido ao aumento nos centros de nucleação durante a redução das partículas.

Outro estudo relevante é o de nanopartículas de óxido de cobre sintetizadas com Cystoseira trinodis, que mostram elevados potenciais antioxidantes e antibacterianos. A diversidade de cepas bacterianas e algas disponíveis para a biossíntese de nanopartículas é um campo em crescimento, com pesquisas revelando novos materiais com propriedades terapêuticas valiosas.

Além do uso terapêutico, as terapias microbianas para o câncer, incluindo a imunoterapia, têm mostrado um aumento significativo no número de ensaios clínicos e pré-clínicos. Essas terapias geralmente se baseiam no uso de bactérias, que podem induzir uma resposta imune eficaz contra células tumorais. A combinação da vacina BCG (Bacillus Calmette-Guérin) com bactérias atenuadas, por exemplo, demonstrou estimular uma resposta imunológica inespecífica contra tumores. A viroterapia, que utiliza vírus para regressão de células tumorais, também tem sido uma área de interesse crescente, com o uso de vírus como o herpes para o tratamento de cânceres específicos.

A vacinação “in situ” é outro método interessante em que o tumor é tratado como um antígeno, e um adjuvante é introduzido diretamente no tecido tumoral. Esse processo visa gerar uma potente resposta antitumoral local, que pode ser útil no combate à metástase. A capacidade dos micro-organismos de modificar o microambiente do tumor, transformando um ambiente imunossupressor em um ambiente imunostimulante, também tem mostrado grande potencial. Isso pode ser alcançado por meio da incorporação de adjuvantes nas bactérias, clonagem de antígenos imunoestimulantes ou pela redução das células imunossupressoras.

Além disso, alguns microorganismos, como Salmonella enterica, Listeria monocytogenes e Clostridium novyi, têm sido selecionados para terapias tumorais devido à sua capacidade de colonizar o microambiente tumoral. Essas bactérias são modificadas geneticamente para produzir antígenos específicos para tumores, como a interleucina-2 (IL-2), que pode induzir uma resposta imunológica mais eficaz contra as células tumorais.

Embora as terapias microbianas mostrem grande potencial no tratamento de cânceres, ainda existem desafios, como a necessidade de maior compreensão dos mecanismos moleculares e imunológicos envolvidos, e a superação das limitações da viroterapia, que ainda está em fase de pesquisa. O futuro da medicina oncológica pode ser profundamente impactado por esses avanços, abrindo portas para tratamentos mais específicos e menos invasivos.

A Tecnologia de Nanossensores e Microscopia para Identificação Microbiana e Detecção de Patógenos

A identificação de microrganismos, como bactérias, vírus e toxinas, é um dos maiores desafios enfrentados nas ciências biomédicas. Avanços significativos têm sido feitos com a aplicação de tecnologias baseadas em nanossensores e técnicas de imagem em escalas nanométricas, oferecendo novos horizontes para diagnósticos rápidos e precisos. O uso de nanotecnologia tem permitido a criação de sensores multifuncionais capazes de realizar a identificação multiplexada de patógenos de maneira mais eficiente do que os métodos tradicionais, como PCR ou imunoensaios.

O uso de sensoriamento por ressonância de plasmones de superfície (SPR) é um exemplo de como a nanotecnologia pode revolucionar a detecção de microrganismos. No SPR acoplado por graduação (GR-SPR), um sensor de superfície metalizada, frequentemente composto de metais nobres, permite a detecção de mudanças ópticas a partir do acoplamento de luz colimada em plasmones de superfície. Esse método tem a vantagem de medir essas mudanças do mesmo lado da superfície sensorial onde ocorrem os eventos de ligação, permitindo a detecção simultânea de múltiplos tipos de moléculas ligadas. A adaptação desse método para ambientes biológicos, como líquidos corporais, aumenta sua aplicabilidade para diagnósticos clínicos de infecções.

Além disso, a técnica de espalhamento Raman amplificado por superfície (SERS) tem sido amplamente explorada para a detecção e rotulagem rápidas de materiais biológicos, incluindo cepas bacterianas. O princípio por trás do SERS é o aumento da intensidade do sinal Raman de moléculas ao utilizar substratos plasmonicos feitos de nanomateriais metálicos, como ouro, prata ou cobre. Esse aumento de intensidade pode chegar a ordens de magnitude de 10^5 a 10^8, permitindo uma detecção mais sensível e precisa. A presença de estruturas metálicas nas superfícies amplia o campo elétrico local, intensificando a interação com a luz laser incidente e facilitando a detecção de biomoléculas com alta resolução. A evolução dessa técnica tem demonstrado grandes avanços na identificação de diferentes cepas bacterianas e na avaliação de sua resistência a antibióticos. Por exemplo, nanopartículas de ouro e prata funcionalizadas com ligantes específicos para espécies patogênicas podem ser usadas para detectar simultaneamente patógenos como Salmonella typhimurium, Staphylococcus aureus e Escherichia coli.

Outro avanço importante é o uso de nanopartículas com propriedades antibióticas, como as nanopartículas de ouro-prata, para aumentar a captura de bactérias, sem que haja interação com componentes sanguíneos humanos. Esses sensores antibióticos são promissores para diagnósticos clínicos, especialmente no rastreamento de infecções hospitalares, intoxicações alimentares e contaminações de água potável. O método SERS é especialmente vantajoso em ambientes clínicos e industriais devido à sua sensibilidade e facilidade de adaptação a diferentes sistemas de captura, como anticorpos, aptâmeros e peptídeos.

Nanotecnologias estão sendo cada vez mais utilizadas não só para diagnóstico, mas também para tratamento. Sistemas terapêuticos e de entrega de medicamentos baseados em nanomateriais, sejam eles orgânicos ou inorgânicos, têm demonstrado ser eficazes no combate à resistência bacteriana. Esses nanossistemas funcionam interferindo nos mecanismos de resistência das bactérias, seja entregando fármacos diretamente às células infectadas ou agindo como agentes antimicrobianos. Esses sistemas não apenas melhoram a eficácia dos tratamentos, mas também ajudam a minimizar os efeitos colaterais, direcionando os medicamentos diretamente aos locais de infecção.

Embora essas técnicas tenham mostrado avanços impressionantes, é importante destacar que as abordagens atuais, como as baseadas em PCR e imunoensaios, ainda são consideradas padrão ouro para a detecção de patógenos. No entanto, essas técnicas tradicionais exigem equipamentos caros, procedimentos demorados e interpretação especializada. A combinação de métodos, como os testes moleculares e imunológicos, pode oferecer uma solução mais eficaz em determinadas situações, especialmente em cenários de alta complexidade onde múltiplos patógenos precisam ser identificados rapidamente.

Por fim, técnicas como a microscopia de força atômica (AFM) têm se mostrado promissoras para a análise detalhada das propriedades mecânicas das células bacterianas. Com alta resolução, a AFM permite a visualização de características estruturais das bactérias, como parede celular, adesão, elasticidade e propriedades hidrofóbicas ou hidrofílicas, sem necessidade de coloração ou fixação. Essa técnica pode ser particularmente útil na diferenciação entre células viáveis e não viáveis, bem como na avaliação de mudanças estruturais associadas a diferentes condições patológicas ou à exposição a antibióticos.

Para compreender completamente o comportamento dos patógenos, é fundamental considerar não apenas suas propriedades biológicas e genéticas, mas também as interações mecânicas e estruturais das células bacterianas. O uso combinado de diferentes ferramentas nanotecnológicas para estudar essas interações pode, sem dúvida, abrir novas possibilidades no diagnóstico e tratamento de infecções microbianas.

Como a Espectroscopia Raman Melhorada (SERS) Pode Revolucionar o Estudo de Bactérias e Microorganismos

A utilização de nanopartículas de ouro (Au NPs) suportadas em sílica (SiO2) através de um processo de sol-gel multietapas, com NaBH4 como agente redutor, tem se mostrado um avanço significativo nos estudos de espectroscopia Raman aprimorada (SERS) para análise de bactérias. Esses substratos de Au NPs impregnados com SiO2 foram dispostos sobre chips de vidro e deixados para cura. Em seguida, as espectroscopias SERS das bactérias foram obtidas usando um microscópio Raman. Nos espectros SERS, observou-se a contribuição de diferentes grupos químicos presentes nos metabolitos celulares das bactérias, relacionados à degradação de purinas, como adenina, hipoxantina, guanina, ácido úrico e AMP (Premasiri et al., 2016, 2017, 2004). Uma observação interessante foi que os espectros SERS das bactérias pareciam ser uma combinação linear dos espectros dos metabolitos, o que revelava a interação seletiva das Au NPs com essas moléculas.

O exemplo do Enterococcus faecalis demonstrou que o espectro SERS era composto por 21% de adenina, 61% de hipoxantina, 10% de xantina e 8% de guanina. Isso indicou que as Au NPs interagiram fortemente com essas substâncias, mesmo quando se tratava de purinas, moléculas típicas do interior da parede celular bacteriana. Sabe-se que as purinas estão associadas a muitas reações de transferência de elétrons dentro da célula (Mosier-Boss, 2017). O fato de os compostos serem ejetados das células e se ligarem às Au NPs foi confirmado quando os pesquisadores coletaram o sobrenadante após as etapas de lavagem das bactérias e realizaram a análise SERS nesse líquido filtrado, observando que o espectro do sobrenadante correspondia exatamente ao sinal SERS das bactérias, confirmando a liberação desses compostos (Premasiri et al., 2016).

Outro exemplo relevante pode ser observado no trabalho de Chu et al., que utilizaram uma técnica de deposição física a vácuo chamada método de deposição em ângulo oblíquo (OAD) para crescer nanorods de prata (Ag). Este método permite o crescimento preferencial de nanorods em uma direção específica, conferindo maior controle sobre o tamanho, forma e densidade das nanoestruturas ao variar parâmetros experimentais. Os nanorods de Ag obtidos pelo método OAD apresentaram espectros SERS reprodutíveis para S. typhimurium e E. coli O157:H7. Observou-se picos característicos de SERS em 735 e 1328 cm^-1, entre outros. Para investigar a especificidade do SERS usando esses nanorods de prata, os autores realizaram testes com bactérias Gram-positivas e Gram-negativas, observando que a diferença espectral entre os dois tipos de Gram era visível, enquanto as variações dentro de um mesmo tipo de Gram não eram tão evidentes. Isso reforça a ideia de que o efeito SERS é de curta distância e, portanto, os espectros observados se devem aos componentes da parede celular das bactérias.

Recentemente, Nayak et al. reportaram o crescimento hidrofóbico mediado de nanobuds galvanoplásticos de prata a partir de nanofios de germânio (GeNWs) como substratos potenciais para análise bioquímica por SERS. Os nanofios de germânio, fabricados usando um método de deposição química a vapor assistida por plasma (PECVD), garantiram um crescimento denso e vertical, sendo um material ideal devido ao seu maior potencial de redução em comparação com metais nobres como Au, Ag e Pt. Além disso, a técnica ofereceu uma vantagem significativa: a possibilidade de armazenar os GeNWs em condições ambientes, o que aumenta a durabilidade do substrato. O germânio, neste caso, desempenha o papel duplo de agente redutor e suporte metálico. Substratos como esse são ideais para aplicações no campo, especialmente em sistemas portáteis e manuais para a detecção de bactérias.

Diversos outros estudos focaram na imobilização ou isolamento de bactérias antes de realizar os experimentos SERS, e uma gama de substratos foi testada. O uso de tais substratos garante que a análise se concentre apenas na parede celular externa das bactérias e não na membrana celular interna, já que os substratos contendo nanopartículas de prata ou ouro não conseguem atravessar a parede celular externa de lipopolissacarídeos (LPS). Contudo, esses substratos podem ser usados com sucesso para estudar os metabolitos que as bactérias secretam, os quais podem ser detectados facilmente.

Além dos metabolitos, a espectroscopia Raman também tem sido aplicada no estudo da comunicação celular entre bactérias, um processo conhecido como quorum sensing (QS). No QS, as bactérias produzem substâncias químicas que aumentam sua concentração à medida que a densidade celular aumenta, permitindo que as células se comuniquem para regular várias atividades fisiológicas, como a virulência, a produção de antibióticos, motilidade, esporulação e formação de biofilmes. Isso abre um campo promissor para o uso de SERS no estudo do QS bacteriano.

Portanto, ao explorar os diversos tipos de substratos e técnicas de crescimento de nanopartículas metálicas, pode-se obter informações detalhadas sobre os componentes das paredes celulares bacterianas, suas secreções e a interação dessas células com o ambiente. O potencial da SERS para detectar bactérias e analisar suas interações moleculares é vasto, e as inovações em nanotecnologia estão proporcionando uma revolução nas metodologias de diagnóstico e pesquisa microbiológica.