O comportamento térmico e a interação entre os materiais LLZTO (Li7La3Zr2O12) e LxCO (Li0.5CoO2) têm sido amplamente estudados devido às suas implicações nas baterias de estado sólido, particularmente no que diz respeito à formação de camadas altamente resistivas e ao desempenho eletroquímico. Em temperaturas elevadas, a estrutura do LLZTO, caracterizada por sua rede tipo garnet, passa por um processo de colapso gradual, o que afeta diretamente a sua estabilidade e eficiência como eletrólito sólido.

A análise da distribuição elementar na interface entre LLZTO e LxCO revelou a difusão intermetálica dos metais de transição à medida que a temperatura de calcinação aumenta. À temperatura de 200 °C, a distribuição dos elementos La, Zr e Ta permanece quase idêntica, sugerindo que a estrutura do LLZTO ainda está preservada após a extração do lítio. No entanto, entre 200 e 500 °C, a estrutura tipo garnet começa a perder sua cristalinidade, o que provoca uma leve mudança na distribuição dos metais de transição. A partir de 500 °C, observa-se a difusão significativa de cobalto (Co) no LLZTO, o que corrobora as observações de difração de raios-X (XRD) que indicam a decomposição do LLZTO, uma reação impulsionada pela formação de vacâncias de lítio e oxigênio.

O comportamento termodinâmico da reação entre LLZTO e LxCO foi avaliado por meio de cálculos da energia de Gibbs, que indicaram que a reação entre esses dois materiais é espontânea a temperaturas moderadas. Especificamente, a reação entre Li0.5CoO2 e Li2O resulta na formação de LiCoO2 e Li2O2, com uma energia de Gibbs negativa de -1,03 eV, o que sugere que o processo é favorável energeticamente. Esse tipo de reação envolve a oxidação do LLZTO e a redução do LxCO, o que implica na evolução de oxigênio, um aspecto fundamental para o entendimento do comportamento eletroquímico desses sistemas.

No entanto, um aspecto crítico das reações interfaciais entre esses materiais é a migração de lítio. A diferença no potencial químico do lítio (ΔµLi) entre o LLZTO e o LxCO cria um gradiente que favorece a migração de lítio para o material com maior potencial eletroquímico. Esse fenômeno tem implicações diretas para a eficiência e estabilidade das células de baterias de estado sólido, pois a migração de lítio pode causar a formação de camadas altamente resistivas na interface, prejudicando o desempenho da célula. Observações experimentais, como as medições de impedância eletroquímica (EIS), mostram que antes do processo de anelamento térmico, a resistência de transferência de carga entre LLZTO e LxCO é considerável, mas diminui à medida que as reações interfaciais se desenvolvem.

Além disso, o estudo das energias de Gibbs também revela que, para temperaturas abaixo de 500 °C, a migração de lítio entre LLZTO e LxCO ocorre espontaneamente, o que pode levar a efeitos indesejáveis como a auto-descarga e a baixa eficiência columbica das células, especialmente em condições de alta temperatura. É importante notar que o comportamento do sistema depende da estabilidade termodinâmica e da reatividade dos materiais à interface, influenciando diretamente a performance das baterias.

Outro aspecto relevante é a decomposição do LxCO em LCO (LiCoO2) e Co3O4 em temperaturas mais baixas (cerca de 150 °C), acompanhada pela liberação de oxigênio. Essa decomposição ocorre como uma reação competitiva à migração de lítio, e seu entendimento é crucial para o desenvolvimento de materiais mais estáveis e eficientes para as baterias de estado sólido.

A formação da camada altamente resistiva está, portanto, relacionada a uma série de processos interligados, como a migração de lítio, a decomposição dos materiais e as interações térmicas, que são importantes não apenas para a compreensão das limitações atuais, mas também para o avanço no design de sistemas de baterias mais eficientes e estáveis. A migração de lítio e a fase separada dos materiais LLZTO e LxCO são as principais causas da formação dessas camadas resistivas, com consequências diretas na performance da célula.

No estudo dessas interações, é fundamental considerar tanto os fatores termodinâmicos quanto os aspectos eletroquímicos que influenciam as reações. A compreensão das diferenças de potencial químico de lítio entre os materiais, bem como os efeitos das reações a altas temperaturas, pode fornecer insights valiosos para o desenvolvimento de baterias mais duráveis e eficientes. A análise do comportamento desses materiais sob diferentes condições de temperatura e tratamento térmico é essencial para otimizar o desempenho e minimizar a formação de camadas resistivas que limitam a capacidade e a vida útil das baterias.

Como as Heterogeneidades Químicas e Estruturais Afetam a Reatividade dos Materiais Catódicos em Baterias de Íon de Lítio

O processo de mistura mecânica (MM) é um processo físico que leva à formação de heterogeneidades químicas e estruturais nos materiais sintetizados. Estas heterogeneidades têm um impacto direto na distribuição da reação de deslítiação e litiação, onde as reações ocorrem apenas em determinados domínios. A consequência disso é o declínio da capacidade das baterias, devido ao sobrecarga ou descarga excessiva local, além de uma degradação estrutural dos materiais envolvidos. Portanto, observar as estruturas heterogêneas em escala nanométrica e identificar os domínios onde essas reações ocorrem é essencial para entender a performance dos materiais.

Neste estudo, partículas de Li10/7V6/7O2 (Li2O 0,25 - LiVO2 0,75) foram escolhidas como exemplo de material catódico do tipo DRS rico em lítio, sintetizado por MM. Para análise detalhada, foram realizadas medições espectroscópicas de raios X na borda K do vanádio (V), utilizando técnicas avançadas de espectroscopia de absorção de raios X no SPring-8, uma fonte de radiação sincrotron. Mapas dos estados químicos, refletindo a valência do vanádio, a simetria do sítio do vanádio e a composição, foram derivados a partir das imagens espaciais resolvidas de XANES (estruturas de absorção de raios X na borda próxima) e imagens de fase.

Partículas de Li10/7V6/7O2 foram sintetizadas por MM, o que resultou em uma solução sólida entre Li2O e LiVO2. A capacidade reversível da eletrodo Li10/7V6/7O2 ultrapassou 350 mAh g−1, com boa retenção de capacidade. Para simular o estado de meia carga, foi realizada a deslitiação química das partículas de Li10/7V6/7O2 preparadas, utilizando iodo em acetonitrila, resultando em partículas de Li10/7V6/7O2 deslitidas.

As partículas de Li10/7V6/7O2 preparadas e deslitidas foram dispersas em soluções de acetonitrila e depositadas em membranas Si3N4 de 500 nm de espessura, sob uma atmosfera de argônio. As medições espectroscópicas de raios X foram realizadas usando raios X na borda K do vanádio, e as imagens complexas de transmissão da amostra foram reconstruídas por meio do algoritmo ePIE com a restrição KKR. As imagens obtidas revelaram heterogeneidades significativas na distribuição dos estados químicos dentro das partículas de Li10/7V6/7O2.

As imagens de microscopia eletrônica de varredura (SEM) e as imagens reconstruídas de absorção e fase mostraram uma boa correspondência na forma das partículas, permitindo uma análise precisa da distribuição de estados químicos nas partículas preparadas e deslitidas. As medições de XANES espacialmente resolvidas indicaram um aumento da valência do vanádio na amostra deslitida em comparação com as partículas preparadas, o que sugere uma oxidação do vanádio e alterações na estrutura de coordenação local.

Análises de ajuste de curvas realizadas nos espectros de XANES espaciais e imagens de fase permitiram a construção de mapas de estado químico para as partículas de Li10/7V6/7O2. Os mapas mostraram gradientes de valência de vanádio e padrões heterogêneos tanto nas partículas preparadas quanto nas deslitidas, com uma aparência manchada em escala submicrométrica. A distribuição heterogênea de estados químicos foi discutida em nível de partícula, revelando que a oxidação do vanádio ocorre da superfície para o interior da partícula, enquanto regiões deslitidas exibem áreas com maior concentração de V3+.

A análise de agrupamento de dados, baseada na semelhança dos estados químicos, revelou seis clusters distintos de propriedades químicas e estruturais nas partículas. Essas distribuições foram diferentes entre as partículas preparadas e as deslitidas. O cluster 1, mais abundante nas partículas preparadas, foi observado também nas partículas deslitidas, sugerindo variações no comportamento reativo dependendo da distribuição de estados químicos no interior das partículas.

Este estudo sublinha a importância de se considerar a heterogeneidade química e estrutural em materiais de bateria de íon de lítio. A capacidade de uma bateria não é determinada apenas pela quantidade total de lítio presente, mas também pela forma como esse lítio está distribuído no material, afetando diretamente as reações de deslitiação e litiação e, por conseguinte, o desempenho da bateria.

Além disso, é fundamental compreender que a deslitiação e litiação não ocorrem de maneira uniforme ao longo do material. Em materiais heterogêneos, as reações podem ser restritas a regiões específicas, o que resulta em degradação localizada e perda de capacidade. As implicações disso para o design de novos materiais e tecnologias de baterias são vastas. A habilidade de controlar e otimizar essas reações em nível nanométrico pode levar à criação de baterias com maior vida útil, eficiência e capacidade de carga.