A imagem do "bisão ferido" gravada nas cavernas de Altamira remonta a um passado distante, mas carrega em si uma relevância atemporal que transcende as fronteiras da arte e da história. O "bisão ferido", com sua cabeça imponente e patas quebradas, revela uma sensibilidade peculiar, quase uma premonição da futura humanidade. A arte pré-histórica não apenas ilustra o realismo brutal de uma luta pela sobrevivência, mas transmite algo mais profundo, quase metafísico: uma expressão da alma humana, onde a dor e a luta pela vida encontram uma expressão de beleza.
Quando, nas primeiras décadas após a descoberta das cavernas de Altamira, estudiosos rejeitaram a autenticidade dessas imagens, sugerindo que poderiam ser uma fraude contemporânea, o motivo estava na simplicidade e sofisticação das linhas. A precisão das figuras e a fluidez das pinceladas pareceram tão modernas que foram tidas como um produto de um artista europeu desconhecido. Mas com o tempo, e com novas descobertas de imagens semelhantes em cavernas remotas, o consenso foi alterado: as gravuras eram, de fato, da era Magdaleniana, cerca de 20.000 anos atrás. A perfeição da representação, como a forma como o movimento das patas do bisão estava descrito com tal tensão, e a resiliência de suas pernas curtas e firmes, revelou um profundo entendimento da realidade.
Este entendimento, por mais que pareça uma mera técnica de observação, esconde algo mais: uma sensibilidade moral. O "bisão ferido", ao contrário do que muitos poderiam esperar de uma representação pré-histórica, não transmite crueldade. A atitude do artista, ao retratar o sofrimento do animal, foi marcada pela compaixão, algo raro em representações de arte primitiva. Ele não pintou uma cena de violência desmedida, mas capturou a fragilidade, a humanidade do ser diante da dor. Tal abordagem nos faz refletir sobre a natureza da arte: como ela, mesmo nos tempos mais remotos, já carregava um potencial de transcendência, de conexão com algo maior do que o próprio ato de criação.
Esse olhar compassivo, que encontramos nas cavernas, ecoa através das gerações. Ao observarmos essa arte, não estamos apenas diante de uma representação de um animal, mas diante de um vislumbre da alma humana, de um "homem eterno" que, de alguma forma, já existia na essência daquele que, com suas mãos, desenhou o bisão. O artista pré-histórico, igualado ao vasto mundo ao seu redor, não era apenas um observador, mas um criador, moldando uma linguagem universal. Essa criação não era apenas de imagens, mas de uma consciência, uma profunda conexão entre o homem e o universo.
E é essa mesma consciência do "homem eterno" que se desenvolve ao longo dos séculos. A leitura das obras de Platão, como os diálogos que fascinaram a juventude de muitos filósofos, ilustra o processo de internalização de uma sabedoria ancestral. Quando um jovem, como o autor, se apropria dessa sabedoria e começa a "viver" com ela, ao invés de apenas estudá-la, ele começa a construir dentro de si o homem eterno. O que se segue é uma jornada de percepção e reconciliação com o passado. As palavras de Marx, que falam da preservação do legado dos antigos para o retorno ao homem "social", apontam para o mesmo conceito: compreender o homem eterno não como um fato distante, mas como algo que já existe dentro de cada um de nós, à espera de ser construído.
Hoje, a humanidade parece ter perdido em parte a simplicidade e a clareza do homem primitivo diante do mundo. O homem contemporâneo, sobrecarregado pela complexidade da vida moderna, já não se sente completamente igual ao mundo que o rodeia. A alma humana, que outrora era profunda e capaz de absorver o infinito, hoje parece mais fragmentada, em grande parte devido à sobrecarga de informações e exigências da vida moderna. O que, no entanto, persiste, é essa capacidade de refletir sobre o próprio ser, sobre a eternidade de sua existência, e sobre sua ligação com os outros seres e com o cosmos. A obra de arte, em sua forma mais pura, permanece como um meio de reconectar o homem com sua essência mais profunda.
O "bisão ferido" de Altamira, ao ser observado sob essa ótica, oferece uma poderosa metáfora: a luta pela vida, o sofrimento, a morte e a beleza são elementos indissociáveis da condição humana. O artista pré-histórico, ao retratar a dor de um ser ferido, não se limitava a capturar uma cena de caça ou uma necessidade pragmática, mas expressava algo universal. A compaixão, a luta pela sobrevivência, e a eterna busca por beleza e significado são os verdadeiros temas dessa arte que, apesar dos milhares de anos, ainda ressoa com força na alma contemporânea.
O desenvolvimento da consciência do "homem eterno" requer, então, um esforço de construção pessoal e espiritual. A arte, a filosofia e a reflexão sobre o passado não são apenas formas de entretenimento ou estudo, mas ferramentas fundamentais para a criação de um ser mais completo, capaz de compreender seu papel no mundo e no tempo. A construção dessa consciência exige uma sensibilidade para com o sofrimento, a beleza e a dignidade da vida, como os artistas da pré-história já demonstraram. Nesse sentido, a arte não é apenas uma representação do mundo, mas uma maneira de estabelecer uma relação profunda e constante com ele.
O Futuro da Automação e o Preço da Alma Humana: Reflexões sobre o Trabalho e a Arte
Dmitry Vasilyevich, com seu olhar de artista, dedicava-se ao estudo profundo do impacto da automação no ser humano, não apenas no que tange ao trabalho físico, mas também em suas implicações emocionais e espirituais. Em uma fábrica automatizada, os operários não mais precisariam usar as mãos, visto que as máquinas se encarregariam de tudo. "Tudo será belo e racional", pensava, "e a sociedade vai ter uma visão positiva sobre o que é mais valioso. Mas o que acontecerá com os trabalhadores? Como manterão a chama da criatividade e da humanidade acesa, quando suas funções forem reduzidas a meros espectadores do processo produtivo?"
Em sua visão, a automação pode tornar-se uma armadilha para a alma do trabalhador. Um operário, como Stepan Levichev, colocado diante de uma máquina, veria suas mãos, outrora imersas em um trabalho físico e criativo, agora inúteis. Mas Dmitry Vasilyevich, um homem de pensamento profundo, acreditava que, apesar da aparente desumanização do trabalho, o interior do ser humano não se perderia tão facilmente. A alma, dizia ele, é como um tesouro enterrado, que necessita ser desenterrado e revelado, mesmo nas condições mais adversas. Isso ressoava em seus próprios trabalhos e em sua vida. Ele havia sido, em sua juventude, envolvido em um acidente grave de carro, e durante os dias em que esteve entre a vida e a morte, passou a refletir profundamente sobre o que poderia deixar de legado para o mundo. Foi a arte que o salvou, mesmo quando o médico, tão certinho em sua perspectiva mecanicista da vida, declarou que ele jamais voltaria a trabalhar com sua pintura.
O conflito entre a máquina e o ser humano, entre a racionalidade fria e a sensibilidade criativa, se desenrolava também nas suas obras. No pequeno estúdio em que recebi sua hospitalidade, Dmitry me mostrou vários de seus desenhos e pinturas, que estavam longe de ser meras representações mecânicas da realidade. Ele pintava a alma humana, pintava os rostos e os olhos que captavam não só os detalhes exteriores, mas as emoções que habitavam cada ser. A expressão em suas aquarelas não se limitava a um simples retrato físico, mas refletia, sobretudo, a luta interna de seres humanos que não aceitavam ser reduzidos a máquinas. Seu retrato de um médico, por exemplo, não era apenas uma reconstituição visual do seu interlocutor, mas um comentário sobre os limites da medicina e da razão humana diante da complexidade do espírito.
Dmitry explicou com uma certa tristeza amarga que, para ele, cada pintura, cada retrato, representava uma forma de vingança doce contra um sistema que queria limitar suas ambições e sua liberdade criativa. "Vingança", disse ele, "não é apenas raiva, mas uma forma de afirmar a nossa resistência contra o que tenta nos desumanizar." E assim, ele pintava médicos, os mesmos que, anos atrás, haviam duvidado de sua capacidade de voltar a criar. Agora, com as mesmas mãos que estavam fracas e feridas, ele modelava e pintava, criando métodos novos, encontrando soluções inovadoras, como se tentasse desafiar o próprio destino que tentava torná-lo uma mera sombra de quem ele realmente era.
Seu amor pela arte era uma forma de superar as limitações do corpo e da mente, de transformar a dor em beleza e em força. "Mesmo o sistema automatizado", dizia ele, "pode ser um terreno fértil para novas criações, desde que o ser humano não perca a sua capacidade de sonhar, de pensar, de amar." O automóvel, a fábrica, as máquinas — tudo isso, se devidamente compreendido, poderia ser um campo de novas possibilidades. Mas para isso, era necessário que o ser humano não se deixasse reduzir a um simples operador de mecanismos. E ele acreditava que, apesar da aparente indiferença do mundo moderno, as pessoas ainda podiam encontrar sua verdadeira vocação nas pequenas coisas, nas expressões da arte e da criatividade.
Em sua casa, entre livros de automação, hidráulica e cerâmica, Dmitry Vasilyevich também exibia a sua habilidade de transformar o comum em extraordinário. Um retrato de Aeschylus, por exemplo, demonstrava uma profunda conexão com a tragédia grega, algo que, aos olhos de muitos, poderia parecer obsoleto ou distante da realidade da produção moderna. Porém, para Dmitry, o teatro antigo era um reflexo da luta atemporal pela liberdade e pela justiça, temas que, apesar de milenarmente debatidos, continuam a ser urgentes na sociedade de máquinas e algoritmos de hoje.
Ele me convidou então a ouvir uma de suas leituras favoritas: Prometeu Acorrentado. A tragédia de Prometeu, o titã que desafiou os deuses para dar o fogo à humanidade, ressoava em seu coração como um símbolo eterno de resistência. "A chama que Prometeu deu aos homens", ele disse, "é nossa responsabilidade agora manter acesa, mesmo em tempos de escuridão." Ele falava, sem perceber, de como a humanidade deve continuar lutando por sua liberdade e criatividade, mesmo quando o mundo ao seu redor se torna cada vez mais automatizado e impessoal.
Neste momento, o fogo do Prometeu não era apenas um símbolo antigo, mas uma metáfora para o poder da criação humana, que jamais deveria ser apagado, mesmo diante dos desafios mais avassaladores da modernidade. Dmitry Vasilyevich acreditava que, como o titã, cada um de nós tem o poder de desafiar as correntes da conformidade e de criar algo único, algo que somente a alma humana é capaz de gerar. A questão, então, não é se a automação vai substituir os seres humanos, mas como os seres humanos vão manter sua alma viva e pulsante, mesmo em uma era de máquinas.
O Conceito de Infância: A Perda do Potencial Criativo e a Busca pela Humanidade
O conceito do ser humano desperta a ideia de que a criança é um milagre. Não é por acaso que o amor pelas crianças ocupa um lugar especial na ética dos revolucionários. Revoluções são realizadas em nome das crianças. Se hoje existe mais infância no mundo moderno do que nas épocas passadas, é porque Lenin, "um garoto como qualquer outro", nasceu em Simbirsk há 100 anos. Dois mil anos atrás, um "garoto como qualquer outro", Spartacus, nasceu em um mundo cruel; 200 anos atrás, um "garoto como qualquer outro", Robespierre, devorava os livros de Rousseau; 150 anos atrás, um "garoto como qualquer outro", Marx, escrevia versos elevados. Parece não haver fim para esses "garotos como qualquer outro", ou meninas como qualquer outra: uma é Joana d'Arc, outra é Maria Volkonskaya, a terceira é Anne Frank, e a quarta é Tanya. Elas viveram em épocas diferentes, países diferentes, mas se uniram pela fé absoluta no triunfo do bem e pela sua abnegação.
Sim, é verdade que há mais infância no mundo de hoje. O fato de o ser humano ter aprendido a respeitar a infância é um sintoma grave de sua maturidade. E não menos grave é a promessa de um futuro melhor. Quanto mais cedo uma pessoa abandona a infância, mais infantilismo carregará em si. A base criativa da personalidade humana deve ser fortalecida na infância. As crianças são artistas, poetas, pensadores. A própria expressão "criança sem talento" parece absurda, embora ninguém, infelizmente, se surpreenda ao ouvir "pessoa sem talento". Talvez uma das questões mais importantes da vida seja por que crianças talentosas crescem para se tornar adultos sem talento. Para onde vai o talento? Será que todo o talento se esgota nos desenhos de uma criança, em seu amor pelos jogos e sua afeição pelos outros?
A linha do poema de Maiakovski, "Vladimir Ilyich Lenin... como qualquer outro menino", pode ser tomada como uma metáfora para algo mais profundo. Esse "menino como qualquer outro" não só encarna a humanidade, mas também carrega o simbolismo da transição da infância para a maturidade, e o risco de perder a essência criativa que define essa fase da vida. Porém, o que acontece com o talento infantil? Onde ele vai? Ele desaparece à medida que as responsabilidades crescem? É possível que a criança dentro de nós se perca ao longo dos anos, dando lugar a um adulto sem brilho, que segue a vida sem uma centelha criativa ou esperança genuína.
Há muitos homens e mulheres que se assemelham em suas ações, mas não há duas crianças iguais. Deveria ser o oposto: à medida que envelhecemos, as diferenças entre as pessoas e suas personalidades deveriam se tornar mais evidentes. Mas, na realidade, essas diferenças se diluem, deixando apenas a memória do mundo único e maravilhoso da infância. Para onde foi a criança? Pode ser que um indivíduo desanimado, sem talento, que anda com uma expressão comum no rosto e repete frases estereotipadas, tenha sido um dia uma criança? Às vezes, parece que a criança realmente partiu, desapareceu silenciosamente ao amanhecer, sem querer se transformar nesta pessoa adulta sem brilho, vivendo agora em um lugar distante — desenhando, fazendo modelos, encantado com o mundo, amando cães e o sol. Pode existir um lugar fantástico, um país das crianças que fugiram, um lugar onde elas permaneceram sendo elas mesmas, sem as correntes da idade adulta?
Neste país eterno da infância, não existem meninos-Sócrates ou meninos-Tolstói, pois estes não precisaram fugir. Eles vivem dentro do homem eterno. E talvez, no futuro, a população desse país fantástico cesse de crescer, sem que mais nenhum menino ou menina seja adicionado nos próximos mil anos, porque o homem será capaz de manter a criança dentro de si mesmo. A criança não precisará mais fugir. E então, as palavras "pessoa sem talento" parecerão tão absurdas quanto hoje soa "criança sem talento".
Enquanto isso, as crianças continuam a fugir, e o mais angustiante é que não percebemos. Um ser humano se abala com a perda de uma carteira ou de posses materiais, mas raramente se perturba ao perceber que perdeu a criança dentro de si. E isso, sem dúvida, é a maior perda possível. A fórmula de Goethe, embora tenha sido dita sobre a coragem, se aplica perfeitamente aqui: "Para aqueles que perderam sua coragem, seria melhor que nunca tivessem nascido". A questão que se coloca não é se há ou não uma força metafísica agindo sobre o homem, mas sim a responsabilidade humana em lidar com as imperfeições da sociedade.
Hoje em dia, as crianças são mais diversas do que os adultos, devido às imperfeições sociais, e não cósmicas, do mundo. Alguns poderiam argumentar que o cósmico se reflete no social, mas a verdade é que o homem é suficientemente cósmico para dominar o mundo. Ele dominará o poder social, assim como dominou o segredo do fogo na aurora da existência e agora está dominando a energia atômica. O capital está dedicado a dominar o poder social, e uma das páginas mais significativas disso diz respeito a Shylock, que segura uma faca sobre uma criança de oito anos. Não há nada mais indefeso do que a infância.
O tormento de Ivan Karamazov é compreensível para qualquer pessoa que ainda não tenha perdido o dom da compaixão. A dor que sentimos, a compaixão por uma criança, não pode ser comparada a qualquer outro sentimento. A dor aguda se mistura com a sede de ação, o sentimento de nossa própria impotência com a sensação de esquecimento, a aversão ao mundo com o amor pela vida. Um dos sentimentos humanos mais elevados, em minha opinião, é o sentimento de culpa diante das crianças. Ele, claro, surge da compaixão, mas é mais amplo e mais consciente do que a compaixão. Se a compaixão é, de fato, dor, então o sentimento de culpa é o próprio pensamento da dor.
No entanto, embora a essência deste sentimento seja profundamente humana, não devemos nos contentar com ele. Precisamos ir além, até que a consciência de nossa responsabilidade moral pelo presente e pelo futuro se torne evidente. O pensamento da dor deve ser culminado em uma ação que a suavize. A responsabilidade ética pelo futuro se torna especialmente urgente quando olhamos para frente e vemos, em nossa mente, a criança do futuro. Podemos passar muito tempo falando sobre a ameaça genética representada pelas explosões atômicas, ou podemos fazer algo diferente. Podemos tentar imaginar uma menina feia, como a descrita por Nikolai Zabolotsky, apenas ainda mais feia, mais infeliz, mas ainda assim feliz. Ela é aleijada e, em 500 ou 1.000 anos, ela andará por uma cidade banhada pela luz do sol, indo até as margens do mar, questionando sua solidão, perguntando-se por que não é como as outras jovens felizes. Quem explicará a ela que o relâmpago branco sobre Hiroshima em um dia de agosto no lendário século XX está fatalmente ligado à sua desgraça? Mas será necessário explicar isso a ela? O absurdo permanece absurdo, mesmo quando explicado em termos de biologia molecular.
E não é possível perceber agora o vínculo entre a menina que caminhou até o Nietzsche insano e a menina que nasceu aleijada muitos anos depois, porque a humanidade havia perdido sua humanidade muito antes de ela nascer? Em uma narrativa sobre o homem eterno, podemos até imaginar que ela e a outra menina são a mesma pessoa. Pessoalmente, porém, gostaria de acreditar que a razão humana será capaz de proteger as crianças de tanto os males antigos quanto os novos.
Não estou sugerindo uma esperança ingênua ou inviável. Pois certamente, entre os meninos e meninas medianos que existem hoje, está uma criança de gênio. ESTA CRIANÇA DE GÊNIO É A HUMANIDADE.
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