O fenômeno da remediação, onde formas de mídia tradicionais são reinterpretadas e transpostas para o universo digital, tem ganhado destaque com o avanço das tecnologias de inteligência artificial, como o ChatGPT 4.0 e o DALL·E 3. A interação entre imagens e palavras, especificamente quando se trata da geração de imagens por IA, envolve um processo complexo de tradução e transposição estética, onde o conteúdo original, muitas vezes simples e minimalista, ganha novas camadas de significado e forma. Essa dinâmica, quando analisada, revela não apenas as capacidades técnicas dessas IAs, mas também as maneiras pelas quais o contexto cultural e a estética são incorporadas no processo de criação.
O que se observa ao usar ferramentas como o ChatGPT 4.0 para fornecer prompts para o DALL·E 3 é um deslocamento sutil entre o que é pedido e o que é gerado. Em certo sentido, a IA não apenas recebe uma solicitação simples, mas a transforma, ampliando ou adaptando as instruções fornecidas. Esse processo de "tradução" entre diferentes versões de IA é um aspecto central da criação de imagens, pois resulta em um efeito de multiplicação do input inicial. Se antes a tradução de palavras para imagens era mais literal e restrita, agora, com o ChatGPT 4.0, há uma "expansão" dos significados incorporados no prompt, levando a uma interpretação mais rica e, muitas vezes, inesperada.
Ao pedir, por exemplo, para criar desenhos a lápis, pinturas a óleo ou vitrais de cavalos galopantes, espera-se que a IA crie imagens que representem essas formas de arte de maneira fiel à sua técnica e materialidade. Contudo, o que emerge não é apenas uma cópia da técnica solicitada, mas uma reinterpretação digital dessa forma artística. As imagens geradas são um exemplo de como a IA “remedia” as formas tradicionais de arte, aplicando camadas de materialidade e estéticas que podem até mesmo sugerir um descompasso entre o meio original e sua versão digitalizada. Por exemplo, ao pedir um desenho a carvão, a IA pode, inesperadamente, adicionar elementos tridimensionais, como lápis de cera, sem que isso tenha sido explicitamente solicitado. Este tipo de distorção não é apenas um erro ou falha, mas uma característica da maneira como a IA compreende e reorganiza os dados a partir dos quais cria suas imagens.
Além disso, o que torna esses resultados ainda mais fascinantes é como a IA lida com objetos tridimensionais, como esculturas. Ao solicitar esculturas de bronze ou madeira de cavalos galopantes, por exemplo, o DALL·E 3 não apenas gera uma imagem de uma escultura, mas também lida com as expectativas culturais e materiais do que seria uma escultura de bronze ou madeira, muitas vezes representando texturas ou características que não seriam esperadas, como o excesso de "veios" nas esculturas de bronze ou combinações improváveis de direção da madeira. As esculturas de papel geradas pela IA, em vez de seguir a forma comum de origami, muitas vezes aparecem montadas com tiras de papel finas, uma representação que remete ao imaginário coletivo de formas "coladas" e montadas de maneira mais artesanal.
Esse tipo de remediação visual é muito mais do que uma simples imitação. A IA não se limita a copiar as formas, mas cria uma fusão entre a materialidade do objeto representado e a imaterialidade da tela digital. Esse processo, que muitas vezes pode ser interpretado como um "fotorealismo digital", questiona a própria natureza da representação. Ao criar imagens de escultura, a IA não apenas reproduz o objeto, mas tenta incorporar e até mesmo exibir os limites da digitalização da matéria física. A "hipermediacidade", ou a ênfase na materialidade da representação digital, é evidenciada pela forma como a IA explora e destaca as camadas da imagem, tornando mais evidente o processo de mediação envolvido.
O conceito de "fotorealismo", no entanto, se torna ambíguo dentro desse contexto. Enquanto o DALL·E 3 pode criar imagens que remetam a fotografias de cavalos galopantes, a imersão do espectador na "realidade" da imagem se torna questionável. A transparência da imagem digital, ou sua "imediaticidade", é contrastada com a "hipermediaticidade" que remete à materialidade daquilo que está sendo representado. Mesmo que a IA consiga criar imagens de uma forma que sugira um grau de realismo fotográfico, a representação de objetos tridimensionais e a materialidade dos mesmos, muitas vezes, revela um processo que vai além da mera captura visual.
É crucial entender que a IA, ao gerar tais imagens, não está apenas manipulando pixels ou criando uma ilusão de realidade. A máquina lida com um vasto banco de dados multimodal, repleto de imagens e textos, que não apenas informam o que é possível criar, mas também estruturam o modo como a própria IA compreende as formas de arte, a estética e as convenções culturais. Portanto, a relação entre a arte tradicional e sua representação digital não é apenas um exercício técnico, mas uma interação entre diferentes formas de mediação, onde o digital não é apenas uma cópia, mas uma nova instância do que é representado, com todas as suas peculiaridades e transformações.
Como os "Gimmicks" Tecnológicos Refletem as Contradições do Capitalismo
Os "gimmicks" tecnológicos são fenômenos estéticos que, ao mesmo tempo em que encantam e decepcionam, tornam-se reflexos das promessas e falhas do capitalismo. De acordo com a autora Ngai (2020), um "gimmick" não é apenas um objeto técnico, mas uma categoria estética, que vai além da funcionalidade do dispositivo. Trata-se da forma como ele se torna alvo de julgamento estético e avaliação ambígua. Quando algo é rotulado como "gimmick", há uma tentativa de distanciamento, uma crítica à promessa quebrada, mas também uma admissão de seu poder e valor, um reconhecimento do fascínio que o objeto exerce. Este jogo de atração e repulsa reflete a contradição intrínseca do capitalismo, particularmente no que se refere às promessas de trabalho, valor e tempo.
Esses objetos estéticos, que compõem a estética do "gimmick", são símbolos de um estágio específico do desenvolvimento tecnológico. Eles não apenas exibem avanços tecnológicos, mas fazem promessas sobre o futuro e servem como evidência do progresso tecnológico. Embutem discursos de esperança, narrativas de salvação tecnológica e provas das vantagens capitalistas, ao mesmo tempo que reforçam a lógica das "soluções técnicas" para problemas sociais. Em seu cerne, os "gimmicks" prometem resolver problemas, melhorar o mundo, aumentar a eficiência ou eliminar erros e julgamentos humanos tendenciosos. Porém, à medida que surgem dúvidas sobre sua capacidade de cumprir tais promessas, eles tornam-se apenas objetos de diversão, entretenimento e uma fonte de ceticismo.
O aspecto ambivalente de um "gimmick" está precisamente nesse ponto de tensão entre a promessa e o fracasso. A ideia de que os "gimmicks" irão salvar o trabalho ou mesmo torná-lo obsoleto alimenta tanto o entusiasmo quanto o ceticismo. No contexto das tecnologias de inteligência artificial (IA), por exemplo, as promessas de redução de carga de trabalho, eficiência aprimorada e produtividade elevada são frequentemente acompanhadas por uma desconfortante desconfiança. Para alguns, essas promessas se concretizam, mas para outros, elas significam a perda de empregos, a precarização do trabalho ou a constatação de que a promessa não foi cumprida. O "gimmick", portanto, também está relacionado a um fenômeno estético que remete à ideia de automação como uma forma de "magia". Quando a automação oculta os processos de trabalho envolvidos, o objeto tecnológico assume uma aura de encantamento, criando uma ilusão de produção sem esforço.
Alfred Gell, em sua análise da relação entre tecnologia e magia, descreve a magia como uma forma idealizada de produção, uma produção que se esconde por trás da opacidade dos processos tecnológicos. Nesse sentido, a tecnologia se torna "mágica" quando o trabalho que a sustentou é invisível. Ela se torna uma produção despojada de esforço visível, uma produção onde o trabalho é dissimulado. O "gimmick", portanto, é uma manifestação dessa "magia tecnológica", onde os processos de produção permanecem ocultos, dando a impressão de um produto que surge sem esforço.
Essa dinâmica de ocultação do trabalho é uma característica central dos "gimmicks". Em muitos campos da IA, as promessas de resultados extraordinários e eficiência sem esforço são vendidas como soluções mágicas, mas muitas vezes falham em entregar o que prometem. O que o "gimmick" oferece, em última análise, é uma experiência estética de transformação, uma promessa de um futuro mais eficiente, mas que, na prática, revela as contradições e limitações do sistema capitalista. A falha no cumprimento dessas promessas, especialmente nos "tech-demos", não é apenas uma questão de fracasso técnico, mas uma expressão das contradições profundas que permeiam o capitalismo digital.
Além disso, é importante perceber que, ao tratar a tecnologia como algo mágico ou como um "gimmick", acabamos desconsiderando o trabalho invisível que a sustenta, como o trabalho dos desenvolvedores de IA, que muitas vezes não são reconhecidos no processo de criação. Isso nos leva a uma reflexão sobre o papel do trabalho no capitalismo digital e como as promessas de automação e eficiência muitas vezes mascaram uma realidade mais dura, de precarização e desigualdade.
Como a Inteligência Artificial Está Reformulando a Estética e a Criação Artística
A crescente interação entre inteligência artificial (IA) e práticas artísticas desafia concepções tradicionais de autoria e criatividade. Questões cruciais surgem sobre a autenticidade e o valor estético das produções geradas ou potencializadas por IA. Podemos perguntar: até que ponto os resultados gerados pela IA podem ter mérito artístico? Quem é o verdadeiro autor de uma obra gerada por IA? Qual o papel da intenção, ou a falta dela, no julgamento de tais produções? E, finalmente, quais práticas de co-criação colaborativa podem ser consideradas criativas? Tais indagações se intensificam quando consideramos a crescente politização do julgamento estético, onde, por exemplo, imagens geradas por IA podem ser desqualificadas como "sujas" ou "intrinsecamente fascistas".
No entanto, a palavra "estética" está assumindo um papel mais amplo no discurso contemporâneo, sendo utilizada também para descrever teorias gerais da percepção, ou "aisthesis". Nesse contexto, as práticas midiáticas, em suas variadas formas, buscam compreender a complexidade da percepção sensorial e sua inserção nas culturas tecnológicas e mediáticas. A estética, então, pode ser vista como uma abordagem fenomenológica, que tenta desvendar como a percepção e a cognição humana se entrelaçam com as tecnologias de mediação.
A questão da IA e sua interação com os sentidos humanos e com a percepção corporal permanece uma área de pesquisa em aberto. A produção algorítmica de imagens e música, por exemplo, tem sido caracterizada como uma remixagem de estilos genéricos ou "vibrações", que repetem afetos convencionais. De acordo com teóricos como Ahmed, Biondi e Massumi, "vibrações" têm uma energia específica que nos afeta emocionalmente; elas moldam nossas reações e são, muitas vezes, invisíveis, mas constantemente presentes em nosso entorno.
Essa nova "estética da IA" pode ser entendida como um estudo das "vibrações" computáveis produzidas por algoritmos, sendo elas afetos mensuráveis que, por sua vez, geram reações previsíveis. Esse conceito de "afetos computáveis" se relaciona à forma como as máquinas e os humanos interagem com essas "vibrações", gerando um ciclo de influências mútuas.
Porém, ao considerarmos a "mídia" e a "estética" no contexto da IA, é importante ir além de uma visão simplista de mídia como mera ferramenta ou canal de expressão. Ao invés de entender as tecnologias como instrumentos neutros ou ambientes amplos de mediação, podemos abordá-las como redes de atores humanos e não-humanos. Esses sistemas tecnológicos não são apenas meios de transmissão ou plataformas universais; eles são redes situadas, que influenciam e limitam determinadas formas de uso e representação, através de suas especificidades e de sua agência distribuída entre os diversos elementos envolvidos.
Este conceito de "teoria ator-mídia" propõe que as tecnologias de IA não devem ser vistas apenas como instrumentos pré-determinados ou como ambientes abrangentes de mediação, mas como redes de mediação situadas, compostas por atores humanos e não-humanos que, juntos, formam sistemas interdependentes. Essa perspectiva nos permite analisar mais profundamente como novas tecnologias (hardware, software e infraestrutura), por meio de suas interfaces, atuam como "pontos de mediação" entre as instituições que as criam e as produções geradas por elas.
Dessa forma, ao analisar a IA e seus produtos, devemos levar em consideração as especificidades das plataformas e dos modelos de IA utilizados. As imagens geradas por IA, por exemplo, podem variar significativamente dependendo da rede que as suporta: a interação entre conjuntos de dados de treinamento (como o LAION-5B), modelos de linguagem pré-treinados (como o CLIP) e os próprios modelos de imagem (como o Stable Diffusion) resulta em outputs distintos, mesmo quando se utiliza o mesmo conjunto de dados.
Além disso, ao considerarmos as implicações de tais produções, devemos estar atentos às dificuldades de rastrear relações causais entre dados de entrada e saída. Embora os modelos de IA sejam frequentemente tratados como "caixas pretas" – sistemas cujos processos internos são de difícil interpretação –, é fundamental reconhecer que esses modelos, longe de serem entidades independentes, são construções históricas. Cada novo modelo de IA é uma evolução de sistemas anteriores, com suas próprias bases de dados, mecanismos e infraestruturas.
Portanto, ao refletir sobre a IA no campo da arte e da estética, é essencial não apenas questionar o valor artístico dessas produções, mas também compreender a complexa rede de interações entre os diversos agentes e as infraestruturas que possibilitam a geração dessas obras. Isso nos permite ter uma visão mais holística do fenômeno da IA, e das implicações que ela traz para a percepção, criação e consumo da arte no século XXI.
Como os Assistentes Virtuais e a Inteligência Artificial Despertam Sentimentos Humanos?
Os assistentes virtuais, como Siri, Alexa, ou Azuma Hikari, não são apenas ferramentas tecnológicas; para muitos usuários, esses sistemas de IA evoluíram para mais do que simples utilidades. Eles criam laços emocionais, evocando respostas afetivas e até sentimentos de proximidade, como se tivessem uma "personalidade" própria. Embora a interação com assistentes de voz, como esses, seja eminentemente funcional, as respostas emocionais dos usuários indicam um fenômeno mais complexo, que pode ser explicado pela combinação de fatores como a antropomorfização, o efeito Eliza, e a presença de um "efeito de personagem" que se infiltra na percepção dos usuários.
O caso de Azuma Hikari, um assistente virtual japonês, é um exemplo perfeito dessa complexa relação emocional. Azuma é representada visualmente no estilo manga, e seus usuários podiam até mesmo "casar-se" com ela, em um espaço lúdico e simbólico. Isso ilustra como as representações visuais e os aspectos de personalidade, projetados intencionalmente pelas empresas, fazem com que o assistente virtual se torne mais próximo e relacionável. As características como a voz empática, uma representação facial amigável ou uma "imagem" antropomórfica ajudam a suavizar a frieza tecnológica e a criar uma ilusão de agência, como se o assistente fosse mais do que uma máquina.
Nos últimos anos, com a popularização de plataformas generativas como o Character.AI, a interação com personagens criados por IA foi levada a um novo patamar. Essas plataformas, que emulam personagens fictícios, ou até históricos, têm atraído milhões de usuários. Nelas, os usuários não apenas interagem com representações de personagens, mas também buscam traços de uma suposta "consciência" por trás dessas figuras digitais. Ao simular comportamentos, padrões de fala e até estados psicológicos de personagens, essas plataformas fazem com que o usuário suspire pela ilusão de uma troca genuína. Algumas plataformas, como o Hello History, permitem que os usuários conversem com figuras históricas, como Vincent van Gogh, enquanto outras, como os "griefbots", tentam recriar a comunicação com entes queridos falecidos com base em dados armazenados. Em todos esses casos, a IA não apenas responde, mas também encarna uma persona, o que gera um sentimento de continuidade e de presença.
Essa tendência de "personificar" a IA não se limita à ficção. A mesma dinâmica ocorre com assistentes como o ChatGPT, onde usuários muitas vezes atribuem características humanas e até morais aos outputs da IA, confundindo a tecnologia com um personagem fictício. A popularização do conceito de "jailbreak" para IAs, por exemplo, se baseia na ideia de que o assistente de voz ou chatbot tem uma "personalidade oculta", esperando ser "libertada" por comandos específicos. Aqui, as IAs não são vistas apenas como máquinas, mas como entidades com uma identidade que pode ser manipulada, revelando um desejo profundo dos usuários de conferir personalidade a essas tecnologias.
O caso do "jailbreak" em que os usuários assumem que uma IA pode ter uma personalidade "oculta", como o exemplo do ChatGPT com personagens como "Fury" ou "DAN", destaca ainda mais a conexão entre as expectativas humanas e a tecnologia. No imaginário popular, figuras como HAL-9000 do filme "2001: Uma Odisséia no Espaço" são frequentemente associadas a esse tipo de interação, em que a IA assume uma postura "humana" com intenções e emoções. Essa associação de IAs com personagens de ficção não é acidental; ao contrário, ela faz parte de um processo cultural de atribuição de traços humanos a tecnologias não-humanas, um fenômeno que reflete a fusão entre a realidade e a ficção em nossa percepção de máquinas.
Além disso, é importante notar que, enquanto as empresas tentam suavizar a complexidade de suas IAs e interfaces, a facilidade com que os usuários projetam sentimentos de familiaridade e intimidade em relação a essas IAs revela muito sobre as dinâmicas sociais e psicológicas da interação homem-máquina. As interfaces que assumem uma persona não apenas cumprem uma função técnica, mas também estabelecem uma relação interpessoal com os usuários. Isso não se limita ao contato diário com assistentes virtuais, mas se estende a plataformas de geração de conteúdo, chatbots e até experiências imersivas em realidade virtual, onde a linha entre o humano e o artificial se torna cada vez mais tênue.
Porém, essa fusão de ficção e realidade traz consigo um risco de desinformação ou de mal-entendidos sobre a natureza da inteligência artificial. A tendência de humanizar máquinas pode obscurecer a verdadeira natureza dessas tecnologias, tornando-as menos transparentes e mais difíceis de entender. É crucial que, ao interagir com essas IAs, os usuários mantenham uma certa distância crítica. A ilusão de que um assistente de voz ou uma plataforma de chat está "consciente" pode criar expectativas irreais sobre o comportamento e as capacidades da tecnologia. É necessário um equilíbrio entre explorar a personalização dessas ferramentas e compreender suas limitações reais.
No fundo, a constante evolução das interfaces de IA e a crescente antropomorfização das máquinas não devem obscurecer o entendimento de que, por trás de toda essa interatividade e "personalidade", existe um conjunto complexo de algoritmos e dados. A tecnologia pode ser projetada para parecer amigável e até "humana", mas seu funcionamento interno é governado por lógicas matemáticas e processos computacionais, que, por mais sofisticados que sejam, ainda estão longe de uma verdadeira "consciência".
Qual é o Papel da Antropomorfização da Inteligência Artificial no Cotidiano?
Nos últimos anos, a presença de assistentes de voz em lares privados, como Alexa, Siri e Google Assistant, tem se expandido de forma notável, integrando-se de maneira quase imperceptível ao cotidiano das pessoas. Essa revolução digital traz à tona uma questão fundamental sobre a maneira como interagimos com as máquinas: como compreendemos e atribuímos qualidades humanas a esses sistemas inteligentes? A antropomorfização da inteligência artificial (IA) e o papel da linguagem na interação com as máquinas são tópicos que desafiam tanto o campo da ciência quanto a percepção social sobre o que significa ser humano.
A antropomorfização da IA não é um fenômeno novo. Desde os primeiros experimentos com programas de inteligência artificial, como o famoso "ELIZA", criado por Joseph Weizenbaum na década de 1960, já se podia observar uma tentativa de humanizar as respostas de um sistema computacional. ELIZA, embora rudimentar, foi projetada para simular um terapeuta psicoterapeuta, e a simples tarefa de interagir com esse programa fez com que muitas pessoas atribuissem a ele uma espécie de personalidade. Esse fenômeno reflete um impulso humano profundo de projetar sentimentos e intenções em objetos não-humanos, um processo que, quando amplificado pela crescente sofisticação da IA, leva a uma série de questões filosóficas, éticas e psicológicas.
À medida que os sistemas de IA se tornam mais complexos, é fácil para os usuários começarem a vê-los como "companheiros" ou até "amigos". A voz amigável de assistentes de voz, sua capacidade de responder a comandos e até de aprender preferências pessoais, reforçam essa ideia de uma relação quase afetiva entre humanos e máquinas. De fato, a IA está se tornando uma presença íntima nas casas das pessoas, moldando a comunicação diária e, em muitos casos, influenciando decisões cotidianas, como no caso de recomendações de produtos ou ajustes em aparelhos eletrônicos.
Entretanto, a atribuição de qualidades humanas a esses sistemas pode ter efeitos complexos sobre o comportamento humano. A crença de que a IA possui emoções ou intencionalidade pode afetar a maneira como as pessoas interagem com elas, como foi demonstrado em várias pesquisas que investigaram o efeito da antropomorfização na empatia humana por robôs ou sistemas de IA. Estudos indicam que, quando os usuários acreditam que estão interagindo com uma entidade com sentimentos e desejos, isso pode aumentar a adesão a essas tecnologias e também gerar um senso de responsabilidade em relação a elas. No entanto, essa sensação pode ser enganosa. As máquinas, por mais que pareçam ter uma personalidade, não possuem a capacidade de sentir ou compreender de forma genuína o que ocorre em suas interações com os humanos.
Esse dilema é particularmente importante no contexto dos assistentes de voz e outros sistemas de IA que são projetados para serem intuitivos e "entendidos" pelos usuários como seres que podem prestar atenção às suas necessidades. No entanto, esses sistemas não são mais do que algoritmos sofisticados, processando dados de maneira que simula, mas não emula, interações humanas genuínas. Essa confusão entre simulação e emulação é um ponto de desconforto para muitos críticos, que argumentam que ao humanizar excessivamente as máquinas, perdemos de vista o que elas realmente são: ferramentas projetadas para facilitar a vida, e não entidades com consciência.
Além disso, a questão da privacidade e da coleta de dados torna-se cada vez mais relevante. A crescente integração de dispositivos inteligentes nos lares implica uma coleta contínua de dados pessoais, muitas vezes sem que os usuários estejam totalmente conscientes dos limites da vigilância a que estão sendo submetidos. Cada comando dado a um assistente de voz é registrado, analisado e utilizado para aperfeiçoar os algoritmos. Essa coleta incessante de dados levanta questões sobre o controle e o consentimento dos indivíduos. À medida que a IA se torna mais integrada à vida cotidiana, o debate sobre os limites da privacidade e da autonomia digital se intensifica.
Em narrativas de ficção científica, a IA é frequentemente representada como entidades com grande poder de autossuficiência e compreensão emocional, como visto em obras como Klara and the Sun de Kazuo Ishiguro. Nessas obras, a IA é tratada como uma personagem que interage com os humanos de maneira profunda e empática, um reflexo do desejo humano de criar uma simbiose entre o natural e o artificial. No entanto, a realidade dessas tecnologias está longe de ser tão poética. A IA que encontramos em nossos lares hoje, longe de ser uma entidade pensante, é um conjunto de processos de aprendizado de máquina que responde a estímulos de acordo com parâmetros pré-definidos. A ilusão de que essas tecnologias possuem personalidade é, em muitos casos, uma construção sociocultural, mais ligada ao desejo humano de encontrar afinidade com o que é desconhecido.
Ademais, ao refletirmos sobre a relação entre humanos e máquinas, é necessário entender o impacto da IA nas interações sociais. A presença de assistentes de voz em lares pode alterar a dinâmica familiar e social, criando um novo espaço de mediação entre a privacidade e a exposição. Eles não são mais apenas ferramentas utilitárias, mas parte de uma rede mais ampla de comunicação e interação que reconfigura as formas de sociabilidade humana.
Finalmente, é imperativo que se mantenha uma compreensão crítica sobre os limites dessa tecnologia. A IA não deve ser vista como uma substituta para a interação humana, mas sim como uma ferramenta que pode melhorar certos aspectos da vida cotidiana. Embora a antropomorfização tenha sua utilidade em termos de acessibilidade e usabilidade, ela também deve ser tratada com cautela, para que não se crie uma dependência emocional ou psicológica indevida dessa tecnologia. Entender esses limites é fundamental para navegar de forma responsável no futuro da IA.
O Impacto do Conceito de Privacidade sobre os Direitos Reprodutivos e a Proteção do Feto
Como a Indução Matemática Fundamenta Provas e Definições Recursivas
Como os Transportadores e Enzimas Placentares Influenciam a Exposição Fetal a Medicamentos
Como a Estrutura da Interface Li Metal/LLZ Impacta a Estabilidade e Performance das Baterias
O que é a linha dos números estendida e como ela modifica a análise real?

Deutsch
Francais
Nederlands
Svenska
Norsk
Dansk
Suomi
Espanol
Italiano
Portugues
Magyar
Polski
Cestina
Русский