Jared Kushner e Ivanka Trump, figuras centrais no círculo de poder do ex-presidente Donald Trump, exemplificam como o nepotismo e as conexões financeiras e políticas podem impactar a governança de uma nação, muitas vezes de maneira negativa. Ao contrário da ideia inicial de que ambos seriam figuras meramente simbólicas e distantes das questões de segurança e política externa, seu envolvimento no governo foi profundamente ligado a interesses financeiros e internacionais, ampliando a corrupção e a falta de responsabilidade no cenário político dos Estados Unidos.

Kushner e Ivanka foram beneficiados por altos níveis de acesso ao governo americano, incluindo autorizações de segurança SF-86, que exigem um rigoroso processo de verificação. No entanto, o histórico de dívidas massivas de Kushner, suas manipulações fiscais e o vínculo com figuras do mundo da máfia e oligarcas internacionais não impediram sua ascensão. Pelo contrário, ele foi nomeado conselheiro de Trump para questões de política externa, uma posição em que sua proximidade com Netanyahu, primeiro-ministro de Israel, tornou-se um fator determinante. Sua relação com Netanyahu, que remonta a uma amizade de longa data, assim como o envolvimento de sua família com os assentamentos ilegais na Cisjordânia, colocaram Kushner em uma posição de flagrante conflito de interesse.

A ideologia religiosa do casal, que tem raízes no Chabad, uma organização judaica ultraconservadora, também exerceu grande influência em sua postura política, especialmente em relação ao Oriente Médio. Não apenas Israel, mas o envolvimento de outros líderes de direita e oligarcas, como Roman Abramovich e Lev Leviev, conectados a Vladimir Putin, criou um ambiente onde interesses políticos e financeiros se entrelaçaram de forma perigosa. Kushner, em sua devoção a Netanyahu, representou mais do que um conselheiro político; ele foi um agente ativo que buscou modificar o equilíbrio global em favor de uma agenda pessoal e de sua rede de contatos, sem considerar os impactos humanitários ou éticos de suas ações.

O envolvimento de Ivanka e Jared na administração de Trump não pode ser visto apenas como um reflexo do nepotismo, mas como um reflexo de um sistema que permitiu que interesses pessoais, financeiros e políticos se misturassem de forma imoral. Ivanka, que inicialmente era vista como uma figura da mídia e uma empresária de moda, e Jared, com sua história de fracassos financeiros e relações com figuras internacionais problemáticas, tornaram-se, de fato, figuras chave na condução da política externa americana.

A influência deles se estendeu para além das questões de segurança e política externa. Durante a presidência de Trump, figuras como Kushner utilizaram seu acesso a informações confidenciais para beneficiar seus próprios interesses financeiros, como foi o caso de seu envolvimento em transações comerciais com Qatar e outros países do Oriente Médio. A forma como a família Trump, com o apoio de amigos e aliados em posições de poder, manipulou a política de segurança e a diplomacia internacional, reflete uma realidade onde o lucro e o poder são priorizados em detrimento da justiça e da equidade.

O papel de Kushner e Ivanka não pode ser separado do contexto de uma "kleptocracia dinástica" que Trump procurou estabelecer. O termo "kleptocracia" refere-se a um sistema em que líderes políticos e suas famílias acumulam riqueza por meio de práticas corruptas, e o governo Trump exemplificou esse conceito. A falta de accountability — a incapacidade de responsabilizar aqueles em posições de poder, especialmente quando há uma rede de conexões que protege os envolvidos — levou a um enfraquecimento da confiança pública nas instituições políticas e na justiça. Mesmo com investigações em curso, como as de interferência eleitoral, o fato de que esses membros da família não enfrentaram as consequências de suas ações é um reflexo de um sistema profundamente corrompido.

É fundamental compreender que, por trás da imagem de "familiares ajudando no governo", há uma rede de interesses financeiros, políticos e até criminais que transcende qualquer tipo de vínculo familiar legítimo. A ascensão de figuras como Jared e Ivanka ilustra como as dinastias políticas podem fragilizar o sistema democrático e criar um espaço onde a ética e a transparência são ofuscadas pela busca incessante por poder e riqueza.

Além disso, é importante que o leitor reflita sobre o impacto dessas dinastias no futuro da política americana. O fato de que pessoas com histórico de falências, manipulação financeira e ligações com governos estrangeiros não sejam impedidas de ocupar cargos de alta responsabilidade é uma clara demonstração do enfraquecimento das instituições democráticas. A ausência de restrições efetivas, de leis que regulem as relações financeiras e políticas desses indivíduos, coloca em risco a soberania nacional e os princípios da justiça.

A Ascensão das Redes Sociais e a Mudança nas Dinâmicas de Poder: Desinformação e a Subversão das Democracias

A chegada das redes sociais no início dos anos 2000 transformou radicalmente o cenário da comunicação e da política. Plataformas como Facebook, Twitter e o VKontakte, na Rússia, tornaram a disseminação de desinformação mais fácil e eficaz. O conceito de "memes" se tornou uma ferramenta poderosa para espalhar mentiras de forma visual e impactante, muitas vezes com um alcance mais amplo, pois os usuários podiam compartilhar esses conteúdos sem a necessidade de um computador. O avanço da mobilidade digital significava que até aqueles sem acesso a computadores fixos podiam participar ativamente do ecossistema de desinformação, facilitando a manipulação de informações de forma quase clandestina.

Antes de deixar o meio acadêmico, dediquei-me ao estudo do que chamei de autoritarismo em rede, não apenas pela sua ameaça imediata aos cidadãos de regimes autoritários, mas pela percepção de que esse modelo poderia ser utilizado também em democracias ocidentais, onde a confiança nas instituições já começava a se deteriorar. Em um artigo de 2011 para The Atlantic, descrevi o cenário da política digital no Uzbequistão, com ênfase em uma conta falsa no Facebook que havia enganado a comunidade dissidente do país. Esse caso foi uma espécie de previsão do que viria a ser uma prática comum no Ocidente, como vimos em 2016, quando perfis falsos foram usados para manipular a opinião pública durante as eleições nos Estados Unidos.

No Uzbequistão, a desconfiança generalizada era um reflexo da paranoia informacional. Para muitos, todo tipo de informação era considerada suspeita, e as fontes eram vistas como inherentemente tendenciosas. Nesse ambiente, o boato não era imediatamente descartado, mas era discutido e compartilhado, muitas vezes muito além de suas origens duvidosas. O resultado desse comportamento não era a descrença, mas uma credulidade pervasiva, alimentada pela incerteza e pela manipulação constante. Esse cenário de total desconfiança nas informações poderia ser visto não apenas no Uzbequistão, mas, com o passar do tempo, também em países ocidentais, como os Estados Unidos, durante o governo Trump. O que antes parecia uma luta pela democracia nas redes sociais transformou-se em uma armadilha de desinformação que os próprios sistemas democráticos não estavam preparados para lidar.

Em 2010, o cientista da computação Jaron Lanier já havia alertado sobre o perigo crescente representado pela proliferação de vazamentos de informações e a manipulação digital. Durante o entusiasmo inicial com o WikiLeaks, que foi visto por muitos como um símbolo de transparência e resistência a governos autoritários, Lanier previu que essa prática poderia, paradoxalmente, alavancar os regimes mais opacos. Em sua visão, as redes sociais não se limitavam a fomentar um espaço de democracia digital; elas estavam, na verdade, criando novos centros de poder digital opacos, tão ou mais autoritários do que os regimes que supostamente contestavam. Para Lanier, o verdadeiro perigo não era a falta de transparência, mas a criação de um mundo digitalizado onde as estruturas de poder seriam definidas por algoritmos e manipulações invisíveis, longe do alcance dos cidadãos comuns.

Na década de 2010, vimos a confirmação dessas previsões. O conceito de que a tecnologia poderia ser uma força democratizante foi rapidamente subvertido. Estados autoritários começaram a usar as mesmas ferramentas digitais para manipular e subjugar suas populações, ao mesmo tempo em que buscavam desestabilizar democracias estrangeiras. O impacto das operações de influência da Rússia nas eleições nos Estados Unidos, na França e no referendo do Brexit demonstrou como a desinformação digital poderia ser uma poderosa arma de subversão política.

As redes sociais, inicialmente vistas como instrumentos de liberação e democratização, tornaram-se cúmplices de um novo tipo de autoritarismo, onde o lucro se sobrepôs ao bem público. Empresas como Facebook, que uma vez proclamaram que a internet poderia ser uma força de liberdade, passaram a ser acusadas de facilitar a "captura" das democracias. Elas desempenharam um papel crucial ao ajudar na criação de "triângulos de ferro" entre o crime organizado, a corrupção estatal e as corporações criminosas, permitindo que regimes autocráticos se consolidassem e prosperassem.

Em 2011, quando dei à luz meu filho, estava em meio a uma tempestade pessoal e política. O mundo parecia estar à beira de uma grande mudança: revoluções em países como o Egito pareciam anunciar uma nova era de liberdade, onde as ditaduras seriam derrubadas por jovens manifestantes energizados pelo poder das redes sociais. Era uma época de otimismo, e muitos viam o surgimento das novas tecnologias como um sinal de que estávamos em um momento de transição para um mundo melhor. Porém, à medida que os anos passaram, ficou claro que as mesmas ferramentas que pareciam ser a chave para a liberdade estavam sendo usadas para corroer as próprias fundações da democracia.

Hoje, enquanto as redes sociais e a tecnologia continuam a ser parte integrante das nossas vidas, é crucial que reconheçamos o papel complexo que elas desempenham na configuração do poder global. As redes não apenas refletem as estruturas de poder, mas muitas vezes as reforçam, criando um ciclo vicioso de desinformação e manipulação que ameaça a estabilidade das democracias modernas. Assim, mais do que nunca, é necessário questionar o modelo de arquitetura digital que molda nossas interações e nosso entendimento do mundo, se quisermos evitar que o que foi um motor de liberdade se transforme em uma ferramenta de controle.

Como entender Ferguson além das imagens da violência?

Em 2014, as manifestações diárias exigiam a responsabilização do policial Wilson pela morte de Michael Brown. A convocação de um grande júri para decidir o destino de Wilson transformou uma vigília em protesto, e este, por sua vez, evoluiu para um movimento profundo. Compreender Ferguson não é apenas uma questão de princípio, mas de proximidade. A narrativa se altera conforme o lugar onde se vive, os meios de comunicação consumidos, com quem se conversa e em quem se deposita confiança. Em St. Louis, o legado de Ferguson permanece presente, sem um verdadeiro início, pois a morte de Brown integra uma sequência contínua de impunidade policial direcionada aos moradores negros da região. Não há um fim real, pois novas vítimas surgem a cada dia. Em St. Louis, não existe justiça, apenas repetições de tragédias.

Fora de St. Louis, Ferguson se tornou sinônimo de violência e desordem. Quando viajo para países estrangeiros que desconhecem a cidade, frequentemente faço uma ironia sombria dizendo que venho de um “subúrbio de Ferguson”. A reação das pessoas é a de quem encontra alguém vindo de uma zona de guerra, pois foi isso que viram na televisão e na internet. O que se perde nessa percepção é que Ferguson representou o mais longo protesto pelos direitos civis desde a década de 1960. Essa luta foi travada no plano dos princípios, porque no condado de St. Louis, a lei já havia se distanciado da justiça há muito tempo, e quando os legisladores abandonam a justiça, resta apenas o princípio. A impunidade criminal, que muitos americanos passaram a descobrir recentemente, estruturava o sistema para os negros do condado de St. Louis há décadas. Eles aprenderam a esperar um sistema truculento e injusto, mas recusaram-se a aceitá-lo.

No início, havia uma esperança de que a polícia se contivesse devido ao grande número de testemunhas. Mas não havia incentivo para isso: nenhuma punição local, nenhuma consequência nacional. A agressão policial militarizada acontecia quase todas as noites, transformando uma situação traumática em uma vitrine de abusos. A polícia usava gás lacrimogêneo e balas de borracha rotineiramente. Detinha autoridades locais, líderes religiosos e jornalistas por meramente saírem da calçada. Ignoravam quem observava suas ações, mesmo sabendo que o mundo assistia. Câmeras ao vivo registravam o caos minuto a minuto para milhões de espectadores. A hashtag #Ferguson nasceu, e as contas no Twitter que cobriam os acontecimentos ganharam dezenas de milhares de seguidores. Contudo, a documentação não deteve a brutalidade. Pelo contrário, trechos foram usados por opositores dos protestos para criar a impressão falsa de distúrbios constantes.

O vandalismo e os incêndios exibidos incessantemente pela mídia nacional aconteceram em poucas noites, em poucas ruas. A mídia nacional chegava a St. Louis apenas para os momentos de crise que garantiam imagens sensacionalistas, desaparecendo quando os protestos eram pacíficos. Algumas equipes de TV exibiam abertamente sua expectativa pela “realidade de um Hunger Games”, entre outros comentários insensíveis e cruéis. Os protestos originais, que denunciavam as especificidades do sistema abusivo de St. Louis, foram soterrados por jornalistas e ativistas de fora da região, que assumiram posições de liderança locais sem real legitimidade. A falta de familiaridade com o contexto levou a uma cobertura confusa e ofensiva, enquanto o sensacionalismo predominava sobre a tragédia humana.

Grupos de diversas partes do país convergiram para St. Louis, atraídos como se o Arco da Cidade fosse um imã para movimentos e organizações de todos os espectros: Anonymous, Oath Keepers, Nation of Islam, Ku Klux Klan, Partido Comunista Revolucionário e celebridades que afirmavam estar ali por profunda preocupação e não para aparecer na televisão. Pouquíssimos retornaram. Em 2014, o mundo assistiu ao caos e à violência; St. Louis viveu o luto. As pessoas, exaustas após noites diante da TV ou da internet, tinham os olhos vermelhos e frequentemente choravam. Algumas lamentavam a estabilidade perdida, outras a desagregação da comunidade, e muitas simplesmente choravam a morte de um jovem único, complexo, vítima de um sistema que o via como uma ameaça instantânea. Era difícil encontrar alguém que não estivesse em algum tipo de luto, mesmo que fosse pela ignorância da situação. Esse sofrimento, vivido internamente, é praticamente incompreensível para quem está fora da região.

Eu cobri os protestos como jornalista, mas vivi tudo isso como morador de St. Louis. São experiências muito distintas. Assistir à implosão de uma região pela televisão é uma coisa; vivê-la em câmera lenta é outra. Quando tentava explicar a situação, as pessoas me diziam para ligar para meu representante político. Eu respondia: “Mas eles também lançaram gás contra meu representante.” Poucos dias antes do Dia de Ação de Graças, Bob McCulloch, um promotor conhecido por seu viés pró-polícia, anunciou em uma coletiva que Wilson não seria indiciado. Nada seria feito para punir o assassino de um adolescente cujo corpo ficou exposto ao sol por quatro horas e meia. Naquela noite de novembro, a região de St. Louis explodiu em fúria previ

Como Ensinar a História de um País em Declínio?

Nos últimos anos, muitos têm se perguntado como explicitar para as futuras gerações os horrores e as contradições do passado, especialmente quando o futuro parece incerto. Em 2016, ao refletir sobre o estado da nação americana, percebi que, embora a história de um país seja marcada por ciclos de transformação e turbulência, a vulnerabilidade de um sistema democrático pode ser mais profunda do que se imagina. A sensação de que as instituições estavam enfraquecendo era palpável, e o futuro do país parecia à beira do colapso.

No entanto, a questão fundamental não é apenas sobre como a sociedade chegou até este ponto, mas como as futuras gerações entenderão a transição de uma democracia para algo muito diferente. As instituições que deveriam proteger a liberdade e a segurança nacional começaram a ser corrompidas de dentro para fora. Ao longo das décadas, a política americana foi marcada por divisões e corrupção, mas nunca antes houve um período em que o governo fosse dominado por indivíduos cujos lealdades não eram para com seu próprio país. A ascensão de uma espécie de sinistro regime transnacional dentro do próprio território, envolvendo corrupção e alianças com potências estrangeiras autoritárias, representa um momento de transição que não tem paralelo na história.

Esse fenômeno não ocorre sem consequências profundas. Ao longo de minha jornada com meus filhos, levando-os a diversos pontos históricos dos Estados Unidos, tentei incutir neles a importância de ver a história por seus próprios olhos. As lembranças pessoais que guardam de sua nação podem ser fundamentais para sua capacidade de discernir o que é real e o que é fabricado. Como pais, temos a responsabilidade de educar nossos filhos sobre os erros do passado, não apenas como uma forma de preservar a memória histórica, mas para que possam distinguir entre um sistema democrático imperfeito e a perda completa de liberdade.

As viagens pela América, especialmente por seus marcos históricos, permitiram que meus filhos observassem não apenas o que a nação foi, mas também o que ela poderia se tornar. Visitamos locais como o tribunal onde os direitos dos escravizados foram debatidos, e o memorial que lembra a morte de nativos americanos durante o forçado deslocamento conhecido como "Trilha das Lágrimas". Embora as crianças mais novas não conseguissem compreender completamente a magnitude de tais acontecimentos, os mais velhos começavam a entender a discrepância entre a virtude proclamada e as práticas cruéis que permeavam o país. Como é possível que a crueldade seja aceita como normal? Como as injustiças mais abomináveis se perpetuam por tanto tempo?

Em resposta às perguntas de minhas filhas, a explicação simplista de que "assim era" já não era suficiente. Não podemos simplesmente recuar para o "era legal na época" ou "muitas pessoas boas praticaram tais coisas", como se isso fosse uma justificativa aceitável. O que precisamos fazer é confrontar as práticas históricas com um olhar crítico e sincero, que nos permita entender que as injustiças não eram apenas uma característica do passado, mas sim uma estrutura que moldou o presente. O que precisamos ensinar é que a normalização da crueldade e da injustiça foi o que permitiu que elas persistissem por tanto tempo.

Nos próximos anos, quando meus filhos forem mais velhos e, talvez, seus próprios filhos começarem a questionar o que aconteceu com a América, a resposta será bem diferente. Como puderam os cidadãos de um país democrático permitir que um líder comete-se transgressões semanais sem enfrentar consequências? Como as instituições de um país democrático puderam ser infiltradas por uma máfia transnacional e ainda assim continuar a existir sem grandes mudanças? A resposta que poderemos dar será de que o que aconteceu não foi uma simples falha das instituições, mas uma tomada do poder por um grupo de atores antiamericanos que desvirtuaram as estruturas governamentais e tornaram o que deveria ser uma democracia em algo irreconhecível.

Essas experiências, essas viagens pela América, foram uma tentativa de fazer com que meus filhos vissem o que um país realmente pode ser — e também o que ele pode deixar de ser. Ensiná-los a diferenciar um governo profundamente imperfeito, mas ainda democrático, de uma nação que se perdeu por completo na espiral de uma autocracia disfarçada de democracia, é uma missão urgente. Hoje, práticas como a escravidão, que antes eram aceitáveis, são vistas como uma abominação. O desafio é ensinar as crianças a nunca normalizar políticas cruéis, não importa o quão amplamente sejam promovidas por políticos ou comentaristas.

Ainda que muitos nos digam que "a história se repete", devemos estar preparados para garantir que, se houver uma repetição, ela não aconteça da mesma maneira. A resistência de pessoas comuns contra a impunidade das elites criminosas é o que pode manter viva a chama da democracia. O futuro de nossa nação não será determinado por uma figura messiânica, mas pela recusa dos cidadãos em aceitar a corrupção como um fato natural e inevitável.

Em nossas viagens, atravessando o vasto território dos Estados Unidos, temos visto de perto os contrastes e as complexidades do país. Desde as terras nativas até as grandes cidades, as histórias de luta e resistência permeiam cada canto. Ao fazer isso, estou criando um futuro para meus filhos onde eles poderão olhar para trás e dizer: "Eu vi com meus próprios olhos. Eu sei o que é real. Eu sei o que foi real". Essa visão pessoal da história é, talvez, a única coisa capaz de fornecer a resistência moral necessária para manter a democracia viva.

O que realmente estava por trás das conexões entre Trump e a Rússia?

A campanha presidencial de 2016 nos Estados Unidos foi marcada por um enredo complexo de relações obscuras, interesses geopolíticos e possíveis conluios, cuja verdadeira extensão permanece envolta em ambiguidade, mesmo após inúmeras investigações. No centro dessa trama está a figura de Donald Trump e as alegadas ligações entre sua campanha e o governo russo.

Em outubro de 2016, no auge da corrida presidencial, Trump declarou publicamente: "Eu não tenho nada a ver com a Rússia, pessoal". Essa afirmação, repetida diversas vezes ao longo dos anos, buscava dissipar as crescentes suspeitas de uma aliança velada com o Kremlin. Contudo, evidências e relatos surgidos nos bastidores indicavam o contrário. A plataforma do Partido Republicano, que até então mostrava apoio explícito à soberania da Ucrânia diante da agressão russa, sofreu alterações notáveis, enfraquecendo suas posições pró-Ucrânia logo após a entrada de Trump como candidato principal. A mudança não foi casual: refletia uma inclinação estratégica, possivelmente negociada, em direção a Moscou.

Ainda em 2016, o senador democrata Harry Reid solicitou ao FBI uma investigação urgente sobre indícios de manipulação russa nas eleições. Em paralelo, agentes da inteligência americana receberam um dossiê produzido por um ex-espião britânico, que detalhava uma suposta operação russa para cultivar Trump como um ativo político. A seriedade das alegações foi suficiente para atrair o envolvimento direto do FBI, que passou a investigar possíveis conexões entre membros da campanha de Trump e operativos ligados ao governo russo.

Glenn Simpson, da Fusion GPS, afirmou sob juramento que o FBI já contava com uma fonte interna na campanha de Trump, corroborando informações do dossiê. Além disso, relatos apontavam para comunicações suspeitas entre um servidor da Trump Organization e o Alfa Bank, sediado em Moscou. Embora nunca tenha sido provado como canal de comunicação direta, o caso levantou preocupações legítimas sobre canais paralelos de influência.

A cobertura midiática também enfrentou pressões e contradições. A própria editora pública do New York Times chegou a minimizar o escândalo, gerando reações internas e críticas severas. A subsequente eliminação da função de editora pública no jornal foi vista por muitos como um reflexo da tensão editorial em torno do caso Trump-Rússia.

Paralelamente, Paul Manafort, ex-chefe de campanha de Trump, enfrentava acusações criminais gravíssimas. O juiz de seu julgamento foi ameaçado, e até os nomes dos jurados foram mantidos em sigilo por motivos de segurança. Manafort chegou a aconselhar a Casa Branca sobre como deslegitimar a investigação liderada por Robert Mueller, revelando uma coordenação ativa para minar as instituições encarregadas da apuração.

A ex-funcionária da NSA, Reality Winner, foi condenada a mais de cinco anos de prisão por vazar um relatório confidencial que confirmava tentativas russas de interferência em sistemas eleitorais dos 50 estados americanos. Sua prisão foi contrastada com a liberdade contínua daqueles que, de acordo com investigações, colaboraram direta ou indiretamente com atores estrangeiros.

Paul Manafort, por exemplo, repassou informações estratégicas de estados-chave das eleições a Konstantin Kilimnik, associado aos serviços de inteligência russos. Esses estados acabaram sendo decisivos para a vitória de Trump. Esse ato de repassar dados eleitorais sigilosos a um agente estrangeiro é, por si só, um dos indícios mais graves de colusão com uma potência adversária.

O caso Cambridge Analytica, por sua vez, revelou como dados pessoais de milhões de cidadãos foram utilizados para manipular o comportamento eleitoral, expondo a vulnerabilidade do sistema democrático às técnicas sofisticadas de desinformação e engenharia social.

A confluência de todos esses elementos — alteração de diretrizes políticas, infiltração institucional, influência estrangeira, manipulação de dados e sabotagem das investigações — compõe um cenário em que a soberania democrática foi abalada por uma teia de interesses transnacionais e estratégias de poder disfarçadas de política eleitoral convencional.

É essencial compreender que a questão não se restringe à legalidade de ações individuais, mas sim à erosão institucional causada pela impunidade e pela manipulação da opinião pública. O caso Trump-Rússia não é apenas um episódio da história recente americana; é um sinal revelador da fragilidade das democracias contemporâneas diante de campanhas híbridas de guerra informacional.