A osteotomia do metatarso, em suas diversas formas, evoluiu ao longo dos anos, oferecendo aos cirurgiões uma gama de opções para o tratamento do hallux valgus. A precisão na execução dessas técnicas é essencial para o sucesso do procedimento e a recuperação do paciente. Entre as abordagens mais modernas, destaca-se o uso da técnica de osteotomia percutânea minimamente invasiva (MIS), que visa reduzir o risco de infecções, rigidez articular e desconforto durante a recuperação.

Quando a osteotomia do metatarso é realizada, o corte precisa ser preciso e rápido. O movimento oscilante do instrumento de corte deve ser realizado com precisão, tomando o cuidado de manter a perpendicularidade do eixo do metatarso. A primeira etapa do procedimento envolve o corte da metade superior do metatarso, que não deve durar mais de 5 segundos para evitar lesões térmicas nos tecidos moles e no osso. Em seguida, a osteotomia da metade inferior é completada da mesma forma, com o mesmo cuidado temporal. O movimento do instrumento deve ser pendular, com o ponto de entrada na pele servindo como centro de rotação do movimento. Ao confirmar que a osteotomia está completa, um elevador ou retrator Hohmann é inserido para deslocar lateralmente a cabeça metatarsal e acessar o canal endomedular, de onde a correção será realizada.

A inserção do fio de Kirschner é uma das etapas que seguem. O fio, avançado até a base do metatarso, deve ser cortado a 2 cm da pele e removido cerca de 6 semanas após a cirurgia. Essa técnica, conhecida como segunda geração MIS, foi aperfeiçoada ao substituir o fio de Kirschner por parafusos, o que reduz significativamente o risco de infecção e melhora a estabilidade da articulação metatarsofalângica, além de proporcionar maior conforto para o paciente. A técnica Bosch, que utiliza parafusos em vez de fios de Kirschner, é conhecida como PECA (Chevron-Akin extracapsular percutânea), e oferece resultados semelhantes, com a vantagem de uma fixação mais segura.

Outra técnica importante no contexto da osteotomia percutânea é o MICA (Minimal Incision Chevron Akin), que segue os mesmos princípios da técnica PECA, mas com uma diferença fundamental no ângulo e na forma da osteotomia. No MICA, o corte no topo do metatarso é feito com um ângulo de aproximadamente 30 graus, tanto na parte superior quanto na parte inferior da cabeça do metatarso, o que melhora o alinhamento e a correção da deformidade. A fixação com parafusos cannulados é similar à técnica PECA, embora o uso frequente de fluoroscopia seja recomendado, especialmente nos primeiros casos, para garantir a precisão da cirurgia.

As osteotomias diafisárias, como a osteotomia do tipo Scarf, possuem um poder corretivo moderado e são indicadas para deformidades de grau moderado. A osteotomia Scarf é caracterizada por um corte translatório, ou seja, o segmento distal do metatarso é lateralizado em um único plano. Ela é indicada para deformidades com ângulo IMA (índice metatarso-falângico) entre 10 a 15 graus. Embora eficaz, essa técnica tem suas limitações, como a impossibilidade de corrigir a rotação axial, e o risco de complicações como o "efeito de desnível" (troughing). O desnível ocorre quando os segmentos ósseos cortados colapsam uns sobre os outros, o que pode levar a uma elevação e pronação da cabeça metatarsal, aumentando o risco de recidiva da deformidade ou impingimento articular.

A taxa de complicações da osteotomia Scarf pode ser alta, chegando a 50%, mas com a técnica adequada e cuidados pós-operatórios, esse índice pode ser reduzido a níveis semelhantes aos de outras técnicas. Para evitar o desnível, é importante fazer os cortes osteotômicos o mais distal e proximal possível, aumentando a densidade óssea nos pontos críticos. Além disso, recomenda-se evitar o peso direto na coluna medial do pé durante o primeiro mês pós-operatório, permitindo que o paciente se mova utilizando a borda lateral do pé ou o calcanhar para distribuir o peso corporal.

A abordagem do tratamento do hallux valgus deve ser personalizada de acordo com o grau e as características da deformidade, levando em consideração a técnica a ser utilizada e a recuperação do paciente. A escolha do tipo de osteotomia deve ser feita com base em uma análise cuidadosa da anatomia do pé e das necessidades de correção, considerando as complicações potenciais e os benefícios de cada técnica. Uma combinação de técnicas pode ser necessária para alcançar os melhores resultados e garantir a mobilidade e o conforto do paciente no longo prazo.

Qual a melhor abordagem para o tratamento da tendinopatia insercional do tendão de Aquiles?

A inserção do tendão de Aquiles deve ser completamente ressecada quando a patologia comprometer a totalidade de sua largura. O uso da posição de equinus da extremidade saudável como guia para determinar a tensão adequada da reinserção do tendão se mostra eficaz nesse tipo de procedimento. A abordagem mediana permite a descompressão da inserção do tendão por meio da ressecção da deformidade de Haglund, realizada sob visualização direta, conforme demonstrado nas imagens (Figs. 3 e 4). Após essa etapa, prossegue-se com a reinserção do tendão de Aquiles, que é feita com uma técnica de dupla fileira, utilizando quatro ancoragens (Figs. 5, 6, e 7), método que tem mostrado resultados superiores quando comparado aos sistemas de âncoras de fileira única, com pontuações AOFAS pós-operatórias significativamente melhores [23, 34].

Essa estratégia terapêutica tem apresentado bons resultados, com taxas de sucesso em torno de 87% [32, 34–40]. No entanto, as taxas de complicações variam entre 6% e 30%, principalmente associadas a complicações da ferida operatória, como hematoma, deiscência e infecção, embora também tenham sido relatados casos de trombose venosa profunda (TVP) e desinserção do tendão de Aquiles [32, 34, 37, 39, 40]. Para minimizar as complicações dos tecidos moles, realiza-se um fechamento cuidadoso por planos, utilizando pontos simples com sutura absorvível nos planos profundos e sutura não absorvível na pele. Em caso de deiscência da ferida, são consideradas técnicas avançadas de cicatrização, sistemas locais de aspiração negativa, e, em último caso, enxertos com retalhos livres microcirúrgicos, quando as opções anteriores falham.

Nos casos em que a patologia insercional do tendão de Aquiles está associada a danos degenerativos extensivos no tendão, impedindo uma reatuação adequada ou quando a ressecção do tecido danificado é tão ampla que não há material suficiente para reinserção funcional, é indicada a transferência do Flexor Hallucis Longus (FHL). Essa técnica é realizada preferencialmente por via endoscópica, com o objetivo de evitar as complicações dos tecidos moles envolvidas na abordagem aberta, através de portais de artroscopia padrão medial e lateral do tornozelo posterior. O FHL é identificado e retirado, e o ponto de inserção é preparado. Sob visão combinada endoscópica e fluoroscópica, realiza-se o túnel no qual o tendão é finalmente introduzido e fixado com parafuso de interferência.

Em relação ao pós-operatório, a atenção especial à cura da ferida operatória é fundamental, com remoção dos pontos não antes de 20 dias. Não utilizamos imobilização (botas), já que a alta resistência oferecida pelos âncoras de dupla fileira permite o início do suporte de peso com 10% do peso corporal desde a primeira semana, aumentando 20% a cada semana, com a remoção completa das muletas entre a quarta e a sexta semana. A mobilização passiva é iniciada a partir da primeira semana pós-operatória, sem ultrapassar a dorsiflexão neutra durante o primeiro mês. A gestão do edema pós-operatório é uma preocupação constante, com a indicação de descanso parcial e elevação do pé, uso de meias de compressão e massagem terapêutica. Fisioterapia é indicada nos primeiros três meses, e posteriormente, inicia-se um programa progressivo de reintegração esportiva, com o objetivo de retomar as atividades esportivas ao redor do sexto mês pós-operatório.

Além da técnica cirúrgica e cuidados pós-operatórios, é essencial que o leitor compreenda a importância da avaliação pré-operatória detalhada e do planejamento individualizado para cada paciente. Isso inclui o uso de exames de imagem, como a ultrassonografia e a ressonância magnética, que ajudam a determinar a extensão da lesão e a melhor abordagem. O diagnóstico precoce e a escolha do tratamento adequado para o tipo específico de tendinopatia insercional podem determinar o sucesso do tratamento e a prevenção de complicações a longo prazo. Também é crucial destacar que a reabilitação progressiva e a adaptação ao esporte ou à atividade física devem ser abordadas com cautela, pois o retorno prematuro a atividades de alta intensidade pode comprometer os resultados e levar a recaídas.

Qual a melhor abordagem para o tratamento da fascite plantar resistente?

Em casos de dor insercional da fáscia plantar, particularmente quando a fascite plantar se torna resistente aos tratamentos convencionais, uma opção recomendada é a combinação da liberação do túnel tarsal com a fasciotomia plantar parcial aberta. Essa abordagem tem demonstrado resultados eficazes, permitindo a diminuição significativa da dor e o restabelecimento da função normal do pé. Ao realizar a liberação do túnel tarsal, permite-se a descompressão das estruturas nervosas comprimidas na região, o que contribui para o alívio da dor neuropática frequentemente associada a essa condição. A fasciotomia parcial, por sua vez, age diretamente sobre a fáscia, liberando a tensão acumulada, o que também contribui para o alívio dos sintomas dolorosos.

Quando a dor persiste apesar de tratamentos conservadores e intervenções iniciais, como fisioterapia e uso de órteses, a liberação proximal medial do gastrocnêmio se apresenta como uma alternativa eficaz. Este procedimento tem mostrado resultados semelhantes aos da fasciotomia plantar, mas com uma vantagem significativa: uma taxa reduzida de comorbidades e uma recuperação pós-operatória mais simples. A liberação do gastrocnêmio proximal tem se revelado particularmente benéfica, especialmente em pacientes com contratura do músculo, que é um fator contribuidor comum para a fascite plantar crônica.

É importante destacar que a fascite plantar crônica, também chamada de fascite plantar recalcitrante, está frequentemente associada a uma combinação de fatores biomecânicos, como a tensão excessiva na fáscia e o encurtamento do gastrocnêmio. A liberação do gastrocnêmio, ao restaurar a flexibilidade e a mobilidade do músculo, reduz significativamente a sobrecarga sobre a fáscia plantar. Este procedimento tem se tornado cada vez mais reconhecido pela sua eficácia em proporcionar alívio duradouro da dor e prevenir a recidiva dos sintomas.

Porém, é essencial compreender que qualquer abordagem cirúrgica, incluindo a liberação do túnel tarsal e a fasciotomia plantar, deve ser considerada apenas após uma avaliação cuidadosa e a falha de tratamentos não invasivos. A decisão de realizar uma intervenção cirúrgica precisa ser individualizada, levando em conta as características clínicas do paciente, sua resposta aos tratamentos conservadores e a presença de outras condições que possam influenciar o sucesso da cirurgia.

Além disso, o manejo da fascite plantar deve ser abrangente, com uma combinação de estratégias de prevenção, diagnóstico precoce e tratamento conservador. A educação do paciente sobre o uso adequado de calçados, a importância do alongamento regular e a modificação das atividades de alto impacto são componentes cruciais no tratamento da fascite plantar. O uso de órteses personalizadas, a terapia física e os métodos de modulação da dor, como as injeções de corticosteroides e o uso de ondas de choque, continuam a ser estratégias eficazes no manejo da condição.

É fundamental que os profissionais de saúde estejam atentos às múltiplas causas e manifestações da fascite plantar para que possam ajustar a abordagem terapêutica conforme necessário. Cada paciente pode apresentar diferentes combinações de fatores de risco, como sobrepeso, alterações no alinhamento do pé ou atividades que sobrecarregam excessivamente a fáscia plantar. Portanto, a avaliação clínica detalhada é essencial para a escolha do tratamento mais apropriado, seja ele conservador ou cirúrgico.

Como se manifestam e tratam as síndromes compartimentais da perna e do pé?

A compreensão detalhada da anatomia dos compartimentos da perna e do pé é essencial para o diagnóstico e manejo eficaz da síndrome compartimental (SC), condição caracterizada pelo aumento da pressão dentro de um espaço osteofascial, resultando em isquemia e possível necrose muscular. O estudo anatômico revela a existência de compartimentos bem definidos que alojam músculos, nervos e vasos, cuja integridade e funcionalidade são essenciais para a biomecânica dos membros inferiores.

No pé, a segmentação anatômica inclui compartimentos medial, superficial, lateral, abdução, além dos interósseos plantares e dorsais, e o compartimento do calcâneo. Cada um destes contém grupos musculares específicos: por exemplo, o compartimento medial abriga o adutor e o flexor curto do hálux, enquanto o compartimento lateral contém os músculos abdução e flexor do quinto dígito. Esta divisão anatômica é fundamental para entender o local de manifestação da pressão elevada e suas consequências clínicas.

Em alguns estudos, observa-se divergência quanto à existência de fascias densas separando compartimentos no antepé, indicando que a pressão dentro destes espaços pode variar segundo diferentes descrições anatômicas. Contudo, a presença de fáscias densas sobre o músculo abductor hallucis, confirmada em dissecações e procedimentos cirúrgicos, reforça a existência de barreiras estruturais que podem contribuir para o aumento de pressão intracompartimental.

A manifestação clínica da SC é geralmente marcada por dor intensa exacerbada pela palpação e movimentos passivos das articulações do pé e dedos, resistente a analgésicos. O edema tenso e doloroso é um achado constante, e a sensibilidade cutânea pode permanecer preservada nas fases iniciais, dificultando o diagnóstico precoce. A perda gradual de sensibilidade e pulso indica avanço da isquemia e lesão nervosa. A avaliação objetiva da pressão intracompartimental é um recurso diagnóstico indispensável, com valores superiores a 30 mmHg indicando necessidade de descompressão cirúrgica urgente.

Medidas conservadoras são limitadas e, apesar de estudos experimentais em animais sugerirem efeitos benéficos do manitol, seu uso em humanos não é comprovado. O tratamento definitivo e emergencial é a fasciotomia, técnica cirúrgica proposta há mais de um século para prevenir a necrose muscular e as sequelas irreversíveis. O tempo ideal para a intervenção é de até 12 horas após o início dos sintomas, período no qual o risco de necrose aumenta significativamente.

A descompressão cirúrgica do pé requer abordagem específica para garantir a liberação dos nove compartimentos. São descritas três incisões, sendo duas dorsais localizadas próximas às bordas medial do segundo metatarso e lateral do quarto metatarso, e uma medial, que permite o acesso ao compartimento abductor e ao quadrado plantar. O espaçamento entre as incisões é fundamental para preservar a vascularização dos retalhos cutâneos e evitar complicações na cicatrização.

Além da técnica cirúrgica, a compreensão das variações anatômicas e a importância do reconhecimento precoce da síndrome são vitais para evitar complicações graves, como a perda funcional do membro e até risco de amputação. A pressão elevada dentro de compartimentos rígidos não só prejudica a perfusão muscular, mas também pode causar danos irreversíveis às estruturas nervosas, implicando déficits sensoriais e motores duradouros.

A pele e sua fáscia subjacente também desempenham papel significativo na contenção da pressão e têm sido consideradas, por alguns autores, como um "décimo compartimento", reforçando a complexidade da síndrome. Este entendimento amplia o olhar clínico, pois as alterações na elasticidade e turgor cutâneo podem influenciar o quadro clínico e os sinais físicos da SC.

É imprescindível que o diagnóstico e o tratamento da síndrome compartimental sejam fundamentados não apenas em medidas quantitativas da pressão, mas também na avaliação clínica contínua, considerando o histórico do trauma e a evolução dos sinais. O manejo adequado e rápido reduz significativamente a morbidade associada, evitando complicações graves como necrose muscular, fibrose, deformidades e disfunção permanente.

O leitor deve compreender que, apesar do avanço tecnológico na medição da pressão intracompartimental e nos métodos indiretos de avaliação da isquemia, o julgamento clínico permanece o principal instrumento para a decisão terapêutica. O conhecimento anatômico aprofundado aliado à vigilância clínica rigorosa assegura que intervenções sejam realizadas no tempo adequado, otimizando os resultados funcionais.

Além disso, a abordagem multidisciplinar, incluindo reabilitação precoce após a fasciotomia, é fundamental para a recuperação da função do membro, minimizando sequelas. A prevenção de complicações infecciosas e a necessidade potencial de enxertos de pele ou outras técnicas reconstrutivas também fazem parte do manejo global do paciente com síndrome compartimental.