Quando Mike Fawsett se distanciou um pouco do resto da equipe para caminhar sozinho, ele não imaginava que a experiência de observação que estava prestes a viver o levaria a reflexões sobre a relação entre os seres e o ambiente que habitam. Sem querer, ele entrou em um estado de alerta subconsciente, desconectado das tarefas cotidianas e imerso em uma introspecção sem igual. O campo de grama que pisava, a distância crescente do som das máquinas, e até a imersão nas flores e plantas ao seu redor, foram detalhes que ele jamais teria notado em uma situação normal. Para Fawsett, a percepção de algo incomum em um planeta alienígena começou a se formar de maneira lenta e quase imperceptível, levando-o a questionar a natureza do que o cercava.
O detalhe sutil e, ao mesmo tempo, intrigante foi o crescimento da grama, algo que, à primeira vista, parecia ser apenas mais uma característica trivial de um ambiente diferente. Mas, ao refletir sobre o comportamento dessa vegetação, ele começou a pensar sobre como ela poderia se comportar. O crescimento da grama, lento e talvez até imperceptível durante a estada dos astronautas, dava pistas sobre o tipo de ambiente que era aquele. Ali, o tempo parecia não ter a mesma marcha de um planeta como a Terra. Ele notou que a cor do planeta, como um campo de grama constante, também não variava, uma peculiaridade que reforçava a ideia de que naquele lugar não existiam estações ou variações sazonais, algo essencial para a vida como conhecemos.
A percepção das plantas e da grama foi uma porta para uma reflexão mais profunda: será que os seres humanos, assim como os peixes que Reinbach e Fiske discutiam, estariam vivendo em um "pântano" sem saber que outra vida, mais avançada ou mais complexa, estava muito perto de seus próprios limites? Esta ideia de ser uma espécie de "peixe" nadando em sua própria água sem saber que algo ou alguém o observa de fora é, no fundo, um alerta sobre a nossa cegueira diante do desconhecido.
Os diálogos entre Reinbach e Fiske, aparentemente desconectados da natureza ao redor, também ecoam um certo desinteresse pela complexidade do ambiente em que estavam. A casualidade com que abordam a falta de insetos, como moscas ou mosquitos, é curiosa, pois revela uma falha na percepção dos astronautas sobre a própria natureza do planeta. Esta indiferença de não questionar o que deveria ser normal, como a ausência de certos organismos, é algo que muitas vezes se aplica à própria condição humana, em que, às vezes, somos tão absortos nas nossas rotinas e preocupações imediatas que não paramos para entender os pequenos, mas significativos, detalhes do mundo ao nosso redor.
O acontecimento de Fawsett com o aparente "fantasma" de Cathy foi um momento que desafiou ainda mais a compreensão do que estava acontecendo naquele lugar. A explicação inicial de que Cathy seria uma alucinação ou uma projeção fantasmagórica foi desmentida pela realidade física de seu toque. A dúvida sobre a verdadeira natureza daquilo que ele estava experimentando, a princípio algo sobrenatural, rapidamente se desfez quando ele teve certeza de que não era uma visão, mas algo real. Aqui, a percepção humana entra em cena de maneira crucial, pois o que parecia ser uma manifestação ilusória, algo que a mente humana pode criar diante do medo ou do desconhecido, acabou se mostrando uma tragédia muito mais pessoal e sombria, levando Fawsett a questionar não só o ambiente alienígena, mas sua própria psique.
A ausência de explicações claras sobre o que exatamente está acontecendo no planeta Achilles, bem como a estranheza de seus habitantes e fenômenos, faz com que os astronautas se sintam como peixe fora d’água. Eles estão distantes de casa, em um lugar que não se revela por completo, e isso faz com que suas certezas fiquem mais vulneráveis a erros de interpretação. Mas o que Fawsett vivenciou não foi só uma crise de percepção. Foi uma descoberta sobre como a realidade pode ser flexível e confusa, quando se está fora de seu ambiente natural, quando o que se vê não é o que se sente.
Assim como os peixes que nadam em seu habitat sem perceber a presença de outros seres, a humanidade muitas vezes caminha em um mundo em que o invisível e o desconhecido estão ao redor, mas sua percepção é ofuscada pela rotina e pela falta de questionamento. O que acontece quando começamos a olhar além do que é familiar? Quando nos confrontamos com o inesperado, com a ideia de que o mundo pode ser muito maior do que imaginamos? Este é o dilema que se coloca diante de qualquer explorador — e, no caso de Fawsett, ele estava diante não apenas de um novo planeta, mas de uma nova maneira de perceber a realidade, de reconhecer o invisível.
O que o leitor deve refletir além disso é como os seres humanos, ao se encontrarem em um ambiente totalmente novo e desconhecido, tendem a adaptar seus sentidos e interpretações àquilo que é familiar. O que os astronautas vivem no planeta Achilles é uma metáfora para muitas das nossas interações cotidianas com o ambiente ao nosso redor, que é muitas vezes ignorado ou mal interpretado. O questionamento da própria realidade, o embate com o desconhecido e a descoberta de que nem tudo é o que parece são questões essenciais para a compreensão do que realmente significa ser parte de um ecossistema, seja em um planeta distante ou na Terra.
Como o Desespero e o Absurdo Moldam o Destino Humano
O sol mal despontava, e o gosto amargo na boca de Conway refletia o desconforto e a estranheza do momento. A arena, antes uma vastidão silenciosa, agora se enchia de pequenos grupos de pessoas, em sua maioria as garotas, espalhadas em camas improvisadas. Algumas tendas, pequenas construções de bambu, surgiam do nada, como se fossem uma resposta instantânea à necessidade de abrigo. Conway observava, e em sua mente se formava a ideia de que aquele cenário estava repleto de uma curiosa e desconcertante normalidade. As garotas, em sua maioria, dormiam juntas, criando um espaço seguro entre elas, protegendo-se mutuamente de qualquer invasão ou surpresa que o ambiente pudesse trazer.
Cathy, ao seu lado, acordou, sua rotina de movimentos lentos e preguiçosos começando com um estiramento de seus membros. Seus cabelos, longos e indisciplinados, exigiam um carinho repetido das mãos, como se ela tentasse recuperar algo que se perdera durante o sono. O ritual diário estava completo quando ela, finalmente, se levantou e observou o que a cercava. Um pequeno sorriso irônico se formou em seus lábios ao notar a cena peculiar. A pergunta flutuou no ar, um comentário que não esperava resposta. Mas, ao ser provocada, Cathy rapidamente recolheu a atenção que a situação exigia, recobrando a memória de sua missão e se retirando para dentro de si mesma.
O movimento nas cercanias da arena começava a acelerar. As garotas, agora despertas, começavam a examinar seus pés e a se preparar para o que viria a seguir. O cheiro de comida invadiu o ar, com o grande caminhão vindo entregar o café da manhã. Conway assistiu à cena com uma mistura de espanto e curiosidade. As garotas devoravam uma variedade de alimentos de maneira voraz e despretensiosa. Hamburgueres, cachorros-quentes, milk shakes espessos, e até uma mistura de bacon e ovos reconstituída, tudo parecia perfeitamente normal dentro daquele contexto insano.
A entrada da grande frota não demorou, e logo estavam ali os grandes nomes, os chefes de estado e as autoridades. O exato momento da chegada parecia ter sido cuidadosamente calculado. Havia uma precisão mortal nas ações, um planejamento meticuloso que excluía qualquer possibilidade de erro. Mas, entre o espetáculo e a agitação, havia uma percepção crescente de que o final estava se aproximando com uma rapidez assustadora.
Fiske, agora no comando de uma nave, se preparava para a aterrissagem, um momento que ele nunca antes experimentara. A responsabilidade era grande, e as horas de preparação foram consumidas na verificação de cada item necessário para o processo. Quando finalmente a nave começou a retroceder, ele sentiu o peso da pressão, o corpo sendo esmagado, e o alívio que se seguiu quando a força começou a diminuir. O espaço tornou-se novamente tranquilo, sem qualquer sensação de movimento, como se já houvesse aterrissado. A leveza do ambiente indicava que o fim estava próximo, mas não era um fim qualquer. Era um fim que carregava o peso de algo maior do que a própria aterrissagem.
Fiske sentiu, ao abrir a porta da nave, a chegada ao ápice. O sol brilhou através da abertura, e o estrondo da multidão abaixo parecia anunciar uma celebração. A garota de cabelos loiros, Ilyana, foi a primeira a sair, seguida por Fiske e Pitoyan. Os músicos abaixo, sob comando preciso, iniciaram a execução da música nacional. O momento havia chegado, mas não era só um momento de glória; também havia algo de profundamente irônico nesse instante. O público, absorvido pela pompa, não parecia se importar com a presença dos russos, mas o efeito, no entanto, foi dado: as autoridades estavam lá, e o espetáculo acontecia como se tudo estivesse no lugar certo.
Cathy, no entanto, sentiu algo de errado. O homem que ela amava, Mike, não estava entre os que retornavam. Seu coração afundou, e a emoção que a tomava foi instantânea. O frenesi da multidão e o som das músicas abafaram a dor crescente. O caos das celebrações se desenrolava enquanto ela corria, desesperada, em direção à nave. Conway observava, impotente, sabendo que o que ela buscava seria inalcançável naquele momento. O corpo de Fawsett foi retirado em uma maca, uma figura de dor no meio de toda a grandiosidade. Cathy, desesperada, gritou seu nome, mas as barreiras físicas e emocionais que a cercavam eram insuperáveis.
Conway, por sua vez, observava tudo de longe, como se estivesse a um passo do abismo, mas sem poder agir. Não restava nada a fazer até que a multidão começasse a se dispersar, o que não aconteceria antes de várias horas. Ele sabia que, quando isso acontecesse, Cathy estaria lá, perdida no caos, sem rumo, esperando que algo mudasse. Ela só encontraria a paz quando a multidão finalmente se dispersasse, quando o espaço se tornasse vazio e o silêncio fosse a única companhia.
O simbolismo dessa cena não passava despercebido. A grandiosidade do espetáculo e a presença das figuras de autoridade contrastavam com a dor e o desespero invisíveis, daqueles que, fora da vista pública, lutam contra os próprios demônios. É uma ilustração do absurdo que permeia a condição humana, onde as aspirações mais altas podem ser ofuscadas pela banalidade do sofrimento individual. No fim, a multidão seguirá em frente, mas aqueles que estão à margem da celebração, aqueles que sofrem sem aplausos, esses continuam a carregar seus fardos sozinhos.
O Que Há Dentro de Você? O Significado da Transformação Interior
Sempre existe algo mais. Algo que está escondido em você, embora talvez você ainda não perceba. Em determinado momento, quando as palavras certas surgirem, poderei explicar. Você pode perguntar se é possível colocar isso em termos racionais. E sim, claro, tudo pode ser traduzido para a razão. Mas, às vezes, é preciso agir, fazer um movimento. A vida não espera por uma explicação completa. Ela exige ação. Às vezes, a ação não se baseia em razão, mas em um instinto de necessidade. E é assim que as coisas acontecem.
Quando a mulher se preparava para partir, ela fez isso de forma notável, muito mais eficiente do que o habitual. Não houve dispersão, não houve incerteza. Como se ela tivesse se transformado em um ser mais ágil e direcionado, como se tivesse alcançado uma clareza interior que antes parecia distante. Conway, por outro lado, continuou a se mover por uma rotina mais habitual, sem perceber as profundas mudanças que aconteciam ao seu redor.
A viagem até Londres, a busca por um simples passeio por Trafalgar Square, eram momentos comuns para ele. Mas, naquele dia, o ambiente parecia diferente. O caos da cidade estava diluído pela enorme quantidade de informações transmitidas pelas potentes caixas de som espalhadas pelo local. O som era ensurdecedor, uma mistura de ansiedade e urgência, enquanto a multidão, atenta ao que estava sendo comunicado, respondia de maneira quase automática. A sensação de impotência diante daquilo que não se pode controlar, de estarmos apenas sendo arrastados por um fluxo coletivo de informações e ruídos, é algo que ressoa em todos nós.
Porém, logo, a multidão voltou ao seu comportamento habitual. Era como se, por um momento, todos tivessem se desviado de suas rotinas para absorver algo novo, mas logo retornaram à normalidade. Conway, então, ficou com a sensação de que algo estava se desenrolando, mas que ele não poderia controlar. Essa percepção de impotência se refletia em seu pensamento sobre a cidade, sobre como ela se reconstruía constantemente, mas sem alterar sua essência. A cada novo prédio que surgia, um antigo desaparecia, mas a rua continuava a mesma. Ele refletia sobre como as mudanças no corpo humano são análogas a isso: os átomos em nosso interior mudam constantemente, mas nossa essência permanece a mesma, porque a estrutura subjacente não se altera.
Enquanto observava os detalhes de Londres, o que parecia ser uma simples caminhada se tornou uma meditação sobre o que realmente importa: a estrutura que sustenta as mudanças. O que realmente conta não são as modificações superficiais, mas a preservação do padrão. Assim como os átomos em nosso corpo podem ser substituídos, mas a estrutura da nossa identidade não se altera, ele percebeu que Cathy havia passado por uma transformação. Ela havia mudado, mas a essência de sua pessoa permanecia intacta. A mudança era apenas um ajuste, uma reorganização, que a tornava mais forte, mais coordenada, mais em sintonia consigo mesma.
Em um mundo onde tudo está em constante transformação, onde a vida parece nos empurrar para uma busca constante por respostas e explicações, é fácil esquecer que, no fundo, a estrutura fundamental permanece a mesma. Como em Londres, onde os edifícios são substituídos, mas a rua continua a seguir seu curso, as mudanças dentro de nós também não alteram o fluxo essencial da nossa vida. O que realmente importa é manter a harmonia entre as partes, aceitar a mudança sem perder a identidade.
A relação de Conway com Cathy reflete essa transformação silenciosa, mas poderosa. Ela, agora, parece ter alcançado uma nova harmonia, uma nova ordem interna. Mas ele, por sua vez, ainda está à deriva, tentando compreender e racionalizar o que está acontecendo. Ele não sabe exatamente o que ela está fazendo, mas há algo em seu comportamento que revela que ela está em sintonia com algo maior. Ele está preso a uma perspectiva limitada, tentando ver tudo com os olhos da razão, enquanto ela já foi além dessa percepção.
Assim, a verdadeira transformação não está no que é visível ou no que é racionalizado. Ela se dá nas pequenas mudanças, na reorganização das partes que formam o todo. E, quando essas partes se alinham, uma nova versão de nós mesmos pode surgir, mais forte e mais consciente. O segredo não está na explicação lógica, mas na aceitação da mudança e na adaptação àquilo que realmente importa: a harmonia interna, o padrão que nunca se perde, mesmo quando tudo ao redor se transforma.
O Último Refúgio: A Impossibilidade do Controle em um Mundo Pós-Ataque Nuclear
O sistema de alertas interligados, um complexo mecanismo de defesa, falhou em sua promessa de dar tempo suficiente para uma resposta efetiva diante da ameaça iminente. O atraso na emissão do aviso não foi um acaso. A necessidade de validação e revalidação das informações antes de qualquer ação oficial se mostrou crucial, mas também catastrófica. Um sistema que se destina a prevenir desastres não pode operar de maneira eficiente se for ativado raramente e constantemente comprometido por falsas alarmes. Quando a verdadeira ameaça chegou, as reações humanas foram lentas demais para prevenir o colapso total.
Mesmo o avançado sistema antimíssil, controlado por computadores e projetado para interceptar ataques, não conseguiu evitar o impacto de uma catástrofe em escala global. Embora tenha derrubado cerca de setenta por cento dos mísseis, esse sucesso, acima das expectativas de especialistas, não foi suficiente para impedir o desastre. A realidade da destruição era implacável. As cidades, antes ícones de poder e prosperidade, estavam agora imersas em nuvens de cogumelo e radiação, tornando-se um cenário de morte indiscriminada. O choque da explosão inicial foi quase imediato, e as consequências de um ataque nuclear eram rápidas e fatais.
A resposta ocidental, um reflexo das tensões geopolíticas, também se arrastou devido a um momento de falha crítica no comando. O presidente não estava disponível quando a informação chegou, o que atrasou a ordem de retaliar. Este tipo de falha, dentro de um sistema de comando militar altamente estruturado, pode parecer impensável, mas é também um reflexo das falhas humanas diante de um sistema de alerta que, mesmo com a mais alta tecnologia, não pode escapar das limitações da própria natureza humana. A decisão, quando finalmente tomada, era irrevogável. Os mísseis em movimento, com velocidades superiores a 32.000 quilômetros por hora, tinham um destino certo: os centros nervosos do inimigo.
Dentro de abrigos subterrâneos, as equipes responsáveis pela defesa eram reduzidas drasticamente. A perda de pessoal, que foi progressiva à medida que a retaliação se intensificava, não deteve o lançamento dos mísseis. A automação, longe de ser um refúgio de eficiência, provou ser um testemunho de um sistema desumanizado, onde as máquinas tomavam o controle absoluto. A destruição era impessoal e contínua, sem interrupção, independentemente da vontade humana.
Conway, testemunha direta da devastação, experimentou em primeira mão a terrível realidade da explosão nuclear. O impacto imediato da onda de choque foi seguido por um silêncio sepulcral, onde ele se viu vulnerável, mas ainda vivo. O tempo passou de forma distorcida: ele sabia que, em questão de horas, sua morte seria inevitável. A radiação, com seu impacto silencioso e devastador, iria lentamente destruir seu corpo. Mas em sua mente, a única possibilidade de escapar daquela dor iminente era a morte rápida, talvez por overdose de medicamentos. A sobrevivência não era mais uma opção. O único desejo agora era encontrar uma forma de escapar do sofrimento. A ideia de nunca mais ver Cathy, de nunca mais ver aqueles que amava, parecia a única certeza em meio ao caos absoluto.
Com a segunda explosão, mais próxima e ainda mais devastadora, Conway foi lançado no ar novamente. Mas desta vez, sua percepção do mundo ao seu redor mudou. A visão de uma mulher com seu filho, mortos, reconfigurou sua compreensão da realidade. A imagem que ele tinha daquela mulher havia se misturado com o trauma de sua perda pessoal, criando uma distorção de sua percepção. O sofrimento humano não era mais tangível, mas havia sido substituído pela experiência de um mundo já em ruínas. A destruição, imperturbável, seguia seu curso.
À medida que Conway vagava pela praça, observando as vítimas do ataque, a visão de corpos espalhados e a destruição imensa, ele percebeu que a própria percepção da dor e do sofrimento se tornara parte do cenário. Os sobreviventes, em um estado de transe, pareciam continuar a lutar contra um inimigo invisível, enquanto o mundo ao seu redor colapsava. A humanidade, antes tão organizada e estruturada, agora se encontrava à mercê do caos absoluto. O medo, a dor e o desespero tornaram-se as novas constantes de uma realidade em que os antigos mecanismos de controle haviam falhado de maneira irreparável.
O que se deve compreender a partir disso é que, em um cenário de guerra nuclear, não há vencedores. A destruição é total e irremediável. A confiança nos sistemas automáticos e na tecnologia, tão celebrada antes da catástrofe, não é suficiente para evitar a desintegração de tudo que é considerado seguro. O controle, tanto humano quanto tecnológico, se revela uma ilusão diante da magnitude do sofrimento humano e da devastação total. Em última análise, as lições desse tipo de guerra devem ser claras: o custo da destruição nuclear não é apenas o imediato, mas as consequências que ecoam por gerações, com a desintegração da humanidade e de suas estruturas sociais e psicológicas.
O que acontece quando a ordem social se desfaz?
Ele não vira nada além de um exame de rotina; isso era tudo o que lhe ocorria pensar quando os militares aparecem sem espetáculo — unidades motorizadas já cercavam a aldeia, mas nada que devesse, à primeira vista, despertar pânico. Fitzalan tivera o cuidado de não provocar suspeitas com demonstrações de força, e ainda assim a presença era implacável. Depois que o Brigadier partiu, o Major jovem e de rosto lisinho sorriu com urbanidade e comentou sobre o jardim; Conway sorriu também, convicto de que fingir calma seria mais prudente. Cathy sabia cuidar de si em questões grandes, tanto quanto continuava a necessitar de pequenas ajudas; entre eles permanecia a mesma simetria de companheirismo e desconfiança.
Saíram para uma volta ao sol da tarde, e apenas quando já haviam dado duas vezes o circuito do jardim veio o grito que rasgou a letargia. O Major sacou uma pistola e correu para a casa; naqueles instantes Conway calculou com a rapidez de quem aprendeu a adivinhar intenções: havia duas hipóteses — Cathy perdera a paciência, ou aquilo era mais grave do que parecia. O gesto do jovem indicava que atirariam primeiro e perguntariam depois. Conway lançou então uma declaração ambígua: «O bastardo está a atacá‑la.» A hesitação aconteceu; com a precisão de um bloqueio de futebol americano atirou‑se sobre o homem, derrubou‑o e recolheu a arma antes que ela raciocinasse.
Dentro da sala, encontraram o Brigadier recostado num cadeirão, respirando com audição deformada e o rosto púrpura, como se a vitalidade tivesse sido sugada de uma só vez. Cathy, com a calma que às vezes passa por frieza, descreveu o gesto de afrouxar a gola como se dançasse um protocolo. Conway, sem elegâncias, disse apenas «Jesus», porque as palavras maiores faltavam. Era claro que o Brigadier não voltaria à velha rotina dos dias; era claro que a situação exigia movimento, fugir antes de ficar à mercê de artilharia que não distinguiria civis de alvos.
Argumentaram sobre a necessidade de deixarem passar os dois homens que haviam interrogado a casa; talvez deviam ter sido eliminados, admitiu Conway com pragmatismo frio, mas ordenou partir. Ao atingir a estrada principal encontraram o primeiro bloqueio; ao tentar contornar, outro. A aldeia era um anel de ferro. Num impulso — talvez orgulho, talvez desespero — Conway conduziu ao encontro do jovem Major e tentou conversar com franqueza: aquele tipo de espetáculo de soldados de brinquedo não resolveria o que ocorrera. A ameaça sibilou entre as palavras, e o Major, pálido, prometeu retaliação. Abriram a cancela; quando já quase passavam, um disparo ecoou, Cathy feriu-se no ombro, e o som fez o mundo encolher.
Conway travou o carro por instinto; havia em seu peito uma ira imediata que roubou-lhe a descrição do ato que se seguiu. Virou‑se contra o atirador com algo que não pôde — nem quis — nomear; o Major caiu sem um grito. Os outros guardas dispersaram, tomados por pânico coletivo. Não houve tempo para entendimento: o que acontecera fora suficiente. O carro retomou a estrada e, à medida que se afastavam da aldeia, uma sensação estranha parecia abandonar Conway, como se algo tivesse sido devolvido ao silêncio.
Cathy abriu os olhos e murmurou sobre a dor no ombro; a blusa rasgada revelou um escuro hematoma que não era fatal, mas exigia socorro imediato. A logística do socorro tornava a fuga mais perigosa: hospitais e postos médicos eram pontos fáceis para rastrear fugitivos. Seriam forçados a escolher rotas secundárias, estradas pequenas, e a esperança era que em vilarejos menores os bloqueios se limitassem a arranjos que Cathy poderia neutralizar. Ele amaldiçoou a própria ingenuidade por ter sido enganado por Fitzalan e pelo jovem oficial. Ainda assim, numa fração de segundo de pura clarividência, compreendeu que algo havia passado entre eles quando o projétil lhe cortou o percurso — uma semente de mudança preparada para o caso de a bala ter sido mortal; Conway teria sido, de repente, o novo abrigo. Aquilo que passou não tinha nome, mas prometera continuidade.
Enquanto conduzia por caminhos laterais em direção a Londres, planejando levar Cathy a um amigo, pensou nas consequências maiores: uma sociedade inteira sustentada por uma ideia entra em colapso se essa ideia é posta em dúvida. A máquina do Estado, quando acuada, recorre à violência indiscriminada: bombardeios, tiros ao acaso, a implantação de pavor como remédio de emergência. Eles tinham de ser alcançados porque, se permanecessem livres, a narrativa de segurança se corroía; para a autoridade restaria apenas esmagar. Entre matar e fugir, escolheram escapar — não por covardia, mas por cálculo: a resistência explícita abriria uma guerra que esmagaria milhares.
Enquanto o carro cortava campos e pequenas aldeias, a fragilidade humana e a brutalidade institucional entrelaçavam‑se numa paisagem onde decisões íntimas reverberavam em políticas gerais. A violência do Estado não era sempre grandiosa; muitas vezes manifestava‑se em barreiras nas estradas, em diligências insistentes, em jovens oficiais que acreditam poder tudo. A fuga não era apenas uma saída física, mas um testemunho de que a ideia que sustentava a ordem podia ser contrariada pela vontade de dois indivíduos que se recusavam a ser reduzidos a peças do aparato.

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