A osteoartrite localizada no tornozelo (LOA) é uma condição que frequentemente está associada a alterações no alinhamento articular, tanto acima quanto abaixo da articulação do tornozelo. O estudo detalhado dessas deformidades é essencial para o diagnóstico e manejo adequados dos pacientes com LOA. Um aspecto fundamental para a avaliação é o alinhamento supramaleolar, que deve ser analisado nos planos coronal e sagital, usando ângulos específicos como o ângulo distal lateral da tíbia (LDTA) e o ângulo distal anterior da tíbia (ADTA). O LDTA é em média 90° (com uma variação de 88° a 95°), e o ADTA é em média 81° (variando entre 78° e 82°). Esses ângulos são medidos entre uma linha ao longo do eixo tibial e uma tangente à superfície articular distal da tíbia, respectivamente no plano coronal (LDTA) e sagital (ADTA).

Esses valores de alinhamento só podem ser avaliados de forma precisa se não houver deformidades óbvias na parte superior do tornozelo, o que reforça a importância de uma análise cuidadosa de cada segmento do membro inferior. Além disso, a avaliação intra-articular também deve incluir a medição da inclinação do tálus, que não deve exceder 4°. Essa inclinação é medida entre a superfície articular distal da tíbia e a linha do domo do tálus. É importante notar que a estabilidade peritalar deve ser analisada com atenção, uma vez que em casos de osteoartrite do tornozelo, o tálus perde sua estabilidade intrínseca devido à diminuição da espessura da cartilagem, o que leva à perda de altura do retropé.

A posição do tálus, como um "osso intercalar" entre o calcâneo e a tíbia, é controlada e manipulada pelas forças aplicadas nos segmentos proximal e distal. Este aspecto é crucial, pois em casos de instabilidade peritalar, o tálus pode desviar para varo ou valgo, com o calcâneo podendo realizar uma compensação na direção oposta. No entanto, se a instabilidade peritalar for exagerada, como no caso de uma osteotomia do calcâneo para compensar uma articulação em varo, o desvio pode ser acentuado, o que pode não aliviar os sintomas do paciente e até piorar o quadro clínico. A instabilidade do tálus pode ser avaliada de forma mais precisa através de tomografia computadorizada (TC) sob carga (WBCT), já que não é possível prever essa condição por uma única projeção radiológica.

Deformidades valgus e varus no tornozelo resultam em sobrecarga articular localizada, principalmente na articulação lateral, gerando desgaste assimétrico da cartilagem do tornozelo. No caso de deformidades do tipo "valgo do retropé induzido pelo antepé", a insuficiência da coluna medial do pé leva à sobrecarga lateral do tornozelo, agravando o desgaste articular. Esse desgaste pode resultar em uma perda de altura do retropé e insuficiência do ligamento deltoide, provocando uma instabilidade rotacional do tálus. Por outro lado, deformidades do tipo "varo do retropé induzido pelo antepé" ocorrem devido à depressão da coluna medial, o que causa instabilidade lateral e aumento do torque de inversão na articulação do tornozelo, levando ao aumento do desgaste assimétrico na articulação lateral.

Nos casos de instabilidade peritalar, as correções cirúrgicas, como osteotomias calcâneas, podem não ser eficazes, e a fusão da articulação subtalar (artrodesse) pode ser recomendada, especialmente quando o subtalar apresenta mobilidade preservada. Caso contrário, a elevação da coluna medial por meio de osteotomias específicas, como a osteotomia do cuneiforme medial (osteotomia de Cotton), pode ser uma opção para reduzir a sobrecarga lateral do tornozelo.

Além da análise radiológica do alinhamento, o exame clínico dos pacientes com LOA deve considerar também fatores como mudanças na atividade física, variações na superfície de apoio, tipo de calçado e alterações no peso corporal. Esses fatores podem contribuir para um aumento no impacto ou torque que o tornozelo suporta, agravando o quadro de dor, especialmente após atividades físicas. Na fase inicial da osteoartrite, as radiografias podem mostrar alinhamentos dentro dos limites normais, mas o paciente ainda pode apresentar dor em áreas afetadas por traumas prévios, como fraturas do tipo pilão, ou alterações visíveis apenas em exames de ressonância magnética (RM).

É imprescindível que os profissionais de saúde considerem não apenas as imagens radiológicas tradicionais, mas também a biomecânica do pé e tornozelo no momento do diagnóstico, para poder propor tratamentos mais eficazes, seja conservadores ou cirúrgicos, que restabeleçam a função e qualidade de vida do paciente. As decisões sobre intervenções cirúrgicas, como osteotomias ou artrodeses, devem ser baseadas em uma compreensão completa do alinhamento do membro inferior e da dinâmica da articulação subtalar, evitando correções inadequadas que possam comprometer ainda mais o estado funcional do paciente.

Quais são os principais desafios e abordagens no diagnóstico e tratamento das deformidades e lesões do pé e tornozelo?

O estudo das deformidades e lesões do pé e tornozelo apresenta uma complexidade anatômica e funcional que exige uma compreensão profunda da biomecânica, da patologia e das opções terapêuticas. A diversidade das estruturas envolvidas — desde os ligamentos laterais de Lisfranc até a musculatura intrínseca e extrínseca do pé — torna essencial o diagnóstico preciso para o sucesso do tratamento, seja ele conservador ou cirúrgico.

Um dos desafios centrais reside na correta classificação e avaliação das lesões, como evidenciado pela importância da classificação de Lauge Hansen nas fraturas do tornozelo e pela análise detalhada das lesões ocultas da articulação de Lisfranc. Essas classificações são ferramentas indispensáveis para orientar o planejamento terapêutico e prever complicações, uma vez que a articulação do Lisfranc é vital para a estabilidade do mediopé e, portanto, para a função global do pé.

A abordagem cirúrgica inclui técnicas que variam da reconstrução ligamentar (como a ligamentoplastia) à correção óssea através de osteotomias, além de procedimentos minimamente invasivos que vêm ganhando espaço por oferecerem menor morbidade e rápida recuperação. O emprego de técnicas específicas, como a técnica de Lapidus para o hallux valgus, e a realização de alongamentos laterais da coluna (LCL) são exemplos de intervenções que demandam rigorosa avaliação pré-operatória e acompanhamento pós-operatório criterioso, incluindo a fisioterapia orientada para otimizar a função.

Ademais, as deformidades dos dedos menores, como os dedos em martelo ou garra, requerem abordagem cuidadosa, considerando as alterações anatômicas dos tendões, cápsulas articulares e placas plantares. As opções variam desde tratamentos conservadores até osteotomias e artrodese, destacando-se o papel dos exames de imagem para a definição da extensão da deformidade e a presença de alterações intra-articulares.

A dor e a limitação funcional decorrentes de processos degenerativos, como a osteoartrite localizada do tornozelo, também exigem uma abordagem multifatorial que abrange desde o manejo conservador com órteses e fisioterapia até técnicas cirúrgicas como a artroplastia de distração e substituição cartilaginosa. A compreensão das fases do movimento do pé — incluindo os “rockers” (primeiro, segundo e terceiro) — é fundamental para o entendimento das cargas mecânicas e seu impacto na progressão das patologias.

Importante também é a avaliação da integridade neurológica, incluindo o estudo dos nervos interdigital, peroneal, tibial e plantar, uma vez que lesões ou compressões desses nervos podem acarretar alterações sensitivas e motoras que agravam as disfunções. O reconhecimento precoce e a intervenção adequada em patologias como o neuroma de Morton são determinantes para evitar complicações e garantir a qualidade de vida do paciente.

O diagnóstico e manejo das deformidades e lesões do pé devem ser compreendidos dentro do contexto da biomecânica global do membro inferior, considerando desde discrepâncias de comprimento até sobrecargas mecânicas específicas que influenciam a evolução das doenças. Além disso, a incorporação de avanços tecnológicos, como a ressonância magnética para avaliação detalhada dos tecidos moles e dos ossos, bem como o uso de métodos moleculares para investigação diagnóstica, tem ampliado a precisão das intervenções.

É imprescindível que o profissional esteja atento à relação entre obesidade, alterações posturais e deformidades do retropé, pois o excesso de peso potencializa os processos degenerativos e dificulta o tratamento. A fisioterapia e a reabilitação funcionam como pilares complementares ao tratamento clínico e cirúrgico, visando não apenas a recuperação anatômica, mas também a reeducação funcional e a prevenção de recidivas.

Além disso, a individualização do tratamento é essencial, pois diferentes pacientes apresentam variações anatômicas e funcionais que influenciam diretamente os resultados. A integração entre avaliação clínica, análise de imagem e conhecimento biomecânico permite uma abordagem eficaz, que minimize as complicações e maximize a funcionalidade do membro.

A compreensão das nuances das patologias do pé e tornozelo transcende o reconhecimento dos sinais e sintomas e se estende ao entendimento do impacto das forças mecânicas, da anatomia complexa e das respostas biológicas às intervenções. A manutenção da qualidade de vida do paciente depende da harmonia entre o diagnóstico preciso, o tratamento adequado e o acompanhamento contínuo.

Como Realizar um Tratamento Ortopédico Adequado em Fraturas Tibiais Pediátricas: Aspectos Cruciais e Recomendações

No manejo ortopédico de fraturas diafisárias da tíbia em crianças, há múltiplos fatores que devem ser considerados durante o procedimento. O controle da rotação e dos eixos, o suporte adequado de três pontos, a tensão da bandagem gessada e o cuidado com os tecidos moles são alguns dos pontos-chave para garantir um bom resultado. Quando uma única pessoa tenta cobrir todos esses aspectos, é altamente provável que ela se distraia com alguns deles, o que pode afetar diretamente o resultado final do tratamento.

O posicionamento correto do paciente é fundamental para o sucesso do tratamento. Durante a redução e a instalação do gesso, recomenda-se deixar a perna pendurada na borda da maca. Dessa forma, a gravidade auxilia na tração e no alinhamento dos segmentos ósseos. A proteção adequada da pele e das partes moles é igualmente importante, especialmente nas áreas com proeminências ósseas, onde o risco de lesões causadas pela bandagem de gesso é maior.

O processo de imobilização deve seguir o padrão da lesão e a deformidade do ferimento, aplicando-se o suporte de três pontos, sempre prestando atenção na posição do pé. Uma recomendação importante é utilizar as palmas das mãos, evitando o uso dos dedos, para evitar a formação de protuberâncias que possam machucar a pele. Após a instalação da primeira metade do gesso (uma bota curta), é necessário realizar incisões de descarregamento de 1–2 cm na borda proximal para evitar o anel de constrição.

Para pacientes com menos de 2 anos, a imobilização pode escorregar, mas a flexão do joelho a 90 graus, associada à flexão do tornozelo a 90 graus, pode evitar o deslocamento do gesso. Durante a instalação da segunda metade, na região da coxa, é crucial moldar bem a área supracondilar do fêmur, evitando o deslizamento do gesso, especialmente em crianças mais novas.

Após a instalação do gesso, é recomendada a realização de uma radiografia da perna para servir como ponto de partida no acompanhamento e para facilitar a comparação com imagens futuras durante o monitoramento da evolução.

Quando se trata de correções menores de fraturas com perda parcial da redução, a yesotomia se apresenta como uma técnica útil. Ela permite realizar correções angulares no plano coronal e/ou sagital, sendo eficaz em fraturas com desvios moderados. Contudo, essa técnica deve ser realizada com cautela, pois manipulações excessivas podem causar desconforto e até lesões nos tecidos moles, além de aumentar o risco de síndrome compartimental.

Após a redução ortopédica e a instalação do gesso, o tratamento continua com a manutenção do gesso por 3–4 semanas, seguido pela troca para uma bota curta, que será mantida por 6–8 semanas, dependendo da estabilidade da fratura. O carregamento progressivo da perna pode ser iniciado conforme a estabilidade da fratura. Pacientes mais velhos, que podem usar bengalas, devem iniciar com carga parcial progressiva, enquanto em crianças mais novas, que não utilizam bengalas, a troca para a bota curta pode ser necessária.

Embora a reabilitação não seja geralmente necessária em pacientes mais jovens e saudáveis, em adolescentes e pacientes mais velhos, é essencial um acompanhamento fisioterápico direcionado. A reeducação da marcha, o fortalecimento dos membros inferiores e a recuperação da amplitude articular são cruciais para garantir a recuperação funcional da perna.

O tratamento cirúrgico é uma opção, dependendo da idade do paciente e da gravidade do desvio inicial ou subsequente. O uso de técnicas de osteossíntese, como pregos endomedulares elásticos, placas ou fixadores externos, será decidido com base na experiência do cirurgião, na idade do paciente, na localização e no tipo da fratura. Em fraturas expostas, o procedimento inicial de limpeza e desbridamento é fundamental, seguido de tratamento com antibióticos nos primeiros três dias após o trauma.

Quando se trata de fraturas abertas, a cirurgia de limpeza deve ser realizada nas primeiras 24 horas, seguidas por osteossíntese definitiva. Técnicas de fixação como o prego elástico intertravado, popularizado por Metaizeau, são comumente utilizadas para fraturas diafisárias da tíbia em crianças, pois oferecem uma boa estabilização, desde que colocadas corretamente, com pré-tensionamento e suporte de três pontos.

É importante que o tratamento de fraturas pediátricas da tíbia leve em consideração a evolução do quadro, sendo necessário o acompanhamento contínuo para avaliar a consolidação óssea e possíveis complicações. O sucesso do tratamento depende não só da técnica utilizada, mas também da colaboração entre a equipe médica e os pacientes e seus familiares, para garantir a recuperação plena e o retorno às atividades cotidianas.