O debate sobre o ceticismo e suas diversas abordagens, como o veridicalismo, tem profundas implicações para nossa compreensão do conhecimento e das limitações humanas. O veridicalismo, uma tentativa de refutar o ceticismo ao afirmar que nossas percepções da realidade são, de fato, precisas, se mostra insustentável quando confrontado com as questões do ceticismo. Especificamente, ao rejeitar a ideia de que não sabemos o que são as coisas (conhecidas como "what's things"), o veridicalismo falha em abordar a verdadeira essência do ceticismo, que questiona a própria natureza da nossa capacidade de conhecer a realidade.

O ceticismo tradicionalmente nos desafia com a ideia de que não podemos ter certeza de que o mundo externo existe como o percebemos. Ele questiona a veracidade de nossas percepções sensoriais e sugere cenários como o de que poderíamos estar em uma simulação ou até mesmo como cérebros em cubas (BIVs - Brain in a Vat). O veridicalismo, em seu esforço para resolver esse dilema, propõe que nossas percepções, por sua natureza, são confiáveis. No entanto, essa solução não resolve o cerne do problema, pois, ao rejeitar a possibilidade de não sabermos o que são as coisas, o veridicalismo inevitavelmente acarreta um novo tipo de ceticismo: o ceticismo sobre o que são as coisas, ou seja, não sabemos o que é uma mesa, mesmo que saibamos que ela existe.

Esse problema se torna mais claro quando se observa a estratégia de rejeição da "fechamento" (closure), que propõe que o conhecimento de que existe uma mesa não implica necessariamente o conhecimento de que não estamos em uma simulação ou de que o objeto percebido não é apenas um BIV-table. Se você não sabe se está em uma simulação, mesmo sabendo que uma mesa existe, você ainda não sabe o que a mesa é de fato, o que a torna um tipo de ceticismo semelhante ao que o veridicalismo procurava evitar.

Entretanto, nem toda rejeição de fechamento leva diretamente ao ceticismo sobre o que são as coisas. Algumas abordagens, inspiradas por Wittgenstein, sugerem que, para saber que há uma mesa, é necessário pressupor (ou ter confiança) de que não estamos em uma simulação, embora isso não constitua conhecimento nem tenha justificativa empírica. De acordo com essas visões, a simples suposição de que não somos BIVs é o que permite que tenhamos conhecimento de coisas como mesas. Isso resolve parcialmente o problema do ceticismo sem recorrer ao veridicalismo, embora ainda haja uma pressuposição de que a simulação ou o erro radical não estão ocorrendo.

Porém, não podemos esquecer que algumas abordagens, como as de Dretske e Nozick, argumentam que não é necessário assumir que não estamos em uma simulação para saber que uma mesa existe. Essas teorias deixam espaço para a dúvida sobre a veracidade do que percebemos enquanto ainda sustentam o conhecimento do mundo externo. Essa postura, no entanto, tem implicações mais profundas, uma vez que abre a possibilidade de que a mesa que você conhece possa ser, na verdade, uma mesa em uma simulação ou uma mesa de um BIV.

Essas considerações evidenciam a complexidade do problema que o ceticismo nos propõe. Se rejeitarmos a noção de fechamento sem considerar as implicações de nossa incapacidade de saber se estamos em uma simulação, inevitavelmente seremos levados de volta ao problema original do ceticismo: o que, de fato, sabemos sobre a realidade que nos cerca? A negação do fechamento parece abrir uma porta para uma forma de ceticismo ainda mais profunda, que questiona nossa capacidade de distinguir a realidade da ilusão.

O ponto crucial aqui é que qualquer estratégia bem-sucedida contra o ceticismo precisa abordar diretamente o problema da certeza do que sabemos (ou do que podemos saber) sobre o mundo. A simples recusa a algumas premissas, como o fechamento, sem uma consideração adequada do impacto disso na natureza do conhecimento, não resolve a questão central do ceticismo. Como vimos, essas estratégias, mesmo quando rejeitam algumas das premissas céticas, frequentemente implicam um retorno a um tipo de dúvida epistemológica fundamental.

Além disso, é importante entender que as abordagens contemporâneas para o ceticismo não podem ser reduzidas a uma simples questão de negar ou afirmar certas premissas. Elas envolvem um delicado equilíbrio entre as limitações da percepção humana, as condições de conhecimento e as implicações mais amplas sobre o que significa "conhecer" algo. O que está em jogo não é apenas uma disputa filosófica sobre a verdade das nossas crenças cotidianas, mas uma questão profunda sobre como as crenças, percepções e contextos sociais influenciam nossa capacidade de fazer afirmações confiáveis sobre o mundo.

Em última análise, o ceticismo não é apenas uma dúvida sobre a existência de mesas ou outros objetos físicos, mas uma reflexão sobre os limites do conhecimento humano. Quando exploramos essas questões, devemos estar cientes de que cada teoria epistemológica que tenta resolver o ceticismo traz consigo novas questões, implicações e, frequentemente, novos dilemas. Assim, entender o ceticismo e suas várias respostas não significa encontrar uma solução definitiva, mas sim aprofundar a nossa consciência das complexidades do conhecimento e da experiência humana.

O que realmente sustenta o problema cético: a experiência ou a metafísica?

É possível levantar o problema do ceticismo radical sem recorrer a cenários hiperbólicos como cérebros em cubas ou demônios enganadores. A dúvida fundamental — como saber qual é a verdadeira fonte de nossas experiências — já é suficiente para instaurar a crise cética. Essa forma de ceticismo, mais fundamental, não exige nenhum artifício ficcional. Basta reconhecer que nossas experiências, por si só, não revelam sua origem última. Se conseguíssemos determinar com certeza a origem das nossas vivências, poderíamos então descartar hipóteses como a do sonho eterno ou da manipulação demoníaca. Assim, mesmo rejeitando os cenários céticos tradicionais como necessários, a resposta ao ceticismo básico deveria, em princípio, desarmar também esses cenários.

No entanto, a formulação padrão do argumento cético — frequentemente organizada em uma sequência de premissas que levam à conclusão de que não sabemos nada sobre o mundo externo — revela-se inadequada. Se alguém pode rejeitar uma das premissas e ainda assim permanecer preso à inquietação que a conclusão suscita, isso indica que a estrutura argumentativa (por exemplo, de (1) a (4)) não capta a verdadeira natureza do problema. O ponto não é apenas lógico, mas ontológico e epistemológico: a dificuldade não desaparece com a negação de uma premissa isolada, porque permanece viva a ignorância sobre o que as coisas realmente são.

Evitar esse impasse exige um comprometimento com uma metafísica padrão — a ideia de que objetos como mesas realmente existem, da forma como os concebemos intuitivamente. Sem isso, a dúvida quanto ao que são as coisas (a questão whatsk) continua a corroer qualquer pretensão de conhecimento. No entanto, essa metafísica é tudo menos inquestionável. Os veridicalistas, por exemplo, já demonstraram com vigor o quanto essa concepção de mundo é frágil. E se essa base metafísica é duvidosa, então a formulação cética que a pressupõe também o é.

Isso revela um ponto negligenciado, mas crucial: o argumento cético típico está enraizado em uma visão metafísica específica. A maneira como o problema é apresentado depende dessa aceitação prévia. Isso ecoa estratégias anticientíficas como o disjuntivismo, que expõem como certos argumentos céticos dependem de concepções discutíveis sobre a experiência perceptiva. A ignorância sobre o que as coisas são, mesmo quando acompanhada por um saber superficial de que “algo há”, é compatível com um conhecimento irrisório do mundo externo — o verdadeiro cerne do problema cético.

Presumir sem questionamento essa metafísica é um erro conceitual. O que nos perturba no ceticismo não é simplesmente a possibilidade de sermos enganados por demônios ou por uma simulação. É o fato de que, nesse caso, a vida cognitiva se torna uma farsa: não sabemos o que está acontecendo, não sabemos se o mundo existe, se as coisas têm uma essência ou se tudo é ilusão. Esse é o impacto existencial do ceticismo, e ele não depende da veracidade de premissas formais, mas da fragilidade ontológica das nossas certezas mais básicas.

É essencial perceber que o ceticismo não é apenas um jogo lógico, mas uma crise na confiança entre experiência e realidade. A forma como construímos o problema — e as possíveis saídas — dependerá de compromissos metafísicos que raramente são explicitados, mas que determinam profundamente nossas respostas. A não ser que sejamos capazes de fundamentar ontologicamente nossas experiências, continuaremos à mercê da dúvida sobre se o mundo que percebemos tem qualquer ligação com um mundo real — se é que há um.

O ceticismo sobre a natureza das coisas e as implicações filosóficas

O ceticismo tem sido uma das questões centrais da filosofia, especialmente quando se trata do conhecimento sobre o mundo à nossa volta. O ceticismo tradicionalmente desafiou a ideia de que podemos saber algo de maneira definitiva sobre a realidade, particularmente sobre a existência de objetos comuns, como mesas, cadeiras e até mesmo outras pessoas. De acordo com a perspectiva cética, esse tipo de conhecimento é fundamentalmente incerto. No entanto, a reflexão filosófica moderna revelou que o ceticismo não é apenas uma dúvida sobre a existência das coisas, mas também uma indagação sobre a própria natureza do que percebemos como real.

Uma formulação clássica do ceticismo, que se encontra em Descartes, é a de que, ao ser enganado por um demônio ou estar preso em um sonho, somos levados a acreditar que estamos experienciando o mundo real, quando, na verdade, nada disso existe. Em tais cenários, tudo o que pensamos saber, até mesmo a própria existência dos objetos ao nosso redor, se torna questionável. A partir dessa ideia, surge uma argumentação central do ceticismo, que coloca em dúvida a possibilidade de se conhecer algo verdadeiro sobre o mundo físico, independentemente da experiência que temos dele.

Este argumento cético pode ser expresso por uma série de hipóteses, como a de que nossa vida inteira poderia ser um sonho ou que somos apenas cérebros em uma cuba, sendo estimulados por uma máquina em um mundo vazio. Essas hipóteses, em sua essência, sugerem que tudo o que percebemos como real pode ser uma ilusão, uma manipulação ou uma construção de nossas mentes. Isso leva à conclusão de que não podemos, com certeza, saber que há mesas, pessoas ou quaisquer outros objetos tangíveis no mundo exterior.

No entanto, essa posição cética não é intransponível. A veridicalismo, uma abordagem filosófica mais recente, tenta confrontar essa dúvida, propondo que, embora o ceticismo questione a natureza das coisas, ainda podemos saber que existem objetos como mesas, mesmo sem entender completamente sua natureza última. O veridicalismo, portanto, afirma que, apesar de nossos conhecimentos serem limitados, temos uma base confiável para acreditar na existência de coisas como as mesas, pois elas são diretamente acessíveis às nossas percepções, que são mais confiáveis do que o ceticismo sugeriria.

Entretanto, a simples aceitação de que sabemos que há mesas não resolve todos os problemas levantados pelo ceticismo. Isso ocorre porque o ceticismo não se limita apenas à existência das coisas, mas também à sua verdadeira natureza. Mesmo que possamos ter certeza de que as mesas existem, ainda não sabemos o que elas são em seu nível mais profundo. O ceticismo nos força a questionar não apenas se as coisas existem, mas também o que elas realmente são e como podemos, de fato, conhecê-las. A dúvida sobre a natureza das coisas não é uma nova forma de ceticismo, mas sim uma extensão das questões filosóficas que surgiram ao longo da história.

De fato, o ceticismo histórico, que remonta a filósofos como Sexto Empírico e Hume, tratava da dúvida não apenas sobre a existência dos objetos, mas sobre o que esses objetos realmente representam e como podemos ter certeza de que nossa percepção deles corresponde à sua verdadeira natureza. Para esses filósofos, o ceticismo não era apenas uma questão de saber se as coisas existiam, mas de compreender como, ou mesmo se, poderíamos alcançar um conhecimento adequado sobre elas.

O ceticismo contemporâneo, em certo sentido, se afastou um pouco dessa tradição ao focar quase exclusivamente na existência dos objetos, como se esse fosse o único problema relevante. No entanto, como nos mostra a história da filosofia, o ceticismo sobre a natureza das coisas continua a ser uma questão pertinente e fundamental. Não basta apenas saber que as mesas existem; precisamos também compreender sua natureza, como se relacionam entre si e o que realmente significa que algo exista.

Ao abordar as estratégias anti-céticas, como o veridicalismo, vemos que estas não são uma solução definitiva para o problema filosófico. Embora o veridicalismo refute o ceticismo quanto à existência de objetos como as mesas, ele não resolve completamente a questão de saber o que essas coisas são. Em outras palavras, saber que algo existe não implica automaticamente que sabemos tudo o que precisamos saber sobre aquilo. Isso revela uma limitação fundamental na forma como abordamos a dúvida cética: a questão da existência é apenas uma parte do problema maior de compreender a realidade.

O veridicalismo, então, ao focar exclusivamente na existência de coisas, não resolve completamente o problema cético, pois não lida adequadamente com o segundo nível de dúvida, que é a natureza dessas coisas. Em outras palavras, o ceticismo contemporâneo muitas vezes ignora ou minimiza o fato de que não é suficiente simplesmente afirmar que as coisas existem; precisamos também saber o que elas são, como se relacionam umas com as outras e como podemos conhecer suas propriedades mais profundas.

Além disso, a questão não se limita a um debate sobre a percepção sensorial e sua relação com o mundo real. Como Stroud sugeriu, o ceticismo também envolve a dúvida sobre a existência de outras pessoas e a natureza de nossa relação com elas. Se não podemos confiar na realidade de nossas percepções, como podemos confiar nas interações com outros seres humanos, que também são parte dessa mesma realidade ilusória ou manipulada? Este é um problema que o veridicalismo também não resolve de maneira plena.

O ceticismo, em sua forma mais radical, desafia não apenas a existência de objetos, mas também a nossa própria capacidade de conhecê-los verdadeiramente. Quando olhamos para o que realmente significa saber que há uma mesa ou que há outras pessoas no mundo, nos deparamos com a complexidade e a profundidade do problema. O simples fato de que acreditamos na existência dessas coisas não nos dá uma compreensão total de sua verdadeira natureza. O ceticismo, portanto, continua a ser um desafio para a filosofia, não apenas em termos de como conhecemos as coisas, mas também em relação àquilo que realmente significa "conhecer" algo de maneira completa e profunda.

É possível saber o que as coisas realmente são?

O veridicalismo propõe uma reconfiguração radical da dúvida cética clássica. Ao invés de questionar se existe ou não uma mesa — como faria o ceticismo tradicional —, o veridicalismo reconhece a existência da mesa, mas questiona algo mais profundo: o que essa mesa realmente é. Não se trata, portanto, de negar o mundo perceptível, mas de reconhecer uma ignorância essencial sobre a natureza última das coisas que percebemos.

Segundo essa perspectiva, mesmo que se aceite que há, de fato, uma mesa diante de nós, não se pode afirmar com certeza se essa mesa é uma estrutura física independente, uma simulação computacional ou uma ideia sustentada na mente de um ser superior. Essa ignorância decorre da aceitação do pressuposto (1), que nega nosso acesso epistêmico ao cenário metafísico no qual nos encontramos. O veridicalismo assume que não sabemos em que tipo de realidade estamos inseridos, e portanto, não sabemos a que categoria ontológica pertencem os objetos que experimentamos.

Essa posição se diferencia tanto do ceticismo radical quanto do idealismo berkeleyano. Berkeley, por exemplo, afirma que as coisas são ideias na mente dos percebedores — ou, em última instância, na mente de Deus — e, portanto, podemos conhecer sua verdadeira natureza. Já o veridicalismo, embora aceite a existência dos objetos, sustenta que sua natureza essencial permanece desconhecida, pois não sabemos se vivemos em um mundo físico, ideal, simulado ou demoníaco. É justamente isso que se chama de ignorância sobre o whatsk das coisas — um termo que sintetiza a ideia de não sabermos “o que” algo é em seu nível fundamental.

Essa ignorância pode parecer mais extrema do que outras formas mais comuns de não saber o que algo é. Por exemplo, se não se sabe se o móvel herdado é uma cadeira ou uma mesa, essa é uma ignorância superficial. Se se sabe que é uma mesa, mas não se sabe se é de madeira ou plástico, essa é uma ignorância intermediária. Mas se se sabe que é uma mesa, mas não se sabe se ela é uma ideia, uma simulação ou um objeto físico, essa é uma forma radicalmente diferente de ignorância — a ignorância whatsk — que apenas o veridicalismo traz à tona.

Essa posição, no entanto, não implica um ceticismo total. Podemos ainda saber que a mesa não é um sofá, que ela tem massa, que é feita de madeira e que suporta objetos como copos. Esses aspectos são mantidos dentro do veridicalismo porque podem ser definidos em termos de seus papéis causais, e tais papéis se conservam mesmo em diferentes cenários metafísicos — sejam eles físicos, oníricos, simulados ou demoníacos. Ainda assim, esse conhecimento é limitado. Não sabemos, por exemplo, se o que chamamos de “madeira” ou “massa” são, em sua natureza última, entidades demoníacas, computacionais ou mentais. Continuamos ignorantes quanto ao whatsk da madeira, da massa, e de tudo o mais.

Essa ignorância se estende ao comportamento potencial dos objetos: não sabemos se a mesa desapareceria caso um demônio cartesiano assim desejasse. Isso reforça a ideia de que, embora possamos conhecer certos aspectos funcionais ou estruturais de um objeto, continuamos radicalmente ignorantes sobre sua essência — se é que a noção de essência se aplica no modelo estruturalista do veridicalismo, em que ser uma “mesa” é ocupar um determinado papel causal, independentemente da substância subjacente.

A substituição do ceticismo tradicional — que duvida da existência das coisas — por um ceticismo sobre o whatsk das coisas é mais do que uma nuance técnica: é uma reformulação profunda da dúvida filosófica. A preocupação desloca-se de “há mesas?” para “que tipo de mesa é esta?”. E esse deslocamento tem consequências. Se alguém considera problemático duvidar da existência da mesa, deveria considerar igualmente inquietante não saber se essa mesa é real ou simulação, material ou mental, produto de leis físicas ou vontade demoníaca.

O veridicalismo, portanto, não elimina o problema cético, mas o reorienta. Ele afirma que, mesmo que saibamos que há algo como uma mesa, permanecemos ignorantes sobre sua verdadeira natureza. E essa ignorância, embora compatível com certos tipos de conhecimento, revela uma limitação inescapável no nosso acesso epistêmico ao