Roberto Farinacci emergiu da pobreza na região de Molise para se tornar uma das figuras mais radicais do fascismo italiano. Imigrando para Cremona, no norte da Itália, tornou-se um fervoroso apoiador de Mussolini e organizador das squads de ação, grupos conhecidos pela brutalidade extrema que exercia para subjugar a população local. Representante da ala sindicalista radical, Farinacci via Mussolini como um líder moderado e cauteloso demais, sendo por sua vez visto pelo próprio Duce como violento e irresponsável. Em 1925, nomeado secretário do Partido Fascista, foi um instrumento na centralização do poder e na purga dos membros mais extremistas, mas em 1926 foi afastado desse cargo. Durante o período em que desapareceu da cena pública, atuou como advogado, retornando à política em 1935. Com o início da Segunda Guerra Mundial, alinhou-se firmemente à Alemanha nazista, influenciando Mussolini a entrar no conflito ao lado do Eixo. Protegido pelos alemães após a queda de Mussolini, tentou fugir com o avanço dos Aliados, mas foi capturado e executado pelos partisans italianos.

Dino Grandi, conde de Mordano, teve uma trajetória mais diplomática e política dentro do fascismo. Nascido em Bolonha, entrou para o movimento fascista aos 25 anos e ocupou cargos como ministro da Justiça, das Relações Exteriores e presidente do Parlamento. Sua atuação como embaixador no Reino Unido lhe conferiu uma rede de contatos extensa, rivalizando apenas com a influência do genro de Mussolini, Galeazzo Ciano. Embora aliado dos grupos mais radicais, Grandi demonstrava oposição às leis raciais italianas e à entrada do país na guerra, o que lhe custou a exclusão do gabinete em 1943. Foi uma das figuras chave na votação que levou à queda de Mussolini no Grande Conselho Fascista.

Gian Galeazzo Ciano, genro de Mussolini e ministro das Relações Exteriores entre 1936 e 1943, foi amplamente considerado o provável sucessor do Duce. A partir de sucessivas derrotas do Eixo na Segunda Guerra Mundial, passou a advogar pela saída da Itália do conflito, o que resultou em sua remoção do ministério e nomeação como embaixador no Vaticano. Em 1943, participou da reunião do Grande Conselho Fascista que depôs Mussolini. Tentando fugir para a Alemanha, foi capturado, julgado pelo regime da República Social Italiana, considerado traidor por ter votado contra Mussolini, e executado.

Ocorreu ainda a figura de Italo Balbo, o único líder fascista de destaque que se opôs à aliança de Mussolini com a Alemanha nazista. Sua morte trágica, causada por fogo amigo quando seu avião foi abatido por canhões antiaéreos italianos em Tobruk, marcou seu fim. Balbo também tem uma ligação curiosa com Chicago, tendo liderado em 1933 uma frota aérea italiana na primeira travessia aérea direta para a cidade durante a Exposição Century of Progress. Em homenagem, uma rua foi renomeada “Balbo Drive”, nome que até hoje suscita controvérsias.

O contexto fascista italiano não pode ser compreendido sem mencionar a importância dos meios de comunicação. Jornais como o Corriere della Sera, fundado em 1876 e o mais influente diário italiano sob direção de Luigi Albertini entre 1910 e 1920, e La Stampa, fundado em 1867 e um dos mais antigos do país, foram veículos centrais para disseminar as ideias fascistas e influenciar a opinião pública, contando inclusive com subsídios do governo para esse fim.

No campo cultural, figuras como Gino Bartali, ciclista campeão do Giro d’Italia e do Tour de France, e símbolos religiosos como São Januário, padroeiro de Nápoles conhecido pelo milagre anual da liquefação do seu sangue, desempenharam papéis significativos na construção da identidade e moral nacional durante esse período conturbado.

É essencial compreender que o fascismo italiano não foi um movimento monolítico, mas sim um conjunto complexo de lideranças com visões, estratégias e graus de radicalismo variados. A dinâmica interna do partido e suas relações com potências estrangeiras, especialmente a Alemanha nazista, foram determinantes para o rumo da Itália na primeira metade do século XX. Além disso, a manipulação da mídia e símbolos culturais reforçaram o controle do regime sobre a sociedade, enquanto as contradições entre os líderes culminaram em eventos que mudaram o curso da história italiana.

A compreensão desse período exige também reconhecer que a história política é indissociável do contexto social e cultural, e que as decisões tomadas por esses líderes tiveram repercussões profundas e duradouras, influenciando não apenas o destino da Itália, mas o equilíbrio global durante a Segunda Guerra Mundial. O impacto do fascismo italiano vai além da política, permeando aspectos de identidade nacional, cultura, memória coletiva e debates sobre autoritarismo e resistência.

Como Mussolini e Trump transformaram o medo em estratégia de poder?

A ascensão de Benito Mussolini ao poder, ainda que envolta na estética de um movimento revolucionário, sempre foi profundamente marcada por uma lógica empresarial, calculista, onde os ideais se moldavam à conveniência da sobrevivência política. Desde o início, o Fascismo foi menos um projeto ideológico coerente e mais uma estrutura maleável, operando como uma empresa disfarçada de partido, cujo produto principal era o próprio Mussolini. Não à toa, sua verdadeira equipe sempre foi apenas ele mesmo — uma concentração absoluta de poder e tomada de decisões isoladas que, inevitavelmente, resultaram em erros catastróficos.

Ao lado de figuras como Giovanni Marinelli, Mussolini instituiu a primeira polícia política fascista, a Ceka — nome e método tomados diretamente da repressão soviética. Esta estrutura não era apenas um instrumento de repressão, mas também uma ferramenta de gestão do medo e do controle social. A violência se tornou uma engrenagem permanente do sistema fascista, culminando no assassinato de Giacomo Matteotti, episódio emblemático da podridão moral do regime.

Apesar de cercado por figuras como Grandi, Ciano ou Balbo, estes nunca foram colaboradores reais, mas competidores. A lealdade era frágil, movida por interesse e oportunidade. Mussolini rejeitava qualquer voz dissidente, e sua intransigência intelectual o levou a decisões como a aliança com Hitler e a desastrosa entrada na Segunda Guerra Mundial — passos que selaram seu destino. O culto à personalidade eclipsou qualquer senso estratégico coletivo. Ao final, o mesmo povo que o aplaudiu em Roma o viu pendurado em Piazzale Loreto.

A falácia de Mussolini como representante da classe operária também ruiu cedo. Entre os primeiros membros dos Fasci di Combattimento havia tanto revolucionários de esquerda quanto conservadores reacionários. Mussolini oscilava entre extremos, adaptando sua retórica ao público mais lucrativo para seu jornal. A retórica revolucionária era um produto — vendido quando útil, descartado quando inviável.

Este pragmatismo cínico encontra um paralelo notável em Donald Trump. Formado ideologicamente por Roy Cohn, advogado infame do macarthismo, Trump herdou uma filosofia de combate absoluto, onde o único objetivo é vencer — sem pedir desculpas, sem explicações, sempre atacando, sempre desviando o foco. Cohn, promotor da execução dos Rosenberg, perseguidor de comunistas e homossexuais — mesmo sendo um deles — moldou em Trump um líder que compreende o medo como alicerce do poder.

Cohn ensinou que as regras servem apenas para serem contornadas após conquistar espaço dentro do sistema. Com isso, Trump desenvolveu uma retórica de dupla camada: de um lado, aproxima-se das classes populares com uma linguagem simplificada e populista; de outro, manipula medos profundos, resgatando o temor ao comunismo e transformando o adversário político em ameaça existencial — como no caso de Bernie Sanders em 2016.

Como Mussolini, Trump também opera com base na teatralidade da democracia, enquanto mina suas estruturas por dentro. Ambos compreenderam que o medo não apenas mobiliza — ele une. Uma sociedade assustada aceita soluções radicais e figuras autoritárias, desde que estas personifiquem a promessa de ordem diante do caos. O inimigo, real ou fabricado, é o cimento de regimes personalistas.

É assim que o populismo autoritário se perpetua: pela narrativa da urgência, pela simplificação do debate, pela demonização do outro e pelo uso deliberado do medo como instrumento de dominação. O que para Mussolini foi o “biennio rosso” e o fantasma do bolchevismo, para Trump foi o espectro do socialismo e da imigração descontrolada. Ambos criaram suas bases de apoio alimentando o pânico moral — uma ferramenta antiga, mas sempre eficaz.

Para entender plenamente a mecânica desses regimes, é crucial reconhecer como a linguagem da violência e o culto à personalidade são construídos. Fascismo e trumpismo não surgem do vazio; eles são cuidadosamente arquitetados para explorar fragilidades sociais, ressentimentos e crises institucionais. A narrativa é sempre moldada para legitimar o excepcionalismo do líder, sua conexão direta com o “povo verdadeiro”, em oposição a uma elite corrupta e distante.

Mais do que ideologias fechadas, são sistemas de poder baseados na manipulação emocional, onde a verdade é secundária à eficácia do discurso. A desinformação, o revisionismo histórico e a teatralização da política não são desvios, mas elementos centrais. Nesse sentido, o estudo comparado entre Mussolini e Trump revela não apenas paralelos históricos, mas também padrões recorrentes que ajudam a compreender como as democracias podem ser corroídas desde dentro, com o consentimento de grandes

Como Mussolini Construiu Sua Política Externa: Parcerias e Conflitos

No auge da Segunda Guerra Italo-Etíope, Mussolini tomou uma decisão surpreendente: chamou Umberto Puppini, presidente da Agip, e ordenou que vendesse toda a participação da empresa para os britânicos. A guerra contra a Etiópia já havia começado e, com o embargo da Liga das Nações, a Itália se encontrava em uma situação de emergência. Mas o embargo, na realidade, não afetava os materiais essenciais para a guerra, como o petróleo. A Itália, então, procurou apoio dos Estados Unidos, uma nação que não era membro da Liga e ainda se mantinha isolacionista. As empresas americanas, dispostas a aproveitar a ausência de restrições, forneceram o petróleo necessário para alimentar a máquina de guerra fascista.

O Reino Unido, por sua vez, não se opôs ao avanço italiano na Abissínia. Permitiram que os navios italianos passassem pelo Canal de Suez, controlado pelos britânicos, transportando suas tropas e suprimentos sem maiores objeções. Para Mussolini, a venda da participação da Agip à Grã-Bretanha representava uma forma de compensação, um pequeno preço a pagar em meio ao conflito que se intensificava.

Além da complexa dinâmica geopolítica, o relacionamento de Mussolini com certos setores sionistas, como o grupo revisionista liderado por Zeev Jabotinsky, também se destacava. Esse vínculo remonta a julho de 1922, quando Jabotinsky escreveu uma carta ao líder italiano. O sionista apresentou a Mussolini a vulnerabilidade da divisão dos territórios árabes do antigo Império Otomano após a Primeira Guerra Mundial e sugeriu uma parceria para facilitar o retorno dos judeus a essas regiões. Em troca, Jabotinsky propôs o uso da língua italiana entre os judeus mediterrâneos, já que ele mesmo havia estudado na Itália.

Nos anos seguintes, a relação entre Mussolini e a liderança sionista se aprofundou. Chaim Weizmann, presidente da Federação Sionista Mundial, encontrou-se com Mussolini em setembro de 1926. Durante esse encontro, Weizmann ressaltou as dificuldades que os judeus enfrentavam ao tentar emigrar para a Palestina e solicitou que os portos italianos fossem usados como ponto de passagem para os imigrantes. Mussolini concordou, mas com uma condição: as obras do porto de Haifa seriam atribuídas a empresas italianas. A flexibilidade do líder italiano em relação à imigração judaica contrastava com a postura mais rígida dos britânicos.

Em 1933, Jabotinsky teve permissão para representar a Itália no Congresso Mundial Sionista. Mussolini, ao se colocar como amigo do povo judeu, visava uma posição estratégica no cenário político europeu. Seu objetivo era se apresentar como um mediador confiável, capaz de distinguir sua política da de Adolf Hitler, que, na época, começava a implementar políticas raciais extremamente agressivas.

A relação com os sionistas permitiu a Mussolini estreitar seus laços com a comunidade judaica e também construir um apoio estratégico entre aqueles que se opunham ao domínio britânico na Palestina. No entanto, os esforços de Mussolini para persuadir os árabes a aceitarem a criação de um estado judeu na Palestina não foram bem-sucedidos, e suas tentativas de influenciar o destino da região passaram a ser vistas com ceticismo.

Uma das peculiaridades dessa fase foi a decisão do regime fascista de permitir a abertura de uma escola naval para os revisionistas sionistas em Civitavecchia, em 1934. Embora o estabelecimento tenha sido fechado em 1938, essa escola formou a base da futura marinha israelense. A colaboração com os sionistas revisionistas estava atrelada ao desejo de Mussolini de projetar a imagem de um líder internacionalmente relevante, capaz de influenciar os eventos no Oriente Médio.

Porém, a política interna de Mussolini começou a mudar. Em 1938, o regime fascista implementou as Leis Raciais, que tiraram os direitos dos cidadãos judeus italianos, discriminando-os e enviando muitos deles para campos de concentração. Essa medida não só prejudicou a Itália, mas também causou uma drástica perda de intelectuais e cientistas, como o físico Enrico Fermi, que fugiram do país.

Nos anos subsequentes, a relação entre Mussolini e os sionistas foi se deteriorando. Sua crescente paranoia sobre o internacionalismo, primeiro socialista e depois judaico, fez com que ele voltasse a adotar uma postura mais radical e intolerante. A mesma estratégia que o havia levado a interagir com grupos como os sionistas revisionistas agora dava lugar a uma política de exclusão e repressão.

Esse jogo geopolítico e as ambigüidades na política externa de Mussolini permanecem uma parte essencial da história da Itália fascista. Mussolini, ao mesmo tempo que se alinhava com alguns objetivos do movimento sionista, também contribuía para a ascensão de um regime que acabaria por se aliar aos nazistas e adotar medidas extremas contra os judeus. É essencial entender as complexidades dessas alianças e as implicações de suas escolhas políticas, que não apenas moldaram a história de sua nação, mas também influenciaram eventos cruciais no Oriente Médio e na Europa.

Como o Fascismo e as Estratégias Políticas Contemporâneas se Entrelaçam?

A análise crítica da história política revela conexões inquietantes entre o fascismo histórico e as dinâmicas políticas atuais, especialmente no contexto dos Estados Unidos e da ascensão de figuras como Donald Trump. A compreensão do fascismo, tal como exposta por autores como Norberto Bobbio, Renzo De Felice e outros especialistas, nos fornece um quadro fundamental para decodificar fenômenos políticos modernos que ecoam os traços do autoritarismo do século XX.

Mussolini, ao deslocar-se da neutralidade absoluta para uma neutralidade ativa, já sinalizava a mobilização política e ideológica que se aprofundaria no fascismo italiano, marcando um estilo de liderança personalista, autoritário e propagandista. Esse modelo de liderança enfatizava a centralização do poder, o controle dos meios de comunicação e o apelo a sentimentos nacionalistas e populistas, ingredientes que podem ser observados em algumas estratégias políticas contemporâneas.

A figura de Donald Trump, frequentemente comparada a Mussolini em diversas análises jornalísticas e acadêmicas, incorpora muitos desses elementos: o uso intensivo da mídia para manipular narrativas, a incitação à violência e polarização social, a construção de um discurso que mobiliza medos e ressentimentos para consolidar apoio político. Textos jornalísticos e documentários, como “The Loudest Voice”, ressaltam como o populismo contemporâneo recicla práticas fascistas adaptadas à realidade da comunicação digital e das redes sociais.

Porém, a análise não pode se restringir a simples analogias históricas. É preciso entender o contexto sociopolítico específico, marcado pela crise das instituições democráticas, o enfraquecimento da imprensa tradicional e a ampliação das desigualdades econômicas. O fascismo, em seu momento histórico, emergiu como resposta autoritária a crises profundas e medos sociais, e o que se vê hoje é uma reprodução desses mesmos gatilhos em uma nova conjuntura, com mudanças estruturais que incluem a globalização, a fragmentação cultural e a revolução digital.

Além disso, a compreensão das dinâmicas entre economia e política — como mostrado nos estudos das relações secretas entre regimes fascistas e potências estrangeiras — ajuda a desvendar a complexidade das alianças contemporâneas, onde interesses econômicos muitas vezes se entrelaçam com estratégias ideológicas para fortalecer regimes autoritários ou populistas. As tensões globais, como as envolvendo Estados Unidos, Rússia e China, também influenciam esses processos, oferecendo terreno fértil para o avanço de narrativas autoritárias em escala mundial.

Outro aspecto crucial é o papel das instituições democráticas e do jornalismo na resistência a essas tendências. A fragilidade de instituições políticas e o comprometimento ou a captura midiática por forças políticas antidemocráticas minam a possibilidade de um debate público saudável e informado. As análises sobre a influência de figuras como Roger Ailes na manipulação da opinião pública nos Estados Unidos ilustram como a mídia pode ser instrumentalizada para consolidar o poder de líderes populistas e autoritários.

A literatura contemporânea sobre fascismo e política moderna também enfatiza a importância do entendimento psicológico das lideranças e de seus seguidores, abordando questões como narcisismo, ressentimento social e o desejo de reafirmação identitária. Esses fatores ajudam a explicar o apelo de figuras que adotam retóricas extremas e que se apresentam como “salvadores” diante de um sistema percebido como falho ou corrupto.

É fundamental reconhecer que o retorno ou a renovação de discursos fascistas não ocorre em um vácuo. Eles são alimentados por crises reais, inseguranças e uma sensação coletiva de perda, que podem ser exploradas por discursos populistas para legitimar a concentração de poder e o desrespeito às normas democráticas. Portanto, a vigilância crítica sobre esses fenômenos deve ser acompanhada por esforços educativos, fortalecimento das instituições e promoção de uma cultura política baseada no diálogo, na pluralidade e no respeito às diferenças.

No contexto atual, a compreensão profunda dessas interações entre passado e presente é essencial para que o leitor possa distinguir entre meras comparações superficiais e análises robustas que consideram as nuances históricas, sociológicas e políticas. O conhecimento dessas dinâmicas contribui para a formação de uma consciência crítica, capaz de identificar e resistir às estratégias que ameaçam a democracia e os direitos humanos.

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