A experiência da dor em crianças internadas na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) é uma das que mais se destaca meses após a alta hospitalar. O manejo eficaz da dor é fundamental para minimizar o sofrimento e garantir uma recuperação adequada. Porém, em muitas situações, crianças muito pequenas ou aquelas que ainda não atingiram o desenvolvimento necessário para expressar a intensidade da dor tornam-se um desafio para os profissionais de saúde. Diversos sistemas de avaliação da dor foram desenvolvidos, entre eles, dois amplamente validados: a Escala de Dor do Hospital Infantil de Ottawa (CHEOPS) e a Escala Oucher.
A CHEOPS é uma escala comportamental, projetada para medir a dor aguda em crianças de 0 a 5 anos. Já a Escala Oucher é uma autoavaliação da dor em crianças, composta por uma série de seis imagens de um rosto infantil, mostrando níveis progressivos de dor, desde "nenhuma dor" até a "dor mais intensa". Para crianças mais velhas, a Escala Analógica Oucher é recomendada. O FLACC (Face, Legs, Activity, Cry, Consolability) é uma ferramenta destinada à avaliação da dor em crianças incapazes de verbalizar ou com déficits cognitivos.
Os opioides representam a base para o manejo da dor na UTI, devido à sua potente ação analgésica. Os receptores opioides, estruturas acopladas a proteínas G inibidoras, estão amplamente distribuídos pelo cérebro, medula espinhal, nervos periféricos, trato gastrointestinal e outros órgãos. Os principais subtipos são os receptores mu, kappa, delta e nociceptina. Os efeitos adversos mais comuns dos analgésicos opioides incluem náuseas, vômitos, sedação, prurido e constipação. Efeitos adversos mais graves incluem depressão respiratória, retenção urinária, hipotensão, delirium e rigidez do tórax. O uso prolongado de opioides pode levar à taquifilaxia e à dependência física, com a síndrome de abstinência ocorrendo caso a medicação seja interrompida abruptamente.
A morfina, um opiáceo de ocorrência natural, é considerada o padrão de comparação para outros opioides no que diz respeito à potência analgésica. Está disponível nas formas intravenosa, intramuscular, intratecal, epidural e enteral. Nas UTIs, as vias intravenosa e enteral são as mais comuns. A dose intravenosa recomendada é de 0,1 mg por kg em bolus, com uma taxa de infusão de 0,01 a 0,02 mg por kg por hora, ajustando conforme a resposta do paciente. O prurido devido à liberação de histamina e a hipotensão são efeitos colaterais comuns da morfina.
O fentanil, um opioide sintético, tem uma meia-vida relativamente curta e é frequentemente utilizado para sedação contínua e analgesia na UTI. A taxa de infusão recomendada é de 0,5 a 2 mcg por kg por hora. Uma complicação rara, mas grave, do fentanil é o fenômeno da rigidez torácica, que ocorre principalmente quando a dose intravenosa é administrada rapidamente. Para reverter essa rigidez, é necessário administrar um bloqueador neuromuscular. Em alguns casos, o antidoto naloxona pode ser necessário.
A hidromorfona, um opioide semissintético, é de seis a dez vezes mais potente que a morfina. É mais eficaz em pacientes pós-operatórios, sendo utilizada em bolus intermitentes ou em analgesia controlada pelo paciente (PCA). A dose recomendada para bolus é de 0,05 mg por kg, ou uma taxa de infusão de 2 a 5 mcg por kg por hora. Opioides mais fracos ou combinações de opioides mais fracos com paracetamol têm sido cada vez mais utilizados no manejo da dor moderada a moderadamente grave, principalmente via oral.
Os medicamentos anti-inflamatórios não esteroides (AINEs) têm um papel importante na modulação da dor. Os AINEs inibem a enzima ciclooxigenase, reduzindo a produção de prostaglandinas, compostos que possuem propriedades analgésicas e hormônio-similares. No entanto, os AINEs podem causar efeitos adversos, como sangramentos, devido à inibição da agregação plaquetária e do tromboxano A, além de aumentarem o risco de falência renal, especialmente em pacientes desidratados ou com débito cardíaco reduzido. O uso de AINEs de maior potência, como o cetorolaco, é comum para analgesia em crianças após procedimentos cirúrgicos, como fusão espinhal e cirurgia cardíaca. A dose intravenosa recomendada de cetorolaco é de 0,25 a 0,5 mg por kg a cada 6 a 8 horas.
O paracetamol, um medicamento não AINE, possui propriedades analgésicas e antipiréticas, sendo indicado no manejo da dor leve a moderada e como adjunto aos opioides no manejo da dor mais intensa. Está disponível nas formas oral, retal e intravenosa, com a dose intravenosa recomendada sendo de 12,5 mg por kg a cada 4 horas ou 15 mg por kg a cada 6 horas, sem exceder 75 mg por kg por dia. Apesar de ser bem tolerado, o paracetamol pode causar hipotensão em pacientes criticamente enfermos quando administrado por via intravenosa.
Doenças respiratórias em crianças também exigem atenção especial na UTI. A laringotraqueobronquite viral, comum em crianças e frequentemente causada pelo vírus parainfluenza, pode necessitar de internação na UTI em casos mais graves. O tratamento é primariamente sintomático, e o uso de dexametasona como terapia de primeira linha tem se mostrado eficaz para reduzir o edema e a inflamação das vias respiratórias. A budesonida, um corticosteroide inalatório, pode ser utilizada como segunda linha de tratamento. Em casos de sintomas moderados a graves, a epinefrina nebulizada pode ser útil para reduzir a obstrução das vias aéreas.
Outro problema respiratório comum em crianças intubadas por períodos prolongados é o estridor pós-extubação, especialmente em lactentes e crianças pequenas. O uso de dexametasona intravenosa antes da extubação tem mostrado reduzir significativamente a incidência de estridor. Além disso, a terapia com HeliOx, uma mistura de hélio e oxigênio, pode ser eficaz na redução do trabalho respiratório em pacientes com obstrução das vias aéreas, como na croup severa, ajudando a evitar a necessidade de intubação. No entanto, seu uso é limitado em pacientes que necessitam de mais de 40% de oxigênio para tratar a hipóxia.
Compreender a natureza e os desafios do manejo da dor em crianças na UTI exige uma abordagem multifacetada, considerando tanto os aspectos farmacológicos quanto os comportamentais. Além disso, o manejo adequado da dor deve ser complementado por intervenções para minimizar os efeitos colaterais dos tratamentos, como a depressão respiratória e a retenção urinária associadas ao uso de opioides. A implementação de estratégias de analgesia eficazes, juntamente com a monitorização contínua do estado clínico do paciente, é essencial para otimizar os resultados no cuidado intensivo pediátrico.
Como Diagnosticar e Tratar Distúrbios Metabólicos e Condições Clínicas Específicas
A acidosis láctica é um distúrbio metabólico complexo que pode se manifestar devido a uma variedade de causas subjacentes, como defeitos no metabolismo celular ou distúrbios mitocondriais. Os pacientes com esse distúrbio frequentemente apresentam sintomas como vômitos, letargia e alterações no estado mental. O diagnóstico precoce é fundamental para o manejo eficaz, uma vez que a desidratação é uma característica comum desses pacientes, que frequentemente necessitam de hidratação intensiva. O tratamento específico depende do diagnóstico preciso, sendo essencial a identificação de distúrbios orgânicos e mitocondriais que possam estar por trás da elevação do ácido láctico.
Os distúrbios mitocondriais, que resultam em falhas na fosforilação oxidativa, representam uma das causas mais complicadas de acidoses lácticas. Para o diagnóstico, uma biópsia muscular, com análise das fibras vermelhas irregulares (ragged red fibers), é de grande ajuda. Exames genéticos, incluindo sequenciamento mitocondrial, podem ser úteis na identificação de síndromes específicas, como a encefalomiopatia mitocondrial, acidose láctica e episódios tipo AVC (MELAS), e epilepsia mioclônica com fibras vermelhas irregulares (MERRF). O tratamento se concentra em melhorar a nutrição do paciente e reduzir a acidosis por meio do uso de bicarbonato de sódio, além de outras terapias específicas.
Outro distúrbio relacionado a condições metabólicas é a hipoglicemia, que pode ser causada por distúrbios na gliconeogênese, no metabolismo de ácidos graxos, doenças de depósito de glicogênio ou até endocrinopatias como a deficiência de cortisol ou hiperinsulinismo. Pacientes hipoglicêmicos tipicamente apresentam sintomas como suores excessivos, irritabilidade, letargia, convulsões e alterações no estado mental. O tratamento inicial deve focar na correção da hipoglicemia com administração intravenosa de dextrose, normalmente na forma de solução D25%, com doses ajustadas conforme o peso corporal do paciente. Em casos graves, a infusão contínua de dextrose é necessária para manter os níveis glicêmicos adequados.
Além dos distúrbios metabólicos clássicos, existem condições clínicas especiais que exigem um manejo diferenciado. A hipertermia maligna (MH) é um distúrbio farmacogenético autossômico dominante que pode ser desencadeado pela exposição a gases anestésicos voláteis ou succinilcolina. Pacientes com doenças musculares hereditárias, como a doença do núcleo central (CCD), estão particularmente vulneráveis a essa condição. A MH é caracterizada por uma resposta metabólica exacerbada, resultando em acidose metabólica e respiratória, rigidez muscular, rabdomiólise, arritmias cardíacas e hipertermia. O único antídoto conhecido para a MH é o dantroleno, que deve ser administrado de forma urgente para reverter os sinais da condição. Doses iniciais de 2,5 mg por kg intravenoso seguidas de doses de manutenção podem ser necessárias até a estabilização do paciente.
A síndrome neuroléptica maligna (NMS) é outra emergência clínica potencialmente fatal, geralmente associada ao uso de agentes neurolépticos ou antieméticos. Caracteriza-se por alterações no estado mental, rigidez muscular, febre e disautonomia. O manejo da NMS envolve a interrupção imediata do medicamento responsável e o tratamento agressivo conforme os sintomas apresentados. Medicamentos como benzodiazepínicos, dantroleno, bromocriptina e amantadina são utilizados no controle da condição, embora a eficácia desses tratamentos seja baseada principalmente em relatos de caso e experiência clínica, já que faltam dados provenientes de ensaios clínicos controlados.
É fundamental compreender que distúrbios metabólicos, como a acidoses lácticas ou hipoglicemia, frequentemente apresentam sintomas que se sobrepõem a condições mais comuns, como infecções ou intoxicações. Portanto, um diagnóstico diferencial cuidadoso é essencial para evitar erros terapêuticos. Além disso, o reconhecimento de condições clínicas raras, como a MH e a NMS, pode exigir uma abordagem imediata e especializada, uma vez que o tratamento inadequado pode levar rapidamente à deterioração clínica do paciente. Portanto, os profissionais de saúde devem estar bem informados sobre essas condições e suas manifestações para garantir a intervenção precoce e eficaz.
Desenvolvimento Renal e Excreção: Impactos e Implicações para a Farmacocinética Pediátrica
A excreção de xenobióticos é um processo crucial no organismo humano e, embora possa ocorrer por diversos sistemas orgânicos, os rins desempenham o papel principal na eliminação de substâncias estranhas ao corpo. O processo de filtração passiva ocorre no glomérulo, enquanto a secreção e a reabsorção – tanto passiva quanto ativa – acontecem nos túbulos proximal e distal, respectivamente. O desenvolvimento renal segue uma trajetória complexa, com uma maturação contínua que se estende bem além do nascimento.
A nefrogênese, processo pelo qual os néfrons se formam nos rins, é completada por volta da 36ª semana de gestação. No entanto, os rins continuam a se amadurecer durante a infância. Ao nascer, os rins do recém-nascido contêm o mesmo número de néfrons que um adulto (aproximadamente 1.000.000 por rim), mas ainda apresentam diferenças anatômicas, morfológicas e funcionais evidentes. Durante os primeiros 12 anos de vida, os rins aumentam consideravelmente em comprimento e peso, o que também é refletido nas microestruturas, com mudanças notáveis no diâmetro do glomérulo e na estrutura dos túbulos proximais.
No primeiro mês de vida, a capacidade do rim para concentrar a urina é limitada, alcançando uma osmolaridade de apenas 600 mOsm/kg de água. Essa capacidade aumenta lentamente, atingindo 1.200 mOsm/kg de água na adolescência. O aumento da resistência vascular e a redução do fluxo sanguíneo renal nos recém-nascidos também são fatores que contribuem para essa imaturidade funcional. Esse processo é seguido por um aumento significativo na taxa de filtração glomerular (TFG) após o nascimento, que continua até a conclusão do crescimento renal. No entanto, mesmo após a normalização da TFG por área de superfície corporal (BSA), a taxa de filtração do recém-nascido ainda permanece inferior à do adulto durante os primeiros 1 a 2 anos de vida.
Essas diferenças funcionais têm implicações diretas na farmacocinética pediátrica, especialmente no que diz respeito à eliminação de medicamentos excretados pelos rins. A imaturidade renal dos neonatos e lactentes, por exemplo, resulta em meia-vida de eliminação prolongada de medicamentos, como fluconazol e vancomicina. Nos recém-nascidos prematuros, a meia-vida do fluconazol pode ser de até 88 horas, enquanto nos recém-nascidos a termo varia entre 19,5 e 25 horas. Isso ocorre porque a taxa de depuração renal desses fármacos é reduzida, o que requer ajustes nas doses administradas.
Outro aspecto importante da maturação renal envolve a modulação dos transportadores renais, que desempenham um papel fundamental na reabsorção tubular de substâncias. Estudos têm mostrado que, nos recém-nascidos, há uma expressão significativamente menor de transportadores de membranas basolaterais, como OAT1 e OAT3, em comparação com crianças mais velhas ou adultos. Essa redução na expressão de transportadores pode afetar a eficiência da eliminação de substâncias e a absorção de medicamentos, com implicações para a farmacocinética pediátrica.
Além disso, a função hepática também contribui para a eliminação de substâncias, com os transportadores hepáticos responsáveis pela excreção biliar apresentando um perfil ontogênico bem definido. Os transportadores localizados na membrana canalicular dos hepatócitos, como P-gp e MRP2, são imaturos nas primeiras semanas de vida, o que influencia a eliminação de medicamentos metabolizados no fígado. A expressão desses transportadores aumenta rapidamente nos primeiros meses de vida, atingindo níveis mais próximos aos encontrados em adultos por volta do primeiro ano de vida.
A compreensão dessas mudanças no desenvolvimento renal e hepático é essencial para a aplicação prática na dosagem de medicamentos pediátricos. O ajuste de doses, com base na função renal e hepática, é fundamental para evitar toxicidade ou ineficácia terapêutica. Além disso, é importante que os clínicos estejam cientes das diferenças de expressão e função dos transportadores renais e hepáticos, pois isso pode afetar a absorção, distribuição, metabolismo e excreção de fármacos.
Com o aumento das pesquisas sobre a farmacocinética pediátrica, novas informações sobre o desenvolvimento dos transportadores renais e hepáticos podem ajudar a otimizar os tratamentos, garantindo uma abordagem mais segura e eficaz para as crianças, especialmente os recém-nascidos e prematuros. Estudos clínicos prospectivos são fundamentais para entender melhor essas alterações ao longo do desenvolvimento e para refinar as diretrizes de dosagem com base na maturação fisiológica dos sistemas de excreção.
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