O uso de dispositivos de assistência ventricular esquerda (LVAD) tem se tornado uma solução cada vez mais importante no tratamento de pacientes com insuficiência cardíaca avançada. Estes dispositivos não apenas prolongam a vida dos pacientes, mas também introduzem um novo conjunto de responsabilidades para os cuidadores. A trajetória do cuidador, desde a avaliação pré-implante até o cuidado no fim da vida do paciente, é um aspecto crítico do manejo do LVAD, frequentemente negligenciado na literatura médica. Esta seção explora os desafios enfrentados pelos cuidadores, suas responsabilidades e o impacto emocional e físico que isso causa, destacando a importância da educação e do suporte contínuo.

A jornada do cuidador começa bem antes da implantação do dispositivo. Segundo as diretrizes da Sociedade Internacional para Transplantes de Coração e Pulmão (ISHLT) de 2023, a carga do cuidador deve ser avaliada antes da implementação de qualquer dispositivo de suporte circulatório durável, como o LVAD. O papel do cuidador é visto não apenas como uma responsabilidade prática, mas também como um fator determinante para o sucesso do tratamento. Nos casos em que a carga do cuidador é considerada significativa ou inexistente, o implante do LVAD pode ser contraindicado, visto que a presença de um cuidador capacitado e disposto é essencial para garantir a continuidade do tratamento. Durante este período pré-implantação, muitos centros médicos utilizam equipes multidisciplinares que incluem médicos, cirurgiões, terapeutas ocupacionais, psicólogos e assistentes sociais para avaliar tanto a viabilidade do paciente quanto a capacidade do cuidador para assumir este papel desafiador.

Após o implante do LVAD, o cuidador assume responsabilidades ainda mais intensas. O paciente passa a depender de cuidados contínuos, incluindo monitoramento do dispositivo, administração de medicamentos, e manejo de possíveis complicações como infecções, trombose do dispositivo e hemorragias. A assistência de enfermagem e o acompanhamento regular são fundamentais para garantir a estabilidade do paciente. Além disso, os cuidadores precisam estar preparados para lidar com as crises e emergências médicas, o que muitas vezes exige conhecimentos técnicos sobre o funcionamento do LVAD e a interpretação dos sinais de alarme do dispositivo.

Outro aspecto importante que deve ser considerado após o implante é a adaptação emocional do cuidador. O estresse psicossocial experimentado pelos cuidadores de pacientes com LVAD é significativo. Muitos enfrentam desafios no gerenciamento do cansaço físico e emocional, além da sobrecarga de responsabilidades. O isolamento social é uma realidade para muitos cuidadores, que, muitas vezes, abdicam de suas atividades sociais e profissionais para se dedicarem integralmente ao cuidado do paciente. Isso pode levar a um desgaste emocional, ansiedade e depressão, que, por sua vez, afetam a qualidade do cuidado prestado.

A interação constante com os profissionais de saúde é fundamental nesse processo, tanto para os cuidadores quanto para os pacientes. A educação contínua sobre o manejo do LVAD, bem como sobre como lidar com os possíveis efeitos colaterais e complicações, é uma ferramenta indispensável. Sem essa educação, os cuidadores podem se sentir despreparados e ansiosos, o que comprometeria a eficácia do tratamento. É importante também que o cuidador receba apoio psicológico e social para lidar com a pressão emocional decorrente de sua função.

Quando se observa o processo de transição após a alta hospitalar, torna-se evidente que o gerenciamento do cuidado não termina no momento do implante. Os cuidadores continuam sendo a linha de frente para a monitoração diária do dispositivo, acompanhamento das condições de saúde do paciente e a prevenção de complicações. As orientações para o cuidado em casa incluem a manutenção do LVAD, a gestão dos níveis de anticoagulação, e a monitorização da pressão arterial e dos sinais vitais do paciente.

A gestão do cuidado pode ser particularmente difícil em situações de fim de vida. Quando o paciente se aproxima de uma fase terminal, os cuidadores enfrentam o desafio de conciliar o manejo do dispositivo com o conforto do paciente, muitas vezes optando por cuidados paliativos. A abordagem no fim da vida envolve decisões difíceis, como o desligamento do LVAD em determinados casos, para permitir uma morte mais natural e menos dolorosa.

Além de todas as responsabilidades diretas, os cuidadores de pacientes com LVAD frequentemente se encontram sobrecarregados pela falta de apoio e compreensão por parte da sociedade em geral. O estigma associado a doenças cardíacas graves e a invisibilidade das dificuldades diárias de um cuidador tornam mais difícil a adaptação a essa nova realidade. Portanto, a criação de grupos de apoio para cuidadores de pacientes com LVAD se mostra essencial. Esses grupos podem fornecer um espaço seguro para o compartilhamento de experiências, a troca de informações práticas e o suporte emocional entre aqueles que vivenciam desafios semelhantes.

O cuidador de um paciente com LVAD desempenha um papel essencial na manutenção da saúde do paciente e na qualidade de vida. Esse papel, no entanto, não é fácil e exige preparação, apoio contínuo e uma rede de suporte sólida. A educação sobre o funcionamento do dispositivo, a gestão de complicações e o apoio psicológico são fundamentais para garantir que o cuidador possa desempenhar suas funções de forma eficaz e saudável.

Complicações e Gestão do Suporte Circulatório Mecânico Crônico com LVAD

O uso de dispositivos de assistência ventricular esquerda (LVAD) contínua tem sido uma intervenção essencial para pacientes com insuficiência cardíaca grave, especialmente aqueles com fração de ejeção reduzida. No entanto, apesar dos avanços, as complicações associadas aos dispositivos de fluxo axial e superfície aumentam as taxas de morbidade e mortalidade. A implementação rigorosa de protocolos médicos para recuperação miocárdica tem mostrado aumentar as chances de recuperação parcial ou completa, especialmente quando as condições subjacentes como miocardite, cardiomiopatia periparto e cardiomiopatia induzida por adriamicina são tratadas adequadamente.

A recuperação miocárdica é mais frequentemente observada em pacientes que iniciam o tratamento com uma combinação específica de medicamentos. O protocolo de Harefield, por exemplo, é um modelo terapêutico de dois estágios que envolve o uso de carvedilol, lisinopril ou losartana, espironolactona e, posteriormente, o uso de clenbuterol. Esses medicamentos têm como objetivo otimizar a função cardíaca e reduzir os riscos de hipertensão pulmonar e regurgitação mitral grave. No entanto, ainda faltam estudos prospectivos multicêntricos que confirmem a eficácia desse protocolo, especialmente com o dispositivo HeartMate3™.

Os estudos de recuperação miocárdica antes da introdução de inibidores da neprilisina e cotransportadores de sódio-glicose (SGLT2-I) indicaram uma taxa mais baixa de trombose da bomba, mas os benefícios em termos de mortalidade para pacientes com insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida (HFrEF) só foram evidenciados após a implementação de terapias mais recentes. Além disso, a introdução de protocolos como o RESTAGE-HF e a alteração no sistema de alocação de corações da UNOS podem ter impacto direto nas taxas de recuperação miocárdica.

Em relação ao uso de anticoagulantes e antiplaquetários, todos os pacientes com LVAD devem ser monitorados cuidadosamente quanto a riscos de trombose e complicações tromboembólicas. Embora as diretrizes geralmente indiquem o uso de aspirina em doses baixas para dispositivos como o HeartMate3™ e o HeartMate II™, a escolha de terapia anticoagulante deve ser individualizada, dependendo do risco de sangramentos e das características do paciente. Para muitos dispositivos, o uso de warfarina é recomendado com um INR alvo entre 2.0 e 3.0.

A infecção no ponto de saída do driveline é uma complicação comum, responsável por cerca de 40% das reinternações em um ano. Fatores como obesidade, diabetes mellitus, insuficiência renal crônica, e trauma no driveline são conhecidos por aumentar o risco de infecção. Protocolos padronizados, como o descrito por pesquisadores alemães e austríacos, têm se mostrado eficazes na prevenção dessas infecções, e o uso de suturas para imobilizar o driveline nas primeiras semanas pode diminuir a incidência de complicações. Além disso, o suporte nutricional adequado e o controle da diabetes mellitus são fundamentais para a cicatrização adequada e prevenção de infecções.

A falência do ventrículo direito (RHF) é uma complicação frequente em pacientes com LVAD crônicos, resultando em aumento da morbidade e mortalidade. A prevalência de RHF moderada aos seis meses após o implante é de cerca de 3%, mas a gravidade da condição pode aumentar a taxa de hospitalizações e complicações como AVC e sangramentos gastrointestinais. A gestão do RHF envolve o uso de diuréticos para reduzir a congestão venosa sistêmica, a otimização da velocidade da bomba para melhorar a função do ventrículo direito, e o uso de vasodilatadores pulmonares em pacientes com hipertensão pulmonar precapilar predominante. Além disso, a monitorização rigorosa de arritmias atriais e ventriculares é essencial para a abordagem eficaz do RHF.

A regurgitação aórtica (AR) em pacientes com LVAD também exige vigilância constante. Estima-se que entre 40% e 60% dos pacientes em suporte de LVAD desenvolvam AR moderada no primeiro ano após o implante. A regurgitação aórtica pode resultar em complicações graves, como RHF tardio e disfunção multiorgânica. A detecção precoce e o manejo agressivo da AR, incluindo a consideração de ajustes na terapia de suporte ventricular, são cruciais para evitar a progressão dessa condição.

No manejo desses pacientes, a individualização do tratamento é a chave para otimizar os resultados. Cada paciente apresenta características únicas que exigem estratégias personalizadas para a prevenção e tratamento de complicações. Isso inclui uma abordagem cuidadosa quanto à terapia farmacológica, monitoramento constante das funções cardíacas e pulmonar, e o acompanhamento rigoroso da evolução clínica para ajustar as intervenções de maneira tempestiva.