A gestão anestésica em procedimentos de fechamento esternal tardio, especialmente após cirurgias cardíacas complexas como a Operação de Troca Arterial (ASO) para a transposição das grandes artérias, exige um entendimento preciso da fisiopatologia envolvida e da dinâmica cardiovascular do paciente. A cirurgia de ASO é uma intervenção crítica para a correção de defeitos congênitos complexos e, frequentemente, é acompanhada de complicações associadas à instabilidade hemodinâmica pós-operatória. A utilização de um fechamento esternal tardio (DSC, do inglês Delayed Sternal Closure) é uma prática adotada quando o quadro clínico do paciente não permite a compressão imediata do esterno, em função do edema miocárdico e da instabilidade hemodinâmica. A abordagem anestésica, portanto, deve ser minuciosa e voltada para garantir não apenas a estabilidade cardiovascular, mas também o controle de possíveis complicações respiratórias e infecciosas.

Em um caso específico, um recém-nascido de 3 dias foi submetido a uma cirurgia de ASO emergencial após o diagnóstico de transposição das grandes artérias. A cirurgia de 3 horas resultou em uma significativa instabilidade hemodinâmica, com uma redução do débito cardíaco devido ao edema miocárdico, o que tornou o fechamento esternal convencional impossível. O DSC foi então realizado após avaliação cuidadosa do quadro clínico e das condições do paciente. A anestesia foi conduzida com a utilização de etomidato, sufentanil e rocurônio para indução, com manutenção através de infusão intravenosa de propofol e sufentanil, além de ventilação controlada por pressão.

Durante a fase intraoperatória, os parâmetros ventilatórios foram ajustados para garantir uma oxigenação adequada com uma FiO2 de 50%, um volume corrente de 30 mL e uma pressão expiratória final positiva (PEEP) de 6 cm H2O. O uso contínuo de drogas vasoativas, como a epinefrina e a norepinefrina, foi necessário para manter a pressão arterial média dentro dos limites desejados, enquanto o monitoramento hemodinâmico foi intensivo, com atenção constante aos sinais vitais do paciente, como pressão arterial invasiva e saturação de oxigênio.

Os riscos associados ao DSC incluem infecção do mediastino, pericárdio e esterno, além de sangramentos ativos que devem ser controlados antes de se proceder ao fechamento. A remoção cuidadosa de dispositivos hemostáticos e a dissecação das aderências ao redor do coração foram fundamentais para permitir o fechamento seguro do esterno. O pós-operatório envolveu cuidados intensivos na UTI cardíaca, com suporte mecânico e contínuo monitoramento do equilíbrio hídrico e eletrolítico.

O sucesso do DSC depende da colaboração de múltiplas especialidades, incluindo cirurgia cardíaca, anestesia, cuidados críticos e radiologia, que juntas garantem a estabilidade do paciente durante um período tão crítico. A análise dos gases sanguíneos durante o procedimento é essencial para ajustar os parâmetros de ventilação e a administração de medicamentos. Após o fechamento esternal, a monitorização rigorosa das funções cardíacas e respiratórias é necessária para evitar complicações adicionais.

Além da competência técnica e dos cuidados anestésicos, a abordagem interdisciplinar e a vigilância contínua são determinantes para o sucesso desses procedimentos. O controle adequado do edema miocárdico, a manutenção da pressão arterial e a prevenção de infecções são elementos chave que influenciam o prognóstico dos pacientes em recuperação pós-cirúrgica. A gestão eficaz da anestesia, aliada a uma abordagem cuidadosa e sistemática, aumenta consideravelmente as chances de recuperação satisfatória.

Como é realizado o manejo anestésico na ligadura do canal arterial patente em recém-nascidos de muito baixo peso ao nascer?

O canal arterial patente (CAP) é uma condição comum em recém-nascidos prematuros de muito baixo peso, caracterizada pela persistência da comunicação entre a artéria pulmonar e a aorta descendente após o nascimento, o que, normalmente, deve se fechar espontaneamente em poucos dias devido ao aumento dos níveis arteriais de oxigênio. Entretanto, em prematuros extremos, com peso inferior a 1500 gramas, essa involução fisiológica é frequentemente incompleta, o que aumenta significativamente a incidência do CAP e agrava as condições clínicas desses pacientes.

O CAP permite o shunt sanguíneo bidirecional, predominantemente do lado esquerdo para o direito, levando a uma sobrecarga pulmonar e, consequentemente, ao risco de hemorragia pulmonar, hipertensão pulmonar, displasia broncopulmonar e, também, comprometimento da perfusão sistêmica, aumentando o risco de enterocolite necrosante, hemorragia intraventricular, insuficiência renal e mortalidade. A associação com defeitos cardíacos congênitos, como defeito do septo ventricular (DSV) e defeito do septo atrial (DSA), complica ainda mais o quadro clínico.

A gestão anestésica durante a ligadura do CAP deve considerar as características fisiológicas e patológicas exclusivas destes neonatos. Manter a frequência cardíaca e a pressão arterial dentro dos parâmetros adequados é fundamental para garantir a perfusão dos órgãos vitais, enquanto a monitorização contínua da função cardíaca e do estado volêmico é indispensável para ajustar a terapia em tempo real.

A ventilação mecânica é imprescindível, sendo necessário um cuidado redobrado para evitar hipóxia e acidose metabólica, que podem agravar o quadro hemodinâmico. O uso de ventilação controlada com parâmetros rigorosamente ajustados para manter a pressão parcial de dióxido de carbono no final da expiração (PETCO2) entre 35 e 45 mmHg ajuda a otimizar a troca gasosa e a estabilidade respiratória durante o procedimento.

Em relação à indução anestésica, a administração cuidadosa de agentes como etomidato, sufentanil e bloqueadores neuromusculares, como o rocurônio, deve ser dosada considerando a fragilidade hemodinâmica do paciente. O suporte inotrópico contínuo com dopamina e dobutamina é utilizado para manter a contratilidade miocárdica e a estabilidade circulatória.

O manejo térmico perioperatório é crítico, já que a hipotermia pode exacerbar a instabilidade hemodinâmica e comprometer a recuperação pós-operatória. Portanto, a manutenção da normotermia durante todo o procedimento é uma prioridade.

Além disso, a decisão de realizar a ligadura do CAP antes da correção dos demais defeitos cardíacos deve ser feita em equipe multidisciplinar, considerando o alto risco cirúrgico e a fragilidade do neonato. A ligadura sem suporte de circulação extracorpórea minimiza complicações, permitindo a estabilização clínica para futuras reparações cardíacas.

O atraso no fechamento do canal arterial em prematuros está ligado à imaturidade do ducto arterioso, que apresenta baixa sensibilidade ao oxigênio e ausência de musculatura média, dificultando a sua constrição natural. Essa particularidade anatômica e funcional exige que o anestesiologista compreenda profundamente a fisiologia neonatal e as adaptações cardiovasculares para otimizar o manejo intra e pós-operatório.

É fundamental que o leitor entenda que o sucesso no manejo anestésico desses casos não depende apenas da técnica anestésica em si, mas também do entendimento integrado das interações entre ventilação, circulação e metabolismo neonatal. A monitorização avançada e a comunicação eficaz entre anestesiologistas, cardiologistas e cirurgiões pediátricos são cruciais para a segurança e a melhora dos desfechos.

O suporte ventilatório deve ser ajustado para preservar a função pulmonar, evitando tanto a hipoventilação quanto a hiperinsuflação, que podem influenciar negativamente a resistência vascular pulmonar e a pressão arterial sistêmica. A fragilidade dos recém-nascidos extremos impõe que cada ajuste ventilatório e hemodinâmico seja feito com extremo cuidado e individualização.

Outro ponto importante é a monitorização contínua da saturação de oxigênio e pressão arterial invasiva quando possível, pois estas variáveis são indicadores diretos do equilíbrio entre o aporte de oxigênio e a perfusão tecidual. A manutenção de um equilíbrio adequado evita complicações neurológicas e renais, que são altamente prevalentes nesta população.

Por fim, o conhecimento sobre as interações farmacocinéticas e farmacodinâmicas dos anestésicos em prematuros é essencial, dado que sua metabolização e excreção são imaturas, aumentando a suscetibilidade a efeitos adversos e prolongando o tempo de recuperação. A abordagem anestésica deve ser personalizada, balanceando analgesia, sedação e estabilidade hemodinâmica para reduzir riscos.

Qual é a Gestão Anestésica para a Reparação Cirúrgica da Coarctação Isolada da Aorta em Crianças?

A coarctação da aorta (CoA) isolada é uma condição cardíaca congênita em que há um estreitamento localizado da aorta, o que pode causar sérias complicações hemodinâmicas se não for tratado adequadamente. A abordagem anestésica para a correção dessa condição, especialmente quando realizada sem o suporte da circulação extracorpórea (CEC), exige uma gestão rigorosa da estabilidade hemodinâmica e da proteção da função orgânica, sendo aspectos essenciais para o sucesso da cirurgia.

O gerenciamento anestésico no caso da coarctação isolada envolve uma combinação de monitoramento hemodinâmico rigoroso, controle de pressão arterial e manutenção de um ambiente equilibrado durante toda a cirurgia. Em um caso típico de coarctação isolada reparada por anastomose término-a-término, a anestesia geral é usada sem a necessidade de CEC. A estabilização inicial do paciente é feita por meio de um monitoramento cuidadoso das pressões arteriais nas extremidades superiores e inferiores, além da cateterização de veias centrais para a monitoração da pressão venosa central (PVC) e administração de agentes vasoativos.

Um caso clínico relatado envolveu uma menina de um ano e um mês, diagnosticada com coarctação da aorta, sem outras anomalias cardíacas associadas. A análise pré-operatória, incluindo ecocardiograma e tomografia computadorizada do tórax, revelou uma diferença de pressão de 58 mm Hg entre os membros superiores e inferiores, indicando a presença do estreitamento aórtico. A cirurgia foi realizada com a técnica de anastomose término-a-término, um procedimento que exige cuidados especiais para garantir que a pressão arterial superior e inferior seja adequadamente ajustada durante o bloqueio aórtico temporário.

Durante a operação, foi fundamental o controle rigoroso da temperatura corporal, com a utilização de cobertores aquecidos e bolsas de gelo para minimizar os efeitos adversos da hipotermia. A manutenção da pressão arterial superior foi alcançada com a infusão de nitroprussiato de sódio, que foi descontinuado após a liberação do bloqueio aórtico. Após a conclusão da anastomose, o monitoramento das gasometrias arteriais indicou a necessidade de correção da acidose metabólica com bicarbonato de sódio, o que é uma prática comum quando há desequilíbrios pós-operatórios.

O manejo pós-operatório também deve ser minucioso. A paciente foi transferida para a Unidade de Terapia Intensiva Cardíaca (CICU), onde permaneceu com intubação endotraqueal até o segundo dia após a operação. A remoção do tubo traqueal e a transição para a alta ocorreram sem complicações, com o paciente sendo liberado após uma recuperação satisfatória.

Além do cuidado anestésico, é importante observar que a coarctação da aorta pode apresentar sintomas variados, dependendo da gravidade e do tipo da doença. O tipo infantil geralmente se manifesta com insuficiência cardíaca congestiva, dificuldade respiratória, retardo no crescimento e desenvolvimento, além de um sopro sistólico audível. Já o tipo adulto pode ser mais assintomático, mas com evidentes sinais de hipertensão nas extremidades superiores e pulsação diminuída nas artérias femorais.

A decisão de realizar a cirurgia deve ser tomada com base na gravidade da condição e no risco de complicações, como hipertensão sistêmica, aneurisma ou até morte súbita. Em pacientes com coarctação isolada, a cirurgia deve ser realizada o mais cedo possível para evitar a progressão para complicações mais graves.

Os critérios para indicação cirúrgica incluem, entre outros, um gradiente de pressão superior a 20 mm Hg entre os segmentos da aorta afetada, ou a presença de hipertensão sistólica, apesar de um gradiente menor. A anastomose da aorta é a técnica cirúrgica padrão para corrigir a CoA isolada, especialmente quando o estreitamento é simples, sem outras malformações cardíacas associadas.

Com relação à classificação da CoA, é importante lembrar que pode ser isolada ou acompanhada de outras anomalias cardíacas, como defeitos do septo ventricular. Além disso, a gravidade do estreitamento pode ser classificada em simples ou complexa, dependendo da localização e extensão do defeito. A coarctação associada à hipoplasia do arco aórtico é uma das formas mais complicadas de apresentar a patologia e pode exigir estratégias cirúrgicas diferenciadas.

Os cuidados anestésicos para a coarctação isolada da aorta, portanto, não se limitam ao simples controle da anestesia geral. Eles envolvem uma gestão integral da função hemodinâmica do paciente, monitoramento contínuo da pressão arterial e das gasometrias arteriais, além de intervenções rápidas para corrigir desequilíbrios metabólicos pós-operatórios. O sucesso da cirurgia não depende apenas da habilidade técnica do cirurgião, mas também do gerenciamento anestésico preciso e da supervisão contínua das condições clínicas do paciente durante todo o processo cirúrgico e pós-operatório.