O ALEC, ou Conselho Legislativo Americano de Troca de Leis, é uma organização que promove a formulação de leis e políticas públicas alinhadas aos interesses do setor empresarial e dos conservadores. Um dos seus métodos mais eficazes de influência é por meio dos modelos de projetos de lei que são disseminados entre legisladores estaduais. A disseminação dessas propostas e sua adoção por parlamentares em diversas partes dos Estados Unidos têm implicações diretas na elaboração da legislação local e na maneira como os interesses privados moldam as políticas públicas.

Os modelos de projeto de lei do ALEC variam de propostas simples a textos legislativos complexos, mas todos compartilham a mesma característica: são criados para refletir de maneira clara as demandas e interesses dos negócios e ativistas conservadores. Um exemplo claro desse processo ocorreu entre 2011 e 2017 com Mike Parson, um senador republicano de Missouri. Parson apresentou o SB 508, um projeto de lei que visava dificultar a participação de indivíduos no programa de navegação de saúde para o Affordable Care Act. O detalhe importante, e que chama atenção, é que esse projeto de lei foi copiado diretamente de um modelo criado pelo ALEC, sem sequer alterar um erro técnico do texto original. Esse tipo de plágio legislativo evidencia a dependência dos legisladores estaduais em relação ao ALEC para a elaboração de políticas públicas, em detrimento de um processo legislativo genuíno e independente.

Quando se observa esses casos de plágio, podemos questionar a ética e a independência dos legisladores, já que muitos deles simplesmente "copiam e colam" o trabalho do ALEC sem a menor modificação, muitas vezes deixando até erros técnicos presentes no modelo original. A repetição dessas falhas, como foi o caso de Parson e de outros legisladores, como Rachel Burgin da Flórida e Steve Gottwalt de Minnesota, é um reflexo do grau de influência do ALEC sobre o processo legislativo.

Esse fenômeno é mais do que uma simples falta de criatividade ou trabalho de um legislador. Ele é a evidência de uma rede bem organizada, com grande poder de articulação, que busca alterar políticas públicas para promover uma agenda ideológica e econômica específica. O que fica claro é que os membros do ALEC têm acesso direto aos tomadores de decisão e oferecem a eles uma “ferramenta pronta”, o que facilita a adoção de medidas que de outra forma poderiam ser mais difíceis de serem implementadas.

O impacto dessa relação entre o ALEC e os legisladores vai além do simples plágio. Ele é um reflexo das profundas interações entre interesses empresariais, políticos e ativistas que moldam a legislação em nível estadual, frequentemente sem o devido debate público. A dependência de modelos de projetos de lei prontos pode tornar o processo legislativo mais eficiente, mas também o despoja de um dos princípios fundamentais da política: a formulação de leis através de um diálogo democrático, onde as múltiplas perspectivas são consideradas.

Essas influências externas tornam-se ainda mais evidentes quando se analisam os padrões de adoção de modelos de lei entre os estados. A análise de padrões de plágio, ou seja, a identificação de quando e onde os legisladores reutilizam os modelos do ALEC, oferece uma visão detalhada sobre o grau de influência que a organização exerce sobre as leis estaduais. O uso de “ferramentas” como a detecção de plágio revela como o ALEC consegue implementar suas políticas em larga escala, muitas vezes com pouca resistência ou exame crítico.

Um dos pontos mais importantes que o leitor deve compreender sobre essa dinâmica é que o ALEC não só impõe seus interesses empresariais através de suas propostas, mas também consegue influenciar diretamente a política pública, em parte, pela eficiência com que suas propostas são disseminadas e adotadas. O sistema de "copiar e colar" permite que interesses específicos sejam rapidamente incorporados às leis, com pouca modificação ou debate.

Esse processo traz uma série de questões mais amplas que devem ser levadas em consideração. Primeiramente, existe uma questão de transparência. Muitos cidadãos desconhecem o fato de que suas leis estaduais podem ser, na prática, adaptações de modelos de projetos de lei criados por uma organização que visa atender a interesses privados. Além disso, a rapidez e a falta de um debate mais profundo sobre essas políticas podem resultar em leis que, embora eficientes em termos de implementação, não são necessariamente benéficas para o bem-estar coletivo.

O uso de modelos prontos pelo ALEC, embora eficiente, também levanta a questão da responsabilidade. Quando um legislador adota sem reflexão um modelo de lei elaborado por uma organização externa, ele abdica de sua função principal: agir como representante de seus eleitores e defender o interesse público. O risco é que, ao adotar essas propostas, os legisladores criem leis que favoreçam grupos de interesse específicos, ao invés de atender às necessidades da população em geral.

Por fim, é importante notar que, apesar das críticas, o uso de modelos legislativos do ALEC não é um fenômeno único. Organizações de diferentes espectros políticos também adotam métodos semelhantes para influenciar a legislação, o que faz com que o processo legislativo se torne cada vez mais permeável à pressão de grupos de lobby. No entanto, a transparência nesse processo, o debate público e a conscientização sobre essas práticas são essenciais para garantir que a política pública seja verdadeiramente representativa dos interesses da sociedade como um todo.

A Influência da ALEC nas Leis Estaduais dos EUA: Uma Análise Detalhada

A ALEC (American Legislative Exchange Council) é uma organização que tem exercido uma influência significativa sobre a elaboração de políticas nos Estados Unidos, principalmente no nível estadual. Sua abordagem consiste na criação de "model bills" ou projetos de lei modelo, que são disseminados entre legisladores estaduais para serem adaptados e introduzidos como propostas formais. Esse processo permite que ideias que favorecem determinados interesses corporativos sejam adotadas em diversas jurisdições de maneira rápida e eficaz. Para entender melhor essa dinâmica, realizamos um estudo detalhado sobre como os projetos de lei da ALEC se espalham e influenciam a legislação nos Estados Unidos.

O primeiro passo para entender a influência da ALEC foi a análise dos projetos de lei modelo que a organização disseminou ao longo dos anos. Com o auxílio de Konstantin Kashin, um especialista em metodologia política, desenvolvemos uma estratégia que visava comparar cada projeto de lei introduzido ou aprovado pelos legisladores estaduais com os modelos criados pela ALEC. A análise focou no período de meados da década de 1990 até 2013, período para o qual havia dados disponíveis. A meta era verificar se algum conteúdo das propostas legislativas estaduais era derivado diretamente dos projetos modelo da ALEC.

Inicialmente, coletamos todos os projetos de lei modelo da ALEC que conseguimos encontrar, utilizando fontes variadas. A primeira etapa foi compilar e digitalizar os modelos de lei disponíveis no Center for Media and Democracy, um grupo de monitoramento com viés progressista, baseado em Madison, Wisconsin, que tem rastreado a ALEC por anos. Em 2011, o Center publicou um vazamento anônimo de muitos projetos modelo da ALEC, que se tornaram uma base importante para a pesquisa. No entanto, como nosso objetivo era obter uma visão mais ampla, decidimos ir além e coletamos projetos mais antigos, que não estavam incluídos no vazamento original.

Essa coleta levou-nos a uma verdadeira "expedição ALEC" pelo país, onde visitamos bibliotecas legislativas estaduais e arquivos da Library of Congress, da Universidade da Califórnia, em San Francisco, e da Universidade da Califórnia, em Berkeley, para reunir projetos de lei mais antigos da ALEC. Embora esses projetos não fossem amplamente distribuídos ao público, muitos legisladores estaduais os tinham em suas coleções, e eventualmente, esses documentos foram doados para as bibliotecas legislativas, formando um valioso repositório.

Depois de compilar mais de 1.000 projetos de lei da ALEC, categorizamos cada um deles de acordo com áreas de políticas específicas, como justiça criminal, saúde, agricultura, energia e meio ambiente. Descobrimos que as propostas da ALEC tendiam a se concentrar em áreas como justiça criminal, saúde e meio ambiente, enquanto temas como direitos sobre armas e eleições, que geraram controvérsias, tinham uma participação menor nos modelos da organização, apesar de sua alta visibilidade nos debates públicos.

O próximo passo foi a coleta de dados sobre todas as propostas legislativas estaduais que foram introduzidas ou aprovadas entre 1995 e 2013. Essa base de dados continha cerca de 2,4 milhões de projetos de lei, provenientes de sites legislativos estaduais. No entanto, devido à limitação de acesso a textos legislativos eletrônicos, a análise não cobriu leis de estados como Indiana, Nova Jersey, Nova York, Pensilvânia, Texas, Virgínia, Washington e Virgínia Ocidental, embora as propostas introduzidas nesses estados ainda estivessem acessíveis.

Uma vez coletados todos os projetos de lei da ALEC e as legislações estaduais, passamos para a preparação dos textos. Isso envolveu a transformação dos textos em minúsculas, a remoção de palavras comuns e a eliminação de pontuação, exceto hífens. Em seguida, converti os textos processados em "n-grams" ou sequências de itens de texto, como bigramas e trigramas, que facilitavam a análise de similaridade.

A etapa final da análise consistiu em calcular a similaridade entre os projetos de lei estaduais e os modelos da ALEC. Usamos um algoritmo para identificar correspondências e estimar quais propostas legislativas continham uma linguagem idêntica ou muito similar à dos projetos modelo da ALEC. Após dois anos de trabalho e programação, conseguimos criar um banco de dados com mais de 10.000 propostas legislativas estaduais que apresentavam semelhanças significativas com os projetos modelo da ALEC, sugerindo uma possível "plágio" de políticas.

Por fim, nossa análise revelou padrões interessantes. A ALEC exerceu uma influência considerável sobre áreas como a justiça criminal, a saúde e a agricultura, com uma presença significativa em questões de regulação e orçamento. No entanto, em áreas mais controversas, como direitos de armas e legislações eleitorais, a organização não era tão ativa na criação de projetos modelo. Isso pode ser explicado pela transição gradual da ALEC para uma agenda mais conservadora, um fenômeno que se intensificou mais recentemente.

Além disso, é importante destacar que a ALEC não age isoladamente. Sua rede de apoio inclui empresas e organizações que financiam suas atividades e contribuem para a criação de modelos legislativos que beneficiam seus interesses. Embora a ALEC alegue ser uma organização que promove o federalismo e a liberdade econômica, sua influência levanta questões sobre a transparência, o controle corporativo sobre a política e o impacto dessa "privatização" da legislação na democracia.