O uso de dispositivos de suporte circulatório mecânico (MCS) tem se tornado cada vez mais frequente no tratamento da insuficiência cardíaca grave, especialmente à medida que a população envelhece e a prevalência de falência cardíaca sistólica aumenta. Esses dispositivos, como os dispositivos de assistência ventricular (VAD), a bomba intra-aórtica de balão (IABP) e a oxigenação por membrana extracorpórea veno-arterial (VA-ECMO), são essenciais para manter a vida dos pacientes enquanto aguardam procedimentos cruciais, como transplantes cardíacos, ou como uma solução definitiva para falência cardíaca avançada. Este capítulo visa detalhar a gestão anestésica de pacientes que utilizam esses dispositivos, focando no contexto perioperatório.
A avaliação pré-operatória desses pacientes deve ser cuidadosa e multidisciplinar. A decisão sobre o tipo de dispositivo a ser utilizado, o momento adequado para a implantação e as estratégias de tratamento devem envolver uma equipe composta por cardiologistas, cirurgiões cardíacos, anestesiologistas, engenheiros e perfusionistas. A gravidade da insuficiência cardíaca, a função dos órgãos periféricos (renal, pulmonar e hepática) e a resposta clínica a tratamentos anteriores, como terapias inotrópicas, devem ser considerados para garantir o melhor manejo anestésico e de suporte circulatório.
Os VADs, como os dispositivos de assistência ventricular esquerda (LVAD) e os dispositivos de assistência ventricular direita (RVAD), têm como objetivo aliviar a carga do ventrículo falido, melhorando a perfusão dos órgãos vitais. O LVAD, por exemplo, é implantado no ventrículo esquerdo, com a cannula de entrada situada na cavidade do ventrículo e a cannula de saída conectada à aorta ascendente, permitindo o aumento do débito cardíaco. O RVAD, por sua vez, é implantado para apoiar o ventrículo direito, geralmente com a cannula de entrada no átrio direito ou ventrículo direito, e a cannula de saída na artéria pulmonar. Quando ambos os ventrículos estão comprometidos, pode-se utilizar um dispositivo biventricular (BiVAD), que combina as funções do LVAD e do RVAD. Há também o coração artificial total (TAH), que pode ser utilizado em casos de falência cardíaca extrema, onde ambos os ventrículos nativos não conseguem manter o débito cardíaco necessário, mas os outros órgãos ainda são recuperáveis.
Os dispositivos de suporte circulatório mecânico têm indicações claras para pacientes com insuficiência cardíaca classe D, de acordo com a classificação da Sociedade Europeia de Cardiologia. Os pacientes que apresentam sintomas persistentes de insuficiência cardíaca, que não respondem adequadamente ao tratamento farmacológico, e que têm uma fração de ejeção ventricular esquerda (LVEF) inferior a 30%, podem se beneficiar do uso desses dispositivos. Os dispositivos VAD, por exemplo, são frequentemente indicados para pacientes com sintomas graves de insuficiência cardíaca, como cansaço extremo, intolerância a atividades físicas, dependência de inotrópicos ou necessidade de hospitalizações frequentes.
Entretanto, a implantação desses dispositivos não está isenta de desafios. A avaliação pré-operatória deve levar em conta a função renal, hepática e pulmonar, pois essas condições podem ser exacerbadamente afetadas pelo uso de dispositivos de assistência. Além disso, contraindicações absolutas para a implantação de dispositivos de assistência incluem doenças hepáticas ou renais irreversíveis, distúrbios neurológicos graves, câncer metastático e outros fatores que limitam a expectativa de vida ou a possibilidade de reabilitação.
No que tange ao manejo anestésico, é crucial que os anestesiologistas compreendam a fisiologia alterada desses pacientes e a interação entre os dispositivos de suporte e a função cardiovascular. O uso de dispositivos como o IABP ou o VA-ECMO pode afetar a perfusão e a hemodinâmica, o que exige um monitoramento rigoroso durante a anestesia. O IABP, por exemplo, aumenta a perfusão coronariana e diminui a carga de trabalho do ventrículo esquerdo, enquanto o VA-ECMO fornece suporte circulatório completo, assumindo o papel do coração e dos pulmões.
Para pacientes que passam por procedimentos não cardíacos enquanto em MCS, é fundamental uma abordagem cuidadosa em relação à anestesia. A presença do dispositivo pode complicar a farmacocinética dos anestésicos e a monitorização hemodinâmica. O anestesiologista deve estar preparado para lidar com complicações como o sangramento, instabilidade hemodinâmica ou dificuldades respiratórias, comuns em pacientes com ECMO.
A gestão do risco perioperatório e a escolha do tipo de anestesia devem ser personalizadas com base nas características clínicas do paciente e nos dispositivos de suporte circulatório utilizados. Em alguns casos, a anestesia geral pode ser indicada, mas o risco de complicações deve ser sempre considerado, especialmente em pacientes com insuficiência de múltiplos órgãos.
Além da avaliação física e das condições clínicas, outro aspecto relevante é a estratégia de desmame do suporte circulatório após a cirurgia. Em alguns casos, após o procedimento cardíaco ou de transplante, pode-se tentar a retirada gradual do dispositivo, o que exige monitoramento intensivo e a coordenação com a equipe multidisciplinar. O desmame bem-sucedido pode levar à recuperação do coração nativo ou à adaptação ao novo órgão transplantado, mas falhas nesse processo podem resultar em complicações graves, exigindo a reintegração do suporte circulatório.
Por fim, é fundamental que os profissionais envolvidos no manejo anestésico desses pacientes tenham um entendimento aprofundado dos dispositivos MCS, suas indicações, limitações e possíveis complicações. A comunicação contínua entre as equipes multidisciplinares e o monitoramento atento durante o perioperatório são elementos-chave para o sucesso do tratamento e a sobrevivência dos pacientes.
Como a Avaliação Pré-Operatória Influencia os Resultados da Implantação de LVAD em Pacientes com Insuficiência Cardíaca Avançada
A gestão dos pacientes com insuficiência cardíaca avançada, especialmente os que necessitam de um dispositivo de assistência ventricular esquerda (LVAD), envolve uma avaliação detalhada e precisa de vários fatores clínicos e hemodinâmicos. O tempo de implantação do LVAD, a otimização clínica pré-operatória e a identificação de potenciais complicações associadas são cruciais para o sucesso do procedimento. O uso de ferramentas como o perfil do INTERMACS, que estratifica os pacientes com insuficiência cardíaca em diferentes estágios, tem demonstrado ser eficaz para prever o risco e o desfecho clínico dos pacientes que precisam de dispositivos de suporte circulatório mecânico.
Os perfis do INTERMACS, que variam de 1 a 7, fornecem uma avaliação útil do estado hemodinâmico do paciente e ajudam a identificar a urgência do tratamento. Pacientes classificados no perfil 1 apresentam um estado de choque cardiogênico grave, com necessidade de suporte inotrópico ou vasopressor urgente, frequentemente acompanhados por falência de múltiplos órgãos e níveis elevados de lactato. Em contraste, pacientes com perfil 4 podem ser otimizados clinicamente antes de uma intervenção cirúrgica, o que lhes dá um tempo adicional para ajustes médicos antes da implantação do LVAD.
Uma das complicações mais críticas no processo de preparação pré-operatória é a disfunção do ventrículo direito (RV). O ventrículo direito, que tem uma estrutura mais fina e menos massa muscular que o ventrículo esquerdo, não é tão adaptável a pressões elevadas, o que pode resultar em falência do RV após a implantação do LVAD. Este fenômeno é observado com mais frequência em pacientes com hipertensão pulmonar, insuficiência cardíaca dilatada ou cardiomiopatia associada a quimioterapia. A função do RV, muitas vezes comprometida em casos avançados de insuficiência cardíaca, é um dos fatores determinantes para a avaliação pré-operatória.
A avaliação clínica pré-operatória deve incluir uma análise detalhada da função ventricular direita, além de considerar a causa subjacente da insuficiência cardíaca. Em particular, pacientes com cardiomiopatia não isquêmica apresentam risco elevado de disfunção do RV após a implantação do LVAD. As complicações associadas ao uso de dispositivos mecânicos de assistência circulatória também são influenciadas pela presença de outras condições clínicas, como arritmias e insuficiência renal, que podem complicar ainda mais o manejo durante o pós-operatório. A análise dos níveis de biomarcadores como o NT-proBNP, o índice de pulsabilidade da artéria pulmonar (PAPi) e a strain longitudinal da parede livre do RV (fwRVLS) são fundamentais para a predição do risco de falência do RV e devem ser incorporadas ao protocolo de avaliação pré-operatória.
O tratamento medicamentoso também desempenha um papel crucial na otimização pré-operatória. Medicamentos como inibidores da enzima conversora de angiotensina (ACE-I), bloqueadores dos receptores da angiotensina (ARBs) e antagonistas dos receptores mineralocorticoides são usados com frequência para gerenciar os sintomas da insuficiência cardíaca. Contudo, a combinação de medicamentos pode provocar efeitos adversos, como distúrbios eletrolíticos, que necessitam de vigilância rigorosa, especialmente durante o período perioperatório. O uso de inotrópicos, como milrinona ou dobutamina, também é comum, mas pode estar associado a complicações adicionais, incluindo arritmias.
É importante considerar que a presença de arritmias, especialmente fibrilação atrial crônica, pode aumentar o risco de eventos tromboembólicos durante o período perioperatório. Portanto, a avaliação eletrofisiológica e a possibilidade de ablação pré-operatória devem ser discutidas para reduzir esse risco. Em alguns casos, a ligadura da apêndice atrial esquerdo pode ser indicada, especialmente em pacientes com fibrilação atrial persistente, durante a implantação do LVAD.
Além disso, a avaliação pré-operatória também envolve a revisão do histórico cirúrgico do paciente, como cirurgias cardíacas anteriores, que podem influenciar a abordagem técnica do procedimento. A realização de exames de imagem, como tomografia computadorizada ou radiografia do tórax, pode ser necessária para identificar possíveis alterações anatômicas que poderiam complicar a implantação do dispositivo.
A avaliação do risco de falência do RV após a implantação do LVAD não é apenas uma questão de preparação técnica, mas também de um planejamento abrangente que envolve uma compreensão detalhada do estado clínico do paciente, das terapias em curso e dos potenciais fatores de complicação. Com uma abordagem cuidadosa e uma avaliação precisa, é possível aumentar significativamente as chances de sucesso da intervenção e melhorar a sobrevida pós-operatória.
Como a Evolução dos Dispositivos de Suporte Circulatório Mecânico Está Mudando o Tratamento da Insuficiência Cardíaca
A busca por alternativas para o transplante cardíaco tem levado à contínua inovação nos dispositivos de suporte circulatório mecânico (MCS, na sigla em inglês). Um dos avanços mais significativos é o desenvolvimento de corações artificiais totais (TAH), que buscam não apenas substituir a função cardíaca em pacientes com insuficiência cardíaca avançada, mas também permitir uma qualidade de vida mais próxima da normal. No entanto, esses dispositivos, até hoje, enfrentam desafios técnicos e clínicos que precisam ser superados para sua adoção em larga escala.
O BiVACOR TAH, por exemplo, representa uma tentativa de introduzir as vantagens observadas com os dispositivos de assistência ventricular esquerda (LVAD) em um coração artificial total. Um dos aspectos centrais de sua funcionalidade é a capacidade de se adaptar às necessidades fisiológicas do corpo, permitindo que o paciente realize atividades cotidianas, como exercício físico, enquanto o dispositivo mantém um funcionamento contínuo e seguro. Ele opera com uma bomba rotatória que visa manter fluxos sanguíneos adequados, ajustando-se automaticamente às mudanças nas condições do paciente, sem a necessidade de controle manual da velocidade da bomba.
No entanto, um desafio técnico crucial é a gestão da velocidade da bomba. Para otimizar o fluxo sanguíneo e reduzir o risco de formação de coágulos, o sistema do BiVACOR é projetado para reduzir momentaneamente a velocidade da bomba, o que altera as taxas de fluxo sanguíneo nas cavidades cardíacas. Esse ajuste, feito por meio de um sinal sinusoidal alternado, melhora o efeito de lavagem da cavidade da bomba e das vias de entrada e saída, promovendo a prevenção de trombos. Essa modulação da velocidade não apenas favorece a circulação sanguínea, mas também mantém as pressões hemodinâmicas dentro de um intervalo fisiológico desejável, ajustando-se às condições variáveis do corpo, como durante o exercício ou o descanso.
Outro aspecto importante na evolução desses dispositivos é o sistema de alimentação elétrica. Tradicionalmente, os dispositivos de MCS requerem a transmissão de energia elétrica por meio de uma linha de acionamento percutânea, que tem como principal desvantagem o risco de infecção no local de saída da linha, algo que pode levar a complicações graves e a hospitalizações frequentes. O desenvolvimento de sistemas de transferência de energia sem fio, como o Transcutaneous Energy Transfer System (TET), pode resolver esse problema, eliminando a necessidade de um cabo externo que conecta o dispositivo ao sistema de alimentação. Isso não só melhora a qualidade de vida do paciente, proporcionando maior liberdade de movimento, mas também reduz consideravelmente o risco de infecção e outros efeitos adversos associados.
Além disso, o futuro desses dispositivos se encaminha para uma integração ainda maior da eletrônica embarcada. A miniaturização dos componentes eletrônicos e o desenvolvimento de sistemas de controle mais compactos permitirão que o dispositivo seja ainda mais eficiente e discreto. A eliminação da necessidade de sistemas externos volumosos representará um avanço significativo, possibilitando que os pacientes utilizem os dispositivos de forma mais natural, sem se preocupar com a manutenção constante de conexões externas.
É importante destacar que a evolução dos dispositivos de suporte circulatório não se limita apenas a avanços tecnológicos. A aceitação de novos modelos de tratamento também depende de uma compreensão completa dos riscos e benefícios desses sistemas, bem como de sua integração no tratamento global da insuficiência cardíaca. O foco deve ser não apenas na sobrevivência do paciente, mas também na melhoria da sua qualidade de vida, com maior autonomia e capacidade de realizar atividades cotidianas sem limitações significativas. O sucesso do BiVACOR e de outros dispositivos semelhantes no futuro dependerá de sua capacidade de atender a esses dois requisitos simultaneamente.
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