Os defeitos do septo ventricular (DSV) podem, paradoxalmente, reduzir a incidência de taquicardia ectópica juncional (JET), uma disritmia comum associada à reparação cirúrgica de DSV. Embora esse fenômeno seja observado principalmente em crianças, sua relevância vai além do campo da cardiologia e nos leva a refletir sobre como o corpo reage a intervenções cirúrgicas complexas, especialmente no contexto de anestesia e sedação.

Em muitos casos, medicamentos sedativos são administrados a pacientes críticos para garantir a sedação durante procedimentos invasivos ou para aliviar a dor. Cada substância tem características próprias que influenciam a fisiologia do paciente, podendo tanto aliviar os sintomas quanto trazer complicações graves. Um exemplo disso é o síndrome de abstinência do dexmedetomidine, uma droga sedativa comum, que pode desencadear taquicardia e hipertensão quando administrada por longos períodos e suspensa abruptamente. Nesse contexto, o uso de clonidina se mostrou eficaz na facilitação da retirada gradual da medicação, uma alternativa que ajuda a prevenir os efeitos colaterais indesejados.

Outro medicamento amplamente utilizado é o propofol, um agente que induz anestesia através da estimulação dos receptores GABA, proporcionando início rápido de ação e uma meia-vida curta. Sua aplicação se estende desde a indução de anestesia até a sedação de procedimentos, sendo fundamental na gestão de crises convulsivas resistentes. No entanto, seu uso não está isento de riscos. Depressão respiratória e hipotensão são efeitos colaterais frequentes, especialmente após a infusão inicial. A hipotensão, provocada pela vasodilatação sistêmica e pelos efeitos depressivos no miocárdio, é mais pronunciada em pacientes com redução do volume intravascular e disfunção cardíaca preexistente. A vigilância constante durante a administração do propofol é, portanto, indispensável. Além disso, uma complicação rara, mas potencialmente fatal, é a síndrome da infusão de propofol, caracterizada por falência cardíaca e renal, disfunção hepática, rabdomiólise, acidose lática e hipercalemia. Esta síndrome ocorre em doses elevadas e uso prolongado, sendo mais comum em crianças e pacientes criticamente enfermos, e sua gestão é puramente de suporte.

O cetamina, por outro lado, é uma substância com características dissociativas, cujo efeito anestésico se dá pela antagonização dos receptores NMDA. Além de ser eficaz em induzir anestesia e manter a sedação, sua vantagem está no seu efeito broncodilatador, tornando-a útil no manejo de crises asmáticas graves. O aumento da liberação de catecolaminas, resultando em taquicardia e aumento da pressão arterial, é uma das respostas fisiológicas mais notáveis. Contudo, o uso de cetamina pode desencadear o fenômeno de emergência, onde o paciente vivencia estados de confusão mental após o fim da sedação, além de aumentar a demanda de oxigênio no miocárdio, o que é preocupante em pacientes com insuficiência cardíaca congestiva.

A etomidato, outro agente sedativo, tem um início de ação rápido e uma meia-vida curta, adequado para indução de anestesia em situações de intubação rápida. No entanto, um efeito colateral grave é a supressão das glândulas adrenais, uma consequência da inibição das enzimas hidroxilases adrenocorticais. Por essa razão, o etomidato não é recomendado para crianças menores de 10 anos. O uso de barbitúricos, como o pentobarbital, era uma prática comum antes da popularização dos benzodiazepínicos. Embora eficazes na indução de coma barbitúrico para o manejo de epilepsia intratável ou hipertensão intracraniana, os barbitúricos possuem uma meia-vida longa e podem causar depressão miocárdica, depressão respiratória e outros efeitos adversos graves, como laringoespasmo.

A sedação em procedimentos é um aspecto crítico em pacientes em unidades de terapia intensiva (UTI). A definição de sedação, estabelecida pela American Society of Anesthesiologists (ASA), varia em um espectro que vai desde a sedação mínima até a anestesia profunda. A avaliação do status físico do paciente antes da sedação é fundamental, sendo orientada por uma classificação específica da ASA, que classifica os pacientes de acordo com sua condição clínica e a adequação para sedação. Além disso, uma nova escala de sedação pediátrica foi desenvolvida, a Pediatric Sedation State Scale (PSSS), que visa monitorar a profundidade da sedação de forma mais precisa em crianças, observando comportamentos e eventos adversos durante a sedação.

É imprescindível que os profissionais de saúde monitorem de perto o nível de sedação e intervenham quando necessário, para evitar complicações como a transição inesperada de um nível de sedação para outro, ou o aparecimento de sintomas adversos não previstos. A avaliação contínua, especialmente em pacientes com doenças sistêmicas graves, é crucial para garantir a segurança durante os procedimentos.

Além disso, a dor e a analgesia não podem ser tratadas de forma isolada; é necessário um entendimento holístico do impacto da dor nos sistemas emocionais e fisiológicos do paciente. A dor não aliviada pode desencadear uma série de respostas adversas, incluindo agitação, sono inadequado e respostas de estresse agudo, que podem prolongar a hospitalização e agravar o estado clínico do paciente. A análise da dor deve ser multifacetada, considerando os efeitos tanto sensoriais quanto emocionais da experiência dolorosa. Assim, além da escolha correta da medicação sedativa ou analgésica, deve-se priorizar o manejo da dor de forma eficaz, prevenindo complicações que podem afetar diretamente a recuperação do paciente.

Qual é o papel do anfotericin B no tratamento de infecções fúngicas invasivas?

O anfotericin B, um dos primeiros agentes antifúngicos macrolídeos polienos, foi aprovado para uso clínico em 1958. Durante muitos anos, ele foi considerado o “padrão ouro” no tratamento de infecções fúngicas invasivas, sendo também a base de comparação para muitos outros antifúngicos desenvolvidos posteriormente. No entanto, com o avanço da farmacologia e o surgimento de novos medicamentos como os triazóis e equinocandinas, o uso de anfotericin B diminuiu consideravelmente, especialmente em pediatria, devido a perfis de eficácia e segurança mais favoráveis dessas novas classes.

O anfotericin B é derivado de um produto natural de fermentação de um actinobactério do solo, coletado na Venezuela em 1953. Ele é denominado "amfotérico" devido à sua capacidade de formar sais solúveis tanto em ambientes ácidos quanto básicos, embora, devido à sua insolubilidade em água, para uso clínico ele seja combinado com desoxicolato de sódio, um detergente, numa proporção de 3:7. O mecanismo de ação do anfotericin B se dá pela ligação do fármaco ao ergosterol, o principal esterol encontrado nas membranas plasmáticas dos fungos. Essa interação lipofílica danifica a membrana celular, resultando na formação de poros que aumentam a permeabilidade às cátions monovalentes e levam à morte celular fúngica por extravasamento de nutrientes essenciais.

Recentes estudos moleculares sugerem que, embora a formação de canais seja um mecanismo complementar, a principal ação citocida do anfotericin B está na sua simples ligação ao ergosterol. Além disso, o anfotericin B possui atividade oxidante que altera o metabolismo celular, inibe a ATPase (bomba de prótons), depleta as reservas de energia celular e promove a peroxidação lipídica, o que resulta em uma maior fragilidade da membrana celular e vazamento de cálcio iônico.

Quanto à farmacologia do anfotericin B, ele é amplamente distribuído no organismo, com uma alta taxa de absorção (>90%) quando ligado a lipoproteínas. A droga é preferencialmente absorvida pelos órgãos do sistema reticuloendotelial, como fígado, baço e pulmões, e segue um modelo de distribuição de três compartimentos. Sua meia-vida inicial de distribuição é de 24 a 48 horas, refletindo sua absorção pelos lipídios do hospedeiro, seguida de uma liberação muito lenta e excreção nas urinas e bile. A meia-vida de eliminação terminal pode ser de até 15 dias, o que destaca a longa permanência do medicamento no corpo e a necessidade de um monitoramento contínuo.

Em estudos realizados com prematuros, foi observada uma variabilidade significativa na eliminação do anfotericin B, com alguns recém-nascidos apresentando acúmulo substancial da droga e outros mostrando uma eliminação quase nula durante o intervalo de dosagem. Isso reflete a variabilidade interindividual que deve ser considerada ao administrar o medicamento.

Para melhorar a eficácia e reduzir a toxicidade associada ao uso de anfotericin B, foram desenvolvidas formulações lipídicas, como o anfotericin B lipossomal (L-Amphotericin B) e o complexo lipídico de anfotericin B (ABLC). Essas formulações oferecem a vantagem de permitir doses mais altas de anfotericin B com menor toxicidade, aumentando a entrega do medicamento nos órgãos reticuloendoteliais e reduzindo os efeitos colaterais graves, como a nefrotoxicidade. A eficácia dessas formulações depende de sua capacidade de liberar a droga livre no local da infecção, onde ela será ativada por fosfolipases. No entanto, as formulações lipídicas, embora mais seguras, apresentam um início de ação mais lento e podem ser menos potentes do que a versão convencional de anfotericin B, especialmente em testes de tempo-morte, onde a disassociação da droga da formulação lipídica pode retardar sua atividade.

A farmacocinética de anfotericin B é especialmente relevante para crianças, incluindo recém-nascidos prematuros, que podem ter uma distribuição e eliminação diferentes das observadas em adultos. Os estudos mostram que a distribuição do fármaco em crianças é menor, e sua eliminação mais rápida do que em adultos, o que requer ajustes na dosagem. A variabilidade entre os pacientes é um fator importante, e o uso adequado do anfotericin B deve ser acompanhado de perto por médicos para garantir a eficácia e minimizar os efeitos adversos.

Além de compreender o mecanismo de ação e a farmacologia do anfotericin B, é crucial que o leitor saiba que a administração desse medicamento exige uma análise cuidadosa do perfil do paciente, especialmente em populações vulneráveis como os prematuros, e um controle rigoroso das doses. As vantagens das formulações lipídicas, com sua maior segurança e capacidade de administrar doses mais altas, são um avanço, mas a escolha do regime terapêutico deve ser sempre individualizada, considerando as características clínicas do paciente e as especificidades do quadro infeccioso.