O problema das "outras mentes" é um dos dilemas centrais na epistemologia, que se manifesta como uma inquietação acerca da existência da consciência em outras pessoas. A questão, formulada de maneira simples, é: como podemos saber que outras mentes existem e que não estamos sozinhos na experiência de uma consciência? Essa dúvida se origina da nossa incapacidade de acessar diretamente as experiências alheias, o que nos leva a questionar se outras pessoas realmente possuem uma mente consciente ou se, por algum motivo desconhecido, todas as interações externas não seriam apenas uma simulação de comportamento humano.

O desafio fundamental que o problema das outras mentes coloca é o fato de que não temos uma maneira direta de acessar ou provar a consciência em outros seres. Sabemos da nossa própria consciência, mas não temos garantias absolutas de que as outras pessoas compartilham a mesma característica. Uma explicação comum que tenta resolver essa questão é a de que, se vemos outros se comportando de maneira similar à nossa, então podemos razoavelmente assumir que eles também têm consciência. Porém, isso deixa de fora a possibilidade de que esses outros seres possam ser, na verdade, máquinas, zumbis ou entidades sem consciência, que apenas imitam o comportamento humano.

Por analogia, o problema das "outras mentes" pode ser comparado ao ceticismo acerca da existência de objetos físicos no mundo. Como podemos ter certeza de que as mesas, as árvores, ou qualquer outro objeto que percebemos, realmente existem fora da nossa percepção? Não saber se um objeto é real ou apenas uma ideia projetada pela mente humana é uma versão do ceticismo sobre a realidade física. Contudo, enquanto o problema das "outras mentes" diz respeito à consciência, o problema das "mesas" trata da existência do mundo externo, como o conhecemos.

Veridicalismo, a posição que afirma que as coisas existem exatamente como as percebemos, tenta resolver ambos os problemas: o das "outras mentes" e o das "mesas". No entanto, ele se vê limitado quando confrontado com a dúvida sobre a natureza real do que percebemos. Por exemplo, afirmar que mesas existem, mas não sabemos se são reais ou apenas simulações, não resolve o ceticismo sobre a natureza dos objetos. O mesmo ocorre com as "outras mentes": afirmar que outras pessoas existem, mas não sabemos se elas são conscientes, não resolve a inquietação original sobre a natureza da consciência alheia.

Uma solução alternativa para o problema das "outras mentes" seria adotar uma visão mais radical, como o eliminativismo. Nesta perspectiva, poderíamos aceitar que existem mentes, mas não necessariamente conscientes. Isso mudaria a formulação do problema para o dilema da existência de consciência, e não mais sobre a existência de "outras mentes" como algo consciente. De acordo com essa visão, até mesmo robôs ou zumbis poderiam ser considerados como tendo mentes, desde que cumpram os critérios mínimos para ser considerados como tal, independentemente de terem ou não consciência.

Contudo, uma teoria da mente que resolva o problema das "outras mentes" deve estar em consonância com o conceito de mente que nos levou a formular o problema em primeiro lugar. Isso significa que as mentes devem ser conscientes; caso contrário, o problema não é resolvido, mas apenas reconfigurado sob novos termos.

O ceticismo sobre os objetos físicos, como as mesas, funciona de maneira similar. O problema não é simplesmente saber se as mesas existem, mas se elas são reais ou simulações. Se não podemos saber se as mesas são ou não simulações, isso altera completamente a nossa relação com o mundo físico. Em última análise, o ceticismo não se preocupa apenas com a dúvida sobre um único cenário, mas com a ignorância sobre qual cenário é verdadeiro.

A solução para esse tipo de ceticismo não é apenas descobrir se um cenário bizarro, como o de um demônio maligno ou uma simulação, é verdadeiro. O verdadeiro problema é o fato de que estamos em uma posição de incerteza sobre qual hipótese corresponde à nossa realidade. Assim, o problema do ceticismo não é uma questão sobre como reagir a cenários inesperados, mas uma questão de como compreender o mundo quando não sabemos qual cenário está, de fato, se desenrolando.

É importante perceber que a falta de certeza não deve ser tratada de maneira trivial. Se você aprendesse que está vivendo sob uma simulação ou sob o controle de um demônio, isso certamente afetaria sua percepção do mundo. No entanto, é fundamental entender que a dúvida não reside no conhecimento de um cenário específico, mas na falta de clareza sobre qual cenário é o verdadeiro.

Este ponto é particularmente importante porque, no caso do ceticismo sobre a existência de mesas, a dúvida não está em saber se as mesas são ou não reais, mas em saber se as coisas que percebemos como mesas são realmente o que acreditamos ser. Essa incerteza sobre a natureza das coisas — seja sobre objetos físicos ou sobre outras mentes — nos coloca em uma posição desconfortável, pois nossa compreensão do mundo depende não apenas do que percebemos, mas do que podemos saber sobre o que realmente constitui o que percebemos.

O Mundo Demoníaco e a Verdade das Coisas: Reflexões sobre o Ceticismo e a Veridicidade

Quando questionamos a natureza do que percebemos como real, somos imediatamente confrontados com os desafios impostos pelas várias teorias do ceticismo. Uma das abordagens mais interessantes para entender essa questão é a teoria conhecida como veridicalismo estruturalista, que afirma que, independentemente das circunstâncias, podemos ter certeza sobre a existência de certos objetos, como as mesas, mesmo em cenários extremos de dúvida como o mundo dos demônios ou a Matrix. A essência desse argumento reside na ideia de que o perfil causal dos objetos — aquilo que define seu comportamento e interação no mundo — pode ser suficiente para garantir a sua existência, mesmo que sua natureza metafísica seja, de fato, mais fluida ou dependente da percepção.

Imaginemos que a realidade que experimentamos seja, na verdade, uma simulação de computador. Nesse caso, o objeto que vemos como uma mesa poderia ser apenas um estado de um chip, uma configuração digital que simula a mesa em nossa percepção. Da mesma forma, se estivermos sob o domínio de um demônio, a mesa que vemos pode ser uma criação demoníaca, uma ilusão que desaparece quando o demônio decide que ela não deve mais existir. Neste cenário, a mesa existe apenas dentro dos limites do controle do ser demoníaco, e não como uma realidade independente. Essas possibilidades, embora alarmantes em um nível existencial, não negam a percepção de que a mesa está ali; elas apenas questionam sua essência fundamental.

O veridicalismo estruturalista propõe que, mesmo em situações onde não podemos ter certeza sobre a verdadeira natureza do mundo ao nosso redor, ainda podemos ter certezas razoáveis sobre o que percebemos. Se não sabemos se estamos sonhando ou vivendo em uma simulação, ainda podemos afirmar que a mesa diante de nós tem certas propriedades, como sua massa, a presença de suas pernas e sua função de suportar objetos como xícaras. Essas qualidades fundamentais permitem que reconheçamos que o objeto em questão é, de fato, uma mesa, independentemente de sua verdadeira origem ou da natureza do mundo no qual ela se encontra.

Em outras palavras, a teoria sugere que a nossa ignorância sobre a realidade última não significa que não saibamos nada sobre os objetos ao nosso redor. Mesmo que a mesa que vemos seja uma construção mental, como no caso de um sonho ou de uma manipulação demoníaca, ainda podemos saber o que ela faz, como interage com o mundo e como ela afeta nossa experiência. A dúvida sobre a natureza do mundo, no caso do veridicalismo estruturalista, é uma dúvida "transcendente", que não impede o conhecimento das coisas em seu contexto imediato.

No entanto, a simples existência de uma mesa, ou de qualquer outro objeto, é uma questão complexa quando se trata do ceticismo. O filósofo Valberg, ao refletir sobre o ceticismo, propôs uma visão mais detalhada da questão, dizendo que a verdadeira dúvida sobre a realidade não reside em nossos objetos de percepção, mas no próprio "horizonte pessoal" em que esses objetos aparecem. Se estivermos sonhando, a mesa que vemos não é uma mesa "real", mas uma mesa "do sonho", algo dependente da nossa mente. O ceticismo, portanto, não é apenas sobre a dúvida do mundo externo, mas sobre a própria estrutura da nossa experiência. Assim, a questão central não é saber se a mesa é real ou não, mas se podemos confiar na nossa percepção do que nos aparece, e até que ponto nossa percepção nos conecta com uma realidade externa.

Davidson, por sua vez, propôs uma outra linha de raciocínio sobre o veridicalismo, baseada na interpretação de nossas crenças. Segundo ele, as crenças mais simples, como a de que há uma mesa na frente de nós, devem ser consideradas corretas em qualquer interpretação coerente da realidade. No entanto, questões mais complexas, como as que envolvem o ceticismo sobre a nossa própria existência — por exemplo, a dúvida de que somos apenas cérebros em um tanque — não se enquadram nesse modelo simples. Para Davidson, a veracidade das nossas crenças depende da forma como elas são interpretadas, o que significa que nossas crenças mais elementares sobre o mundo não podem ser equivocadas, enquanto as mais sofisticadas podem, sim, ser suscetíveis de erro.

Ainda assim, essa interpretação traz à tona outra questão relevante: o que significa, de fato, "conhecer" algo? Se sabemos que há uma mesa à nossa frente, sabemos realmente o que essa mesa é, ou estamos apenas aceitando uma interpretação limitada da realidade? Esse é o cerne do ceticismo global, que não busca negar o que vemos, mas questionar até que ponto podemos confiar na forma como interpretamos nossa experiência do mundo.

Em última análise, todas essas teorias procuram explicar como conseguimos, ou não, ter certeza sobre a realidade. Elas desafiam a ideia de que a dúvida, por mais profunda que seja, deve necessariamente levar à negação de nossa capacidade de conhecer o mundo. A discussão entre essas diferentes formas de verificação e ceticismo continua a ser uma das questões filosóficas mais complexas e fascinantes.