O fenômeno das distorções, rumores, mentiras, desinformação e difamação, conhecidos sob a sigla DRUMS (Distortions, Rumours, Untruths, Misinformation and Smears), constitui uma força silenciosa, mas poderosa, na formação de nossas crenças e opiniões. Essas informações falsas, frequentemente disseminadas por meio das redes sociais e da internet, têm um impacto profundo na sociedade, moldando desde decisões políticas até percepções pessoais. Mas por que acreditamos nelas? A resposta reside em um conjunto de predisposições cognitivas que são profundas e difíceis de superar.

Acredita-se que a tendência humana de crer em DRUMS é um reflexo das limitações cognitivas que evoluímos para lidar com a quantidade de informação que recebemos. Em um mundo onde a internet nos bombardeia com dados de todos os tipos, o cérebro humano, que ainda carrega traços de sua evolução em tempos mais simples, não consegue processar eficientemente a sobrecarga informacional. Robert Brotherton, em seu estudo, observa que a psicologia humana tende a procurar padrões, uma habilidade que foi crucial para a sobrevivência ancestral, como prever mudanças sazonais ou identificar a presença de predadores. No entanto, quando nos sentimos inseguros ou ameaçados, nossa natureza de buscar padrões nos leva a encontrar conexões onde elas não existem, criando explicações errôneas para eventos ou fenômenos aleatórios.

Brotherton argumenta que essa necessidade de encontrar causalidade é uma característica fundamental da psicologia humana. O fenômeno das teorias da conspiração exemplifica bem isso: indivíduos que acreditam em conspirações não são necessariamente "desajustados" ou "irracionais", mas estão simplesmente respondendo a um impulso psicológico básico. A mente humana tem uma predisposição a associar eventos e buscar explicações causais, o que pode levar à formação de crenças distorcidas, mesmo quando os fatos não as sustentam.

No entanto, esta predisposição não foi intensificada pela internet. O ambiente informacional contemporâneo, impulsionado pela internet, não resultou em um aumento significativo nas crenças em conspirações, como muitos pensam. Historicamente, revoluções tecnológicas como a imprensa ou o telégrafo também foram vistas com desconfiança, com receios de que a propagação de informações de maneira acelerada traria danos à sociedade. A despeito disso, Brotherton acredita que os temores sobre o impacto negativo da sobrecarga informacional no ambiente digital são exagerados.

Já Daniel Fessler apresenta uma visão diferente. Para ele, a mente humana evoluiu de forma a ser credulosa, com uma tendência inata de acreditar no que os outros nos dizem, especialmente sobre perigos ou ameaças. Esse mecanismo de "credulidade negativamente tendenciosa" faz com que as pessoas sejam mais propensas a seguir informações relacionadas a riscos, especialmente quando as consequências de ignorá-las são vistas como muito graves. O perigo de uma falha de julgamento, nesse caso, é interpretado como mais prejudicial do que a possibilidade de acreditar em algo falso. Fessler argumenta que, devido à disseminação sem precedentes de informações, especialmente sobre perigos, a mente humana hoje está desprotegida diante do ambiente digital do século XXI. Assim, informações falsas sobre riscos e ameaças se espalham rapidamente, enquanto as avaliações mais ponderadas e verdadeiras ficam para trás, arrastadas pela maré da desinformação.

Por outro lado, a utilização de DRUMS não se limita ao campo psicológico; ela tem sido amplamente explorada em contextos políticos e sociais. Como ferramenta de manipulação, as DRUMS foram empregadas para alcançar objetivos políticos específicos, tornando-se uma arma digital estratégica. Em eventos como as eleições presidenciais dos EUA em 2016 e o referendo sobre o Brexit, as redes sociais, como Twitter e Facebook, foram usadas para espalhar informações falsas e influenciar a opinião pública. Nicolas Arpagian destaca que, assim como as tecnologias de comunicação anteriores, como a imprensa e o telégrafo, as redes sociais podem ser poderosas ferramentas de influência e manipulação. Ele alerta para o potencial de operações de influência que podem afetar as eleições, como no caso das eleições para o Congresso dos EUA em 2018, e defende uma resposta que vai desde a regulamentação até o incentivo ao pensamento crítico.

Além disso, a análise da interferência russa em eleições, como a francesa de 2017, revela a complexidade dessas operações de influência. Kevin Limonier e Louis Pétiniaud, ao investigarem as redes de influência russas, identificam uma "galáxia" de contas controladas pelo aparato estatal russo que direcionam as operações de desinformação. Esse fenômeno ilustra como a manipulação digital se estende além de simples ações diretas e envolve uma rede complexa de atores, com diferentes plataformas sendo utilizadas simultaneamente para espalhar desinformação. A ampla presença de atores terceiros nesse cenário sugere que essas redes podem operar de forma autônoma, sem a necessidade de intervenção direta de Moscovo.

No entanto, as operações de desinformação não são exclusivas de estados autoritários. No mundo democrático, o uso de "propaganda computacional" tem se mostrado cada vez mais comum. Gillian Bolsover e Philip Howard investigam o uso de técnicas avançadas de análise de dados para manipular a opinião pública. Embora a tecnologia desempenhe um papel importante nesse processo, eles argumentam que o aspecto crucial dessas operações não é apenas o domínio da tecnologia, mas sim o controle sobre ela. A capacidade de influenciar as emoções e a percepção das pessoas com mensagens manipulativas e emocionalmente carregadas depende das condições sociais que tornam as pessoas vulneráveis a tais mensagens.

Em um nível mais amplo, a questão da desinformação não diz respeito apenas às ações de governos ou de grandes atores políticos. A participação dos cidadãos comuns, especialmente em regimes autoritários como a China, tem sido um aspecto muitas vezes negligenciado nas análises de operações de influência. Embora essas operações sejam frequentemente associadas ao estado, as dinâmicas sociais e a mobilização de cidadãos comuns desempenham um papel importante na disseminação de desinformação.

É fundamental entender que, embora as DRUMS possam ser manipuladas por agentes externos, a verdadeira ameaça reside na nossa própria predisposição a acreditar nelas. Compreender os mecanismos psicológicos que nos tornam suscetíveis a esses fenômenos é essencial para desenvolver uma resistência mais forte à manipulação digital. O primeiro passo para combater a desinformação é, portanto, o autoconhecimento: entender como nossas próprias mentes funcionam e como nossas crenças podem ser moldadas por fatores externos.

Como a Manipulação Informacional Desestabiliza Estados: O Mecanismo da Autodestruição

O mecanismo de autodestruição e autoanulação penetra na estrutura interna do Estado, no seu sistema de governança, como um vírus o faz, de maneira sorrateira e espontânea. O principal alvo desse impacto informacional é a autoconsciência da população, a mentalidade da nação. A dimensão ideológica da guerra, a conquista dos corações e mentes das pessoas, é fundamental para a vitória. O lado que possui um sistema claro de ideias e uma narrativa bem definida, baseado em um entendimento prévio da população alvo, possui uma vantagem operacional clara. Dada a centralidade da ideologia na guerra, conquistar os corações e mentes da população é decisivo. Durante a Guerra Sino-Japonesa, por exemplo, Mao Zedong obteve uma vantagem significativa sobre o Japão, pois sua ideologia tinha grande apelo, motivando o povo a lutar por seus ideais, enquanto os japoneses não tinham uma ideologia a oferecer (Yamaguchi, 2012).

Parte significativa das operações de influência ocorre no nível mental. É mais fácil para o adversário alcançar seus objetivos se a sociedade do Estado atacado acredita que seu país é um Estado fracassado, que não se importa com os interesses e as necessidades de sua população, e que a perda da soberania atual trará melhores condições de vida. Assim, o descontentamento público com o desenvolvimento social e econômico do Estado pode resultar em uma vulnerabilidade significativa à segurança, caso a guerra seja conduzida por meios não militares.

Alguns objetivos principais de operações de influência incluem: estimular e apoiar ações separatistas armadas, polarizar a elite e a sociedade, desmoralizar as forças armadas, degradar estrategicamente a situação socioeconômica, intensificar crises sociopolíticas, e promover o pânico em massa, com a perda de confiança nas principais instituições governamentais. A desinformação é um dos pilares dessas operações, e a inserção de artigos em mídias russas, o uso de trolls nas redes sociais para disseminar notícias falsas ou compartilhar opiniões favoráveis aos interesses russos, e a promoção de eventos como o dia 9 de maio ou a comemoração do Ano Novo de Moscovo, são exemplos claros dessas estratégias.

Nos Estados Bálticos, os instrumentos das operações de influência russas são principalmente ONGs, grupos informais, jornalistas, acadêmicos, artistas, líderes de opinião e funcionários governamentais, que podem estar conscientes ou não de estarem sendo utilizados como tal. O objetivo é gerar descontentamento sobre questões específicas dentro de grupos sociais, estimular uma conexão mais próxima com a Rússia ou aumentar o repúdio aos valores ocidentais. O discurso dominante usado pela Rússia inclui alegações como a marginalização das minorias de língua russa, o fracasso dos Estados Bálticos como países, a corrupção generalizada, e a ideia de que a adesão à União Europeia resultou no subdesenvolvimento econômico e social.

O sucesso dessas operações depende diretamente da variável da receptividade, que pode ser analisada a partir do quadro teórico de Albert Hirschman sobre voz, saída e lealdade. A população pode expressar seu descontentamento de duas maneiras: por meio da voz, ao comunicar diretamente sua insatisfação, ou pela saída, que ocorre quando o cidadão se convence de que expressar sua opinião não resulta em mudança. A maior presença de "voz" está associada a maior lealdade, enquanto a "saída" é associada à menor lealdade. Em termos políticos, "sair" pode ter implicações graves, já que representa uma forma de alienação das estruturas do país.

Nos países ocidentais, a crise financeira mais recente e o fracasso do neoliberalismo em promover crescimento econômico resultaram no apoio crescente a partidos de extrema-direita, que criaram novas narrativas que atravessam desde o espectro político de direita até a esquerda radical. O crescimento de narrativas como o nacionalismo, o anti-globalismo, o anti-feminismo e o negacionismo climático gerou um ambiente de desconfiança e fragmentação, que pode ser explorado por agentes externos.

Ademais, em um contexto mais amplo, é crucial compreender que essas estratégias não se limitam a simples manipulação de informações. Elas visam criar um espaço de incerteza, onde o questionamento das estruturas políticas e sociais existentes se torna a norma. Essa dissensão sistemática pode, a longo prazo, levar a um processo de desintegração interna, no qual a confiança no sistema governamental e nas instituições democráticas é erodida, dando lugar a uma fragmentação social que facilita o controle externo. Além disso, a desinformação e a manipulação ideológica também têm o poder de reforçar a polarização interna, tornando mais difícil para as sociedades reconhecerem e combaterem as ameaças externas. Esse processo de alienação pode, portanto, ser visto como um mecanismo de enfraquecimento do Estado, criando uma vulnerabilidade que pode ser explorada por potências estrangeiras para desestabilizar a ordem interna sem recorrer à força militar direta.

O Nacionalismo Branco e o Impacto das Políticas Populistas no Mundo Contemporâneo

No cenário político atual, surge um fenômeno crescente e preocupante: o fortalecimento de movimentos populistas alimentados por ideologias anti-globalistas, anti-democráticas e, muitas vezes, xenofóbicas. Essas correntes, que se espalham principalmente entre os que se sentem marginalizados ou desconectados das políticas tradicionais, oferecem uma visão de mundo que se opõe aos modelos democráticos e liberais vigentes no Ocidente. Em muitos casos, esses movimentos combinam nacionalismo extremo com um ódio crescente contra instituições globais, como a União Europeia, e forças políticas, como o governo dos Estados Unidos, em um esforço para resistir à globalização e à homogeneização cultural que a acompanha.

Um dos principais alicerces desses movimentos é o sentimento de desconexão social e econômica. A globalização e o desenvolvimento tecnológico, embora tenham promovido avanços em muitas áreas, também provocaram disrupções profundas nas formas tradicionais de reprodução social. O modelo em que uma pessoa trabalha, forma uma família e garante uma vida melhor para seus filhos por meio da educação e do trabalho, já não se sustenta da mesma maneira que antes. Profissões antes consideradas essenciais desapareceram, e um diploma universitário, que um dia significava um futuro promissor, já não garante um emprego estável, especialmente para as novas gerações. Esse mal-estar econômico, combinado com o desemprego estrutural, se traduz em uma sensação de frustração e desilusão com o sistema político e econômico vigente.

Esse sentimento de desconfiança foi amplificado pela crescente onda de imigrantes que, segundo muitos, representam uma ameaça à possibilidade de encontrar trabalho e estabilidade. Embora os dados sobre o impacto real da imigração sobre o mercado de trabalho sejam debatíveis, a percepção de que imigrantes competem diretamente por vagas de emprego tem gerado tensão social. No entanto, é importante entender que esse medo pode ser utilizado de forma manipulativa por políticos que buscam angariar apoio popular.

Outro aspecto importante é a transformação da sociedade ocidental em uma sociedade pós-moderna, marcada pela incerteza e pela nostalgia de um passado idealizado. O futuro, que antes parecia claro e promissor, agora é incerto, e o passado, com seus valores e normas bem definidos, é retratado como uma era dourada perdida. Exemplos recentes, como o Brexit, a ascensão de políticos de extrema-direita e o aumento das narrativas anti-ocidentais dentro dos próprios países ocidentais, são manifestações claras dessa tendência. As incertezas alimentam um terreno fértil para operações de influência externas que buscam explorar as fragilidades internas desses países.

Compreender essas dinâmicas é essencial para desenvolver estratégias eficazes de resistência e resiliência frente a essas influências. A resistência começa com a capacidade de monitorar e analisar o ambiente informativo e social. Em um mundo onde a desinformação se espalha rapidamente, a preparação estratégica é fundamental para neutralizar as ameaças externas e internas que buscam minar as bases das democracias ocidentais. A análise constante do público-alvo (Target Audience Analysis - TAA) é um ponto crucial. Ela permite identificar as fraquezas da sociedade, os fatores que podem ser explorados e as áreas onde é necessário reforçar a confiança nas instituições.

A integração de resiliência nas políticas de defesa contra a guerra informacional exige uma comunicação eficaz com a população, criando uma narrativa que promova a resistência ao influenciamento externo. A confiança no governo e nas instituições é, muitas vezes, abalada pela percepção de corrupção e ineficácia. Portanto, é imperativo que as autoridades não utilizem estratégias de relações públicas superficiais, mas que se engajem em uma comunicação transparente, aceitando críticas e discutindo abertamente os problemas e falhas políticas.

Além disso, a preparação para operações de influência estrangeira deve ser uma prioridade. O governo deve antecipar essas operações e informar a população sobre as intenções e interesses dos adversários. Em um cenário de desinformação crescente, a transparência e a educação crítica se tornam os principais aliados na preservação da coesão social e na proteção das instituições democráticas.

O fortalecimento da resiliência social não se limita ao controle da desinformação, mas também envolve a promoção de um debate mais profundo sobre as causas subjacentes dos problemas sociais e econômicos. A verdadeira resistência não está apenas na capacidade de reagir às manipulações externas, mas em restaurar a confiança da população nas instituições políticas, sociais e econômicas, que se encontram distantes das necessidades e preocupações do povo.