Os retrovírus, lentivírus e adenovírus representam sistemas fundamentais utilizados na engenharia genética para a terapia de doenças, incluindo o câncer. Cada um desses vírus tem um modo distinto de funcionamento, mas todos compartilham a capacidade de introduzir material genético nas células, um passo crucial na construção de terapias baseadas em células modificadas geneticamente.
Os retrovírus e lentivírus entram nas células imunes por fusão com a membrana celular, após o reconhecimento de receptores específicos presentes na superfície das células alvo. Uma vez dentro da célula, o RNA viral é convertido em DNA complementar pela enzima transcriptase reversa. Esse DNA é então transportado para o núcleo, onde se integra ao genoma da célula hospedeira. Esse processo de integração permite que o DNA viral seja transcrito e traduzido pelas próprias enzimas da célula, expressando proteínas virais que podem ter funções terapêuticas, como a produção de receptores quiméricos de antígenos (CARs), importantes para terapias de células T.
No caso dos adenovírus, o mecanismo é ligeiramente diferente. Os adenovírus se ligam a um receptor específico na superfície da célula, o receptor de coxsackievirus e adenovírus (CAR), e entram na célula por endocitose. Dentro dos endossomos, os adenovírus se desintegram, liberando seu DNA, que também é transportado para o núcleo. O DNA viral é então expresso para gerar as proteínas desejadas. Esse tipo de vetor é frequentemente utilizado em estratégias que buscam não integrar o DNA viral ao genoma da célula hospedeira, sendo uma escolha útil para terapias em que a expressão temporária de genes é suficiente.
Entre os retrovírus, o γ-retrovírus se destaca no campo clínico. Sua capacidade de integrar permanentemente material genético ao DNA da célula hospedeira o torna uma ferramenta poderosa para transferências genéticas de longo prazo. Ele pode transportar grandes volumes de informação genética, o que é especialmente útil quando se busca a entrega de genes terapêuticos grandes, como os que codificam os CARs. Além disso, a integração estável do gene terapêutico ao genoma da célula hospedeira permite a expressão duradoura da proteína, uma característica essencial para a eficácia de tratamentos como as terapias de células CAR-T.
O γ-retrovírus tem sido usado em uma série de ensaios clínicos, incluindo aqueles com células NK (Natural Killer) geneticamente modificadas, e tem mostrado resultados terapêuticos impressionantes, como em um estudo com pacientes com tumores positivos para CD19, onde a resposta foi extremamente positiva, com muitos pacientes apresentando remissão completa. Além disso, sua utilização se expandiu para as terapias CAR-T aprovadas, como Yescarta e Tecartus, estabelecendo-o como um vetor essencial para o tratamento de cânceres hematológicos.
Por outro lado, os lentivírus são ferramentas altamente versáteis na modificação genética de células. Derivados do HIV-1, esses vírus têm a vantagem de poder infectar tanto células em divisão quanto células quiescentes, como as células T, sem a necessidade de divisão celular. Essa característica torna os lentivírus ideais para a engenharia de células imunes, como as células T, que precisam ser modificadas em estados de descanso para evitar toxicidade durante as terapias. As modificações de segurança nos lentivírus, como sistemas auto-inativantes e a remoção de genes acessórios, como os que codificam para proteínas virais indesejáveis (vif, vpr, vpu, nef), aumentaram a segurança desses vetores, tornando-os mais adequados para uso clínico.
A evolução dos lentivírus em sistemas de terceira geração, que incorporam recursos de biossegurança como a divisão dos genes virais essenciais em plasmídeos distintos, aprimorou ainda mais seu uso terapêutico. Esses vetores são amplamente empregados em tratamentos baseados em células T geneticamente modificadas, como no caso das terapias CAR-T, e continuam a desempenhar um papel central na imunoterapia do câncer.
Além das terapias com retrovírus e lentivírus, o campo de vetores virais está em constante evolução, incluindo o uso de técnicas não virais, como a transdução mediada por lipídios ou nanopartículas lipídicas, que transportam mRNA e outras moléculas genéticas diretamente para as células. Esses métodos não envolvem a inserção do gene no genoma da célula hospedeira, o que pode ser desejável em certos tratamentos.
Essas novas abordagens tecnológicas estão rapidamente se expandindo, oferecendo uma gama de opções para a modificação genética de células em terapias de câncer e outras condições. A manipulação do material genético de forma precisa e segura representa um dos maiores avanços na medicina moderna, particularmente no desenvolvimento de terapias personalizadas.
É essencial que os leitores compreendam que, embora a promessa de terapias baseadas em células geneticamente modificadas seja grande, elas envolvem desafios significativos, incluindo a necessidade de garantir a segurança a longo prazo e a eficácia dessas terapias. Além disso, o uso de vetores virais, embora altamente eficaz, deve ser cuidadosamente monitorado para evitar complicações, como a ativação indesejada de genes que poderiam levar ao desenvolvimento de câncer ou outras doenças. Por fim, o avanço contínuo na ciência dos vetores virais e das metodologias de engenharia genética promete transformar ainda mais a maneira como tratamos doenças complexas como o câncer.
Como a engenharia genética das células CAR-T está revolucionando a imunoterapia contra o câncer?
As células CAR-T têm se destacado como uma das estratégias mais promissoras na imunoterapia contra o câncer, demonstrando eficácia notável em modelos murinos e avançando rapidamente para testes clínicos. A utilização de tecnologias de edição genômica como CRISPR/Cas9, TALEN e ZFN potencializa a performance dessas células, permitindo modificações específicas e controladas que ampliam suas capacidades terapêuticas.
A tecnologia TALEN consiste em uma enzima de restrição sintética composta por três módulos estruturais: um segmento N-terminal com sinal de localização nuclear, uma região central com repetições TALE para reconhecimento específico do DNA, e uma parte C-terminal com domínio nucleolítico FokI. Ao se ligar a sequências específicas do DNA, TALEN gera quebras de fita dupla que podem ser reparadas por mecanismos celulares endógenos, como a reparação dirigida por homologia (HDR) ou a junção de extremidades não homólogas (NHEJ). Essa precisão tem sido empregada para desenvolver terapias CAR-T alogênicas universais, como demonstrado por Jo et al., que modificaram simultaneamente loci TRAC e B2M para produzir células T CAR-T hipoimunogênicas, capazes de evitar a doença do enxerto contra o hospedeiro (GvHD) e resistir à eliminação por células NK e linfócitos T alorreativos. Esses avanços evidenciam o potencial da engenharia TALEN para aprimorar a persistência e eficácia das células CAR-T no combate tumoral.
De modo semelhante, as nucleases de dedo de zinco (ZFNs) combinam arrays personalizáveis de dedos de zinco para reconhecimento específico do DNA com o domínio catalítico FokI para indução de quebras específicas. ZFNs têm sido aplicadas no desenvolvimento de terapias CAR-T “off-the-shelf”, que eliminam riscos imunológicos ao desativar genes relacionados ao receptor de células T (TCR) e aos antígenos HLA, promovendo aceitação e funcionalidade prolongada das células. Em estudos recentes, ZFNs foram usados para criar células CAR-T universais resistentes à supressão por glicocorticoides, mantendo seu potencial citotóxico mesmo sob tratamentos imunossupressores. Esses dados iniciais indicam a segurança e a eficácia das células CAR-T alogênicas modificadas por ZFN, reforçando seu papel como alternativas prontas para uso clínico.
A imunoterapia baseada em células geneticamente modificadas redefine o paradigma do tratamento do câncer ao reforçar o sistema imune do paciente para reconhecer e destruir células malignas com alta especificidade. No entanto, a heterogeneidade molecular de doenças como a leucemia mieloide aguda (LMA) impõe desafios significativos, como a resistência a terapias direcionadas a antígenos únicos e a alta taxa de recidiva. Para contornar essas dificuldades, plataformas bispecíficas de CAR-T foram desenvolvidas para atacar simultaneamente múltiplos antígenos associados à LMA, como CD123 e CD33, mostrando atividade citotóxica robusta e prolongada. Além disso, mecanismos de segurança integrados, como o uso do alemtuzumabe para controle funcional, permitem uma regulação precisa da resposta imunológica, aumentando a segurança do tratamento.
Na oncologia de tumores sólidos, como o glioblastoma, a monoterapia com CAR-T direcionada a um único antígeno pode ser insuficiente devido à ocorrência de variantes tumorais que escapam do reconhecimento imunológico. Estratégias bispecíficas, como as células TanCAR que combinam domínios para HER2 e IL13Rα2, promovem a ativação sinérgica das células T, resultando em citotoxicidade mais eficiente e prolongada contra as células tumorais. A capacidade de reconhecimento simultâneo de múltiplos antígenos representa uma inovação que pode superar as limitações do escape imune e aumentar o sucesso clínico das terapias CAR-T.
É fundamental compreender que o avanço dessas terapias depende não apenas da edição precisa do genoma, mas também da complexa interação entre as células modificadas e o microambiente tumoral. A resistência imunológica, a heterogeneidade antigênica e os mecanismos de escape permanecem desafios cruciais que exigem abordagens multifacetadas e contínua inovação biotecnológica. Além disso, o desenvolvimento de estratégias que equilibrem eficácia antitumoral e segurança do paciente, incluindo sistemas de controle para modular a atividade das células CAR-T, é essencial para a transição bem-sucedida dessas terapias para a prática clínica rotineira.

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