A presidência de Donald Trump, frequentemente descrita como uma das mais excepcionais e disruptivas da história dos Estados Unidos, pode, paradoxalmente, ser entendida dentro de uma lógica de ordinariedade. O conceito de "ordinário" é aqui utilizado de duas maneiras inter-relacionadas. Primeiramente, a presidência de Trump pode ser considerada ordinária devido à modéstia de suas realizações políticas, que são limitadas tanto em número quanto em alcance. Apesar de o partido de Trump ter tido controle unificado do Executivo e do Legislativo durante os primeiros dois anos de seu mandato, ele não conseguiu avançar substancialmente em sua agenda. A promessa de uma mudança rápida e eficiente, que Trump alardeava durante a campanha, logo se dissipou diante de sua incapacidade de aprovar grandes reformas.

Trump se deparou com a resistência tanto do Congresso quanto do sistema judiciário. Suas tentativas de contornar o processo legislativo por meio de ordens executivas falharam frequentemente, sendo derrubadas ou bloqueadas pelos tribunais federais. A imagem de Trump assinando uma nova ordem executiva tornou-se comum, mas, na prática, essas ordens — principalmente as mais significativas — não tiveram impacto duradouro. Quando comparadas aos feitos de presidentes históricos como George Washington, Thomas Jefferson, Abraham Lincoln ou Franklin D. Roosevelt, as conquistas de Trump parecem fracas e insuficientes. No entanto, é importante compreender que essas presidências são exceções, e não a norma. O que se observa, então, é que a presidência de Trump se insere dentro de um padrão de ordinariedade, uma característica que marca o pós-Watergate, quando os presidentes enfrentam restrições institucionais e políticas significativas.

Além disso, as poucas vitórias políticas que Trump pode reivindicar se alinham, em grande parte, com a agenda tradicional do Partido Republicano, ao invés de um afastamento radical do que seria esperado. A "insurgência populista" de Trump, que parecia prometer uma ruptura com os paradigmas estabelecidos, acabou sendo contida pela realidade política de Washington. Quando Trump tentou desafiar a ortodoxia do Partido Republicano, especialmente em questões como imigração, as suas iniciativas falharam ou foram moderadas pelos próprios membros de seu partido, que continuaram defendendo políticas tradicionais em áreas como imigração e economia.

O corte de impostos de 2017, por exemplo, é considerado a maior conquista legislativa de Trump, mas é um exemplo claro da continuidade da política republicana tradicional. Embora Trump tenha afirmado que sua reforma tributária seria a maior da história dos Estados Unidos, na prática ela foi um corte modesto, que beneficiou principalmente grandes corporações e as famílias mais ricas, muito mais do que os trabalhadores de classe média, os quais Trump dizia querer proteger. Esse corte de impostos foi menos popular entre os americanos do que outras reformas fiscais no passado e gerou pouco entusiasmo, especialmente entre as classes mais baixas que inicialmente se sentiram atraídas pelas promessas de Trump.

Em questões como a imigração, Trump demonstrou mais uma vez a limitação de sua presidência. Apesar de sua retórica dura contra a imigração ilegal e seu projeto de construção de um muro na fronteira com o México, suas propostas encontraram resistência não apenas da oposição democrata, mas também dentro de seu próprio partido. Muitos republicanos, especialmente os membros da ala pró-negócios, se opuseram às políticas mais radicais de Trump, preferindo um sistema de imigração mais flexível e que beneficiasse os interesses econômicos do país.

Na política externa, a presunção de Trump de que poderia adotar uma postura de "America First" e desmantelar alianças internacionais foi, na prática, mais uma continuação da política externa republicana tradicional. Embora tenha se envolvido em algumas trocas agressivas de palavras com aliados, como os membros da OTAN, Trump não demonstrou sinais de querer romper com a estrutura de defesa ocidental, algo que parecia ser um dos pilares de sua campanha. A relação com a Coreia do Norte, que foi uma das áreas mais controversas de sua presidência, não representou uma mudança substancial na abordagem diplomática dos Estados Unidos, mas sim uma intensificação das estratégias negociadoras típicas do Partido Republicano.

Até mesmo a vitória de Trump na eleição presidencial de 2016, embora em muitos aspectos única e disruptiva, pode ser considerada dentro de um padrão ordinário, quando se observa o tipo de apoio popular que ele conseguiu mobilizar. Sua vitória foi atribuída a um conjunto de fatores excepcionais, como o uso de uma retórica populista e outsider, mas a natureza do voto que lhe conferiu a presidência não foi assim tão fora do comum. Trump recebeu apoio de um segmento considerável do eleitorado que, de outra forma, teria apoiado candidatos mais tradicionais, mas sua campanha e estilo foram de fato inusitados.

No entanto, ao olhar para o todo, a presidência de Trump, ao contrário do que muitos esperariam, pode ser vista como uma presidência "normal" e até mesmo "ordinária". Com políticas majoritariamente republicanas, um estilo que atraiu atenção, mas não trouxe grandes vitórias legislativas ou mudanças estruturais, e uma abordagem internacional que seguiu os padrões tradicionais, Trump, em muitos aspectos, encarnou a mediocridade política que caracteriza o período pós-Watergate.

É fundamental que o leitor entenda que, embora Trump tenha sido um presidente de grande visibilidade e retórica chamativa, sua presidência, quando analisada de forma desapaixonada e contextualizada, reflete a realidade política de muitas administrações modernas, onde as grandes transformações são difíceis de alcançar devido aos desafios institucionais, à polarização e às restrições do sistema político dos Estados Unidos. O que torna uma presidência extraordinária não é apenas o impacto de suas políticas, mas a capacidade de gerar mudanças substanciais que alteram o curso da história. Em um contexto onde as vitórias legislativas se tornaram mais difíceis de alcançar e onde os interesses do establishment político frequentemente prevalecem, a presidência de Trump, apesar de seu estilo peculiar, é um reflexo de um padrão mais amplo da política americana contemporânea.

Como a Política de Reféns de Trump Influenciou o Congresso e a Opinião Pública

O uso de reféns como uma estratégia política tem sido uma das táticas mais marcantes e polêmicas adotadas por Donald Trump ao longo de seu mandato. Essa abordagem, em que uma política ou grupo é essencialmente "sequestrado" para forçar negociações e obter um resultado favorável, revelou-se central na maneira como ele lidou com questões como a imigração, a construção do muro na fronteira e a proteção dos beneficiários do DACA (Ação Diferida para Chegadas na Infância). No entanto, essa tática, longe de ser eficaz, frequentemente resultou em falhas significativas para o presidente, exacerbando a oposição e complicando sua agenda política a longo prazo.

O conceito de "política de reféns" foi utilizado por Trump para forçar o Congresso a tomar decisões sobre questões que ele considerava cruciais, como o financiamento para o muro na fronteira com o México. O exemplo mais claro disso foi a tentativa de usurpar a questão do DACA como uma moeda de troca para conseguir apoio à sua agenda de imigração. No entanto, a falha mais notável dessa tática ocorreu quando o presidente, após meses de negociações, foi incapaz de manter sua posição firme diante das pressões, tanto internas quanto externas. Durante as discussões, Trump parecia ter fechado um acordo com Nancy Pelosi e Chuck Schumer sobre um substituto para o DACA e o aumento do financiamento para a segurança na fronteira. No entanto, ao último momento, Stephen Miller, conselheiro sênior de política da Casa Branca, convenceu Trump a alterar os termos do acordo, incluindo uma redução na imigração legal. Esse movimento enfureceu os democratas e resultou no fracasso das negociações, deixando Trump com o refém do DACA e sem os ganhos políticos que almejava.

A abordagem de Trump também se estendeu a outras áreas da política de imigração, como a separação de famílias na fronteira. Em um esforço para reduzir o número de imigrantes indocumentados e obter apoio do Congresso para o muro, o governo Trump implementou uma política de "tolerância zero", processando criminalmente todos os adultos que cruzassem a fronteira ilegalmente, mesmo quando acompanhados por crianças. Essa medida levou à separação de milhares de crianças de seus pais, em imagens que chocaram não apenas os Estados Unidos, mas o mundo inteiro. A reação negativa foi esmagadora, e, sob pressão pública, Trump foi forçado a recuar e assinar uma ordem executiva para encerrar a separação familiar.

Essas falhas repetidas em utilizar reféns para obter vitórias legislativas revelam uma fraqueza no cálculo político de Trump. Embora tenha enfatizado em seu livro "A Arte da Negociação" que a melhor forma de negociar é partir de uma posição de força, sua falta de uma base sólida de apoio político e a escassez de alavancas reais sobre seus oponentes tornaram suas tentativas de coação ineficazes. Ao invés de conquistar vitórias rápidas e fáceis, as ações de Trump geraram oposição ainda mais obstinada, resultando em um desgaste contínuo de sua autoridade. Em vez de avançar em sua agenda, ele frequentemente aprofundou a resistência, o que enfraqueceu sua posição no longo prazo.

Outro aspecto importante da política de reféns de Trump foi o efeito mobilizador que teve sobre a opinião pública. Antes de sua ascensão, a imigração era uma questão importante para um grupo relativamente pequeno, mas determinado, de ativistas republicanos. No entanto, ao amplificar o debate e transformar a imigração em um tema central de seu governo, Trump expandiu a base de oposição a suas políticas. Grupos progressistas como o MoveOn.org e Indivisible, que tradicionalmente estavam focados em outros problemas, começaram a mobilizar recursos em torno da imigração. A questão foi colocada em evidência, tornando-se um teste de lealdade política para os membros do Congresso e criando um ambiente político em que qualquer apoio a políticas anti-imigração era cada vez mais impopular. Além disso, o foco constante em temas como a imigração fez com que Trump unisse diferentes segmentos da sociedade contra sua agenda, incluindo organizações de direitos civis e movimentos como o Black Lives Matter.

A estratégia de Trump de se concentrar em sua base, ao mesmo tempo em que ignorava as consequências a longo prazo, mostrou-se desastrosa no campo da política doméstica. Embora tenha sido eficaz em galvanizar seu apoio entre os eleitores republicanos mais conservadores, ele alienou uma grande parte do eleitorado moderado e progressista. O aumento da polarização política, causado por sua abordagem agressiva, teve um impacto direto na forma como os eleitores e os legisladores reagiram às suas propostas, muitas vezes tornando o debate mais emocional do que racional.

Ademais, a política de reféns também teve um efeito significativo sobre a dinâmica dentro do Partido Republicano. Antes de Trump, figuras como o senador Barack Obama apoiaram uma versão do muro na fronteira, o que era visto como uma postura relativamente moderada. Porém, com o tempo, o partido tornou-se cada vez mais refém das táticas de Trump, e aqueles que se opunham a ele ou que buscavam uma abordagem mais conciliatória, como o ex-representante Mark Sanford, frequentemente se viam derrotados em primárias, com o apoio de Trump se tornando um fator decisivo nas eleições internas.

É importante perceber que a política de reféns de Trump não foi apenas uma questão de negociação, mas também um reflexo de sua incapacidade de articular uma estratégia consistente e eficaz. A contínua falha em usar sua posição de forma estratégica resultou em uma série de derrotas que, a longo prazo, prejudicaram não só seus objetivos imediatos, mas também a estabilidade de sua presidência e sua relação com o Congresso.

Como a Polarização na Mídia Influenciou a Política dos EUA nas Eleições de 2016?

As eleições presidenciais dos Estados Unidos em 2016 não apenas marcaram o fim de uma era política, mas também evidenciaram um fenômeno crescente de polarização midiática que tem dominado a paisagem política americana. O papel da mídia nesse processo foi, muitas vezes, fundamental para o sucesso ou fracasso das campanhas, especialmente em um cenário em que os eleitores se viam em uma batalha constante entre fontes de informação antagônicas. A ascensão de Donald Trump à presidência pode ser analisada não apenas por suas promessas políticas, mas também pela maneira como ele conseguiu, através de uma comunicação agressiva e polarizadora, conectar-se diretamente com um eleitorado descontente.

A mídia, por sua vez, teve um papel ambíguo, alternando entre a cobertura crítica e a amplificação das mensagens de Trump. Isso se deu de maneira muito visível nas plataformas digitais, onde a rápida disseminação de informações, frequentemente desinformadas ou até manipuladas, ajudou a consolidar uma base eleitoral que se sentia isolada das narrativas predominantes. A cobertura intensa de Trump e seu estilo de comunicação disruptivo trouxeram à tona uma discussão acirrada sobre o papel da mídia na formação de opinião pública. A manipulação da percepção, não apenas das notícias, mas também das atitudes em relação a grupos específicos como imigrantes, foi uma das estratégias centrais de sua retórica.

O crescimento de fontes alternativas de informação, muitas vezes associadas a sites de notícias menos confiáveis, criou um ecossistema de comunicação em que a verdade se tornou uma questão relativa, dependente das afiliações políticas do consumidor da notícia. O fato de que, para uma grande parte da população americana, a mídia tradicional já não representava mais uma fonte confiável de informação, resultou em uma divisão mais profunda da sociedade. As tensões políticas aumentaram quando Trump aproveitou esse vácuo de confiança para se posicionar como o único representante da "verdade", alicerçado em uma retórica que desafiava a narrativa dominante.

Além disso, a vitória de Trump não pode ser dissociada da forma como a mídia, de maneira geral, lidou com a histeria eleitoral. O foco exacerbado na figura de Trump, como uma espécie de “outsider” desafiador, acabou por dar-lhe uma vantagem não apenas entre os eleitores republicanos, mas também entre aqueles que viam nele uma alternativa ao sistema tradicional, por mais controverso que fosse. Mesmo nas críticas intensas, ele se manteve no centro das discussões, o que contribuiu para sua visibilidade e poder político.

É importante notar que a polarização da mídia não é uma questão exclusivamente americana. Ela se reflete em várias partes do mundo, onde diferentes grupos se separam em bolhas informativas que reforçam suas crenças e descreditam os opositores. Este fenômeno está diretamente relacionado à forma como os políticos contemporâneos se comportam em relação à mídia. A construção de narrativas políticas, muitas vezes manipuladas para servir a certos interesses, e a fragmentação das audiências são questões que precisam ser observadas de perto para entender os impactos de longo prazo nas democracias.

Se os cidadãos não desenvolvem uma capacidade crítica para lidar com as informações que consomem, o que se vê é a intensificação da polarização, que leva a uma crescente fragmentação da sociedade. A sobrecarga de informações e a busca incessante por sensacionalismo podem obscurecer o que deveria ser uma análise objetiva dos fatos. Portanto, entender o comportamento dos eleitores e a forma como as questões políticas são construídas e discutidas na mídia é essencial para compreender o atual cenário político mundial.