O apoio a figuras como Donald Trump está frequentemente envolto em estereótipos e simplificações que falham em capturar a complexidade das motivações de seus seguidores. As narrativas predominantes, que associam os apoiadores de Trump a características como pobreza, falta de educação, velhice ou um contexto rural e religioso, são, em muitos casos, imprecisas e redutoras. Essas descrições, embora amplamente disseminadas, carecem de profundidade e falham em explicar o fenômeno de apoio à Trump de forma adequada.

Ao longo das eleições de 2016, a ideia predominante era de que o eleitorado de Trump consistia majoritariamente de homens brancos, pobres e desinformados. Muitos viam seus eleitores como vítimas da globalização, deslocados pela perda de empregos em fábricas ou pela concorrência de imigrantes no mercado de trabalho. No entanto, um olhar mais atento aos dados revela um quadro bem diferente. Por exemplo, os eleitores de Trump em 2016 não eram, em sua maioria, economicamente empobrecidos. Na verdade, muitos pertenciam a faixas de renda média a alta, com a maior margem de vitória de Trump ocorrendo entre aqueles que ganhavam entre $70.000 e $120.000 anuais. Esses dados sugerem que a pobreza e a insegurança financeira não foram as principais motivações para o apoio a Trump, contrariando a narrativa de que seus eleitores eram parte de uma classe trabalhadora esmagada pela economia.

Além disso, a ideia de que os eleitores de Trump eram economicamente oprimidos ou marginalizados também não se sustenta quando analisamos dados sobre a percepção de segurança financeira. Estudos indicam que os apoiadores de Trump não se sentiam menos seguros financeiramente do que o restante da população; na verdade, alguns até se sentiam mais seguros, o que desafia a visão de que a crise econômica levou pessoas ao apoio de políticas nacionalistas e populistas.

O verdadeiro núcleo de apoio de Trump não é formado por um grupo homogêneo de pessoas em situação de dificuldades econômicas, mas sim por um conjunto de indivíduos cujas crenças e atitudes estão profundamente enraizadas em uma forma de segurança psicológica que transcende a lógica econômica. O fenômeno do apoio a Trump está, portanto, mais ligado a uma mentalidade securitária, um desejo de proteção contra o que é percebido como uma ameaça externa e interna ao status quo, do que a uma simples reação contra as dificuldades econômicas. A defesa de uma ordem social mais rígida, a aversão a mudanças rápidas e o desejo de preservar uma identidade nacional claramente definida são características que marcam esse grupo.

De maneira geral, a divisão entre os eleitores de Trump e seus opositores não pode ser vista apenas como uma oposição entre os “ricos” e os “pobres” ou os “informados” e os “ignorantes”. Em vez disso, essa divisão é mais complexa e envolve diferentes orientações em relação à vida social e política. Em muitos casos, o apoio a Trump pode ser visto como uma manifestação de um medo profundo e de uma desconfiança em relação ao futuro, ao que é estranho e ao que ameaça a ordem percebida como natural ou tradicional.

Além disso, as narrativas que descrevem os apoiadores de Trump como uma massa uniformemente desinformada ou irreconhecível falham em perceber a diversidade dentro desse grupo. Nem todos os apoiadores de Trump compartilham as mesmas motivações ou crenças, e há uma gama de fatores que influenciam a decisão de apoio a ele, desde o desejo de defender uma visão particular da identidade nacional até o apoio a políticas específicas, como a redução de impostos e a imigração controlada. Cada um desses fatores contribui para a complexidade do apoio a Trump e dos apoiadores de figuras similares ao redor do mundo.

A melhor abordagem para compreender o apoio a Trump, e a outros líderes com visões semelhantes, é evitar simplificações e procurar entender as motivações profundas que alimentam esse fenômeno. Trabalhar com as informações que temos sobre a mentalidade securitária, por mais alienígena e repulsiva que ela possa parecer a um público mais liberal, é um passo essencial para construir uma sociedade mais construtiva e, possivelmente, mais unida. A beligerância, o ataque direto e os epítetos desdenhosos não contribuem para o diálogo e só aprofundam as divisões.

Além disso, a compreensão do comportamento político exige uma análise de fatores psicossociais, como o medo do desconhecido, a busca por estabilidade e a necessidade de se sentir parte de uma comunidade coesa. A segurança, tanto em termos materiais quanto psicológicos, é um valor central para muitos, e líderes como Trump exploram esses sentimentos ao se apresentarem como salvadores da ordem estabelecida. A construção de uma resposta política eficaz, então, requer uma compreensão empática dessas necessidades e uma disposição para engajar de maneira construtiva, não através de acusações ou ridicularização.

Democracia em Perigo: O Que Está Realmente em Jogo?

A história dos Estados Unidos está repleta de episódios que expõem a fragilidade dos direitos democráticos. Desde a detenção de cidadãos durante a Segunda Guerra Mundial, passando pelo macarthismo dos anos 1950 e as lutas pelos direitos civis nos anos 1960, até as exclusões sistemáticas de mulheres e negros da cidadania plena — a democracia nunca foi uma realidade garantida. O ponto a ser enfatizado não é que o país sobreviveu a esses ataques anteriores e, portanto, sobreviverá a outros. A lição mais profunda é que a democracia está sempre em risco. Ela exige vigilância constante, coragem contínua e, sobretudo, comprometimento incondicional com seus princípios, mesmo quando isso significa abrir mão de vitórias políticas imediatas.

A era pós-Trump não será um simples retorno ao status quo anterior. A democracia americana sofreu abalos que deixaram cicatrizes institucionais e normativas profundas. A disposição de Donald Trump em questionar a legitimidade de uma possível derrota e sua tendência a subverter instituições democráticas geraram temores realistas de uma crise constitucional. Ainda que o pior cenário não se concretize, os alicerces de uma democracia funcional foram enfraquecidos. A normalização da intolerância, da deslegitimação do adversário político, do flerte com a violência e da disposição para restringir liberdades civis já teve um custo.

Steven Levitsky e Daniel Ziblatt identificaram quatro ameaças centrais à democracia: o enfraquecimento do compromisso com as regras do jogo democrático, a negação da legitimidade dos opositores, a aceitação ou incentivo à violência, e a disposição de restringir liberdades civis e da imprensa. Essas ameaças não são teóricas ou distantes: elas se concretizaram na retórica e na prática do trumpismo. Seus seguidores — os chamados “securitários” — acreditam que a preservação da segurança dos “de dentro” justifica ações não democráticas. Para eles, a segurança é um valor não-negociável, e, se for necessário sacrificar a democracia para garanti-la, que assim seja.

Essa lógica esteve presente quando, nos anos 1980, figuras como Ronald Reagan e Oliver North violaram uma lei aprovada democraticamente para evitar a ascensão de um governo considerado ameaçador na Nicarágua. A fidelidade dos securitários não é à legalidade ou à democracia, mas à manutenção da ordem interna e da hierarquia dos “insiders”.

Embora seja possível que os valores democráticos se restabeleçam, é mais plausível que alguns danos sejam permanentes. A democracia não é uma inclinação natural da espécie humana; ela depende de normas frágeis como a tolerância mútua e o autocontrole institucional. Quando esses pilares ruem, os líderes e cidadãos passam a questionar se ainda vale a pena jogar pelas regras quando o outro lado claramente não o faz. O resultado é uma espiral de desconfiança e ruptura normativa. O futuro da democracia dependerá, em grande parte, da disposição dos líderes futuros em reconstruir essas normas — com transparência, cooperação, responsabilidade e disposição para serem fiscalizados.

A polarização atual não é apenas ideológica — é visceral. Os cientistas políticos Marc Hetherington e Jonathan Weiler argumentam que, quando disputas políticas se alinham com visões de mundo fundamentais, o ambiente político se torna tóxico, polarizado e intransigente. É exatamente isso que vivemos hoje. A divisão entre securitários e “unitaristas” — aqueles que veem o mundo como uma comunidade global onde as distinções entre "nós" e "eles" devem ser superadas — reflete uma das mais antigas clivagens evolutivas: como lidar com o outro, o diferente, o estranho. Quando a política se alinha a essa divisão, como ocorreu na Guerra Civil ou nos anos 1960, o conflito é inevitável, e a reconciliação, exaustiva.

Entender que a motivação principal dos veneradores de Trump é a segurança é um começo, mas está longe de ser suficiente. Democracia exige compromisso mesmo quando se está perdendo. Os securitários, por sua natureza, não estão dispostos a esse sacrifício, pois, em sua visão, deixar a segurança dos insiders à mercê dos caprichos democráticos é impensável. Já os unitaristas, se pressionados, também poderiam abrir mão da democracia — mas em nome de salvar o planeta, redistribuir riqueza ou promover justiça social. Para eles, se a sobrevivência do mundo está em jogo, qual é a utilidade de regras democráticas?

A compreensão fundamental, porém, é que para a base trumpista, a ausência de segurança pessoal e a ameaça aos insiders é equivalente ao colapso do planeta. Essa lógica pode parecer absurda para quem não compartilha dessa visão, mas ignorá-la é o mesmo que fechar os olhos à realidade política contemporânea. Sem esse entendimento, qualquer tentativa de diálogo ou mediação está fadada ao fracasso.

Existe, sim, uma possibilidade de avanço: reconhecer as fronteiras que nos dividem. Os securitários precisam aceitar que a segurança total é inatingível e que seu desejo constante por proteção absoluta é, muitas vezes, contraproducente. Já os unitaristas precisam reconhecer que a dissolução imediata das distinções entre dentro e fora é uma utopia inviável. As filosofias desses dois grupos são irreconciliáveis, mas a maioria das questões concretas que os separam — imigração, por exemplo — possui soluções intermediárias. A condição para qualquer progresso está na renúncia à sacralização das posições políticas. O conflito é menos político e mais psicológico.

Durante a pandemia de COVID-19, quando a cooperação era mais necessária, o presidente Trump optou por acentuar divisões, chamando o vírus de “chinês” e incentivando uma narrativa de culpa externa. Seus apoiadores, como o senador John Cornyn, ecoaram esse discurso com comentários depreciativos sobre a cultura chinesa. Essa retórica, amplamente criticada como racista, ilustra perfeitamente a divisão securitário-unitarista: os primeiros enxergam a ameaça em termos de “nós contra eles”; os últimos pedem cooperação e solidariedade global. Enquanto uns querem erguer muros para se proteger dos perigos externos, outros querem construir pontes para resolver os desafios coletivamente.

A democracia só florescerá quando for sustentada não apenas por leis e instituições, mas por uma cultura que valorize o compromisso com o outro, com o diferente, com o dissenso. O futuro dependerá menos de reformas políticas e mais da reconstrução de disposições psicológicas que tornem possível, novamente, o ato de viver juntos, mesmo em desacordo.

Como os sistemas de defesa do ego influenciam a política e as identidades sociais?

Os sistemas de defesa do ego são mecanismos psicológicos que ajudam os indivíduos a proteger sua autoestima, mantendo uma imagem coerente de si mesmos e de suas crenças. Tais mecanismos desempenham um papel fundamental na formação e na manutenção de atitudes e comportamentos políticos, pois as questões relacionadas à identidade pessoal e social estão, frequentemente, entrelaçadas com a forma como nos vemos no contexto de grupos e ideologias. Embora a teoria sobre as defesas do ego tenha sido estudada em diversos campos, sua relação com o comportamento político e social tem ganhado crescente atenção.

Uma das manifestações mais evidentes desse fenômeno é a resistência ideológica e a negação de ideias que desafiam profundamente a identidade do indivíduo. Um exemplo claro disso é o comportamento de muitos apoiadores fervorosos de Donald Trump durante sua presidência. A relação desses apoiadores com o líder político não se limita apenas à adesão a políticas ou ideologias, mas está também vinculada à defesa de uma identidade em crise, onde suas crenças e visões de mundo se tornam um escudo psicológico contra ameaças percebidas ao seu status social e cultural. A ascensão de líderes como Trump pode ser vista, em parte, como uma resposta defensiva a um mundo em mudança, onde questões como a imigração e a globalização parecem ameaçar valores profundamente arraigados.

A pesquisa acadêmica sugere que as atitudes hostis a grupos fora do círculo de identidade (como imigrantes ou grupos minoritários) podem ser uma manifestação direta dessa defesa do ego. A rejeição generalizada a qualquer grupo percebido como "fora" pode ser um reflexo do desejo de proteger a coesão do grupo "in", em oposição à ameaça percebida por esses grupos externos. Isso não significa, contudo, que todos os defensores dessas ideologias compartilham das mesmas motivações conscientes. A complexidade dos fatores psicológicos e sociais envolvidos leva à formação de uma percepção muitas vezes simplificada e polarizada, onde a inabilidade de compreender as preocupações legítimas de outros indivíduos pode gerar hostilidade.

Além disso, muitos estudos indicam que indivíduos com atitudes pré-concebidas contra um grupo tendem a transferir essas atitudes a outros grupos. Essa generalização do preconceito é uma característica importante que reforça a coesão do grupo "in", tornando a defesa de uma identidade política uma tarefa que ultrapassa os limites do raciocínio lógico, indo para o campo das emoções e da identidade grupal. As preocupações com questões como imigração, por exemplo, são muitas vezes associadas a uma necessidade de proteger não apenas a nação, mas também uma identidade cultural que é vista como ameaçada.

A questão da identidade e do pertencimento é central para entender o comportamento político contemporâneo. Em muitos casos, o apoio a figuras políticas como Trump pode ser interpretado como uma tentativa de restaurar uma sensação de segurança e continuidade em tempos de incerteza. No entanto, essa busca por segurança pode ter efeitos negativos, criando uma sociedade mais fragmentada e polarizada, onde os indivíduos se veem mais como adversários do que como cidadãos compartilhando uma mesma comunidade.

É essencial compreender que essa defesa do ego não é um fenômeno exclusivo de um único grupo político ou ideológico. Como observam estudiosos como Jost e Hunyadi, tanto liberais quanto conservadores podem ser guiados por mecanismos de defesa do ego que reforçam suas crenças e afastam qualquer ameaça a sua visão de mundo. Por exemplo, enquanto os conservadores podem ver suas identidades ameaçadas pela perda de valores tradicionais, os liberais podem se ver em uma posição defensiva quando confrontados com as críticas ao multiculturalismo ou à globalização.

Ademais, é importante notar que o comportamento político não é sempre movido pela racionalidade, mas muitas vezes por fatores emocionais que, de forma inconsciente, reforçam divisões e estereótipos. A maneira como percebemos a "ameaça" de outros grupos e a reação que temos a essas percepções é fortemente influenciada por nossas defesas psicológicas. Em tempos de crise, essas defesas tornam-se mais pronunciadas, moldando, assim, o discurso político e social de maneira muitas vezes polarizada e irracional.

No entanto, é importante também destacar que a política não deve ser reduzida a um campo exclusivo de emoções e defensividade. Embora os mecanismos psicológicos desempenhem um papel importante, também há espaço para o diálogo, a reflexão e a mudança. A compreensão dos próprios mecanismos de defesa do ego pode permitir um maior entendimento das motivações por trás de certas atitudes políticas, contribuindo para uma abordagem mais empática e construtiva para lidar com as divisões sociais e políticas.

Por fim, a interação entre ego, identidade e política não deve ser vista de forma unidimensional. Os estudos sobre o comportamento político demonstram que as escolhas ideológicas são muitas vezes mais complexas do que uma simples linha de confronto entre "liberais" e "conservadores". Elas envolvem uma série de fatores psicológicos, sociais e culturais que interagem entre si, formando uma rede de influências que, por sua vez, molda a paisagem política de uma nação. A defesa do ego é apenas uma das muitas forças em jogo, e sua compreensão pode oferecer uma chave importante para entender o comportamento político contemporâneo.

Como a Discrepância de Percentuais Pode Ser Explicada pelas Diferenças no Número de Casos nas Categorias de Securitários e Guerreiras Sociais

Quando observamos os níveis de significância em algumas pesquisas, podemos perceber que, em determinados casos, os percentuais podem parecer discordantes, mas essa diferença pode ser explicada pela quantidade desigual de participantes em cada categoria, especialmente pelo número muito maior de securitários em comparação com as Guerreiras Sociais. Por exemplo, os seguidores de Trump classificados como Guerreiras Sociais se mostram ligeiramente mais dependentes (medido como conscienciosidade), com 92% em comparação com os 91% dos securitários, o que é superior ao dos outros dois grupos (83% e 84%, respectivamente). No entanto, essa diferença não é significativa quando comparamos as Guerreiras Sociais com os outros tipos de veneradores de Trump, mas é quando olhamos para os securitários. A razão para isso é que o número de securitários é muito maior do que o das Guerreiras Sociais (aproximadamente 4 para 1).

Nos cálculos de correlação realizados, optei por usar toda a gama de variáveis disponíveis, ao invés de uma forma dicotômica (por exemplo, as correlações foram baseadas nas dezesseis categorias de renda, ao invés de simplesmente considerar se a renda estava acima ou abaixo de $50.000). Com isso, evita-se o descarte de informações e as correlações apresentadas se tornam mais precisas.

Outro ponto de divisão importante se encontra na faixa etária. Securitários e Guerreiras Sociais formam um grupo mais velho, enquanto os "economicamente preocupados" e os seguidores do Tea Party são, em média, seis ou sete anos mais jovens do que os primeiros dois grupos. Esses dados indicam que há uma separação geracional clara, com as gerações mais novas possuindo uma visão e uma preocupação diferentes em relação aos securitários.

Em relação à autoavaliação, um ponto a ser considerado é que as respostas baseadas em autodeclara