A construção do estado de Israel e a criação dos Estados Unidos têm raízes comuns na narrativa da colonização, da expulsão e da subordinação de populações nativas, cujos destinos se entrelaçam por meio de uma lógica de conquista que transcende séculos e continentes. O exemplo da Nakba, que envolve o deslocamento forçado dos palestinos no contexto da formação do estado israelense, é, de certa forma, o reflexo de um processo já vivido pelos nativos americanos durante a expansão territorial dos Estados Unidos. Assim como os indígenas norte-americanos foram marginalizados e deslocados para abrir caminho para a “civilização” europeia, os palestinos foram forçados a abandonar suas terras para dar espaço ao novo estado judeu, o que revela uma contínua repetição de um ciclo colonial.
No caso da Nakba, como nas operações militares planejadas sob o disfarce do Plano Dalet, os líderes sionistas, apesar de suas afirmações públicas de aceitação da partição da Palestina, estavam comprometidos com uma estratégia de conquista que se distanciava profundamente dos limites territoriais definidos pela ONU. O vínculo com potências estrangeiras, incluindo o monarca da Transjordânia, Abdullah I, e a colaboração com elites árabes, revelava o caráter estratégico do deslocamento de populações, uma estratégia que se desvia da retórica de paz, mas que se assemelha à lógica que norteou a colonização do Novo Mundo. Esse processo de deslocamento, de acordo com a análise de Gyasi Ross, advogado Blackfeet, e outros ativistas indígenas, não é um caso isolado de opressão de um povo, mas sim parte de um padrão histórico de destruição de culturas e povos que ocorre sempre que os colonizadores buscam a possessão e o controle de um território.
A colonização, tanto nas Américas quanto na Palestina, foi justificada por uma visão messiânica que propunha uma "reconstrução" violenta das terras e das culturas nativas, alegando que o colonizador estava cumprindo uma missão de progresso e civilização. Essa narrativa tem uma forte base bíblica e se perpetua em diversas culturas, mesmo quando disfarçada de ideais modernos, como a democracia e a modernidade. Para os colonizadores, os nativos eram um obstáculo, não apenas no sentido territorial, mas também na preservação de sua identidade, cultura e saberes. Esses elementos foram desprezados, ou até mesmo apagados, como se fossem símbolos de um passado primitivo que precisava ser substituído pela “iluminação” do colonizador.
Em um nível mais filosófico, os teóricos como Walter Mignolo, que estudam as relações coloniais e a formação do sistema moderno, argumentam que a modernidade e as noções de progresso não surgiram de forma independente, mas estão intrinsecamente ligadas ao processo de colonização, que foi impulsionado por potências europeias, especialmente Portugal e Espanha. A busca pelo “centro” da modernidade, como a Europa se via, levou a um distanciamento da compreensão da “periferia” e das culturas que foram afetadas por esse processo. A ideia de que a modernidade é universal e atingiu todos os cantos do mundo de forma igualitária é, em sua essência, uma falácia que apaga os efeitos destrutivos da colonialidade sobre os povos nativos e as culturas não europeias.
Além disso, Mignolo propõe um conceito chamado "desvinculação", que busca entender a lógica colonial e suas continuidades na realidade moderna. Ele aponta que a neoliberalização da política e da economia cria uma falsa ilusão de progresso, promovendo a ideia de uma "terra prometida" através do consumo e da exploração, enquanto simultaneamente mantém uma estrutura colonial de violência e subordinação. Isso é evidente na forma como a narrativa do progresso foi utilizada para justificar o extermínio de populações nativas, tanto nos Estados Unidos quanto na Palestina.
A análise das conexões entre os processos de colonização e extermínio é crucial para compreender as lutas de povos indígenas e palestinos na atualidade. No caso dos povos indígenas de Turtle Island, como ressaltado por Erica Violet Lee, ativista do movimento Idle No More, a solidariedade com a luta palestina não é apenas uma questão de empatia, mas de um entendimento profundo das estratégias coloniais que buscam apagar não apenas a terra, mas também a história, o saber e a identidade dos povos oprimidos. Lee destaca que, para os povos indígenas, a luta pela soberania é uma luta contra a erasure de suas culturas e memórias ancestrais, um fenômeno que se repete em diferentes partes do mundo à medida que o colonialismo se espalha.
Por fim, é importante destacar que a análise dessas questões exige um entendimento das conexões globais e das estratégias que as potências coloniais utilizaram para justificar a subordinação de povos e terras. As narrativas de extermínio e deslocamento, como as que marcaram a formação dos Estados Unidos e de Israel, não são eventos isolados, mas parte de um padrão de exploração e violência que afeta todas as comunidades colonizadas. É imperativo que as lutas de descolonização, seja em relação aos povos indígenas das Américas ou aos palestinos, sejam compreendidas no contexto mais amplo da história da opressão colonial, onde as lutas por justiça e soberania continuam sendo fundamentais para a sobrevivência de culturas e identidades ao redor do mundo.
Israel e a Colonização: A Conexão com as Lutas Indígenas e Palestinas
A história da colonização se reflete em diversos contextos ao redor do mundo, mas poucos são tão emblemáticos quanto o caso de Israel. Recentemente, Israel se estabeleceu como um dos estados colonizadores mais novos do mundo. Sua fundação envolveu o deslocamento de milhões de palestinos, confinando-os em campos de refugiados e negando-lhes os direitos humanos mais fundamentais. A fome, o deslocamento forçado de suas terras e a falta de cuidados médicos são apenas alguns dos sofrimentos que marcam o povo palestino, os verdadeiros habitantes da Palestina.
A relação entre Israel e o colonialismo se torna ainda mais evidente quando se observa a semelhança com a formação do Canadá. O Canadá, presenteado à população branca masculina de colonos britânicos, foi moldado por uma série de ações violentas, como o extermínio dos nativos e a destruição de suas terras, de forma análoga à expansão israelense. Israel, assim como os primeiros colonos no Canadá, recebeu apoio internacional – neste caso, principalmente dos Estados Unidos e do Reino Unido – para ocupar e despossuir o povo palestino de suas terras, tomando suas aldeias, fazendas e assassinando aqueles que se opõem. Ambos os grupos colonizadores, em suas respectivas terras, tiveram a obrigação de oprimir e desalojar as populações indígenas para manter seus regimes de colonização.
Autoras como Maracle sintetizam essa vasta gama de intervenções poéticas que se posicionam sobre a Palestina. Ela entende Israel não apenas como uma realidade geopolítica, mas como a encarnação moderna de um fenômeno antigo: o uso da terra como uma mercadoria, uma dádiva dada por uma autoridade superior. Maracle traça um paralelo explícito entre o processo de colonização dos Estados Unidos, Canadá e Israel, tratando esses eventos como fenômenos essencialmente idênticos. Ela se utiliza da noção moderna de direitos humanos para entender os crimes cometidos pelos primeiros colonos na América do Norte, fundindo as distâncias legais e temporais, e posicionando os povos indígenas como os verdadeiros guardiões da terra, e não como obstáculos para o progresso ou reconciliação.
Ao lado dessa reflexão, Erica Violet Lee, uma escritora Cree, eleva outra questão importante, focando na marginalização das mulheres dentro dos círculos de ativismo. Ela observa como as vozes das mulheres continuam a ser silenciadas, especialmente em movimentos que lidam com questões que as afetam diretamente. O ativismo de mulheres indígenas e palestinas, muitas vezes invisibilizado, é marginalizado até mesmo dentro de suas próprias comunidades. Lee critica como, ao tentar denunciar o patriarcado e a misoginia, essas mulheres são chamadas de divisivas. Ela questiona a natureza da resistência e a estrutura de poder que permite que a violência colonial seja perpetuada dentro de suas próprias comunidades. Essa reflexão de Lee complementa as observações de Maracle, mas com uma abordagem mais focada na importância da decolonização através da crítica interna às próprias comunidades colonizadas.
Esse tipo de análise sobre a Palestina, como simbolismo, se estende ao campo da poesia indígena, onde é possível observar as conexões profundas entre os temas da colonização e a luta pelo reconhecimento e pelos direitos das populações originais. A Palestina, em muitas obras poéticas indígenas, se torna uma representação da luta contra a opressão, um símbolo contínuo de resistência. Poetas como Mahmoud Darwish, cujos textos inspiraram figuras como o ativista Lakota Russell Means, oferecem uma oportunidade única para analisar como temas inter/nacionais transitam entre diferentes geopolíticas e se tornam símbolos de resistência. A poética que conecta a Palestina e a terra indígena é mais do que uma mera alusão geográfica, mas uma tentativa de traduzir as lutas coloniais em uma linguagem comum e simbólica que atravessa fronteiras e contextos.
No entanto, as mulheres ocupam um papel crucial neste processo de descolonização, como enfatiza Erica Violet Lee. Em sua poesia, ela aborda não só as dores do corpo colonizado, mas também as dinâmicas de gênero que amplificam a opressão. Ela argumenta que as mulheres são as verdadeiras portadoras da consciência de descolonização, pois são aquelas que carregam a memória do sofrimento ancestral, mas também a esperança de um futuro livre. Lee posiciona as mulheres como o núcleo da resistência, afirmando, com sua poesia, que "somos a nação" e que "somos a resistência", desafiando as estruturas patriarcais que, mesmo dentro de comunidades indígenas, ainda buscam marginalizar e silenciar a contribuição feminina para a luta.
Portanto, o que emerge dessas reflexões poéticas não é apenas a luta de resistência dos palestinos ou dos povos indígenas, mas também a luta pela visibilidade e pelo reconhecimento das mulheres dentro dessas narrativas. A resistência não é apenas uma questão de territórios ocupados ou de direitos civis, mas também um processo de reconstrução das relações sociais internas, onde as mulheres são reconhecidas como figuras centrais. A descolonização, nesse sentido, não é apenas uma batalha contra forças externas, mas uma luta interna contra as estruturas que perpetuam a violência colonial dentro das próprias comunidades.

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