O desenvolvimento de sistemas e arquiteturas de computador frequentemente envolve um equilíbrio entre inovação e manutenção de compatibilidade com tecnologias existentes. Este equilíbrio, em muitos casos, pode ser perturbado pela complexidade e variedade dos padrões de interfaces de programação de aplicações (APIs). Uma das principais dificuldades enfrentadas pelos desenvolvedores de aplicativos reside na multiplicidade de padrões concorrentes, frequentemente em rápida evolução. Isso torna praticamente impossível criar um software que seja verdadeiramente portátil entre diferentes plataformas de sistemas operacionais.

Embora a definição formal de APIs, como as do POSIX ou da Single UNIX Specification, ofereça uma solução em parte, ela ainda não resolve o problema da portabilidade total. Isto ocorre porque muitas vezes os aplicativos precisam contornar essas APIs para obter um desempenho adequado, resultando em dependência do hardware e software subjacentes. Nesse cenário, os problemas observados nas arquiteturas centradas no processador reaparecem sempre que o software é forçado a ultrapassar as limitações impostas pelas APIs.

Uma solução para essa limitação está na definição de uma interface formal para todas as aplicações, com o objetivo de alcançar uma verdadeira independência do hardware. Um exemplo disso é a arquitetura AS/400, que adota uma Filosofia de Arquitetura Independente de Tecnologia. O coração dessa arquitetura é o Machine Interface (MI), um conceito que permite que o sistema opere sem a necessidade de reescrever aplicativos quando há atualizações no hardware, como a transição de tecnologia RISC de 32 bits para 64 bits.

Essa independência do hardware, porém, não é o único benefício trazido por essa abordagem. A separação entre a interface de software e os detalhes do sistema operacional permite que múltiplos sistemas operacionais possam coexistir sob a mesma arquitetura, aumentando ainda mais a portabilidade e flexibilidade dos aplicativos. Em sistemas como o AS/400, o suporte a diferentes APIs e a possibilidade de rodar múltiplos sistemas operacionais sem comprometer o desempenho são características que fornecem uma vantagem significativa aos desenvolvedores e clientes. Ao eliminar a necessidade de suporte adicional ou reescrita de aplicativos, o sistema oferece uma plataforma robusta e escalável que é difícil de igualar por outras tecnologias existentes no mercado.

Essa arquitetura é uma resposta ao paradigma de sistemas de computador que ainda seguem modelos mais tradicionais, como os que se baseiam em modelos de tempo compartilhado, comuns nas décadas de 1960 e 1970. Sistemas que operam de maneira isolada, com estruturas de endereçamento de hardware rígidas, tornam a partilha de dados e o acesso simultâneo a informações por múltiplos usuários um desafio técnico significativo. A evolução das tecnologias, como no caso do AS/400, reflete a mudança de foco de uma arquitetura de tempo compartilhado para uma abordagem mais flexível e colaborativa, onde a comunicação e a integração de dados são fundamentais para o funcionamento eficiente de aplicações em ambientes corporativos complexos.

O AS/400 exemplifica, assim, um sistema que não apenas lida com múltiplas camadas de software e hardware de maneira independente, mas também antecipa e resolve problemas de compatibilidade, ampliando a capacidade de adotar novas APIs e sistemas operacionais sem interrupções ou retrabalho. O mais significativo é que o AS/400 não é apenas um reflexo da evolução de tecnologias pré-existentes, mas sim uma inovação que parte de uma visão completamente diferente da de sistemas concorrentes. A partir dessa arquitetura, muitos dos problemas de compatibilidade e performance que afligem sistemas mais tradicionais são mitigados, oferecendo aos desenvolvedores uma plataforma mais estável e escalável para aplicações futuras.

O impacto dessa abordagem vai além da simplicidade técnica ou do design inovador. Ele altera profundamente a forma como empresas e desenvolvedores encaram a evolução tecnológica e a compatibilidade entre sistemas. A independência do hardware e do sistema operacional transforma o AS/400 em uma plataforma de desenvolvimento não apenas mais confiável, mas também mais ágil, permitindo que os aplicativos se adaptem rapidamente a novos desafios sem a necessidade de reescrever grandes porções de código ou reinventar a roda a cada nova geração de hardware.

Para o leitor, é crucial entender que a verdadeira inovação não está apenas na criação de novos sistemas operacionais ou na construção de máquinas mais rápidas. A inovação real reside na capacidade de desenvolver plataformas que possibilitem a flexibilidade e a adaptabilidade necessárias para suportar diferentes necessidades e cenários de uso ao longo do tempo. O conceito de Arquitetura Independente de Tecnologia, como exemplificado pelo AS/400, pode ser visto como um modelo para o futuro da computação, onde os sistemas evoluem sem perder a compatibilidade com os sistemas legados, oferecendo uma base sólida para os desenvolvimentos tecnológicos dos próximos anos.

Como o AS/400 Garante a Integridade e Disponibilidade dos Dados: Triggers, Integridade Referencial e Alta Disponibilidade

A integridade e a disponibilidade dos dados em sistemas de banco de dados são questões cruciais para qualquer aplicação empresarial. No contexto do AS/400, uma das abordagens mais eficazes para garantir que os dados sejam manipulados de forma segura e consistente é por meio de operações atômicas de banco de dados e mecanismos que garantem que os dados sejam recuperáveis, mesmo após falhas no sistema. Vamos explorar como isso ocorre, focando em triggers, integridade referencial e sistemas de disco de alta disponibilidade.

Triggers: Automatizando Ações no Banco de Dados

Triggers são uma das formas mais elegantes de garantir que, quando uma modificação é feita em um banco de dados, outras ações sejam executadas automaticamente. Uma trigger é um mecanismo que aciona uma ação sempre que uma mudança ocorre em um arquivo físico. Elas permitem que diferentes atividades no banco de dados sejam ligadas de maneira conveniente e automática, formando uma espécie de "integridade personalizada" incorporada à definição do arquivo.

Por exemplo, se um registro é atualizado em um arquivo de inventário, e essa atualização faz com que a quantidade de um item em estoque caia abaixo de um valor pré-determinado, uma trigger pode automaticamente chamar um programa para verificar a quantidade e realizar um novo pedido do item, caso necessário. Isso elimina a necessidade de intervenção manual, automatizando processos críticos.

Para configurar uma trigger em um arquivo físico, três atributos principais devem ser definidos. Primeiro, o evento que irá disparar a trigger (inserção, atualização ou exclusão de um registro). Em seguida, define-se o momento em que a trigger será acionada – antes ou depois do evento. Por fim, o programa a ser executado quando a trigger for acionada deve ser especificado. Este programa pode ser escrito em qualquer linguagem de alto nível suportada pelo AS/400. Como resultado, até seis triggers podem ser definidas para um único arquivo físico, permitindo maior flexibilidade na automação de tarefas.

Integridade Referencial: Protegendo as Relações entre Arquivos

Na prática, dados de um arquivo físico dependem de dados de outro arquivo. Se uma aplicação não considerar essas dependências ao fazer uma atualização, a integridade dos dados pode ser comprometida. O AS/400 resolve esse problema por meio da integridade referencial, um mecanismo que garante que as relações entre arquivos sejam mantidas corretamente, sem que a aplicação precise se preocupar com essas verificações.

A integridade referencial assegura que, ao modificar um arquivo, todas as restrições e regras definidas sejam respeitadas. Por exemplo, em um arquivo de clientes, onde o ID do cliente é usado como chave primária, o AS/400 pode garantir que não seja possível adicionar um ID de cliente em outro arquivo se esse ID não existir previamente no arquivo mestre de clientes. Essa verificação automática elimina a possibilidade de inconsistências nos dados entre arquivos dependentes.

Sistemas de Disco de Alta Disponibilidade: Protegendo os Dados Contra Falhas de Hardware

Discos são dispositivos mecânicos e, como tal, estão sujeitos a falhas. Em muitos sistemas, os dados são periodicamente copiados para mídias externas, como fitas, para garantir que, em caso de falha de um disco, a cópia de segurança possa ser restaurada. Porém, o tempo necessário para restaurar dados a partir de uma cópia de segurança pode ser inaceitável para muitas empresas, especialmente se isso significar que o sistema ficará indisponível durante o processo de recuperação.

O AS/400 oferece soluções de alta disponibilidade para garantir que os dados possam ser recuperados rapidamente e sem causar interrupções no serviço. Uma dessas soluções é o espelhamento de discos, que utiliza dois discos emparelhados para criar redundância total. Quando um dado é gravado em um disco, ele é simultaneamente gravado no outro, garantindo que, caso um disco falhe, o sistema possa continuar operando normalmente com o outro disco. Para aumentar a confiabilidade, os discos podem ser conectados a controladores e barramentos separados.

Outra solução é o uso de arrays de discos, onde os discos são agrupados em conjuntos. A tecnologia RAID (Redundant Array of Independent Disks) é frequentemente empregada nesses conjuntos, permitindo que, caso um disco falhe, os dados possam ser recuperados utilizando um procedimento de XOR (exclusive or), uma operação binária que permite reconstruir os dados perdidos com base nas informações dos outros discos no conjunto.

Ambas as soluções garantem alta disponibilidade, mas com custos diferentes: o espelhamento oferece o nível mais alto de proteção, mas com um custo mais elevado devido à duplicação total dos dados. Já os arrays de discos, embora mais econômicos, oferecem um nível de proteção um pouco menor, dependendo do tipo de RAID utilizado.

Considerações Finais

Ao considerar a integridade e a recuperação de dados, é importante que qualquer sistema de banco de dados não só proteja contra falhas de hardware, mas também que garanta que as operações de banco de dados sejam realizadas de forma atômica e que as dependências entre dados em diferentes arquivos sejam automaticamente gerenciadas. O AS/400 integra várias tecnologias, como triggers, integridade referencial e soluções de alta disponibilidade, para garantir que dados críticos sejam sempre protegidos e recuperáveis.

A capacidade de garantir a continuidade dos negócios e a integridade dos dados não é apenas uma questão técnica, mas também uma questão estratégica para a operação de qualquer organização. Ao entender esses mecanismos e como eles são aplicados no AS/400, as empresas podem reduzir significativamente o risco de corrupção de dados e tempo de inatividade, promovendo uma operação mais eficiente e segura.

Como o Sistema de Processos foi Estruturado: A Evolução dos Processos e a Gestão de Tarefas no AS/400

Nos primeiros dias da computação, os processadores não tinham noção do que era um "processo". Desenvolvidos na década de 1960, eles eram projetados para entender apenas interrupções. A interrupção é uma mudança no fluxo de execução das instruções, originada por um erro ou por um evento externo ao programa em execução. Este último é geralmente relacionado à entrada e saída (E/S). Quando ocorre uma operação de E/S, o processador inicia o processo, mas a execução acontece fora dele. Ao ser concluída, a operação de E/S precisa notificar o processador, e a interrupção serve como esse mecanismo de comunicação.

A interrupção interrompe o programa em execução e transfere o controle para um manipulador de interrupção, que realiza a ação necessária. Quando o manipulador termina sua tarefa, o controle é devolvido ao programa interrompido. Para garantir que o programa retome exatamente de onde parou, o manipulador deve restaurar todos os registradores internos para o seu estado anterior à interrupção. Alguns processadores oferecem múltiplos conjuntos de registradores, e o manipulador pode usar um conjunto diferente ao lidar com a interrupção, retornando ao conjunto original quando o controle é restabelecido.

Em sistemas com múltiplos níveis de interrupção, a prioridade é um conceito essencial. O processador só muda para um novo programa se ele tiver uma prioridade superior ao programa em execução. A maior parte dos processadores possui apenas um número limitado de níveis de prioridade, o que leva o software do sistema operacional a construir um mecanismo de gerenciamento de processos que vá além das capacidades básicas das interrupções.

Nos anos 70, ao desenvolvermos um novo processador microprogramado para o System/38, uma ideia inovadora surgiu. Se conseguíssemos construir uma estrutura de processo diretamente sobre o hardware, poderíamos reduzir a sobrecarga das interrupções, tornando o sistema mais eficiente. Além disso, essa estrutura de processo também poderia ser aplicada à E/S, eliminando a necessidade de um mecanismo de interrupção separado. Com isso, economizaríamos circuitos no processador, uma questão crucial para a gestão de engenharia. Assim, a engenharia aceitou o desafio de criar a estrutura de processo e escrever o microcódigo necessário.

Explicar essa ideia para os engenheiros foi uma tarefa curiosa. Recordo-me de uma conversa com Ray Klotz, nosso gerente de engenharia, sobre como a nova estrutura permitiria suportar centenas de processos com diferentes níveis de prioridade. Cada dispositivo de E/S poderia até ter sua própria prioridade, já que o sistema seria projetado para lidar com múltiplos processos. Ray interrompeu e perguntou: "Você está construindo um multiprocessador?" Respondi: "Não, estamos criando um sistema que suporta múltiplos processos, não múltiplos processadores." A confusão foi natural, já que a terminologia de "processo" e "tarefa" não estava bem definida. Depois dessa conversa, começamos a nos referir a esses componentes como "tarefas" em vez de "processos".

No AS/400, cada tarefa tem um bloco de controle de memória chamado "elemento de despacho de tarefa" (TDE). O TDE é a estrutura fundamental que suporta a execução de tarefas. Embora esteja abaixo do MI (máquina intermediária), o TDE não é visível para o nível superior, mas é uma parte essencial de alguns objetos do sistema. O TDE contém todas as informações necessárias para controlar a execução de uma tarefa, que pode ser vista como um programa em execução. O TDE conecta o programa e o status da execução, permitindo a gestão eficiente da tarefa.

Uma tarefa no sistema pode estar em um de quatro estados: suspensa, pronta, em execução ou aguardando. O estado de uma tarefa define a sua elegibilidade para ser executada no processador. O estado suspenso é onde uma tarefa começa ou termina, sendo incapaz de ser executada. O estado pronto é quando a tarefa está pronta para ser executada, mas ainda não foi escalada para a execução. O estado em execução é quando a tarefa está efetivamente sendo executada no processador. O estado de espera ocorre quando a tarefa está aguardando por algum evento externo, como a conclusão de uma operação de E/S.

A transição entre esses estados é regida por uma série de operações. Quando uma tarefa é iniciada, ela passa do estado suspenso para o estado pronto. Uma vez pronta, ela é despachada para o processador, entrando no estado em execução. Após a conclusão de sua execução, a tarefa pode ser suspensa ou preemptada, dependendo da prioridade de outras tarefas. Quando uma tarefa precisa aguardar uma operação, ela transita para o estado de espera, retornando ao estado pronto quando a operação aguardada é concluída.

Essas transições são importantes para o entendimento do funcionamento do AS/400 e como ele gerencia as tarefas dentro de um único processador. A chave para essa gestão eficiente de processos é o conceito de fila de despacho de tarefas (Task Dispatching Queue), que organiza as tarefas de acordo com sua elegibilidade para execução. O processo de enfileiramento e desenfileiramento das tarefas é feito de forma lógica, sem a necessidade de movimentar fisicamente os dados, o que garante uma operação rápida e eficiente.

Além disso, entender como o AS/400 lida com as transições de estado das tarefas pode ser crucial para quem busca otimizar o desempenho do sistema, ajustando as taxas de transição entre os estados e melhorando o tempo de resposta do sistema. A análise dos dados fornecidos pelas transições de estado, como as taxas de atividade e inatividade das tarefas, pode ser usada para ajustar os níveis de atividade de uma determinada pool de memória, otimizando assim o uso dos recursos do sistema.