A Doutrina da Descoberta, um princípio legal europeu, fundamentou muitas das primeiras incursões coloniais do Ocidente, sustentando que quando uma nação cristã europeia "descobria" uma terra não cristã, essa nação automaticamente adquiriu o direito de soberania e propriedade sobre a terra e as pessoas que a habitavam. Sob essa doutrina, os povos indígenas mantinham um direito limitado, denominado "direito de ocupação" ou "Título Aborígine", o que significava que, embora pudessem continuar vivendo na terra, o poder de negociação e venda da terra era exclusivamente da nação "descobridora". Este conceito se estendia ao reconhecimento de que, uma vez que uma nação europeia chegasse a um território não cristão, ela automaticamente detinha o monopólio das relações políticas, comerciais e internacionais com os povos locais.

O uso dos termos "conquista" e "descobrimento" é essencial para entender o raciocínio por trás da doutrina. Na prática, um simples "passo" de uma nação cristã sobre o solo de uma terra não cristã bastava para declarar a posse e iniciar a "conquista". A questão central estava em desconsiderar os direitos e a soberania dos povos indígenas, que, sem saber, viam suas terras e direitos ameaçados, simplesmente pelo fato de uma potência estrangeira ter chegado.

Alguns estudiosos sugerem que a origem dessa doutrina remonta ao mandato bíblico dado a Abraão no livro de Gênesis, capítulo 1, versículo 28, onde Deus ordena: "subjuguem a terra e dominem todos os seres vivos". A partir desse versículo, foi argumentado que os cristãos tinham a obrigação divina de subjugar as terras dos "infieis", os povos não cristãos. Esse conceito não foi apenas teológico, mas também estratégico: as expedições mercenárias às terras do Oriente Médio e do Norte da África, por exemplo, não apenas cumpriam um mandato religioso, mas também garantiam grandes lucros devido aos saques. Com o tempo, os monarcas europeus começaram a ver a colonização como uma missão divina, ao mesmo tempo que preenchiam seus próprios cofres reais.

A união entre a coroa espanhola e o Papa Alexandre VI, por exemplo, selou o destino de muitas terras no "Novo Mundo". Em 1493, o Papa emitiu uma bula papal que conferia a Espanha e Portugal o direito exclusivo de explorar e colonizar terras "não possuídas por nenhum cristão". O Papa justificou essa autoridade com base na necessidade de converter os povos "infieis", permitindo que as nações cristãs tomassem posse dessas terras em nome da Igreja. Nesse contexto, a Igreja Católica se tornou o principal árbitro das disputas territoriais entre as potências europeias, criando uma corrida entre países como Espanha, Portugal, França e Inglaterra para expandir suas possessões no continente americano e outras partes do mundo.

A Inglaterra, embora excomungada pela Igreja Católica desde 1570, também se alinhou à Doutrina da Descoberta, pois desejava garantir o reconhecimento europeu de suas reivindicações territoriais. Isso resultou em um confronto entre diversas potências, cada uma tentando justificar sua posse de terras recém-descobertas, o que muitas vezes gerava disputas e rivalidades intensas. Esse processo, embora aparentemente legal sob a ótica das potências colonizadoras, significava a desconsideração total dos direitos e da soberania dos povos indígenas.

O impacto da Doutrina da Descoberta tornou-se palpável nas décadas seguintes, especialmente na América do Norte, onde as primeiras interações entre colonizadores e povos indígenas ocorreram de maneira abrupta. Em meados do século XVI, as expedições espanholas lideradas por Francisco Vázquez de Coronado e Hernando de Soto chegaram a áreas próximas ao que hoje é o estado do Missouri, nos Estados Unidos, em busca de riquezas e novas terras. Esses exploradores espanhóis, em sua busca pela mítica "Cidade de Ouro" de Cibola, entraram em contato com diversas tribos indígenas. Embora não tenham encontrado as riquezas que procuravam, deixaram um impacto duradouro nas comunidades locais.

Esses encontros ilustram a interação entre as crenças de superioridade dos colonizadores e a resistência, frequentemente silenciosa, dos povos nativos. Os indígenas, muitas vezes, viam os europeus como estrangeiros inóspitos e sem qualquer respeito pelos seus valores e modos de vida. A relação entre colonizadores e indígenas foi marcada não apenas pela exploração territorial, mas também pela violência e pela imposição de uma cultura e religião estrangeiras, que desconsideravam completamente os sistemas de governança e as tradições dos povos nativos.

Além disso, a ideia de "descobrimento" contida na Doutrina é questionada à medida que se reconhece que os povos indígenas já habitavam essas terras muito antes da chegada dos europeus. A noção de que essas terras estavam "desabitadas" ou "não possuídas" é um dos maiores mitos criados pela colonização. Os povos nativos, com suas culturas complexas, sistemas de governança e práticas econômicas, eram tão donos de suas terras quanto qualquer nação europeia poderia ser. A Doutrina da Descoberta, ao relegar os direitos indígenas a uma posição secundária, não só prejudicou suas culturas, mas também os impôs um futuro de subordinação e exploração.

O desenvolvimento histórico da Doutrina da Descoberta e sua aplicação prática revela muito sobre as origens da colonização europeia e suas consequências duradouras. O entendimento dessa doutrina e das justificativas legais por trás das ações coloniais é essencial para compreender os desafios que os povos indígenas enfrentaram durante os séculos seguintes. A luta pela terra, pela soberania e pelos direitos civis continua a ser um tema central nas discussões sobre a história da colonização e suas reverberações até o presente.

Como o Tratado de Remoção do Kickapoo e a Expansão Territorial nos Estados Unidos Modificaram a Dinâmica das Terras Indígenas no Século XIX

No início do século XIX, a política de remoção indígena nos Estados Unidos gerou consequências profundas para as nações nativas, particularmente aquelas localizadas ao leste do rio Mississippi. A proposta de remoção para terras do oeste não era apenas uma questão de mudança geográfica, mas de ruptura cultural, de uma tentativa de assimilação e de negociação forçada, muitas vezes sob condições desvantajosas.

A nação Kickapoo, que se encontrava em terras do estado do Missouri, foi uma das primeiras a vivenciar as implicações diretas da política de remoção. Em 1826, Clark, um dos principais agentes do governo na negociação com as tribos nativas, já discutia com os Kickapoos a possibilidade de sua mudança para o Kansas. Embora o governo dos Estados Unidos tivesse prometido garantir a "posse pacífica" das terras para os Kickapoos em Missouri, as questões legais envolvendo a cessão de terras, principalmente devido ao emaranhado de burocracia federal, dificultaram essa negociação. O ato de remoção indígena, que visava resolver questões de titularidade de terras entre as tribos e o governo, não se aplicava ao Missouri ou a outros estados a oeste do Mississippi até 1831. Assim, os Kickapoos não podiam legalmente ceder suas terras até que o Congresso aprovasse uma legislação específica para essas áreas.

Foi somente em 1831 que o Congresso aprovou a lei necessária, permitindo a negociação de terras com os Kickapoos. Clark, aproveitando-se da nova possibilidade, convocou os líderes da tribo para uma negociação. Os Kickapoos, que haviam já visitado o Kansas e achado as terras adequadas, foram pressionados a ceder sua terra no Missouri e se mudar para uma nova reserva no Kansas, perto da reserva Delaware, ao lado do Forte Leavenworth. Os detalhes do tratado revelam o cenário de exploração e endividamento a que os Kickapoos foram submetidos. O valor de $18.000, que foi dado como compensação, teve dois terços descontados para pagar as dívidas com comerciantes licenciado pelo governo, que haviam inflacionado os preços dos produtos necessários à sobrevivência da tribo.

Após a assinatura do tratado, as primeiras famílias Kickapoo chegaram ao Kansas na primavera de 1833. A chegada foi marcada por uma tentativa de adaptação à vida agrícola, com o uso de equipamentos e ferramentas fornecidas pelo governo. A nação Kickapoo foi dividida entre duas bandas: uma, liderada por Kennekuk, o Profeta Kickapoo, aceitou relativamente bem as novas condições e fez progressos na adaptação ao novo modo de vida; a outra, liderada por Kishko, resistiu ativamente ao processo de aculturação e preferiu se afastar, construindo um novo vilarejo isolado dos outros Kickapoos. Mesmo dentro da mesma nação, surgiram tensões que resultaram em um grupo menor de Kickapoos, sob a liderança de Kishko, migrando para o Território Indígena, onde acreditavam poder preservar suas tradições de maneira mais autêntica.

Esses eventos ilustram não apenas a resistência, mas também o impacto devastador da política de remoção sobre os povos indígenas. A negociação de terras não envolvia apenas uma troca de espaço geográfico, mas uma ruptura com o estilo de vida tradicional das tribos. Para muitos, a mudança significava perda de identidade, destruição de culturas, e, em muitos casos, a imposição de uma realidade econômica insustentável. O tratamento desigual e as promessas não cumpridas pelo governo federal apenas agravavam o sofrimento das nações indígenas.

Além disso, a questão da titulação das terras e a assinatura de tratados também envolviam complexas disputas internas entre as próprias tribos e com os agentes do governo, que muitas vezes exploravam as dificuldades financeiras das tribos para negociar de maneira que lhes fosse mais favorável. A manipulação econômica por meio de altos preços e dívidas irreparáveis foi uma tática recorrente utilizada para forçar os indígenas a cederem suas terras, muitas vezes sem a compreensão total das implicações dos acordos assinados.

Em paralelo ao deslocamento dos Kickapoos, outras tribos também enfrentaram pressões para sair de suas terras, como as disputas envolvendo a região do Platte Country, em Missouri. A presença de colonos brancos em territórios indígenas, muitas vezes em desacordo com as fronteiras estabelecidas, gerou conflitos frequentes e violentos, como o caso da chamada Guerra Heatherly em 1836, que resultou de confrontos entre colonos brancos e nativos, exacerbando ainda mais a tensão entre as comunidades indígenas e os invasores.

A remoção das tribos para o oeste, além de representar uma perda territorial irreparável, também foi uma tentativa de "eliminar" a presença indígena nas terras a leste do Mississippi. A ideia de uma "América para os brancos", livre de nativos, foi uma motivação central por trás de muitas dessas políticas, que buscavam, entre outras coisas, a expansão de terras para a colonização e o aproveitamento dos recursos naturais por parte dos recém-chegados.

O estudo de tais tratados e suas consequências é essencial para entender não apenas o impacto imediato das remoções, mas também as longas repercussões sobre a identidade, a cultura e a estrutura social das tribos. A perda de terras, a destruição dos modos de vida tradicionais e as violações contínuas dos direitos indígenas formaram uma base para os conflitos e as lutas que continuariam a marcar a história dos povos nativos nos Estados Unidos por muitos anos.

Como a Lei Dawes e a Comissão Jerome Transformaram as Nações Indígenas

Na Reserva Ioway em Oklahoma, 109 famílias e indivíduos receberam um total de aproximadamente 8.600 acres de terra alocada. No entanto, mais de vinte vezes essa quantidade — pelo menos 220.000 acres — foram declarados excedentes pelo governo federal e, posteriormente, reclamados por colonos brancos durante a chamada "Segunda Corrida de Terras de Oklahoma" em 21 de setembro de 1891. O trabalho da Comissão Jerome também incluiu a dissolução dos governos tribais, muitos dos quais, recentemente forçados a se modelar conforme o sistema dos Estados Unidos, passaram a ser vistos como obstáculos à assimilação dos nativos. Os governantes tribais estavam em desacordo com a visão federal, que considerava a centralização do poder e o sistema de terras privadas como fundamentais para o progresso.

Em novembro de 1891, os Sacs e Foxes no Território Indígena foram obrigados a abrir mão de sua constituição e de sua corte suprema. Seu governo foi reduzido a um conselho de oito membros, liderado por dois chefes. Sete anos depois, até mesmo essa forma modesta de governo tribal foi abolida pelas autoridades federais. Em 1893, o Congresso criou a Comissão Dawes para facilitar a alocação de terras entre os Cherokees, Muscogees, Chickasaws, Seminoles e Choctaws. Em 1895, iniciou-se um censo do Território Indígena, e, no ano seguinte, a Comissão Dawes começou a elaborar as "listas finais" de cidadãos aptos a receber a distribuição de terras. Embora os líderes dessas nações tenham resistido e tentado formular planos alternativos, o Ato Curtis, aprovado pelo Congresso em 1898, forçou todas as nações à alocação; esse mesmo ato também abriu caminho para que o Território Indígena fosse admitido na União como o estado de Oklahoma, em 1907.

A Lei Dawes, embora ostensivamente tenha concedido aos indígenas o direito de posse de terras, incluía provisões que, na prática, dificultavam a melhoria das propriedades e o exercício pleno dos direitos de posse. O governo mantinha a titularidade das alocações em status fiduciário por pelo menos 25 anos, o que impedia que os beneficiários usassem suas terras como garantia para obter hipotecas e, assim, comprometia seus esforços para melhorar suas propriedades. A incapacidade de acessar crédito impediu que os nativos saíssem da pobreza ou deixassem riqueza acumulada para seus descendentes. Essa situação perdurou mesmo após o Congresso ter concedido cidadania aos indígenas em 1924. Como apontou a historiadora K. Tsianina Lomawaima, os indígenas foram, por um lado, convidados a se integrar ao "corpo da cidadania", mas, ao mesmo tempo, mantidos à distância e marcados como diferentes.

Outro elemento central do processo foi o censo tribal, uma parte vital da Lei Dawes. As listas definitivas de pessoas pertencentes a cada nação indígena eram necessárias para garantir que apenas membros legítimos das tribos recebesse as alocações de terras. Como se poderia esperar, esse processo foi marcado por corrupção. A Comissão Dawes era responsável por compilar as listas para os Cherokees, Choctaws, Chickasaws, Seminoles e Muscogees, enquanto outras comissões, como a Jerome, trabalhavam com as nações restantes. Os comissionados tinham autoridade para inscrever membros tribais com base em três critérios: os inscritos deveriam residir fisicamente dentro dos limites da sua nação; deveriam estar vivos na época do cadastramento; e finalmente, deveriam figurar no censo de 1880 ou 1896 realizado pela tribo e ser reconhecidos pela tribo como cidadãos. Esse processo envolvia uma combinação de registros escritos e testemunhos orais para determinar não apenas quem era "índio", mas também o grau de "sangue indígena", o chamado "quantum de sangue".

Essa verificação tornou-se ainda mais complicada pelo fato de os indivíduos poderem se inscrever apenas em uma tribo. Em casos em que uma pessoa tinha ascendência direta de mais de uma tribo, ela só poderia contar o quantum de sangue para a tribo em que estivesse tentando se inscrever. Isso levou a situações em que, por exemplo, uma pessoa com pai "cheiro de sangue" Cherokee e mãe "cheiro de sangue" Choctaw seria registrada como "metade sangue" se se inscrevesse em qualquer uma das tribos. Esse sistema de inscrição, com seus critérios raciais e subjetivos, enfraqueceu a soberania indígena, uma vez que os comissionados tinham a última palavra sobre quem seria incluído nas listas. O processo de determinação de elegibilidade foi marcado por arbitrariedades e preconceitos raciais. Nos registros dos Choctaws, por exemplo, os membros da Comissão Dawes frequentemente decidiam a inscrição de uma pessoa e seu quantum de sangue com base em uma simples inspeção visual. Para pessoas que demonstravam "características visíveis de sangue Choctaw", a documentação de sua ancestralidade não era exigida, enquanto aqueles que pareciam "menos" Choctaw eram obrigados a apresentar provas.

A compilação dos registros foi lenta devido ao grande número de pessoas inelegíveis que tentaram se inscrever. No total, a Comissão Dawes recebeu 250 mil pedidos de inscrição entre as Cinco Tribos Civilizadas, dos quais 101 mil foram aprovados. Somente entre os Choctaws, cerca de 25 mil pessoas tentaram se inscrever; no entanto, quando o período de registro terminou em 1907, apenas 1.634 pedidos de inscrição foram aceitos. Essa enorme quantidade de solicitações deve-se ao fato de que membros tribais inscritos receberiam benefícios de terras e dinheiro, avaliados entre US$ 5.000 e US$ 8.000. Houve também a presença de pessoas brancas que enviaram pedidos fraudulentos, principalmente aqueles que haviam se casado com mulheres Choctaw em "casamentos de fachada". Esse tipo de fraude, conhecida como "indígenas de cinco dólares", estava presente no processo, embora seja impossível determinar quantos desses casos foram bem-sucedidos.

Enquanto isso, muitos membros legítimos das tribos resistiram à alocação, recusando-se a ser inscritos nos registros. A resistência dos Cherokees à alocação foi liderada por Redbird Smith, conselheiro nacional, que trabalhou incansavelmente para convencer os Cherokees a retornar a um modo de vida mais tradicional. Para isso, ajudou a ressuscitar a Sociedade Nighthawk Keetoowah e liderou uma comunidade de resistentes na região de Cookson Hills, na nação Cherokee. No auge, o movimento de resistência de Smith contava com 5.500 apoiadores. Ao mesmo tempo, mais de 5.000 Muscogees se opuseram à alocação, liderados por Chitto Harjo, também conhecido como Crazy Snake, que ajudou a criar um governo alternativo Muscogee na aldeia de Hickory Ground. No fim, ambos os líderes foram presos e forçados a se inscrever. Harjo foi baleado e morreu enquanto se escondia.

O trabalho de alocação das comissões governamentais destruiu os fundos coletivos de terras e causou danos irreparáveis à viabilidade das comunidades e culturas indígenas no Território Indígena. O impacto sobre os indígenas do Missouri, embora menos direto, não foi menos devastador. Aqueles que foram deixados de fora do processo de inscrição ficaram sem terras e perderam os laços oficiais com suas tribos. Os indígenas não inscritos ficaram "dispersos e sem terra", e como apontou a historiadora Katherine Ellinghaus, esses indivíduos estavam mais propensos a enfrentar pobreza e uma série de problemas sociais e de saúde associados a ela.