A nutrição enteral desempenha um papel crucial no desenvolvimento gastrointestinal neonatal, especialmente durante o período inicial de vida, no qual a aceleração do crescimento do trato gastrointestinal ocorre predominantemente pelos efeitos tróficos da alimentação enteral. A introdução precoce de alimentos não nutritivos, como água, retarda a atividade motora enteral, prejudica o crescimento gastrointestinal e compromete o progresso clínico dos neonatos. O impacto da alimentação enteral, portanto, não se limita ao fornecimento de nutrientes, mas também influencia aspectos fundamentais do metabolismo e da biodisponibilidade de fármacos. Observações indicam que o tipo de alimentação, seja leite materno ou fórmula, afeta a flora bacteriana intestinal e, consequentemente, a biotransformação de substâncias. O tipo de alimentação também foi mostrado influenciar diretamente o metabolismo de enzimas hepáticas específicas, como CYP3A4 e CYP1A2, afetando a metabolização de substâncias como dextrometorfano e cafeína, respectivamente. Assim, a alimentação com fórmula pode acelerar a maturação do sistema gastrointestinal e hepático, influenciando a resposta a terapias farmacológicas.

Além disso, a nutrição enteral tem efeitos substanciais sobre a duração e a extensão da hiperbilirrubinemia neonatal. A nutrição parenteral, por outro lado, está associada a uma maior probabilidade de desenvolvimento de colestase, incluindo elevações nos níveis de bilirrubina conjugada. Essas diferenças ressaltam a importância do tipo de alimentação na regulação de processos bioquímicos vitais, refletindo a complexidade das interações entre nutrição e farmacocinética nos neonatos.

Nos casos em que a via oral é inviável, seja por questões relacionadas à maturação ou a condições patológicas, são utilizadas vias não orais de administração, sendo a via parenteral (principalmente intravenosa) a mais comum em neonatos. As vias intramuscular, percutânea e retal também podem ser empregadas, mas a escolha da via e a eficiência da absorção dependem de uma série de fatores fisiológicos e físico-químicos. As vias extravasculares apresentam desafios adicionais no que diz respeito à biodisponibilidade e à taxa de absorção dos fármacos, que são influenciadas por fatores como a solubilidade do fármaco, a permeabilidade das membranas, a área de superfície disponível para absorção e as condições fisiológicas específicas do neonato, como o fluxo sanguíneo local e o grau de perfusão periférica.

A administração de fármacos via intramuscular, por exemplo, está sujeita à lipofilia do fármaco, que facilita sua difusão nas capilares, mas também depende de sua solubilidade em água para evitar precipitação no local da injeção. Fármacos como a vitamina K, administrada intramuscularmente para prevenir hemorragias neonatais, exemplificam como as características físico-químicas do fármaco influenciam seu perfil de absorção e sua eficácia terapêutica. O ambiente clínico de cuidados neonatais também influencia a absorção, com distúrbios patológicos como insuficiência cardíaca ou doenças respiratórias prejudicando a circulação periférica e, por consequência, a absorção de fármacos.

A absorção percutânea, por sua vez, também se torna um aspecto crucial em neonatos, dada a imaturidade da pele, especialmente em prematuros. Embora o processo de maturação da barreira cutânea ocorra rapidamente após o nascimento, neonatos ainda apresentam características de permeabilidade dérmica superiores às de lactentes e adultos. A relação entre a área de superfície corporal e o peso é significativamente maior nos neonatos, o que aumenta a absorção sistêmica de substâncias aplicadas na pele. Isso explica por que substâncias tópicas podem causar toxicidade em neonatos, como no caso de produtos contendo hexaclorofeno ou lidocaína, que, em doses inadequadas, podem ser altamente tóxicos.

A absorção retal, por outro lado, é uma via imprevisível, variando dependendo da formulação (líquida ou sólida) e do tempo de retenção do fármaco. A absorção por via retal é geralmente mais lenta e menos eficiente do que pela via oral, o que se traduz em uma biodisponibilidade menor e mais variável. A administração de fármacos como o paracetamol via retal pode exigir doses mais altas para alcançar uma concentração plasmática semelhante à obtida pela via oral.

Esses fatores reforçam a necessidade de um cuidado rigoroso no tratamento farmacológico de neonatos, considerando as especificidades de cada via de administração e as condições fisiológicas e patológicas do paciente. Além disso, a interação entre a alimentação enteral e a farmacocinética neonatal deve ser sempre monitorada para otimizar a terapêutica e evitar efeitos adversos.

Como os Corticoides Agem no Corpo e Seus Mecanismos Moleculares

Os corticoides, como o cortisol, têm um papel central na regulação do metabolismo, no controle do estresse e na modulação de várias funções corporais. Sua ação começa com a conversão do cortisol em formas inativas, como o glicuronídeo e o sulfato, que são excretadas pelos rins. Menos de 1% do cortisol é excretado inalterado na urina. Dessa forma, a eliminação metabólica do cortisol é predominantemente influenciada por fatores que alteram sua depuração hepática, bem como pelas enzimas renais e fatores que afetam a excreção renal.

A ação dos corticoides nos tecidos é mediada pela 11β-HSD, uma enzima que modula a conversão entre cortisol e cortisona. Existem dois tipos de 11β-HSD: a 11β-HSD tipo 1 (11β-HSD1) e a 11β-HSD tipo 2 (11β-HSD2). A 11β-HSD1 atua como uma redutase, convertendo cortisona inativa em cortisol ativo, o que pode contribuir para a hipersensibilidade dos tecidos aos corticoides. Essa enzima está amplamente presente no fígado, pulmões, tecido adiposo, vasos sanguíneos, ovários e sistema nervoso central. O aumento da expressão da 11β-HSD1 no tecido adiposo visceral está associado à obesidade visceral, indicando que a 11β-HSD1 pode potencializar a ação dos corticoides em tecidos locais.

Em contraste, a 11β-HSD2 tem um papel fisiológico bem documentado. Indivíduos com mutações nessa enzima apresentam sintomas de excesso de mineralocorticoides, enquanto camundongos com a deleção do gene apresentam excesso de mineralocorticoides dependente de corticoides. A 11β-HSD2 age como uma desidrogenase, convertendo cortisol em cortisona inativa, e é expressa em tecidos sensíveis ao aldosterona, como os rins, cólon, glândulas sudoríparas e placenta, onde protege o receptor mineralocorticoide (MR) dos efeitos mineralocorticoides do cortisol, permitindo que concentrações muito menores de aldosterona exerçam tais ações.

Em nível celular, a ação dos corticoides é mediada pelo receptor intracelular GR (receptor de corticoides), que funciona como um fator de transcrição ativado por hormônios, regulando a expressão dos genes-alvo dos corticoides. O gene humano do GR (hGR) pertence à superfamília de receptores de esteroides, hormônios tireoidianos e de ácido retinoico. Esse gene contém nove éxons e é composto por uma região amino-terminal pouco conservada, uma região central altamente conservada que se liga ao DNA (DBD), uma região de dobramento (HR) e uma região carboxil-terminal que se liga ao ligante (LBD). A região NTD contém o principal domínio de transativação, conhecido como função de ativação (AF)-1, localizado entre os aminoácidos 77 e 262 do hGR. A região DBD abrange os aminoácidos de 420 a 480 e contém dois motivos de dedo de zinco, por meio dos quais o receptor se liga a sequências específicas de DNA na região promotora dos genes-alvo, os elementos de resposta aos glucocorticoides (GREs).

A região HR, que fica entre a DBD e a LBD, fornece flexibilidade estrutural para que o receptor ativado se ligue aos GREs. Além disso, essa região contém lisinas críticas que sofrem acetilação pelo fator de transcrição “circadian locomotor output cycle kaput” (CLOCK), responsável pelas oscilações circadianas da expressão gênica. A LBD contém um segundo domínio de transativação, AF-2, e sequências importantes para a interação com as proteínas de choque térmico (HSPs), translocação nuclear e dimerização do receptor.

O hGR gera duas isoformas principais, hGRα e hGRβ, através do splicing alternativo no éxon 9. Essas isoformas são idênticas até o aminoácido 727, mas depois divergem: hGRα tem 50 aminoácidos adicionais, enquanto hGRβ tem 15 aminoácidos adicionais não homólogos. O hGRα é amplamente expresso em quase todos os tecidos e células humanas, reside principalmente no citoplasma e funciona como um fator de transcrição dependente de ligante. Já o hGRβ, embora também expresso em muitos tecidos, reside principalmente no núcleo, independentemente da presença do ligante, não se liga aos corticoides e exerce um efeito negativo dominante sobre o hGRα. Além disso, hGRβ pode regular a transcrição de alguns genes-alvo independentemente da atividade transcricional mediada pelo hGRα.

Além do splicing alternativo, foram identificadas oito isoformas distintas do GRα, denominadas GRα-A, GRα-B, GRα-C1, GRα-C2, GRα-C3, GRα-D1, GRα-D2 e GRα-D3, que são geradas por inícios alternativos de tradução do mRNA do GRα. Embora essas isoformas tenham afinidade semelhante pelo ligante e capacidade de se ligar às regiões reguladoras dos genes responsivos aos glucocorticoides, elas apresentam atividades transcricionais diferentes.

Em ausência de ligante, o hGRα reside principalmente no citoplasma, associado a um grande complexo de proteínas, que inclui a polipeptídica do receptor, duas moléculas de hsp90 e outras proteínas. As moléculas de hsp90 parecem sequestrar o hGRα no citoplasma, mantendo o receptor em uma conformação que mascara ou inativa seus sinais de localização nuclear (NLS). Após a ligação ao hormônio, o receptor sofre mudanças conformacionais, resultando na dissociação do hsp90 e outras proteínas, desmascarando os NLSs e expondo o bolso de ligação ao ligante. Nesse novo estado conformacional, o hGRα ativado se transloca para o núcleo, onde se liga como homodímero aos GREs localizados na região promotora dos genes-alvo.

Após a ligação aos GREs, o hGRα ativado melhora a expressão dos genes responsivos aos corticoides, regulando a montagem de um complexo de pré-iniciação transcricional na região promotora dos genes-alvo. Isso é alcançado pela interação do receptor ligando com os fatores de transcrição basais, que incluem a RNA polimerase II e proteínas associadas à TATA (TAFIIs). Essa interação é mediada pelos coativadores, nucleoproteínas com atividades de remodelação da cromatina e outras atividades enzimáticas.