A re-toracotomia em crianças com cardiopatias congênitas complexas representa um momento crítico, onde cada etapa cirúrgica carrega riscos elevados, tanto estruturais quanto hemodinâmicos. Quando realizada após procedimentos como correção de transposição das grandes artérias (ASO) com defeitos associados — como comunicação interventricular (CIV), comunicação interatrial (CIA), coarctação da aorta (CoA), persistência do canal arterial (PCA) —, as alterações anatômicas e fisiológicas residuais podem ser múltiplas, incluindo estreitamentos nas anastomoses da aorta e das artérias pulmonares, com aumento das velocidades de fluxo, hipertrofia ventricular direita e bloqueios incompletos de ramo.

O exame físico inicial muitas vezes é tranquilo: saturação periférica de oxigênio preservada em ar ambiente, sem cianose evidente, com desenvolvimento físico dentro da normalidade, sons cardíacos audíveis e sem estertores pulmonares. No entanto, a cicatriz esternal prévia já antecipa a complexidade da abordagem cirúrgica. A monitorização invasiva precoce — incluindo pressão arterial em membros superiores e inferiores, pressão venosa central e acesso venoso femoral — torna-se indispensável. O padrão anestésico adotado prioriza estabilidade cardiovascular e rápida intervenção em caso de colapso hemodinâmico: propofol, sufentanil, rocurônio e sevoflurano, administrados de forma contínua ou intermitente conforme as necessidades intraoperatórias.

A presença de aderências severas entre o pericárdio e o esterno é um dos principais desafios técnicos. A dissecção dessas aderências pode precipitar eventos críticos, como fibrilação ventricular, exigindo desfibrilação imediata e administração de drogas vasoativas. A manutenção da perfusão durante esses episódios é sustentada por fluidos intravenosos, como soluções de Ringer, amido hidroxietílico e hemácias concentradas. O retorno ao ritmo sinusal não significa estabilidade definitiva, sendo frequentemente necessário instituir circulação extracorpórea (CEC) após o controle da arritmia e estabilização hemodinâmica.

Durante a CEC, identificam-se e corrigem-se as estenoses residuais com patches de pericárdio bovino, ampliando-se as anastomoses críticas — como as da aorta e artéria pulmonar direita. A artéria pulmonar esquerda, frequentemente hipoplásica ou com calibre reduzido, é avaliada quanto à viabilidade funcional. O retorno do ritmo sinusal e da função ventricular ocorre geralmente após o clampeamento da aorta ser liberado, com suporte inotrópico ajustado de acordo com os parâmetros de pressão arterial e débito cardíaco.

O pós-operatório imediato demanda vigilância intensiva, com intubação orotraqueal, monitorização contínua e controle rigoroso do balanço ácido-base, eletrólitos e parâmetros gasométricos. A extubação precoce, possível em até 24 horas em casos estáveis, é seguida por transição à enfermaria cirúrgica por volta do quinto dia, desde que o paciente esteja hemodinamicamente estável, sem necessidade de drogas vasoativas.

A taxa de complicações maiores (MI) em re-toracotomias pediátricas pode atingir até 10%, com lesões em estruturas vasculares e cardíacas antes do estabelecimento da CEC. Por isso, o preparo para canulação emergencial da artéria e veia femoral deve ser parte da rotina cirúrgica em tais casos. A decisão de realizar a re-toracotomia planejada, especialmente em patologias como interrupção do arco aórtico ou TBA (tronco braquiocefálico anômalo), deve considerar a janela ideal de 2 a 3 meses de idade, conforme recomendações do consenso chinês de 2020.

Fatores como o número de cirurgias anteriores, o intervalo entre as intervenções e a gravidade das aderências determinam o risco operatório. Crianças submetidas a três ou mais esternotomias apresentam maior mortalidade perioperatória, refletindo não apenas a complexidade técnica, mas também a deterioração progressiva da função cardíaca. A escolha do momento c

Como a Anestesia e a Gestão Farmacológica Influenciam o Tratamento de Crianças com Deficiência de Acil-Coenzima A Desidrogenase de Cadeia Curta e Defeitos Cardiovasculares

A gestão anestésica de pacientes pediátricos com condições cardíacas complexas, como a Deficiência de Acil-Coenzima A Desidrogenase de Cadeia Curta (SCADD) e defeitos cardíacos congênitos, exige cuidados minuciosos e uma abordagem personalizada, que considere não apenas as peculiaridades do defeito anatômico, mas também as características metabólicas e fisiológicas únicas de cada paciente. A indução e manutenção da anestesia precisam ser adaptadas para garantir a estabilidade hemodinâmica e evitar complicações, como arritmias ou hipoxemia, que são comuns em crianças com condições cardiovasculares complexas.

No caso de um paciente pediátrico com defeito do septo atrial (DSA) e SCADD, a avaliação pré-operatória se torna ainda mais crucial. O SCADD, uma condição genética rara, resulta em uma deficiência na oxidação de ácidos graxos de cadeia curta devido a mutações no gene responsável pela produção da acil-coenzima A desidrogenase. Isso leva a uma falha na produção de energia e ao acúmulo de intermediários metabólicos, causando hipoglicemia, acidose metabólica, e potencialmente comprometendo o sistema nervoso central. Essa condição exige que a anestesia seja cuidadosamente planejada, pois substâncias como o propofol, que são ricas em lipídios e exigem metabolização pela via de ácidos graxos, são contraindicadas. Portanto, deve-se evitar o uso de propofol nesses pacientes, optando por anestésicos que não sobrecarreguem o metabolismo lipídico, como o etomidato, que não interfere na via de metabolização dos ácidos graxos de cadeia curta.

No cenário da cirurgia de DSA, a ventilação unilateral do pulmão (OLV), um método comum em cirurgias torácicas pediátricas, exige estratégias específicas para manter a oxigenação adequada, já que a ventilação de apenas um pulmão pode agravar a hipóxia, especialmente em crianças com um sistema cardiovascular comprometido. Nesse contexto, a escolha dos fármacos e a dosagem correta dos anestésicos são essenciais para evitar a queda da pressão arterial ou distúrbios arrítmicos. Fármacos como o midazolam, etomidato, sufentanil e rocurônio foram escolhidos devido à sua capacidade de manter a estabilidade hemodinâmica sem causar depressão miocárdica excessiva.

A monitorização contínua da função cardíaca é fundamental. No caso do DSA, a presença de taquicardia atrial persistente pode ser difícil de controlar com medicamentos como o propafenona. Em alguns casos, a taquicardia atrial pode ser tratada com um choque elétrico sincronizado ou com o uso de antiarrítmicos intravenosos, como a propafenona, que deve ser administrada lentamente para evitar efeitos colaterais como hipotensão. Amiodarona pode ser uma opção terapêutica, mas seu uso deve ser restrito devido aos efeitos colaterais sobre a tireoide, fígado e sistema nervoso.

É importante destacar que o controle da ventilação durante o OLV deve ser otimizado para reduzir o risco de complicações pulmonares pós-operatórias. Uma estratégia eficaz envolve o uso de volumes correntes menores, cerca de 4 mL/kg, combinados com uma pressão expiratória positiva final (PEEP) de 6 cm H2O, o que ajuda a manter a oxigenação sem sobrecarregar os pulmões. Mesmo em um ambiente de ventilação unilateral, é possível permitir uma certa hipercapnia permissiva, que pode ser vantajosa para reduzir a incidência de complicações respiratórias, desde que a saturação de oxigênio seja mantida acima de 90%.

Outro aspecto relevante da gestão anestésica é o monitoramento cuidadoso dos parâmetros metabólicos, como a glicemia e os níveis de potássio. Crianças com SCADD podem sofrer de hipoglicemia durante o período perioperatório devido à incapacidade de metabolizar adequadamente os ácidos graxos. Portanto, a monitorização rigorosa da glicose e a administração de soluções de glicose, especialmente nas horas que antecedem a cirurgia, são fundamentais. Além disso, é essencial monitorar a função renal e a eletrólitos, já que a acidosis metabólica e as disfunções eletrolíticas podem ser comuns nesses pacientes.

Por fim, a recuperação pós-operatória também requer atenção redobrada. O desmame gradual da ventilação mecânica deve ser cuidadosamente planejado para evitar sobrecarga do sistema cardiovascular. A remoção do tubo endotraqueal, geralmente feita após 5 horas, deve ser acompanhada de uma avaliação constante da função respiratória e da estabilidade hemodinâmica. O monitoramento pós-operatório em uma unidade de terapia intensiva pediátrica (UTI) é imprescindível, dado o risco de complicações respiratórias ou metabólicas que podem surgir nas horas seguintes à cirurgia.

A gestão anestésica desses pacientes, portanto, não se resume apenas à escolha de fármacos adequados, mas também à preparação cuidadosa do paciente, monitoramento constante e adaptação das estratégias durante o curso da cirurgia. A compreensão das complexas interações entre a anestesia, as condições metabólicas e as necessidades fisiológicas do paciente é a chave para um desfecho cirúrgico bem-sucedido.

Como Gerenciar o Tamponamento Pericárdico Durante a Ablatação por Cateter de Radiofrequência em Pacientes Pediátricos

A ablação por cateter de radiofrequência (RFCA) é uma técnica intervencionista utilizada para tratar arritmias cardíacas em pacientes pediátricos. Embora eficaz, esse procedimento envolve riscos, incluindo a possibilidade de tamponamento pericárdico, uma condição grave que pode surgir durante a manipulação do cateter nas cavidades cardíacas. O tamponamento pericárdico ocorre quando há acumulação de sangue ou fluído na cavidade pericárdica, causando uma compressão do coração e impedindo o preenchimento ventricular adequado, o que pode resultar em colapso hemodinâmico. A seguir, discutiremos como o tamponamento pericárdico pode se manifestar durante a RFCA e as abordagens para seu diagnóstico e manejo.

Em um caso clínico relatado, um paciente pediátrico foi submetido a uma RFCA programada para tratar uma taquicardia supraventricular (SVT). Durante o procedimento, o paciente apresentou uma queda abrupta na frequência cardíaca (FC) e pressão arterial (PA). A pressão arterial diminuiu de 88/40 mmHg para 70/33 mmHg, e a frequência cardíaca caiu para 72 batimentos por minuto, a partir de 145. Esses sinais indicam uma complicação grave, possivelmente um tamponamento pericárdico. O diagnóstico foi confirmado por meio de exames de imagem, incluindo uma ecocardiografia de emergência, que mostrou a presença de fluído no pericárdio. Após o procedimento de drenagem pericárdica e reanimação com soluções intravenosas, o paciente foi estabilizado, e a cirurgia foi interrompida.

Durante a RFCA, o tamponamento pericárdico pode ocorrer devido à inserção incorreta do cateter nas cavidades cardíacas, o que pode causar perfuração do coração. As áreas mais comuns de perfuração são as paredes do átrio esquerdo e ventrículo, o seio venoso coronário e as veias pulmonares. Além disso, o uso excessivo de energia de ablação durante o procedimento pode resultar em lesões cardíacas, levando ao tamponamento. Assim, é crucial que os anestesiologistas e cardiologistas monitorizem de perto o paciente durante a RFCA, observando sinais clínicos e parâmetros hemodinâmicos.

Nos casos de tamponamento pericárdico, a monitorização constante dos sinais vitais do paciente é essencial. Se o paciente não responder a manobras de reanimação, como a infusão de líquidos intravenosos ou a administração de medicamentos vasoativos, a hipótese de tamponamento deve ser considerada. O exame de imagem, como a ecocardiografia, pode ser utilizado para confirmar a presença de fluído no pericárdio e avaliar a gravidade do tamponamento.

A anestesia geral é um componente essencial durante a RFCA em pacientes pediátricos. A indução anestésica é realizada com medicamentos como midazolam, propofol, sufentanil e rocurônio, e o tubo endotraqueal é intubado após o desaparecimento do reflexo da cílios. A ventilação é mantida com parâmetros ajustados para garantir uma ventilação adequada, enquanto os sinais vitais do paciente são monitorados. A monitorização da pressão arterial não invasiva, ECG e saturação de oxigênio (SpO2) deve ser realizada o tempo todo.

Embora o tamponamento pericárdico seja uma complicação rara, ele exige uma vigilância constante. Além disso, a técnica de RFCA é frequentemente realizada em pacientes pediátricos mais jovens, cujos corações são menores e mais delicados. Por essa razão, a margem de segurança durante o procedimento deve ser maior, levando em consideração as peculiaridades anatômicas e fisiológicas das crianças.

A ablação por cateter de radiofrequência continua sendo um tratamento eficaz para arritmias pediátricas, mas é vital que os profissionais de saúde, incluindo anestesiologistas e cardiologistas, estejam bem preparados para lidar com complicações como o tamponamento pericárdico. O diagnóstico precoce, a monitorização rigorosa e o manejo apropriado das complicações podem melhorar os desfechos para os pacientes.

Após a cirurgia, a drenagem pericárdica e a monitorização intensiva no ambiente de UTI cardíaca são essenciais para o acompanhamento do paciente. O volume de drenagem pericárdica deve ser observado, e a retirada do tubo de drenagem deve ser realizada conforme os sinais clínicos e os resultados dos exames de imagem. A evolução do quadro pós-operatório pode ser acompanhada por ecocardiografia para verificar a resolução do tamponamento e a presença de outras complicações.

É importante notar que, em pacientes pediátricos, a presença de tamponamento pericárdico pode ser difícil de identificar imediatamente devido à ausência de sintomas clássicos, como dor torácica. Em vez disso, o quadro clínico pode se assemelhar a um reflexo vagal, com bradicardia, palidez e sudorese. Portanto, os exames de imagem devem ser usados de forma decisiva para confirmar o diagnóstico e orientar a intervenção adequada.

Quando Iniciar a ECMO em Pacientes Críticos: Indicações, Modos de Suporte e Precauções

A ECMO (Oxigenação por Membrana Extracorpórea) tem se consolidado como uma tecnologia crucial no tratamento de pacientes com falência circulatória e respiratória grave. Embora a indicação exata para o início da ECMO possa variar de centro para centro, existem diretrizes gerais que orientam sua aplicação em situações de falência orgânica aguda que não respondem ao tratamento convencional.

Uma das principais indicações para o uso da ECMO é a falência respiratória aguda, mesmo após otimização do ventilador, com ajuste de parâmetros como a fração de oxigênio inspirado (FiO2), pressão positiva expiratória final (PEEP) e a relação inspiratória-expiratória. Quando a relação de pressão arterial de oxigênio (PaO2) para a FiO2 cai abaixo de 100 mm Hg, a ECMO pode ser necessária. Da mesma forma, em falências respiratórias hipercápnicas, com pH sanguíneo abaixo de 7,20, ou em choque cardiogênico, onde o sistema cardiovascular não consegue fornecer perfusão adequada aos órgãos vitais, o uso de ECMO se torna uma opção viável.

O uso de ECMO também é indicado em situações de parada cardíaca, especialmente em crianças com falência cardíaca aguda após cirurgia cardíaca, miocardite fulminante ou síndrome de desconforto respiratório agudo (SDRA). Outras condições que podem justificar a ECMO incluem choque séptico, como foi observado durante a pandemia de COVID-19, e dificuldades em desmamar o paciente da circulação extracorpórea (CPB) após cirurgia cardíaca. Além disso, a ECMO tem sido utilizada como ponte para o transplante cardíaco, colocação de dispositivos de assistência ventricular ou até mesmo para o transplante pulmonar.

É importante compreender que, embora a ECMO seja eficaz em fornecer suporte temporário à função cardíaca e pulmonar, ela não possui efeito terapêutico direto sobre as doenças subjacentes. O principal objetivo da ECMO é oferecer tempo para que o organismo se recupere ou para que outras terapias sejam administradas, como o transplante de órgãos. A ECMO funciona drenando o sangue venoso do paciente, oxigenando-o e removendo o dióxido de carbono, para então devolvê-lo ao sistema circulatório, promovendo a troca gasosa e mantendo a perfusão tecidual.

Existem duas abordagens principais para a instalação de ECMO: veno-venosa (VV) e veno-arterial (VA). A ECMO VV é geralmente usada para pacientes com falência respiratória em que a função cardíaca ainda está preservada. O sangue venoso é drenado e passa por um oxigenador para ser reintroduzido nas veias, proporcionando suporte pulmonar sem interferir diretamente na circulação arterial. Já a ECMO VA, utilizada em casos de falência tanto respiratória quanto circulatória, envolve o retorno do sangue oxigenado à circulação arterial, substituindo a função cardíaca e pulmonar do paciente.

Os modos de suporte ECMO são complementares ao tratamento clínico, mas a decisão sobre qual tipo de suporte iniciar depende de diversos fatores, como o quadro clínico, a gravidade da doença e as condições gerais do paciente. O início da ECMO deve ser cuidadosamente avaliado, levando em consideração os benefícios e os riscos do tratamento. Contraindicações absolutas à ECMO incluem doenças irreversíveis que não oferecem possibilidade de recuperação, condições neurológicas graves ou doenças terminais, além de fatores como idade extrema ou defeitos genéticos severos.

Além disso, a ECMO deve ser realizada em um ambiente cuidadosamente monitorado, dado que existem riscos associados ao uso dessa tecnologia, incluindo o sangramento devido à anticoagulação necessária, complicações hemodinâmicas e efeitos adversos no sistema cardiovascular, como arritmias ou pressão arterial não pulsátil. O risco de hemorragia aumenta devido à redução das plaquetas e à diminuição dos fatores de coagulação, tornando essencial a monitoração constante e a reposição de sangue e plaquetas.

Durante a utilização da ECMO, cuidados adicionais devem ser tomados, especialmente no que se refere à posição das cânulas e ao risco de obstrução ou dobra dos tubos. Em crianças, o acesso vascular pode exigir uma incisão cirúrgica direta, e os cuidados com o uso de anticoagulantes, como a heparina, são cruciais para evitar complicações tromboembólicas. A hemodinâmica do paciente também precisa ser monitorada de perto, uma vez que a ECMO pode modificar a pressão arterial, o débito cardíaco e a oxigenação.

Em termos farmacológicos, os efeitos de medicamentos inalatórios podem ser alterados durante a ECMO, visto que a ventilação alveolar é frequentemente reduzida, o que pode comprometer a eficácia dos anestésicos e outros fármacos administrados. Além disso, o aumento do volume sanguíneo total devido ao circuito da ECMO pode interferir na distribuição e eficácia de certos medicamentos, como os inotrópicos e vasoconstritores, que podem ser necessários para estabilizar o paciente.

É fundamental que todos esses aspectos sejam considerados na gestão do paciente em ECMO, garantindo que a terapia seja otimizada para as necessidades individuais de cada caso.