A implementação de dispositivos de assistência ventricular (LVAD) desempenha um papel crucial no tratamento de insuficiência cardíaca avançada. No entanto, o uso desses dispositivos é frequentemente acompanhado por um risco aumentado de trombose da bomba, o que representa um dos maiores desafios clínicos. A evolução dos LVADs visa reduzir essa complicação, com avanços notáveis no design e na mecânica dos dispositivos, particularmente com a introdução de dispositivos magneticamente levitados.

O HeartMate II, por exemplo, é um dispositivo de fluxo axial que apresenta um risco significativamente maior de trombose devido ao estresse de cisalhamento e à geração de calor, ambos resultantes do contato mecânico entre o rotor e as superfícies internas do dispositivo. O risco de trombose no HeartMate II é exacerbado por alterações que podem reduzir o fluxo sanguíneo e a dissipação de calor, fatores críticos no desenvolvimento de complicações. Estudos como o MOMENTUM III, ao compararem o HeartMate II com o HeartMate III, demonstraram taxas de trombose significativamente mais baixas no HeartMate III (0%) em comparação com o HeartMate II (10,1%), destacando a superioridade deste último na prevenção de complicações trombóticas.

O HeartMate III, um dispositivo de fluxo centrífugo, utiliza forças magnéticas e hidrodinâmicas para suspender o impulsor, eliminando pontos de contato mecânico. Essa inovação foi fundamental para reduzir o estresse de cisalhamento e, consequentemente, o risco de trombose. Em ensaios clínicos como o ADVANCE, o HeartMate III demonstrou uma taxa de trombose de apenas 1,1% após dois anos de uso, enquanto o HeartMate II apresentou uma taxa de 15,7%. Esses avanços são atribuídos não apenas à eliminação de pontos de contato, mas também ao design centrífugo que favorece um fluxo mais suave e menor turbulência sanguínea, o que é crucial para prevenir a formação de coágulos.

Entretanto, o risco de trombose ainda persiste, especialmente em dispositivos como o HVAD (HeartWare Ventricular Assist Device), que não alcançou uma redução substancial nas taxas de trombose em comparação com o HeartMate II, apesar de seu design centrífugo e da ausência de pontos de contato mecânico. A análise de ensaios clínicos como o ENDURANCE revelou que, em comparação com o HeartMate II, o HVAD não apresentou redução significativa nos casos de trombose da bomba, apesar de seus benefícios mecânicos.

A patofisiologia da trombose nas LVADs está intimamente ligada às alterações fisiológicas que ocorrem após a implantação do dispositivo, como alterações na coagulação e anomalias hematológicas. A formação de trombos é exacerbada por fatores como a hipercagulabilidade, infecções, distúrbios vasculares e disfunção endotelial. Além disso, o dispositivo em si pode exercer estresses mecânicos que favorecem a adesão de proteínas procoagulantes, como o fibrinogênio e o fator XI, que formam uma rede de fibrina propensa à adesão de plaquetas. No caso do HeartMate II, foi observado que o depósito de fibrina e a hemólise nas proximidades dos suportes do rotor contribuem significativamente para o desenvolvimento de trombos. Esses trombos podem ser classificados em "trombos vermelhos", ricos em células sanguíneas, e "trombos brancos", compostos principalmente por plaquetas e fibrina.

A hipercagulabilidade observada em pacientes com LVADs é um fenômeno multifatorial, que resulta da combinação do estado inflamatório crônico da insuficiência cardíaca avançada, da reatividade plaquetária aumentada devido ao dispositivo e da estase sanguínea gerada pelo fluxo anômalo. A adesão de plaquetas aos dispositivos de LVAD e a propagação contínua da formação de trombos brancos é um ciclo vicioso que pode resultar em complicações graves, como acidente vascular cerebral ou falha do dispositivo.

No entanto, a introdução de técnicas de engenharia como a sinterização – um processo que utiliza calor e pressão para criar uma superfície pseudo-intima sobre o titânio, evitando o contato direto entre o sangue e o metal – demonstrou reduzir significativamente o risco de adesão de proteínas e plaquetas. A engenharia de superfícies biocompatíveis, como o titânio revestido, também tem sido uma estratégia eficaz para minimizar a trombose.

Além do avanço tecnológico, a prevenção da trombose em pacientes com LVADs também depende de uma gestão clínica rigorosa. Isso inclui monitoramento adequado da anticoagulação, prevenção de infecções e a manutenção de um fluxo sanguíneo adequado. A escolha de anticoagulantes, a dosagem e a monitorização dos níveis de INR são cruciais para evitar eventos trombóticos. Estudos clínicos apontaram que a administração insuficiente de aspirina ou anticoagulantes, além de um nível inadequado de INR, estão entre os principais fatores de risco para o desenvolvimento de trombose da bomba. Pacientes com níveis elevados de pressão arterial média (MAP), superior a 90 mmHg, também apresentaram maior risco de trombose, como demonstrado em análises do estudo INTERMACS.

Em resumo, enquanto o desenvolvimento de dispositivos como o HeartMate III representa um avanço significativo na redução do risco de trombose, a complexidade da patofisiologia das tromboses em LVADs exige uma abordagem multifacetada. Isso inclui tanto inovações tecnológicas quanto uma gestão clínica cuidadosa para otimizar a eficácia do tratamento e reduzir as complicações trombóticas associadas a esses dispositivos.

Como o iVAS Pode Transformar o Tratamento de Pacientes com Insuficiência Cardíaca: Avanços e Desafios

O uso de dispositivos de contrapulsação como o iVAS (Intra-Aortic Valve Assist System) tem se tornado um marco na medicina cardiovascular, especialmente para pacientes com insuficiência cardíaca avançada que aguardam um transplante. O iVAS oferece uma alternativa menos invasiva e mais flexível em comparação aos dispositivos tradicionais, como os VADs (Dispositivos de Assistência Ventricular), e apresenta várias vantagens tanto em termos de segurança quanto de eficácia.

O dispositivo iVAS é composto por três componentes principais: o dispositivo de interface com a pele (SID), o dispositivo de interface arterial (AID) e a unidade de acionamento NuPulse (NDU), que pode ser transportada de forma portátil. O SID conecta a interface da pele com o sistema arterial, facilitando a inserção do balão intra-aórtico e da linha de condução externa. Esse sistema minimiza o risco de complicações, como a formação de trombos, ao permitir uma anticoagulação mais leve com o uso de aspirina e warfarina (INR entre 1,5 e 2). A flexibilidade do iVAS permite que o dispositivo seja desligado sem maiores consequências durante períodos curtos, o que não é uma opção em sistemas tradicionais de contrapulsação.

Um aspecto inovador do iVAS é a sua capacidade de responder dinamicamente ao sinal do ECG, ajustando-se automaticamente às necessidades do paciente. Isso garante uma operação mais eficiente e menos dependente de intervenções humanas constantes. Outro benefício é a possibilidade de ajustar o modo de funcionamento do dispositivo (1:1, 1:2, 1:3), adaptando-o às condições específicas de cada paciente. Essa personalização de suporte torna o iVAS uma solução mais eficaz e com maior taxa de sucesso em situações clínicas variadas.

A primeira experiência em humanos com o iVAS foi conduzida em 2016 na Universidade de Chicago. O estudo envolveu pacientes classificados como status 1A ou 1B pela United Network for Organ Sharing (UNOS), ou seja, aqueles que estavam em lista para transplante cardíaco. O estudo demonstrou que 89% dos pacientes atingiram o desfecho primário, que era a sobrevivência até o transplante ou a ausência de acidente vascular cerebral (AVC) nos primeiros 30 dias. Após 6 meses, 80% dos pacientes continuaram a apresentar sucesso no tratamento, o que é um indicativo claro da eficácia do dispositivo. O período médio de suporte foi superior a 30 dias para 64% dos pacientes, e alguns chegaram a ser mantidos por mais de 180 dias.

Os benefícios observados em termos de hemodinâmica foram notáveis: 92% dos pacientes apresentaram melhora nos parâmetros cardíacos, com 69% dos pacientes deixando de precisar de suporte inotrópico após a implantação do dispositivo. Além disso, a função ventricular esquerda, medida pela fração de ejeção, também demonstrou melhorias significativas em vários pacientes, o que destaca a capacidade do iVAS de promover uma recuperação funcional substancial, mesmo em casos graves.

No entanto, como qualquer novo dispositivo, o iVAS apresenta desafios. As complicações mais graves observadas foram o acidente vascular cerebral (AVC) em dois pacientes nos primeiros 30 dias, falha do dispositivo em seis pacientes no período de 30 dias, e infecção do SID em três pacientes. Essas complicações destacam a necessidade de um monitoramento cuidadoso e de intervenções rápidas para mitigar riscos associados. Além disso, alguns pacientes necessitaram de escalonamento do suporte para dispositivos mais avançados, como ECMO ou LVAD, quando o iVAS não foi suficiente para manter o suporte necessário.

No cenário de insuficiência cardíaca avançada, especialmente em pacientes que dependem de inotrópicos ou de dispositivos de suporte temporário, o iVAS tem se mostrado uma alternativa viável para pacientes menos graves que poderiam se beneficiar de um tratamento menos invasivo e mais compatível com a sua qualidade de vida. Embora os dispositivos de assistência ventricular (VAD) sejam mais comuns em pacientes com insuficiência cardíaca mais grave, o uso de iVAS pode reduzir os riscos associados à cirurgia invasiva e complicações prolongadas, como infecções e danos ao dispositivo.

Porém, é importante entender que o iVAS não é uma solução definitiva para todos os pacientes. A seleção de candidatos para o uso do iVAS deve ser criteriosa, levando em consideração fatores como o diâmetro da aorta (acima de 19 mm) e da artéria subclávia (acima de 7 mm), além de condições contraindicadas, como dissecção aórtica, regurgitação aórtica maior que leve e arritmias ventriculares incontroláveis. O uso do dispositivo deve ser acompanhado de perto para garantir que os benefícios superem os riscos, e que os pacientes possam aproveitar ao máximo o potencial terapêutico oferecido.

O iVAS representa um avanço significativo no tratamento de insuficiência cardíaca avançada, mas como toda inovação médica, exige uma avaliação contínua e rigorosa de sua eficácia e segurança a longo prazo. A adaptação do dispositivo para diferentes perfis de pacientes, a monitorização constante e o ajuste da terapêutica são essenciais para garantir os melhores resultados possíveis para aqueles que aguardam um transplante cardíaco ou que necessitam de um suporte cardíaco prolongado.