A gestão de fluxos heterogêneos de migração é uma questão central nas políticas globais contemporâneas, especialmente quando se trata da migração entre o México e os Estados Unidos. A complexidade dos fluxos migratórios, envolvendo diversos perfis de imigrantes, desde trabalhadores temporários altamente qualificados até migrantes irregulares, exige uma abordagem multifacetada e uma compreensão das várias dimensões do fenômeno.
O sistema migratório México-EUA, por exemplo, revela nuances que vão além das estatísticas tradicionais. A migração entre esses dois países, em grande parte impulsionada pela busca de melhores condições de vida, não pode ser reduzida a uma questão econômica ou de mercado de trabalho. Embora o papel dos migrantes mexicanos no mercado de trabalho americano, particularmente nos setores de baixa qualificação, seja amplamente documentado, os fluxos migratórios também envolvem questões culturais, sociais e políticas. A presença dos imigrantes mexicanos nos Estados Unidos é marcada por uma dinâmica de inclusão e exclusão, onde a identidade panétnica se sobrepõe às diferenças culturais locais, resultando em um cenário de discriminação e adaptação mútua.
A migração de trabalhadores mexicanos, por exemplo, tem sido historicamente caracterizada por uma concentração no setor de manufatura e na economia informal, especialmente nas indústrias de montagem, como as maquiladoras, que têm um papel fundamental na dinâmica entre os dois países. Nesse contexto, a política migratória dos EUA, que inclui tanto a repressão às imigrações ilegais quanto a limitação das possibilidades de regularização dos migrantes, tem um impacto significativo. Programas como o NAFTA e a implementação de leis como o Immigration and Naturalization Act de 1965 moldaram o fluxo de imigrantes e suas condições de vida nos Estados Unidos.
O efeito das reformas imigratórias sobre a força de trabalho é multifacetado. Por um lado, as políticas de imigração restritivas visam proteger o mercado de trabalho nacional e reduzir a competição, especialmente entre trabalhadores menos qualificados. Por outro, a presença de trabalhadores imigrantes, frequentemente em condições precárias, tem implicações para a economia, desde a pressão sobre os sistemas de bem-estar social até os impactos no crescimento econômico local. Além disso, o fenômeno da “mexicanização” de determinados setores, como a agricultura e a construção, é um exemplo claro de como os migrantes se tornam parte integrante, e muitas vezes indispensável, da estrutura econômica americana.
Ainda assim, o debate sobre a imigração não pode ser reduzido apenas a números e impactos econômicos. A polarização política, especialmente sob administrações mais conservadoras, exacerba a narrativa de ameaça associada aos migrantes. O discurso anti-imigrante, alimentado por estereótipos raciais e medos sobre a perda de empregos e identidade nacional, tem gerado uma atmosfera hostil, que se reflete em políticas mais rígidas e em um aumento das práticas de criminalização dos imigrantes.
Os fluxos migratórios não são apenas movimentos de pessoas; são também formas de resposta às transformações globais, como as mudanças nas estruturas de trabalho e o impacto da industrialização. No caso do México, a industrialização por substituição de importações e o surgimento das maquiladoras impulsionaram a migração interna e externa, criando uma dinâmica de oferta e demanda de trabalho. As diferenças econômicas entre o México e os Estados Unidos continuam a ser um dos principais motores das migrações, mas elas também estão ligadas a um processo mais amplo de globalização que afeta os padrões de consumo, produção e desenvolvimento em ambos os países.
Ademais, a análise do impacto das políticas imigratórias e da dinâmica social entre migrantes e nativos deve considerar também a questão da integração social. Embora a migração traga vantagens para o mercado de trabalho, especialmente no que se refere à alocação de trabalhadores para setores menos atrativos, ela também acarreta desafios significativos. O estigma associado aos imigrantes e as barreiras sociais e culturais podem dificultar o processo de adaptação e inserção plena na sociedade de acolhimento.
A importância de compreender essas dinâmicas migratórias vai além das questões de política pública. Os leitores devem refletir sobre as interações cotidianas entre migrantes e a população nativa, que muitas vezes são marcadas por preconceitos e uma visão distorcida do papel do imigrante na sociedade. Além disso, é fundamental considerar o impacto psicológico e social da migração para os indivíduos, que muitas vezes enfrentam não apenas a adaptação a uma nova cultura, mas também a pressão por parte de políticas públicas restritivas e da discriminação racial. O estigma de ser um "imigrante indesejável" pode ter consequências profundas na identidade do migrante e na sua capacidade de se integrar plenamente na sociedade de acolhimento.
O fenômeno migratório, portanto, não deve ser visto apenas através de uma lente econômica ou política. Deve-se atentar para a complexidade das experiências individuais e coletivas dos migrantes, que são moldadas por fatores históricos, sociais e culturais. Reconhecer isso é fundamental para desenvolver políticas migratórias mais justas e inclusivas, capazes de responder às necessidades de todos os envolvidos nesse processo.
O Impacto da Migração Não Documentada: Desafios e Dinâmicas de um Fenômeno Global
A migração não documentada, ou migração irregular, tem sido um dos maiores desafios para as nações contemporâneas, especialmente no contexto de países como os Estados Unidos. Esse fenômeno abrange tanto trabalhadores não qualificados quanto famílias em busca de melhores condições de vida, muitas vezes atravessando fronteiras de forma clandestina. A migração não autorizada, embora em parte alimentada pela busca por emprego e melhores condições sociais, também está diretamente ligada a políticas internas, como a repressão ao trabalho informal e as políticas de imigração restritivas.
Nos Estados Unidos, a migração não documentada tem uma história intrincada, profundamente enraizada em acordos como o Bracero Agreement, que, em sua época, permitiu a entrada de trabalhadores mexicanos, mas não solucionou as questões estruturais da imigração. O tamanho da população imigrante indocumentada, especialmente mexicana, permanece substancial, com dados estimados que apontam números significativos de imigrantes sem status legal.
A fronteira, muitas vezes considerada o "limite final" de uma nação, tornou-se um campo de batalha entre as forças da imigração e as políticas de segurança, com medidas mais rígidas de patrulhamento e controle de fronteira. A militarização das fronteiras, somada ao endurecimento das políticas, não só dificultou o acesso de migrantes, mas também aumentou as violações dos direitos humanos ao longo da jornada migratória. O aumento das travessias indocumentadas, muitas vezes com deslocamentos em condições de extrema vulnerabilidade, revela o desespero daqueles que buscam um futuro melhor, mesmo à margem da legalidade.
Além disso, a migração não autorizada também impacta diretamente o mercado de trabalho, especialmente nas indústrias mais informais e menos regulamentadas. Setores como a construção civil e a agricultura dependem em grande parte de trabalhadores imigrantes indocumentados, os quais frequentemente enfrentam condições de exploração e abuso. A falta de documentação torna esses trabalhadores ainda mais suscetíveis à exploração, pois estão em uma posição vulnerável tanto legalmente quanto socialmente.
A questão do trabalho não documentado vai além da exploração laboral. Ela também envolve a mobilidade social e as disparidades salariais entre nativos e imigrantes. A falta de uma rede de segurança legal para os trabalhadores imigrantes contribui para a precarização das condições de trabalho e para a manutenção de desigualdades estruturais. A frustração com o sistema de imigração nos Estados Unidos e em outros países resulta em um ciclo contínuo de exclusão social e econômica para uma parcela significativa da população.
Outro ponto crucial a ser considerado é o impacto da migração indocumentada nas políticas sociais, como saúde, educação e bem-estar. A presença de uma grande população de migrantes não documentados, muitas vezes em estados chamados "santuários", que oferecem alguma proteção legal, não elimina as dificuldades enfrentadas por essas pessoas, especialmente em tempos de crises econômicas ou políticas. A insegurança de status e a marginalização social tornam a vida desses migrantes um desafio constante, e seu acesso a serviços públicos frequentemente é limitado.
É importante ressaltar que, apesar das políticas cada vez mais restritivas, a migração não documentada continua sendo um fator crucial para o crescimento econômico e a manutenção de certas indústrias em países como os Estados Unidos. A contribuição dos migrantes indocumentados para setores como a agricultura, construção e serviços domésticos não pode ser subestimada. Muitas dessas indústrias dependem da mão-de-obra barata e disponível dos imigrantes não qualificados, gerando uma dicotomia complexa entre a necessidade de trabalhadores e a criminalização da sua presença.
O fenômeno da migração não autorizada também está intimamente relacionado a dinâmicas políticas mais amplas, como o racismo estrutural e o nacionalismo. A ascensão de movimentos de direita e a retórica anti-imigração alimentam a estigmatização dos migrantes, associando-os frequentemente a problemas sociais e econômicos, como o desemprego e a violência. Esse estigma social não apenas prejudica a imagem dos migrantes, mas também ignora as realidades mais complexas e as contribuições que esses indivíduos trazem para suas comunidades de acolhimento.
Para os leitores, é fundamental compreender que a migração não documentada não é um fenômeno isolado ou puramente econômico. Trata-se de um fenômeno multifacetado que envolve questões de direitos humanos, políticas públicas, desigualdade social e globalização. Além disso, é importante perceber que, embora as políticas possam restringir a migração indocumentada, as causas subjacentes desse fenômeno são muitas vezes mais profundas e relacionadas a desigualdades estruturais tanto nos países de origem quanto nos países de destino. A luta por melhores condições de vida, a busca por estabilidade econômica e a necessidade de proteção em face de situações de violência e repressão continuam a ser forças motrizes que levam milhões a atravessar fronteiras, muitas vezes à margem da legalidade.
Quais são os Efeitos da Militarização da Fronteira no Fluxo Migratório?
A militarização da fronteira dos Estados Unidos, especialmente após a década de 1990, foi uma intervenção massiva que transformou um sistema migratório até então relativamente estável. O crescimento da verba destinada à patrulha de fronteira gerou um ciclo contínuo de aumento nas detenções de migrantes indocumentados, independente do número real de entradas não autorizadas. Este ciclo funcionou como um mecanismo de retroalimentação, onde o aumento de detenções alimentava a percepção pública sobre a necessidade de legislações mais restritivas e operações mais rígidas de patrulhamento, o que, por sua vez, gerava mais recursos e mais agentes nas fronteiras, resultando em mais horas dedicadas ao patrulhamento e mais detenções. Esse ciclo repetitivo culminou no aumento exponencial do orçamento da Patrulha de Fronteira, como evidenciado pelos gráficos que mostram um crescimento contínuo após a década de 1980, particularmente após a aprovação do Ato de Reforma da Imigração e Responsabilidade do Imigrante em 1996, a criação da Operação Blockade em El Paso em 1993 e a Operação Gatekeeper em San Diego em 1994.
Esse aumento do orçamento não correspondia diretamente a um aumento no número de entradas de migrantes não autorizados, mas sim ao efeito de um sistema que, uma vez em funcionamento, gerava a necessidade de mais fiscalização, mais recursos e mais prisões. De fato, o aumento nas detecções foi em grande parte uma consequência de uma maior presença de agentes e um aumento nos esforços de patrulhamento, que passaram a ser mais concentrados em certos pontos da fronteira, especialmente nas regiões de San Diego e El Paso.
A militarização resultou em um grande deslocamento nos padrões de migração. O foco das operações de patrulha começou a se concentrar nas zonas mais movimentadas, como as já mencionadas em El Paso e San Diego, que forçaram os migrantes a procurarem rotas alternativas. Com isso, os fluxos migratórios foram empurrados para áreas mais remotas e perigosas, como o deserto de Sonora, que apresentava condições extremamente desafiadoras, com temperaturas extremas e escassez de água. As mortes de migrantes aumentaram significativamente após a intensificação das operações de patrulha, como visto nos registros de óbitos que começaram a disparar a partir de 1994, com uma escalada no número de mortes registradas nos anos subsequentes.
Os migrantes, que antes cruzavam a fronteira em locais mais seguros, como áreas urbanizadas, passaram a depender cada vez mais de "coyotes" — guias pagos que ajudavam na travessia. O custo desses serviços subiu vertiginosamente, passando de US$ 500 a US$ 600 por travessia na década de 1970 para quase US$ 2.700 em 2010. Esse aumento nos custos foi diretamente associado ao aumento da fiscalização e das dificuldades de travessia. Além disso, a adoção de guias não apenas tornou a travessia mais cara, mas também mais arriscada, uma vez que os migrantes passaram a percorrer terrenos mais hostis e distantes dos centros urbanos, o que aumentava a probabilidade de acidentes fatais.
Embora a militarização tenha causado um impacto profundo no modo de travessia, no custo e na localização dos fluxos migratórios, o efeito sobre as taxas de apreensão foi mais complexo. Surpreendentemente, o número de detenções não aumentou proporcionalmente às horas de patrulhamento. A razão para isso é que, enquanto a militarização da fronteira causava um deslocamento geográfico dos migrantes para locais mais isolados e perigosos, ela não resultava em maior detecção. O aumento no número de patrulhas em determinados pontos da fronteira não se refletiu diretamente em um maior número de apreensões, o que sugere que o mecanismo de detecção estava mais sobrecarregado e incapaz de acompanhar a dispersão dos migrantes.
Esse fenômeno ilustra como uma política de segurança intensiva, sem uma consideração mais ampla dos fatores socioeconômicos e das realidades das comunidades migrantes, pode não alcançar os resultados desejados. Em vez de reduzir o número de entradas não autorizadas, a militarização da fronteira fez com que os migrantes se adaptassem às novas condições de fiscalização, mudando rotas e métodos de travessia, e resultando em maiores custos e riscos. O efeito disso, paradoxalmente, foi uma intensificação da crise humanitária, ao invés de uma diminuição do fluxo migratório.
O aumento do orçamento da patrulha de fronteira, a maior presença de agentes e a intensificação das operações não garantiram um controle efetivo sobre as migrações indocumentadas, mas sim uma reorganização das rotas migratórias, que, ao mesmo tempo, exacerbaram a violência e os custos para os migrantes. Esse ciclo de retroalimentação, embora aparentemente eficaz em termos de aumentar o número de apreensões, revela a falácia de políticas que ignoram as realidades mais amplas da migração transnacional e as condições em que os migrantes operam.
Como as Relações México-Estados Unidos São Moldadas pela Fronteira e Pelo Nacionalismo
A troca de mensagens e respostas públicas entre os presidentes dos Estados Unidos e do México durante o governo Trump ilustra as tensões diplomáticas entre as duas nações, principalmente no que diz respeito à construção do muro na fronteira e questões comerciais. As mensagens e tuítes de Trump sobre o México revelam uma narrativa de confronto, onde ele acusa o país vizinho de explorar os Estados Unidos economicamente, principalmente em relação ao déficit comercial e ao tráfico de drogas. No entanto, a resposta do México, ainda que forte e direta, reflete um compromisso com a dignidade nacional e uma resistência a ceder a pressões externas.
A postura de Trump em relação ao México, desde o início de sua presidência, foi clara e contundente: o pagamento do muro deveria vir de forma direta ou indireta do México, um país que, segundo ele, "tem um superávit comercial ridículo de 71 bilhões de dólares". Essa retórica é complementada pela afirmação de que o muro é necessário não apenas para a segurança nacional dos Estados Unidos, mas também como um meio de parar o fluxo de drogas e pessoas ilegais, principalmente do México. O ex-presidente, então, afirmou que se o muro não fosse construído, não haveria acordo sobre o comércio com o México. Esta abordagem agressiva refletia não apenas a lógica de "America First" mas também uma visão da relação bilateral como um jogo de soma zero, onde o ganho de um lado é uma perda do outro.
Por outro lado, o governo mexicano, principalmente através de seu ministro das Relações Exteriores, Luís Videgaray, emitiu uma resposta firme, mas diplomática, enfatizando que o México não pagaria pelo muro. Videgaray afirmou que a questão não era uma estratégia de negociação, mas um princípio de soberania e dignidade nacional. Essa resposta também foi um reflexo de uma mudança na forma de comunicação do México, que optou por um canal mais formal e menos inflamado, uma forma de afastar o discurso de confronto direto e promover a cooperação em vez da hostilidade. Essa postura refletiu uma tentativa de manter o respeito pelas normas internacionais e pelas relações diplomáticas, ao mesmo tempo que se mantinha firme na defesa de sua soberania.
Em 2018, Trump voltou a reforçar sua posição, afirmando que o muro seria pago pelo México, seja diretamente ou por meio de algum tipo de reembolso futuro, alegando que o superávit comercial mexicano com os Estados Unidos justificaria o custo da obra. O presidente mexicano, no entanto, não cedeu a essas pressões e reiterou a sua recusa em financiar a construção, com o ministro das Relações Exteriores deixando claro que essa posição era inegociável. Essa troca de declarações não foi apenas um confronto sobre questões econômicas e de segurança, mas também um reflexo das identidades nacionais em jogo, com cada lado buscando preservar sua própria imagem e autoridade no cenário internacional.
O governo Trump, por sua vez, intensificou suas críticas ao México, especialmente em relação ao tráfico de drogas e à imigração. O argumento central de Trump era de que o México não estava fazendo o suficiente para controlar o fluxo de drogas e imigrantes que se dirigiam aos Estados Unidos, responsabilizando-o diretamente por esses problemas. No entanto, ao mesmo tempo, o governo mexicano procurava enfatizar a necessidade de uma abordagem conjunta para lidar com esses problemas, sugerindo que a responsabilidade era compartilhada. O presidente Peña Nieto, por exemplo, afirmou que o México estava pronto para dialogar de forma construtiva e trabalhar com os Estados Unidos em questões de segurança e imigração, mas sempre com base no respeito à soberania de seu país.
Com a chegada de Andrés Manuel López Obrador (AMLO) à presidência do México em 2018, a retórica também começou a mudar. Obrador buscou estabelecer um tom mais amigável e conciliatório, ao mesmo tempo que reafirmava a independência do México. Sua abordagem, ainda que mais suave em relação a Trump, manteve uma postura firme sobre as questões de imigração e comércio. AMLO procurou focar em soluções mais amplas, como programas conjuntos de desenvolvimento e criação de empregos na América Central, tentando não apenas conter a imigração, mas também tratar suas causas estruturais.
Essas dinâmicas revelam não apenas um confronto de políticas públicas, mas também uma disputa de narrativas. Trump procurava representar os Estados Unidos como vítimas de um sistema desigual e de um México que se aproveitava dessa situação, enquanto o México procurava afirmar sua dignidade e sua soberania, resistindo a ser tratado como um subordinado. Essa troca de acusações e respostas não é apenas sobre questões econômicas ou de segurança, mas também sobre o papel de cada nação no sistema internacional e o modo como cada um define sua identidade nacional. O muro, as tarifas e as questões migratórias não são apenas elementos de uma política externa, mas também símbolos da forma como as duas nações se veem uma à outra, em um jogo complexo de interesses, símbolos e poder.
Além disso, é essencial compreender que, apesar de sua retórica agressiva, Trump não estava apenas buscando a construção física de um muro, mas também tentando redefinir as bases das relações econômicas e diplomáticas entre os dois países. O muro e as tarifas se tornaram símbolos de um confronto mais amplo, que envolvia questões de poder, de dependência econômica e de controle da narrativa nacional. O México, por sua vez, teve que equilibrar suas respostas, sendo desafiado a manter a dignidade e, ao mesmo tempo, lidar com a pressão externa. Essa interação entre retórica, política e identidade foi crucial para moldar a relação México-Estados Unidos durante a presidência de Trump e continua a ser um tema central nas relações bilaterais até hoje.
Como os Latinos Respondem à Política Anti-Imigrante nos Estados Unidos?
A crescente polarização política nos Estados Unidos, especialmente após a eleição de 2016, levou muitos observadores a questionar como grupos historicamente marginalizados, como os latinos, reagiriam à retórica anti-imigrante. A ascensão de Donald Trump à presidência foi acompanhada de um discurso que visava, de maneira explícita, mexicanos e outros imigrantes latino-americanos. Esse tipo de retórica, combinada com propostas políticas claramente excludentes, parece ter ativado uma resposta significativa entre a população latina, revelando as complexidades de sua identidade racial e a maneira como essa identidade é manipulada politicamente.
Em 2016, os dados do Collaborative Multi-Racial Post-Election Survey (CMPS) mostraram que a retórica anti-latina de Trump foi um fator motivador para o comportamento político dos eleitores latinos. Aqueles que se viam como parte de um grupo panétnico racializado, ou seja, aqueles que sentiam uma ligação política e social com outros latinos independentemente de sua nacionalidade específica, eram mais propensos a manifestar raiva e descontentamento em relação ao candidato republicano. Essa raiva, por sua vez, se traduziu em um maior engajamento político, como aumento de atividades eleitorais e apoio à candidatura de Hillary Clinton, a principal adversária de Trump.
A identidade panétnica, ou latino/hispânico, embora relativamente nova nos Estados Unidos, tem raízes profundas na história da discriminação e marginalização. O termo "latino" foi utilizado pela primeira vez pelo governo dos EUA em 1970 para agrupar pessoas de origem latino-americana, uma tentativa de simplificar as complexas realidades de grupos etnicamente diversos. Contudo, ao longo das décadas, essa identidade foi moldada pela experiência comum de racismo e exclusão social. Desde os projetos de renovação urbana em Nova York, que afetaram severamente a comunidade porto-riquenha, até as políticas de inglês obrigatório na Flórida, voltadas contra os cubano-americanos, todos esses eventos ilustram a maneira como os latinos foram tratados como um grupo homogêneo em termos de discriminação.
Apesar de as diferenças internas entre os latinos — como a origem nacional, o nível de assimilação e a cor da pele — ainda existirem, a experiência de marginalização tende a unir esses grupos sob uma identidade comum. As dificuldades enfrentadas por mexicanos, porto-riquenhos, cubanos, dominicanos e outros povos da América Latina, ao serem racializados pela sociedade americana, demonstram que a discriminação transcende a origem nacional e cria um senso de pertencimento a uma identidade coletiva. Esse fenômeno tem sido crucial na formação da identidade panétnica latina, que é cada vez mais percebida e experimentada de forma racializada.
A racialização dos latinos nos Estados Unidos é, portanto, um fator importante para entender o comportamento político do grupo. Quando imigrantes latino-americanos chegam aos EUA, eles rapidamente aprendem que suas identidades nacionais específicas muitas vezes são menos relevantes do que o estigma racial atribuído a todos os latinos, independentemente de sua origem. Isso reflete a visão do “outro” que a sociedade americana tem em relação a esse grupo, o que contribui para uma percepção comum de sofrimento e discriminação. Esse processo de racialização intensifica a ideia de uma identidade panétnica, pois, independentemente de serem mexicanos, colombianos, ou dominicanos, a experiência de ser latino nos EUA é muitas vezes marcada por um tratamento uniforme e uma associação com a marginalidade social.
O comportamento eleitoral dos latinos, especialmente durante a eleição de 2016, ilustra como esse processo de racialização pode ser politicamente mobilizado. A retórica de Trump, ao atacar de forma agressiva imigrantes e minorias raciais, não apenas isolou uma parte significativa da população, mas também uniu os latinos em torno de uma identidade política comum. O fenômeno da “fúria política” e do engajamento eleitoral crescente entre os latinos foi um reflexo da percepção de ameaça existencial que muitos sentiram em relação ao futuro de sua comunidade no país.
É crucial entender que, embora a maioria dos latinos seja classificada racialmente como branca, a identificação com o termo panétnico latino/hispânico tem se tornado cada vez mais importante. A maneira como os latinos se veem e se identificam politicamente é fortemente influenciada pela forma como a sociedade americana os racializa. Isso significa que, embora os latinos possam sentir afinidade com sua origem nacional, a identidade panétnica se torna uma resposta coletiva às condições raciais e sociais em que estão inseridos.
Compreender como os latinos respondem à política anti-imigrante é essencial para entender os impactos de uma retórica excludente na mobilização política de minorias. Os dados de 2016 demonstram que uma maior percepção de ameaça pode resultar em uma identidade política mais forte e engajamento nas urnas. No entanto, a discriminação e o racismo continuam a ser fatores estruturais que influenciam não apenas o comportamento eleitoral, mas também a coesão e a solidariedade dentro da comunidade latina.
Ademais, a politização dessa identidade, especialmente em um contexto de crescente animosidade racial e étnica, pode fortalecer a coesão interna do grupo, mas também pode gerar divisões, à medida que os latinos buscam formas de alinhar suas diferentes experiências e prioridades. A retórica política pode, assim, ter o efeito oposto ao desejado, provocando uma resposta mais intensa e organizada entre aqueles que se sentem alvo de políticas excludentes.
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