A assistência circulatória mecânica tem experimentado avanços significativos desde a década de 1960, com desenvolvimentos em dispositivos como as bombas de assistência ventricular esquerda (LVADs) e corações artificiais totais (TAHs). Em 2013, a equipe do Texas Heart Institute iniciou um trabalho inovador no desenvolvimento de um TAH de fluxo contínuo, conhecido como BiVACOR, com o objetivo de oferecer uma solução clínica definitiva para pacientes com falência cardíaca avançada. A principal inovação desse dispositivo é o seu tamanho reduzido e a capacidade de fornecer fluxos de até 20 L/min, um aumento significativo em comparação aos dispositivos anteriores. Além disso, o BiVACOR é menor do que os TAHs pulsáteis, o que o torna adequado para uso em adultos de estatura menor e até mesmo em crianças.

Até 2019, mais de 60.000 LVADs foram implantados, e a expectativa é que a aprovação clínica do BiVACOR aconteça ainda no final de 2023, com base na pesquisa pré-clínica concluída. Vale ressaltar que, até o momento, nenhum dispositivo de fluxo contínuo foi levado ao ponto de falha mecânica. Um paciente do Texas Heart Institute foi mantido em suporte por mais de 18 anos utilizando a mesma bomba, um testemunho impressionante da durabilidade e eficácia dessas tecnologias.

A fabricação de LVADs é liderada pela Abbott (anteriormente Thoratec), que em 2019 reportou que mais de 700 pacientes haviam sido suportados por mais de 10 anos utilizando bombas não pulsáteis. Isso demonstra não apenas a eficácia, mas também a evolução da confiança na longevidade desses dispositivos. No entanto, as complicações observadas em pacientes com LVADs têm estado principalmente relacionadas ao posicionamento anatômico dos dispositivos e à complexidade do gerenciamento médico dos pacientes, que lidam com uma nova fisiologia introduzida pela bomba.

É importante notar que grande parte dos avanços na área da assistência mecânica ao coração foi impulsionada por médicos que buscaram resolver problemas clínicos específicos, como os pioneiros Gibbon, com sua máquina coração-pulmão, e Cooley, com o TAH. Em particular, o TAH é mais eficaz quando funciona em paralelo com o coração nativo, mantendo a abertura da válvula aórtica durante a operação. Essa abordagem é vista como uma das melhores práticas para a operação desses dispositivos, preservando a fisiologia do paciente.

O Texas Heart Institute desempenhou um papel crucial na história dos dispositivos de assistência circulatória, com mais de 1.200 transplantes cardíacos e 1.000 implantes de LVADs realizados entre 1982 e 2012. Estes procedimentos salvaram inúmeras vidas, mas a dependência de corações de doadores e a falta de melhorias na sobrevivência a longo prazo dos pacientes transplantados ainda representam limitações significativas. As chances de sobrevida de um paciente transplantado não mudaram muito desde a década de 1990, o que reforça a necessidade de uma abordagem mais eficiente e escalável, como os dispositivos artificiais de coração, que podem ser “prontos para uso” (off-the-shelf).

Dentro da vida profissional dos médicos que lerão este livro, é possível que a falência cardíaca seja tratada de forma mais eficaz com um dispositivo totalmente implantável, sem a necessidade de depender de um coração de doador. Esse futuro está se tornando cada vez mais tangível, à medida que novas tecnologias de assistência circulatória evoluem, levando à possibilidade de melhorar as taxas de sobrevivência e reduzir as complicações associadas ao uso de dispositivos como os LVADs e TAHs.

Além disso, é fundamental que os leitores entendam que, embora esses dispositivos estejam cada vez mais avançados, a aceitação e a adaptação dos pacientes à fisiologia alterada por essas bombas continuam a ser desafios. A introdução de uma nova dinâmica circulatória no corpo humano exige um gerenciamento médico cuidadoso e um acompanhamento constante para minimizar riscos. A qualidade de vida dos pacientes que recebem essas tecnologias pode ser muito melhorada, mas o risco de complicações, embora minimizado, ainda persiste.

Como Gerenciar Cuidados Pós-Operatórios em Pacientes com Suporte Circulatório Mecânico

Os dispositivos de assistência circulatória mecânica, como o Centrimag, TandemHeart, Impella RP e o ProtekDuo, são frequentemente empregados em pacientes com falência cardíaca grave, oferecendo suporte temporário enquanto aguardam um possível transplante ou recuperação da função cardíaca. Esses dispositivos, apesar de serem fundamentais, apresentam riscos significativos de complicações, como infecção, sangramento e disfunção de órgãos. Quando implantados, o cateter de entrada geralmente é colocado na veia cava inferior ou na veia jugular interna, enquanto o cateter de saída é posicionado na artéria pulmonar. Esses dispositivos podem fornecer diferentes fluxos de sangue, sendo o Centrimag capaz de fornecer até 10 L/min, o TandemHeart até 4,5 L/min, e o Impella RP também até 4,5 L/min, com uma duração de suporte variando de 14 a 30 dias, dependendo do dispositivo e da condição do paciente.

Após a cirurgia, a principal preocupação é a instabilidade hemodinâmica, com a avaliação contínua dos parâmetros cardíacos e o manejo das complicações. No ambiente de UTI, o paciente é monitorado de perto para detectar sinais de falência ventricular direita (FVD) ou complicações hemorrágicas. A falência ventricular direita, comum após a implantação de dispositivos como o LVAD (Left Ventricular Assist Device), pode ser identificada por meio de métodos semiquantitativos de avaliação da função longitudinal e radial do ventrículo direito (RV), com a utilização de parâmetros como RVFAC, TAPSE e S′. Em caso de falha, o tratamento pode incluir suporte farmacológico, ajuste na velocidade do rotor do dispositivo e, se necessário, o uso de dispositivos adicionais como o VA-ECMO ou um RVAD temporário.

O sangramento pós-operatório é uma das complicações mais comuns após a implantação de um LVAD. Os pacientes geralmente são iniciados em terapias anticoagulantes para prevenir complicações trombóticas, com a meta de manter um INR entre 2 e 3. O sangramento intratorácico grave, que pode necessitar de reoperação, ocorre em até 30% dos casos, e é tratado com reposição de fluidos, administração de produtos sanguíneos e, em casos mais graves, intervenção cirúrgica. Além disso, o risco de complicações hemorrágicas também está associado ao uso de anticoagulantes pré-operatórios, como a heparina, e à utilização de bombas de circulação extracorpórea prolongada.

Outro aspecto importante a ser considerado no manejo pós-operatório é o risco de infecção. Pacientes com dispositivos de assistência circulatória mecânica estão particularmente vulneráveis a infecções no local das incisões, nos drenos ou devido ao uso de ventilação mecânica prolongada. A utilização rigorosa de técnicas estéreis, lavagem frequente das mãos e antibióticos profiláticos são fundamentais para minimizar o risco de infecção. Além disso, o suporte nutricional adequado e a fisioterapia precoce são essenciais para a recuperação do paciente, ajudando na cicatrização das feridas e na prevenção de complicações infecciosas.

A implantação de dispositivos como o BiVAD (Biventricular Assist Device) pode ser necessária em casos de falência biventricular irreversível, com suporte contínuo para ambos os ventrículos. O BiVAD é particularmente útil em pacientes com cardiomiopatias restritivas ou infiltrativas, falência de alotransplantes ou taquicardias ventriculares refratárias. Embora as bombas contínuas, como o HeartMate III, não sejam ainda aprovadas pela FDA para uso em biventricular, seu uso off-label tem demonstrado resultados promissores. Outro dispositivo de importância é o Total Artificial Heart (TAH), um coração artificial pneumático que substitui os ventrículos nativos e pode ser uma solução para pacientes com falência biventricular terminal.

É importante destacar que, embora a maioria dos pacientes com insuficiência cardíaca grave possa ser manejada com dispositivos temporários de suporte circulatório, o tratamento definitivo muitas vezes envolve a realização de um transplante cardíaco. Em casos de falência biventricular, o suporte com dispositivos como o VA-ECMO, RVAD ou BiVAD pode oferecer um tempo crucial para que o paciente seja transferido para a lista de transplante ou aguarde a recuperação da função cardíaca.

Além das complicações relacionadas diretamente aos dispositivos, é essencial que o paciente seja monitorado de perto para evitar complicações de órgãos não cardíacos, especialmente em pacientes que necessitam de cirurgias não cardíacas. O manejo eficaz de pacientes com LVADs e outros dispositivos de assistência circulatória mecânica exige uma abordagem multidisciplinar, com a colaboração de cirurgiões cardiotorácicos, anestesiologistas cardíacos e cirurgiões não cardíacos, garantindo que todas as condições clínicas do paciente sejam adequadamente gerenciadas.

É fundamental, portanto, que o manejo pós-operatório de pacientes com suporte circulatório mecânico seja feito de maneira rigorosa, com atenção contínua às complicações hemorrágicas, infecciosas e hemodinâmicas. A colaboração entre as equipes de cuidado é essencial para garantir a melhor recuperação possível para esses pacientes, muitos dos quais estão aguardando um transplante cardíaco ou tentando se recuperar de uma falência cardíaca grave.

Como o Suporte Circulatório Mecânico e a Terapia Anticoagulante Influenciam o Sangramento Gastrointestinal: Desafios e Avanços

O sangramento gastrointestinal (GI) é uma das complicações mais graves em pacientes com dispositivos de assistência ventricular esquerda (LVADs). O risco de hemorragia GI em pacientes submetidos a LVADs contínuos está intimamente ligado a uma série de fatores patofisiológicos complexos, que envolvem desde a disfunção plaquetária até a ativação de mecanismos de coagulação. A presença de distúrbios adquiridos, como a síndrome de von Willebrand, e a formação de malformações arteriovenosas, combinada com a necessidade de anticoagulação contínua, cria um cenário multifatorial para o surgimento de sangramentos.

A anticoagulação tem um papel crucial no manejo de pacientes com LVADs, pois esses dispositivos aumentam significativamente o risco de trombose e formação de coágulos. O uso de anticoagulantes, como a warfarina, é fundamental para minimizar a formação de trombos dentro do dispositivo e em outras partes do sistema circulatório. Contudo, a anticoagulação excessiva pode levar a eventos hemorrágicos, complicando ainda mais o quadro clínico. Nesse contexto, a eficácia de diferentes terapias anticoagulantes e antiplaquetárias tem sido amplamente investigada, com estudos sugerindo alternativas promissoras ao regime tradicional de warfarina, como o uso de apixabano e dabigatrana.

Estudos recentes indicam que, em comparação com a warfarina, o apixabano apresenta um perfil hemostático favorável, com menos complicações hemorrágicas, especialmente em termos de sangramentos gastrointestinais. Isso sugere que o apixabano pode ser uma escolha mais segura para pacientes com LVADs em termos de controle de sangramentos, embora os resultados não tenham sido completamente conclusivos em todos os aspectos. Um estudo retrospectivo comparando 20 pacientes tratados com warfarina a 15 tratados com apixabano encontrou taxas de sangramentos mais baixas no grupo de apixabano, especialmente no que se refere ao sangramento gastrointestinal, que apresentou uma redução significativa (6% contra 30% no grupo da warfarina). No entanto, os autores do estudo afirmam que esses resultados não foram estatisticamente significativos, destacando a necessidade de mais pesquisas sobre o assunto.

Além disso, o uso de terapias combinadas com inibidores plaquetários e outros anticoagulantes experimentais tem mostrado resultados interessantes. O uso de clopidogrel, por exemplo, combinado com anticoagulantes, pode fornecer um controle mais eficiente sobre a formação de coágulos sem induzir um aumento significativo do risco de sangramentos, o que pode ser particularmente útil em pacientes com LVADs. A escolha do tratamento adequado, no entanto, deve ser cuidadosamente individualizada, levando em consideração não apenas os fatores de risco do paciente, mas também a resposta a diferentes esquemas terapêuticos.

Os avanços no entendimento dos mecanismos patofisiológicos que levam ao sangramento gastrointestinal em pacientes com LVADs estão pavimentando o caminho para abordagens terapêuticas mais personalizadas e eficazes. A síndrome de von Willebrand adquirida, que causa defeitos na função plaquetária, e as malformações arteriovenosas são fatores que contribuem significativamente para o sangramento, tornando essencial um diagnóstico precoce e um manejo adequado. Os pacientes com LVADs, portanto, requerem uma vigilância contínua e uma abordagem terapêutica adaptada, que considere tanto a necessidade de prevenir complicações trombóticas quanto o risco de hemorragias.

O tratamento do sangramento gastrointestinal em pacientes com LVADs também envolve o uso de terapias adjuvantes, como o uso de inibidores da serotonina e outras drogas que modulam a função endotelial e plaquetária. Embora o tratamento farmacológico seja um dos pilares da terapia, os procedimentos endoscópicos e cirúrgicos podem ser necessários em casos mais graves. A realização de endoscopias repetidas tem se mostrado útil para monitorar e, em alguns casos, intervir no tratamento de sangramentos persistentes, embora a eficácia desses procedimentos ainda seja tema de debate, dado que nem sempre proporcionam alívio duradouro.

Adicionalmente, o papel dos tratamentos mais recentes, como o uso de bevacizumabe para controlar sangramentos refratários, está sendo testado em estudos clínicos, mostrando resultados promissores em algumas situações. O bevacizumabe, que atua como um inibidor do fator de crescimento endotelial vascular, pode ajudar na redução da angiogênese patológica que contribui para as malformações arteriovenosas e sangramentos.

É importante destacar que, além do manejo imediato do sangramento, a prevenção a longo prazo também é um aspecto crucial. As abordagens preventivas incluem o controle rigoroso dos níveis de anticoagulação, o monitoramento constante das condições do dispositivo e a identificação precoce de complicações hemodinâmicas. Em paralelo, o tratamento de condições comórbidas, como a insuficiência renal e os distúrbios endócrinos, também desempenha um papel significativo na redução do risco de complicações hemorrágicas.

Portanto, o manejo do sangramento gastrointestinal em pacientes com LVADs envolve uma abordagem multidisciplinar que vai desde a escolha adequada dos anticoagulantes até a intervenção terapêutica direta. O avanço das pesquisas em anticoagulação e novas estratégias terapêuticas oferece um panorama promissor, embora ainda haja muitos desafios a serem superados. A personalização do tratamento e a monitoração constante continuam sendo a chave para garantir o melhor prognóstico a longo prazo para esses pacientes.