A pesquisa sobre as atitudes sociais britânicas revela uma mudança crescente na direção do UKIP, um reflexo de uma transformação mais profunda na sociedade britânica. A crescente adesão a ideias como a de que o bem-estar deve ser um benefício fornecido de acordo com a necessidade, não como uma escolha de estilo de vida, ou a crença de que as escolas gramáticas são um motor essencial para a mobilidade social, exemplificam o deslocamento das atitudes tradicionais. O maior ponto de virada, sem dúvida, é a questão da imigração. Para muitos britânicos, a imigração se tornou o maior desafio enfrentado pela nação, com implicações diretas na economia, no sistema de saúde (NHS), nas escolas, nos serviços públicos e no déficit do governo. Por décadas, os debates sobre a imigração foram silenciados pelas instituições, mas o UKIP, em sua postura combativa, abriu um espaço para que essa questão fosse abordada de maneira aberta e honesta.

É fundamental reconhecer que a imigração é uma questão de magnitude crítica. Em 2010, mais imigrantes chegaram ao Reino Unido do que nos mil anos anteriores combinados. Isso gerou um ponto de ruptura no modelo tradicional de acolhimento. Não se trata de uma postura contra os imigrantes. O discurso de que os imigrantes trazem qualidades admiráveis e buscam uma vida melhor é uma constante, mas, com meio milhão de novos chegados por ano, torna-se evidente que a situação é insustentável. Aqueles que analisam a questão com honestidade reconhecem que, mesmo que se admire o desejo de prosperidade dos imigrantes, não se pode ignorar a sobrecarga do sistema.

Por muito tempo, a política de imigração foi tratada como tabu, e aqueles que se atreviam a levantar a voz contra a imigração em massa eram frequentemente silenciados, rotulados como intolerantes. Entretanto, o UKIP se posicionou como a única força política disposta a dialogar com a população sobre esse tema de forma transparente. Em diversas partes do país, longe da Londres politicamente correta, grandes audiências têm se reunido para discutir o impacto da imigração na vida cotidiana, e não são apenas membros de partido, mas cidadãos comuns, preocupados com o futuro de suas comunidades.

A pergunta "Quem somos nós?" torna-se central quando se observa o eleitor típico do UKIP. De fato, o eleitor típico do UKIP não existe. O partido atrai uma gama vasta de indivíduos de diferentes camadas da sociedade britânica. Empregados, patrões, empresários, trabalhadores autônomos, jovens e idosos. Alguns à esquerda, outros à direita, muitos no centro. A maioria não é ideológica, mas compartilha uma insatisfação comum com a política convencional de Westminster. Esses eleitores estão fartos dos "políticos de cartolina", daqueles que jogam o jogo da política de modo superficial, com foco em pesquisas de opinião e tentando agradar a todos, sem nunca se comprometer com uma visão clara e direta.

É interessante notar que muitos desses eleitores não se sentem desconectados da política, mas sim dos políticos. Eles têm um desejo profundo de discutir questões fundamentais de maneira franca, sem rodeios, algo que o UKIP tem proporcionado, ao contrário dos outros partidos, que hesitam em abordar questões como a imigração, por medo de alienar eleitores. Quando o UKIP se posiciona, o faz com coragem, não buscando ajustar suas opiniões ao que as pesquisas sugerem ser popular. Isso gera uma identificação com aqueles que se sentem excluídos ou ignorados pelas estruturas políticas dominantes.

A crise da identidade, portanto, é um fenômeno que não se restringe à política de imigração, mas reflete uma crise mais profunda na percepção de quem somos enquanto nação. A sociedade contemporânea enfrenta uma crise da identidade social, onde as percepções do "eu" se tornam mais fragmentadas e nebulosas. A incerteza sobre o futuro, o medo de perder uma identidade cultural e a perda de confiança nas instituições políticas aumentam o apelo de narrativas populistas. Estas narrativas oferecem uma resposta clara: uma definição simples do "outro", seja ele o imigrante, o político distante ou a elite globalizada, em contraste com o "nós", o povo que luta pela preservação de uma identidade ameaçada.

A busca por autoestima e significado é um dos motores mais poderosos por trás do crescimento do populismo. Quando as necessidades de agência (a capacidade de influenciar o que acontece em nossas vidas), autoestima e significado não são atendidas, as pessoas procuram essas soluções em ideologias que oferecem respostas rápidas. O populismo, muitas vezes, preenche esse vazio ao proporcionar um sentido de pertencimento, ao criar uma narrativa de "nós contra eles", e ao afirmar que a solução para os problemas sociais está em uma ação direta, sem os entraves das estruturas políticas tradicionais.

Além disso, a questão da imigração não deve ser entendida isoladamente, como um simples problema de números. Trata-se de um reflexo de uma mudança estrutural na própria natureza das sociedades modernas. O mundo globalizado, com suas movimentações rápidas de pessoas, culturas e ideias, coloca em xeque os conceitos de pertencimento e coesão social. A identidade nacional, que antes parecia clara e imutável, agora é questionada por muitos. E é aqui que o populismo oferece uma resposta, por vezes simplista, mas eficaz: uma volta às "raízes", ao que é percebido como "autêntico" e "verdadeiro".

É essencial entender que, embora a imigração seja um tema central, a crise da identidade social está enraizada em algo mais profundo. O populismo, com seu apelo emocional e simples, tem sucesso em tempos de incerteza e frustração, pois oferece algo que muitos sentem faltar: um sentido de controle, de agency, e de pertencimento. O debate sobre imigração, portanto, não deve ser apenas sobre números ou políticas, mas sobre o que essas mudanças significam para a percepção de identidade e pertencimento em uma sociedade em constante transformação.

Como Líderes Populistas Moldam Identidades: Lições de Jerry Falwell e Viktor Orban

Na década de 1980, os fundamentalistas enfrentavam uma crise existencial, com um risco iminente de isolamento e até extinção no contexto cultural volátil da época. A perda de um dos pilares definidores da identidade fundamentalista levou à busca por novas estratégias. Foi então que Jerry Falwell, até então um típico líder fundamentalista, percebeu que o isolamento não era mais uma opção. Ele e outros líderes começaram a expandir sua visão, buscando alianças com evangélicos e encorajando os fundamentalistas a penetrarem nas profissões, além de cultivar relações com políticos simpáticos. Isso resultou em uma transformação na maneira como os fundamentalistas viam seu papel na sociedade.

Falwell estabeleceu uma nova base para os fundamentalistas, um movimento que, embora permanecesse fiel a certos princípios, precisava se expandir e se redefinir para garantir a continuidade de sua influência. Em vez de pregar o significado literal das escrituras, ele reafirmou a autoridade inerrante da Bíblia, mas passou a enfatizar um objetivo mais amplo: a necessidade de uma transformação moral nacional. Aquele que antes se dedicava a conversões individuais agora visava uma espécie de renascimento espiritual para a nação inteira. Falwell acreditava que, para essa transformação acontecer, o pecado deveria ser denunciado com veemência, pois "não se muda nada se não fizer as pessoas ficarem furiosas". Assim, o fundamentalismo se reformulou dentro de um conceito maior: o dos "nascidos de novo", que deveria permeiar todas as esferas da sociedade, desde as universidades até os negócios.

Apesar dessa ampliação de seu alcance, Falwell não deixou de lado a condenação tradicional do pecado e a importância do arrependimento e da renovação espiritual. A chave para o sucesso desse movimento foi a habilidade de Falwell em representar pessoalmente a nova identidade que ele procurava promover. Ao participar de debates públicos com liberais e não-crentes, ele não apenas ampliava a voz do fundamentalismo, mas também dava aos seus seguidores a sensação de que estavam finalmente sendo ouvidos e respeitados na arena pública.

Falwell foi um mestre na adaptação da identidade fundamentalista. Mas, ironicamente, essa reconfiguração acabaria por contribuir para a gradual decadência do fundamentalismo protestante nos Estados Unidos. A identidade que ele ajudou a forjar, ao se afastar da pureza fundamentalista em busca de uma base mais ampla, também diluía as raízes do movimento e seu sentido original.

Em um cenário diferente, Viktor Orban, o atual primeiro-ministro da Hungria, exemplifica como líderes populistas sabem se utilizar de identidades tradicionais para criar uma forte oposição entre "nós" e "eles". Ele tem sido um dos líderes mais eficazes em cultivar uma narrativa populista que, como Falwell, define um "inimigo" claro e tangível. A Hungria, uma nação histórica marcada por um longo passado de vitimização — desde a perda de grandes territórios após a Primeira Guerra Mundial até a dominação soviética — serve como o cenário perfeito para a ascensão de Orban. Ele se apresenta como o defensor de uma Hungria independente e orgulhosa contra forças externas ameaçadoras.

A ascensão do populismo de Orban se deu com a intensificação da crise migratória europeia, em particular a chegada de refugiados do Oriente Médio e da África. Orban se aproveitou dessa situação para reforçar sua narrativa, apresentando os imigrantes e os muçulmanos como os inimigos internos. Ele rapidamente construiu uma identidade nacional em oposição ao "inimigo", com uma ênfase na defesa das raízes culturais e religiosas húngaras. Como Falwell, Orban se posicionou como o verdadeiro representante de uma nação que precisava se proteger das ameaças externas e internas. Ele foi capaz de unir sua base, que se sentia marginalizada e ameaçada, sob a bandeira de uma identidade nacional que era simultaneamente conservadora e populista.

Ambos os líderes, Falwell e Orban, mostraram uma habilidade única em manipular e moldar identidades. Eles compreenderam que, para alcançar o poder e a lealdade de seus seguidores, era necessário mais do que defender um conjunto rígido de ideias; era preciso criar uma narrativa que conectasse as emoções e o senso de pertencimento das pessoas com uma visão de mundo que as colocasse em oposição a uma ameaça externa. Esse processo de "construção do inimigo" é central para qualquer movimento populista bem-sucedido.

A adaptação da identidade em movimento não se limita a simples estratégias políticas ou religiosas, mas envolve um profundo entendimento das dinâmicas sociais e culturais que influenciam a percepção coletiva. Ao moldar e redefinir a identidade de seus seguidores, esses líderes criam uma base sólida de apoio que é ao mesmo tempo resistente e maleável, capaz de se ajustar às mudanças sem perder seu núcleo fundamental. Contudo, o risco dessa adaptação constante é que ela pode enfraquecer as raízes da identidade original e gerar uma desconexão gradual com seus próprios princípios, como se observou no declínio do fundamentalismo protestante nos Estados Unidos.