O fenômeno das "fake news", embora amplamente debatido hoje, não é uma novidade. O pânico causado pela adaptação de "A Guerra dos Mundos" de H.G. Wells em 1938, nos Estados Unidos, a invenção dos rumores sobre cartuchos de gordura animal que motivaram a Revolta dos Sipais em 1857, na Índia, e o uso histórico do "libelo sanguíneo" para perseguir judeus, são apenas alguns exemplos de como a desinformação tem sido usada ao longo da história para manipular a opinião pública. A diferença, no entanto, reside na velocidade, intensidade e alcance com que as informações circulam na era digital.

O avanço da digitalização da informação e o surgimento da Internet trouxeram uma transformação radical na forma como a informação é disseminada. O impacto disso é profundo, pois as informações hoje circulam de forma muito mais rápida e intensa, atingindo uma audiência global em um curto espaço de tempo. A informação digital tem uma intensidade e extensão que antes eram inimagináveis, alcançando milhões de pessoas instantaneamente, o que não era possível nas épocas em que os jornais e transmissões de rádio dominavam a comunicação.

Anteriormente, espalhar informações falsas exigia acesso a recursos caros, como impressoras ou estações de rádio. Agora, qualquer pessoa com um perfil em redes sociais pode criar e divulgar conteúdo falso ou distorcido, o que torna o controle de tais informações mais difícil. Além disso, a quantidade de dados que circulam na Internet é tamanha que os cidadãos muitas vezes não conseguem distinguir o que é verdadeiro do que é falso. Os meios de comunicação tradicionais, que por muito tempo serviram como baluartes da veracidade, não conseguiram acompanhar a evolução tecnológica e a nova dinâmica da comunicação. Em muitos casos, jornais respeitados são eclipsados por fontes de informação novas, visivelmente atraentes, mas, frequentemente, imprecisas ou completamente falsas.

Diante desse cenário, as pessoas podem acreditar, e até agir com base, em informações equivocadas. Isso cria uma sociedade vulnerável à manipulação. Muitos argumentam que o termo "fake news" é insuficiente para descrever adequadamente esse fenômeno, que é muito mais complexo. O termo muitas vezes é utilizado de maneira excessiva, ou até manipulada, por líderes políticos, como o ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump ou o presidente filipino Rodrigo Duterte, para desqualificar informações que lhes são inconvenientes, independentemente de serem verdadeiras ou falsas.

A disseminação de informações falsas tem várias facetas e, para melhor compreender essas dinâmicas, o conceito de "DRUMS" (Distorsões, Rumores, Mentiras, Desinformação e Difamações) foi criado. Esse acrônimo foi sugerido por Ng Eng Hen, Ministro da Defesa de Singapura, para descrever o fenômeno da manipulação informacional na sociedade moderna. DRUMS não se refere apenas às notícias falsas, mas a uma gama de conteúdos criados e disseminados com o propósito de desestabilizar a sociedade. Esses conteúdos podem assumir diversas formas, mas todas têm um elemento comum: seu objetivo é influenciar a percepção pública, criar confusão, e distorcer a realidade de maneira a atingir objetivos políticos ou sociais específicos.

O conceito de DRUMS pode ser entendido através de uma analogia filosófica proposta por Ludwig Wittgenstein, que usou a ideia de "semelhanças familiares" para explicar como coisas aparentemente diferentes podem ser unidas por uma característica comum. Assim, as diferentes formas de distorção de informações compartilham entre si uma série de semelhanças, mesmo que seus formatos e contextos variem. Essa compreensão ajuda a mapear a multiplicidade de estratégias utilizadas por aqueles que desejam manipular a opinião pública, seja por interesses políticos, econômicos ou ideológicos.

A era digital e a proliferação de plataformas de mídia social amplificaram ainda mais o problema da desinformação. Com a acessibilidade das ferramentas para a criação e disseminação de conteúdo, qualquer indivíduo ou grupo pode lançar campanhas de desinformação em larga escala. Além disso, a utilização de algoritmos nas redes sociais contribui para o espalhamento de informações distorcidas. Tais algoritmos favorecem conteúdos que geram mais engajamento, muitas vezes priorizando sensacionalismo, polarização e até mesmo inverdades, em detrimento da veracidade dos fatos.

Esse ambiente de desinformação cria uma série de desafios para a sociedade moderna. Para além do simples reconhecimento das mentiras, há uma necessidade urgente de entender como essas informações afetam os processos sociais, políticos e até psicológicos. É crucial que os cidadãos desenvolvam uma alfabetização midiática sólida, que não se limite apenas a identificar mentiras, mas também a entender os contextos e as intenções por trás de cada narrativa. A manipulação da informação não é apenas uma questão de conhecimento factual; ela envolve estratégias psicológicas complexas que exploram vulnerabilidades cognitivas, como a tendência humana para buscar padrões e confirmar crenças pré-existentes. Portanto, reconhecer as táticas utilizadas por aqueles que propagam DRUMS é um passo fundamental para proteger a sociedade contra os efeitos corrosivos da desinformação.

Como a Educação Precisa Evoluir para o Mundo Pós-Verdade

A rápida evolução da tecnologia e a transformação dos mercados de trabalho exigem que as novas gerações estejam mais preparadas do que nunca. No entanto, a realidade global revela que, mesmo em países como Cingapura, onde as habilidades da população jovem são mais avançadas do que em outras nações, uma grande parte da juventude não está verdadeiramente preparada para os desafios do mundo contemporâneo. Aproximadamente um terço dos jovens adultos, mesmo em um dos países mais avançados do mundo, não possui as habilidades essenciais para prosperar na era moderna. Este cenário se reflete em uma observação crítica: a educação precisa se adaptar rapidamente à velocidade das mudanças, preparando os indivíduos não apenas para resolver problemas simples, mas para navegar por um mundo de informações contraditórias, complexas e frequentemente volúveis.

Vivemos em uma era de pós-verdade, onde o simples entendimento e análise de informações não são mais suficientes. A educação, portanto, não pode mais se basear apenas na transmissão de conteúdos, mas deve equipar os indivíduos com ferramentas cognitivas que lhes permitam discernir o real do falso e desenvolver um pensamento crítico diante da multiplicidade de fontes informativas que bombardeiam a sociedade. Não se trata apenas de aprender um conjunto fixo de informações, mas de adquirir a capacidade de navegar por um mar de incertezas, utilizando um compasso ético sólido e uma visão holística do mundo.

Neste novo cenário, a educação não pode mais ser vista como um processo estático, mas como um contínuo desenvolvimento de habilidades que permitam aos indivíduos não só compreenderem, mas também moldarem o mundo ao seu redor. Em vez de simplesmente transmitir conhecimento, as escolas precisam preparar os alunos para se tornarem cidadãos críticos, capazes de lidar com questões éticas, sociais e emocionais de maneira integrada. Para isso, o desenvolvimento de competências emocionais, como empatia, compaixão, colaboração e autorregulação, são fundamentais. Essas competências, muitas vezes negligenciadas nas abordagens tradicionais de ensino, são essenciais para formar indivíduos capazes de responder aos dilemas morais e sociais do mundo moderno.

O conceito de "Educação 2030" surge como um modelo inovador para as escolas do futuro. Este modelo enfatiza a criação de novos valores, a habilidade de lidar com tensões e dilemas e o desenvolvimento de um senso de responsabilidade global. A capacidade de gerar valor novo não se limita à criatividade, mas envolve a habilidade de transformar ideias inovadoras em ações concretas, que possam realmente contribuir para o bem-estar coletivo. Além disso, é crucial que os jovens aprendam a lidar com as tensões e contradições que surgem na sociedade globalizada, equilibrando demandas diversas como liberdade e responsabilidade, autonomia e comunidade, inovação e continuidade.

A educação do futuro não pode ser apenas reativa, mas deve preparar os indivíduos para enfrentarem mudanças constantes, desafios imprevistos e uma diversidade de perspectivas. Isso exige um enfoque no desenvolvimento da autonomia intelectual e moral, permitindo que cada aluno desenvolva a capacidade de pensar criticamente, tomar decisões informadas e avaliar as consequências de suas ações. A ética, em particular, se torna uma competência central nesse processo. A habilidade de questionar o que é certo ou errado, de refletir sobre normas e valores, é fundamental para que os jovens possam tomar decisões que não apenas atendam aos seus interesses individuais, mas também contribuam para o bem comum.

No entanto, essa transformação na educação exige uma mudança estrutural profunda. As escolas do futuro precisam ser mais do que locais de transmissão de conhecimento; elas devem ser ambientes dinâmicos de aprendizado, onde a integração de diferentes disciplinas, a personalização da aprendizagem e a conexão com o mundo real se tornam elementos centrais. Em vez de se concentrarem em um currículo rígido e padronizado, as escolas devem abraçar a diversidade de habilidades, interesses e capacidades de seus alunos, oferecendo experiências de aprendizagem mais personalizadas e centradas no aluno. Isso implica a adoção de práticas pedagógicas diferenciadas, que atendam às necessidades específicas de cada estudante, respeitando suas paixões e talentos individuais.

Além disso, a tecnologia, longe de ser uma simples ferramenta para melhorar a eficiência, deve ser utilizada para libertar o aprendizado das convenções do passado, promovendo novas formas de colaboração e conectividade entre os alunos. As escolas do futuro devem ser lugares onde a participação ativa dos alunos seja a norma, e não a exceção, e onde as parcerias inovadoras entre instituições educacionais, comunidades e o setor privado desempenhem um papel fundamental no desenvolvimento de soluções criativas para os desafios do mundo contemporâneo.

Portanto, a transformação educacional necessária para o mundo pós-verdade não é apenas uma questão de atualização curricular, mas de um redesenho fundamental da própria natureza da educação. A escola do futuro será uma escola onde o conhecimento, a ética, as habilidades emocionais e a capacidade de inovação se integram de forma fluida, preparando os indivíduos para navegar com sucesso em um mundo cada vez mais complexo e interconectado.