A transformação é, sem dúvida, um dos maiores enigmas que a natureza nos propõe, seja pela forma como ela ocorre em seres vivos como as borboletas, seja pelas reflexões filosóficas que essa metamorfose nos inspira. Na narrativa de Kostya Malinin e seu amigo, a metamorfose não é apenas uma mudança física, mas também uma descoberta do próprio ser, do entendimento das leis naturais que governam suas vidas e das interações com o mundo ao redor.

No cenário retratado, o protagonista se vê transformado, de uma forma inexplicável, em uma borboleta. A princípio, a sensação de maravilha domina. As asas, as cores, a leveza e a liberdade do voo são elementos fascinantes dessa nova existência. Mas, à medida que a história avança, os personagens começam a confrontar as complexidades dessa nova realidade, como a necessidade de adaptação às leis da natureza — uma delas, especialmente importante, é o descanso forçado que as borboletas devem cumprir durante o inverno. Um descanso que, embora necessário para algumas espécies, levanta questões sobre a efemeridade da própria existência.

A aparição de uma borboleta chamada "Goldilocks" e sua reação misteriosa ao ser chamada por Kostya revela um outro aspecto dessa transformação. Ela está adormecida, em um sono profundo, como todas as borboletas da espécie, algo que é parte do ciclo natural. "Para que isso aconteça, há uma regra", diz Kostya, referindo-se ao ciclo da vida das borboletas. Esse sono prolongado é essencial para a sobrevivência delas, pois protege as borboletas das baixas temperaturas do inverno. No entanto, a descoberta dessa regra natural, no contexto da transformação dos protagonistas, provoca uma angústia. Afinal, se eles, agora borboletas, precisam dormir durante o inverno, perderão os momentos preciosos que antes viviam como humanos — as férias, o hóquei, as experiências de vida comuns.

A conversação que segue entre os personagens sobre o que os aguarda é, no fundo, uma reflexão sobre a inevitabilidade da morte e a transitoriedade da vida. Embora a transformação em borboletas traga consigo uma série de maravilhas, ela também revela o lado cruel da natureza — a necessidade de adaptação a ciclos que, muitas vezes, nos tiram a capacidade de viver plenamente no presente.

Porém, a verdadeira profundidade do enredo está na interação entre os personagens e a maneira como eles começam a questionar suas transformações e o papel do destino. O diálogo com Kostya revela a insegurança e o medo do desconhecido, o que é comum a todos nós, seres humanos, diante da inevitabilidade da mudança. Quando Kostya explica que ele e o amigo são "borboletas humanoides", a história se torna ainda mais fascinante, pois, com esse rótulo, surgem novos questionamentos. O que significa ser uma borboleta humanoide? As leis da natureza se aplicam da mesma forma? O sono da borboleta será, para eles, igualmente uma regra rígida ou há algo mais por trás dessa transformação?

Há, ainda, o componente da interação com outros seres, como o pardal sem cauda que aparece na história. Esse pardal, que já havia sido um inimigo no passado, agora se revela uma ameaça real para as borboletas. Quando ele devora a borboleta adormecida, a história mostra de forma crua a vulnerabilidade das borboletas, ou de qualquer ser vivo, diante da força implacável da natureza e de suas próprias limitações.

O que se deve compreender ao ler esse episódio é que a história não trata apenas de transformações físicas, mas de uma busca existencial. As borboletas, com sua fragilidade e beleza, representam a brevidade da vida e a luta constante pela sobrevivência, enfrentando tanto os inimigos naturais como os próprios dilemas internos sobre identidade e propósito. O paradoxo que surge com a ideia de "borboletas humanoides" simboliza a luta entre a natureza e os desejos humanos, entre o instinto e a racionalidade.

Para o leitor, o que é essencial entender é que, por trás dessa fábula sobre borboletas e transformação, existe um convite à reflexão sobre o ciclo da vida e as regras que governam nosso destino. As borboletas, com sua metamorfose, nos ensinam que, embora as transformações possam ser deslumbrantes e encantadoras, elas sempre trazem consigo aspectos sombrios e desafios que exigem aceitação. Mesmo diante do inevitável descanso da morte ou da transformação, há uma beleza no processo de adaptação, no aprendizado sobre o que significa ser parte da natureza e, talvez, no entendimento de que cada etapa da vida tem seu propósito e seu tempo. A chave está em aceitar essa transitoriedade e encontrar significado em cada momento, por mais efêmero que seja.

O que acontece quando os filhos desobedecem sua mãe?

Eu derrubei meu melhor amigo da árvore. Felizmente, ele conseguiu se segurar em um galho. Olhei para baixo, e Mooska, a gata, balançava sua cauda sobre a grama, lambendo os beiços. Pequenas penas que Mooska havia arrancado de mim flutuavam no ar, como peixinhos em um aquário. “Bem feito, tuit-tuit!” Kostya Malinin continuou tagarelando, desta vez de maneira maliciosa. “Eu não entendo,” eu piou. “Essa gata é tão familiar. Quase da família, diria.” “Familiar! Família! Agradeça às estrelas por ter escapado inteiro.” “Barankin nunca se rendeu a gatos!” “Valente, hein! Tem muito o que piar mesmo! ‘Não vou te devorar, seu engraçadinho!’ Engraçadinho você mesmo! Esqueceu que os gatos comem pardais?” “Não,” respondi, “simplesmente não me acostumo com a ideia de ser um pardal.” “‘Não consegue se acostumar!’ Eu me acostumei rapidinho,” disse Kostya, e acrescentou: “O que sua mãe diria se Mooska tivesse te comido?”

Tentei imaginar por um momento o que teria acontecido se eu não tivesse conseguido escapar das garras de Mooska a tempo. O pensamento me deu arrepios. Na verdade, eu estava realmente assustado, embora o perigo já tivesse passado e não houvesse mais nada para temer. Mesmo assim, as penas se eriçaram ao pensar nisso.

“O que houve com você?” Kostya Malinin me perguntou. “Nada. Estou com calor,” respondi, abanando-me com a asa. Kostya começou a me repreender novamente, então enfiei a cabeça sob a asa para ignorá-lo. Nesse momento, senti uma picada aguda no lado.

Levantei a cabeça debaixo da asa e vi um pardal velho e mofado sentado ao meu lado. “Ei, você, passarinho bico-amarelo,” disse o velho. “Estive te observando o tempo todo daquela bétula ali. O que você é, um idiota ou só está fingindo?”

“O que você quer de mim?”

“Não seja mal-educado com os mais velhos.”

“Não estou sendo mal-educado. Minha voz está rouca.” Para me livrar do velho, enfiei a cabeça debaixo da asa novamente, mas ele me deu outra picada dolorosa no pescoço.

“Escute quando os mais velhos falam com você. Respeite os mais velhos. Ree-spec-pec-pect. Não seja tão atrevido!”

“Não estou sendo atrevido.”

“O que foi isso sobre os gatos que você estava piando? Como um pardal pode ter amigos gatos? Ah, você, tuit-tuit-tuit! Não sei o que seus pais estão pensando!”

O velho revirou os olhos e começou a tagarelar sobre como os pardais eram obedientes e trabalhadores na sua época, como todos eram inteligentes, e como a nova geração estava sendo tão atrevida. Imagine só! Transformar-se em um pardal só para ouvir esse tipo de conversa chata! Quando as velhas se reúnem no banco do jardim à noite, é isso que elas ficam piando, quer dizer, conversando sobre.

“De quem são esses filhos de chi-chi?” o velho me perguntou.

“Ninguém’s chi-chi! Ninguém’s!” eu piou, e voei para longe do galho, com Kostya me seguindo.

“Chi-chi-chi! Não seja chi-chi-chi!” Kostya disse, batendo as asas. “Esse velho tem parafusos soltos, se me perguntam.”

Voamos em círculos sobre o nosso quintal, procurando uma árvore que não estivesse ocupada por pardais. Embora eu fosse um pardal também, de algum modo não estava com vontade de procurar a companhia deles. Não fiquei muito impressionado com o meu encontro com o sem-cauda e o velho mofado. O que mais me preocupava, no entanto, era o fato de que, embora já tivesse passado meia hora desde que eu e Kostya viramos pardais, ainda não conseguimos levar uma vida decente nesse novo corpo. As coisas não estavam saindo como eu imaginei. O tempo estava passando...

Amanhã, por sinal, teríamos que voltar para a escola. Claro, não disse nada a Kostya. Afinal, tínhamos o dia todo pela frente – a vida se ajeitaria, tudo ficaria certo. O truque era não se entregar ao desespero, não perder a esperança. Depois de voarmos um pouco, Kostya e eu pousamos em uma árvore que não estava ocupada por pardais. O galho em que nos acomodamos estava do lado ensolarado, e o sol estava quase tão quente quanto no verão. Eu escondi a cabeça nos ombros com prazer e estava prestes a escondê-la sob a asa quando de repente algo passou zunindo perto do meu ouvido. Houve um barulho de algo caindo atrás de mim, seguido por um espirro de folhas caindo. O que diabos é isso?

Abri os olhos e olhei para baixo. Ao lado do banco onde Kostya e eu estávamos sentados há poucos minutos, estava o menino da vizinha, Venka Smirnov, com um olho apertado da maneira mais sinistra. Na mão dele, um estilingue com mira telescópica. Reconheci aquilo imediatamente. Era uma peça que eu mesmo fizera. Ninguém sabia fazer estilingues de longo alcance como eu. Fiz aquele especialmente a pedido de Venka.

Venka estava me olhando através da mira telescópica. Eu olhava para ele. No rosto de Venka estava estampado: “Errei! Que pena!” Então, não bastasse a nossa própria gata quase me devorar, agora eu tinha que ser alvo de tiros do meu próprio estilingue.

“Você vai ver, Venka!” piou de cima da árvore. “Você vai ver, rapaz! Quando eu virar um homem, vou te mostrar como atirar em mim com um estilingue!”

Ignorando meu piar, Venka se abaixou e começou a procurar outra pedra. Kostya e eu nos olhamos e, num impulso, largamos aquela árvore o mais rápido possível. Decidi voar o mais longe que eu pudesse do nosso quintal, da gata Mooska, de Venka com seu estilingue e de todos aqueles pardais briguentos e antipáticos.

Voamos de quintal em quintal, e da perspectiva de pássaro que agora eu tinha da vizinhança, percebi que havia muito mais gatos na cidade do que eu pensava quando ainda era um homem. Havia também muitos meninos com estilingues por aí. Essa descoberta me perturbou.

Embora minha experiência com a vida de pardal tivesse sido curta, já dava para perceber que, se o pardal quisesse manter a vida, tinha que evitar ao máximo gatos e estilingues. E Malinin também estava começando a me irritar. Ele estava sempre para trás, voando devagar, e parecia que estava me fazendo um favor.

“Por que você está sempre para trás?” eu gritei, perdendo a paciência. “Você é muito devagar!”

“Estou cansado.”

“‘Cansado!’ A gente voou quatro quarteirões, e já está cansado?” “Eu não estou cansado de voar. Estou cansado de ser um pardal!”

“Olha ele! Faz meia hora que ele virou pardal e já está cansado! E os pardais que são pardais a vida toda? Se eu soubesse que ia ser assim, nem teria me envolvido com você!”

Avistamos abaixo um pequeno jardim público com árvores grandes e pousamos.

“Pode descansar agora!” eu disse a Kostya, enquanto ele se deixava cair no galho ao meu lado. Kostya levantou a asa e estava prestes a esconder a cabeça debaixo da asa quando, de repente, uma voz surgiu de cima.

“Aí estão, os vagabundos! Mandei vocês buscarem palha e estão aí, tomando sol! São uns filhos da mãe mesmo!”

Olhei para cima e vi uma pardal fêmea gordinha e resmungona, pendurada de um galho próximo. Foi ela quem nos chamou de filhos.

“Bem, vocês não vão falar nada? Por que não respondem à sua mãe?”

“Eu não entendo!” Kostya sussurrou para mim. “Por que ela se chama de nossa mãe?”

“O que tem para entender? Ela deve ter nos confundido com os filhos dela.”

“Mas, a gente se parece com eles?”

“Como vou saber?”

“Por que você está se escondendo da sua mãe?” a gorducha continuou piando. “Não tenha medo. Venham aqui, não vou fazer nada.”