A análise das atitudes e visões sobre a limpeza étnica de figuras históricas como Andrew Jackson e Ze’ev Jabotinsky revela a persistência de uma ideologia colonial que se justifica por uma visão profundamente racista do mundo. Embora ambos os personagens compartilhem um compromisso com uma forma de colonização violenta, é crucial compreender que as suas motivações e as suas ações não surgiram de um impulso meramente individual, mas estavam enraizadas em condições sistêmicas e nas estruturas de poder que moldavam suas respectivas épocas.
Andrew Jackson, por exemplo, não era particularmente religioso, mas seus pensamentos e ações foram amplamente influenciados pelas narrativas cristãs predominantes de sua época. Sua postura agressiva, embora não tão bombástica quanto a de Theodore Roosevelt, se manifestava de forma incisiva quando se tratava de praticar violência contra os nativos. A discriminação racial de Jackson não pode ser compreendida isoladamente, pois era uma consequência direta do sistema político e social em que ele se inseria. A supremacia branca, o expansionismo territorial, a valorização do poder masculino e o capitalismo agressivo formavam o pano de fundo de suas decisões políticas.
A limpeza étnica, como conceito, foi fundamental para Jackson, não apenas como uma justificativa para suas ações, mas como um mecanismo necessário para a criação de uma "conciência moderna", moldada pelos valores de colonos brancos, masculinos e cristãos. A política de remoção, que levou milhões de nativos americanos a serem deslocados de suas terras, resultou em um genocídio cujos efeitos ainda são sentidos. Para Jackson, essas mortes não eram imorais nem evitáveis, mas sim uma consequência inevitável de um projeto maior de civilização. A tragédia da perda de vidas nativas foi vista como uma infelicidade decorrente do "atraso" dos povos indígenas, incapazes de se adaptar à modernidade imposta pelos colonos.
Por outro lado, Ze’ev Jabotinsky, figura central do movimento sionista no século XX, apresenta uma visão que, apesar de seus elementos de verdade, também carrega uma forma de desonestidade fundamental. Nascido na cidade de Odessa, no Império Russo (atualmente Ucrânia), Jabotinsky se envolveu no sionismo e participou do Congresso Sionista de Basel, na Suíça. Ao contrário de Jackson, Jabotinsky reconheceu a existência de um povo palestino e sua luta legítima pela autodeterminação. Porém, sua visão de coexistência era baseada em uma concepção profundamente etnocêntrica e colonizadora, que minimizava a presença e os direitos dos árabes da Palestina em nome de um projeto sionista de colonização.
A comparação entre Jackson e Jabotinsky revela uma abordagem similar quanto à visão de uma "missão" nacional que justifica a subordinação ou expulsão dos nativos, seja no caso dos nativos americanos ou dos palestinos. Ambos estavam imbuídos de uma crença na superioridade de seu povo e na inevitabilidade de uma mudança radical na composição demográfica dos territórios. Jackson via os nativos como inadequados para o capitalismo de mercado livre, enquanto Jabotinsky os via como um obstáculo a ser superado em nome da construção de um estado judeu. Jabotinsky, no entanto, adotava uma postura de "indiferença educada", disfarçada de neutralidade, ao afirmar que sua relação com os árabes era baseada em um respeito superficial, mas na prática, ele defendia a expulsão e subordinação dos palestinos.
A diferença crucial entre esses dois personagens históricos é que, enquanto Jackson acreditava na destruição das culturas indígenas em favor da civilização branca, Jabotinsky via os árabes como concorrentes a serem deslocados para dar lugar ao projeto sionista. Jabotinsky não enxergava o outro como um ser humano com o direito à autodeterminação, mas sim como um obstáculo a ser removido para que sua visão de um Estado judeu prosperasse. Sua retórica de "indiferença educada" esconde a violência implícita em suas ideias e práticas políticas.
Porém, o que deve ser notado é que, embora Jackson e Jabotinsky compartilhem uma visão racista e colonizadora do mundo, suas abordagens para lidar com os povos nativos e palestinos diferem nas formas, mas não na essência. Ambos estavam dispostos a utilizar a violência como um meio legítimo para alcançar seus objetivos, e ambos estavam inseridos em contextos históricos que permitiam a normalização de suas ideologias extremas. A limpeza étnica, tanto em Jackson quanto em Jabotinsky, não era apenas uma consequência de suas atitudes individuais, mas uma necessidade política e ideológica para a realização de suas visões de modernidade e civilização.
É fundamental, portanto, que ao analisarmos esses episódios históricos, compreendamos que as ideias de supremacia racial, colonização e limpeza étnica não surgem de atitudes isoladas de indivíduos, mas são fruto de sistemas políticos, sociais e econômicos que as alimentam. A violência contra os nativos americanos e os palestinos foi, em ambos os casos, justificada como um mal necessário para a criação de uma ordem "superior", de acordo com os valores de um determinado grupo dominante. O estudo dessas figuras nos oferece uma oportunidade crucial para refletirmos sobre como as ideologias de exclusão e violência continuam a se manifestar em contextos contemporâneos, muitas vezes disfarçadas de boas intenções ou racionalizações políticas.
Como a Retórica de "Valores Americanos" Influi nas Relações Coloniais e nas Narrativas de Solidariedade
A retórica de valores americanos, tão frequentemente utilizada em discussões sobre política externa, especialmente no contexto do apoio a Israel, é uma ferramenta poderosa na formação das alianças geopolíticas. No caso da administração Obama, por exemplo, o porta-voz Josh Earnest, ao comentar sobre as críticas a Israel, afirmou que “os valores americanos são a base do apoio inabalável dos EUA a Israel” e que “os valores americanos nos levaram a lutar para garantir recursos para fortalecer a segurança de Israel de maneira tangível”. Esta declaração reflete a importância de construir narrativas que não se concentram nos interesses geoestratégicos tradicionais, mas sim em valores compartilhados, com apelos emocionais que visam solidificar afinidades e reforçar uma imagem de amizade mútua inquebrantável.
O que é notável na declaração de Earnest é o tom quase submisso e reverente ao relacionar os "valores americanos" com ações militares e apoio a Israel. A ênfase em “valores” cria uma justificativa moral que torna difícil questionar as ações políticas. O conceito de valores, por sua natureza, é volúvel, mas o que é crucial compreender é que tais valores, exaltados ao longo do tempo, têm sido essencialmente os mesmos durante séculos. A simplicidade com que figuras políticas como o primeiro-ministro israelense Binyamin Netanyahu recitam esses valores, como uma espécie de código comum, indica como a retórica de valores transcende as divisões políticas e geográficas. Netanyahu, ao usar o argumento de que certas críticas ao governo israelense estão em desacordo com “valores americanos”, reforça a ideia de que qualquer discordância com a política de Israel é, de fato, uma afronta aos princípios fundamentais compartilhados entre os dois países.
Essa construção discursiva não é apenas uma questão de retórica política, mas também de formação histórica e cultural. O apoio aos valores de uma nação é frequentemente entrelaçado com mitos fundadores e narrativas de salvação. No caso dos Estados Unidos e de Israel, ambas as nações compartilham uma mitologia comum: a de um destino predestinado, relacionado com histórias bíblicas de libertação e conquista. Este ethos messiânico molda, em muitos aspectos, a percepção de que os direitos de uma nação à terra e à autodeterminação são irrefutáveis, independentemente das consequências para os outros povos.
A união entre os valores de ambas as nações não é apenas um reflexo de um apoio mútuo que se limita ao campo político. Ela também toca em questões profundas de colonização, violência e exclusão. A maneira como esses valores são aplicados — e, de fato, muitas vezes usados para justificar práticas violentas de dominação — é algo que deve ser examinado com cuidado. A retórica de valores frequentemente se dissocia de suas implicações reais no campo da justiça e da violência. Quando se fala de "valores americanos" em apoio a Israel, por exemplo, é necessário analisar como esses valores estão ligados a práticas coloniais que resultam em deslocamento, opressão e violência contra povos indígenas e palestinos. Ao fazer isso, torna-se possível perceber como tais valores, longe de serem neutros ou universais, carregam consigo as marcas de um sistema colonial que é historicamente enraizado.
Neste contexto, a análise crítica do colonialismo e suas práticas, incluindo o uso da violência sexual e do racismo, como destacado pelos estudiosos Mike Krebs e Dana Olwan, se torna central. Estes autores argumentam que o colonialismo não é apenas uma questão de dominação política, mas também de destruição física e psicológica de culturas inteiras. A colonização impõe um conjunto de valores que, embora apresentados como universais, são profundamente alienantes e devastadores para aqueles que os experimentam em sua forma mais bruta.
A reflexão sobre solidariedade internacional, como a proposta por Glen Coulthard, também deve ser considerada. Em sua crítica ao uso de valores coloniais, Coulthard propõe uma abordagem ética baseada na reciprocidade e no reconhecimento das lutas dos outros, especialmente em um contexto de solidariedade entre povos indígenas e palestinos. No entanto, as práticas de solidariedade são frequentemente complicadas pela tendência de simplificar as relações entre diferentes movimentos sociais, negligenciando as complexidades históricas e culturais que marcam as lutas específicas de cada grupo.
Quando figuras proeminentes como a poeta nativa Joy Harjo se envolvem em ações que parecem contrariar os princípios de solidariedade indígena e palestina, surgem debates intensos. Harjo, ao aceitar uma bolsa de estudos em Israel e viajar para o território ocupado, gerou um debate sobre o significado da solidariedade e as possíveis traições dentro de contextos de opressão. Embora sua intenção fosse a de aproximar as duas causas, a reação de outros nativos e ativistas palestinos foi, muitas vezes, de frustração e ressentimento. Esse episódio revela a complexidade da solidariedade e como ela pode ser facilmente mal interpretada ou se tornar contraditória.
Em última análise, o que se deve entender é que a solidariedade, mesmo quando genuína, pode ser incapaz de superar as barreiras históricas e as dinâmicas de poder entre os povos. A solidariedade verdadeira requer um reconhecimento profundo e reflexivo das diferentes histórias de colonização, assim como uma consciência crítica das implicações de cada ação. Movimentos de solidariedade não devem apenas buscar apoiar as lutas dos outros, mas também garantir que seus próprios gestos não se tornem formas de imposição ou apropriação, onde a dor e a história de um povo são simplificadas para se encaixar em narrativas externas.
A Importância dos Estudos Indígenas Americanos no Contexto Acadêmico e de Liberdade Acadêmica
Os Estudos Indígenas Americanos (AIS) têm se estabelecido como um campo acadêmico relevante, mas constantemente desafiado por um contexto maior de colonialismo e exclusão. A história de sua inserção nas universidades reflete um campo de batalha não apenas intelectual, mas também político e cultural, em que os povos indígenas e seus estudiosos enfrentam uma luta contínua pela autonomia e pelo reconhecimento.
Embora as discussões acadêmicas sobre a Palestina frequentemente remontem a um período pós-1967, seria plausível ampliar essa tradição para incluir o período do Mandato Britânico na Palestina, quando textos como "O Despertar Árabe", de George Antonius, ajudaram a moldar uma visão do conflito a partir de um olhar mais global. Nos Estados Unidos, muitos estudiosos e ativistas têm estabelecido paralelos entre a colonização da América do Norte e o assentamento sionista, considerando as semelhanças nos processos de ocupação, expropriação e marginalização. Desde a década de 1960, figuras como Walid Khalidi e Fayez Sayegh compararam diretamente as situações de colonização, argumentando que a experiência palestina pode ser melhor entendida à luz da história de outros povos colonizados, como os nativos americanos.
Essa interseção de estudos, que abrange tanto os campos de solidariedade com a Palestina quanto os estudos indígenas, pode parecer uma abordagem radical para muitos. Porém, ela emerge de uma necessidade de integrar lutas por justiça, que não podem ser limitadas a uma única região ou questão. O movimento de solidariedade com a Palestina nos Estados Unidos não pode se restringir apenas ao debate sobre o sionismo e a libertação palestina; ele deve engajar-se com as dinâmicas de colonização em terras de outros povos subjugados. É essencial que aqueles que trabalham por justiça no contexto americano reconheçam e se beneficiem do trabalho realizado por estudiosos e ativistas indígenas cujas terras ancestrais estão em jogo. Essa interconexão entre os dois campos de estudo revela uma complexa rede de solidariedade global, essencial para qualquer projeto de descolonização.
A análise do campo dos Estudos Indígenas Americanos, no entanto, não pode ser dissociada das dificuldades que ele enfrenta dentro das instituições acadêmicas. A relação entre o campo acadêmico e os Estudos Indígenas é complexa, especialmente no contexto das universidades, que frequentemente operam sob uma lógica corporativa que marginaliza as vozes dos povos indígenas. O exemplo da Universidade de Illinois, Urbana-Champaign (UIUC), ilustra de maneira vívida as tensões que permeiam esse campo. Em 2014, poucos dias antes de iniciar seu cargo de professor associado, um acadêmico foi demitido devido a críticas ao governo de Israel e às ideologias sionistas. Embora esse incidente tenha gerado um debate amplo sobre a liberdade acadêmica, a verdadeira questão subjacente reside na relação entre os Estudos Indígenas e a lógica colonial que ainda permeia muitas universidades.
Em um nível simbólico, a presença do mascote da universidade, "Chief Illiniwek", exemplifica essas tensões. Criado como símbolo de uma tradição cultural, o mascote é visto por muitos como uma representação da injustiça contínua contra os povos indígenas. Para os defensores do mascote, ele representa uma tradição importante da cultura do estado, mas para os indígenas, ele é um símbolo da opressão e da continuidade de uma narrativa colonizadora. A insistência da administração da universidade em manter essa figura, apesar das demandas da comunidade indígena local e do Programa de Estudos Indígenas, reflete uma visão preconceituosa e racista que perpassa o sistema educacional americano.
A permanência do "Chief Illiniwek" na universidade, apesar das críticas, simboliza a resistência das instituições acadêmicas à mudança e à reflexão sobre a história colonizadora dos Estados Unidos. Esse mascote não é apenas uma questão local, mas representa uma tendência mais ampla de desvalorização dos Estudos Indígenas como campo acadêmico legítimo e essencial. A resposta do corpo acadêmico à demissão do professor e a justificativa de que a presença de figuras como o mascote é um reflexo da cultura e tradição locais, são, na verdade, um reflexo de um colonialismo persistente e de uma rejeição ao reconhecimento das questões indígenas como centrais para a história e a sociedade americana.
O caso da UIUC não é isolado, mas sim uma manifestação das tensões maiores que envolvem o campo dos Estudos Indígenas Americanos dentro das universidades. O campo, que deveria ser um lugar de resistência e análise crítica, frequentemente se vê subordinado às demandas de uma gestão acadêmica orientada por uma lógica colonial, que vê os povos indígenas como marginalizados ou irrelevantes. Esse é um reflexo do fracasso das instituições educacionais em reconhecer a soberania indígena e a necessidade urgente de um estudo aprofundado das histórias e culturas dos povos nativos.
Portanto, a importância dos Estudos Indígenas não reside apenas na preservação de uma memória cultural, mas na crítica ativa a uma estrutura acadêmica que, muitas vezes, ainda perpetua as dinâmicas coloniais e racistas. Os estudiosos indígenas, ao abordarem suas próprias histórias, contribuem de maneira única para a compreensão mais ampla dos processos de colonização que ainda afetam milhões de pessoas em todo o mundo. A solidariedade entre os povos colonizados, incluindo a interseção entre os estudos sobre a Palestina e os Estudos Indígenas, não é apenas uma estratégia política, mas um movimento intelectual que desafia as narrativas dominantes sobre o poder, a terra e a liberdade.

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