No campo da ortopedia veterinária, os dispositivos ortopédicos e próteses (V-OP) desempenham um papel crescente no tratamento e reabilitação de animais, especialmente na medicina esportiva e reabilitação de pequenos animais. No entanto, a regulação da fabricação e do uso desses dispositivos ainda é incipiente, o que implica em riscos significativos tanto para os pacientes veterinários quanto para seus tutores. Em contraste com a ortopedia humana (H-OP), onde a formação e a certificação dos profissionais são amplamente padronizadas, a ortopedia veterinária carece de uma estrutura similar, o que coloca em questão a segurança e a eficácia dos tratamentos fornecidos.

Embora os dispositivos ortopédicos e próteses para seres humanos estejam sujeitos a regulamentações rigorosas, como o cumprimento dos padrões educacionais e a exigência de programas de certificação como os estabelecidos pelo American Board of Certification (ABC) e pelo Board of Certification (BOC), a fabricação de dispositivos veterinários ainda não possui requisitos uniformes de licenciamento e certificação. Nos Estados Unidos, por exemplo, a licenciamento de fabricantes de dispositivos ortopédicos e próteses não é obrigatório em todos os estados. Isso significa que nem todos os fabricantes de dispositivos ortopédicos e próteses veterinárias possuem a formação necessária ou certificação adequada, o que eleva o risco de que os animais recebam tratamentos inadequados ou até mesmo prejudiciais.

A ausência de regulamentação e de requisitos de licenciamento para a fabricação de dispositivos veterinários pode resultar em graves consequências para os pacientes. Desde a possibilidade de atrasos no tratamento adequado até lesões iatrogênicas — ou seja, lesões causadas pelo próprio tratamento —, que podem superar em gravidade a lesão original. Além disso, o cliente, ao buscar esses dispositivos, corre o risco de incorrer em custos financeiros com dispositivos ineficazes ou prejudiciais. Muitos dispositivos são comprados por meio de canais não regulamentados, como sites online, onde não há controle sobre a qualidade ou adequação do produto ao paciente animal.

Embora a prática da ortopedia veterinária não tenha ainda uma regulamentação específica, é fundamental que os profissionais e fabricantes sigam padrões básicos de segurança e treinamento. A prescrição de dispositivos ortopédicos para animais deve ser realizada por um veterinário qualificado, dentro de um relacionamento veterinário-cliente-paciente (VCPR), e com acompanhamento contínuo durante o uso dos dispositivos. A recomendação de que o veterinário seja envolvido em todas as etapas do processo de fornecimento de dispositivos ortopédicos para animais é essencial para garantir a segurança do paciente e a eficácia do tratamento.

Embora a ortopedia veterinária esteja em constante evolução, é importante que os profissionais da área se atualizem constantemente e busquem mais estudos e pesquisas que comprovem a eficácia dos dispositivos ortopédicos e próteses. A falta de uma base científica sólida e de estudos clínicos suficientes para confirmar os benefícios dos dispositivos ortopédicos para animais torna essencial a comunicação constante entre veterinários e clientes, a fim de garantir que as escolhas feitas sejam as mais adequadas e baseadas em conhecimento técnico.

Em um cenário ideal, todos os fabricantes de dispositivos ortopédicos veterinários deveriam possuir, no mínimo, a certificação estabelecida para ortopedia humana (H-OP), de forma a garantir que os profissionais responsáveis por esses dispositivos tenham a formação necessária para oferecer um atendimento de qualidade e seguro. Até que novas regulamentações e exigências de certificação sejam implementadas, é imprescindível que os veterinários assumam a responsabilidade pela prescrição e pelo acompanhamento dos dispositivos ortopédicos e próteses para os animais sob seus cuidados.

Além disso, a escolha de dispositivos assistivos para reabilitação canina, como cadeiras de rodas e órteses, exige uma compreensão aprofundada das necessidades específicas do paciente. Dispositivos mal escolhidos ou inadequados podem causar lesões adicionais e atrasar a recuperação do paciente. O papel do clínico de reabilitação canina é fundamental na seleção dos dispositivos mais adequados para cada caso, considerando o tipo de deficiência ou condição clínica do animal. Isso inclui a avaliação cuidadosa das limitações físicas e necessidades do paciente, bem como a interação contínua com o tutor para garantir que o dispositivo seja eficaz na melhoria da qualidade de vida do animal.

Portanto, a adaptação de práticas de H-OP para a veterinária deve ser feita com cautela e em conformidade com as necessidades específicas de cada paciente animal, considerando tanto os aspectos biomecânicos quanto psicológicos do tratamento. A comunicação entre o clínico veterinário e os tutores é essencial para garantir que os dispositivos utilizados sejam verdadeiramente benéficos, e a falta de regulamentação deve ser abordada com urgência para proteger tanto os pacientes quanto os profissionais da área.

Como a terapia regenerativa influencia o tratamento das disfunções musculoesqueléticas em cães

A aplicação de terapias regenerativas, como o uso de Plasma Rico em Plaquetas (PRP) e Ácido Hialurônico (AH), tem se mostrado uma abordagem promissora na reabilitação de disfunções tendíneas e articulares em cães, especialmente em condições como tendinopatias calcificadas e osteoartrite. Estudos recentes compararam a eficácia da combinação de PRP com AH versus o uso isolado de PRP, demonstrando que a combinação potencializa os efeitos terapêuticos, acelerando o processo de regeneração tecidual e melhorando a funcionalidade articular.

A prevalência da osteoartrite e das disfunções musculoesqueléticas em cães, como a displasia do cotovelo e a tendinopatia do músculo supraespinhal, destaca a importância de abordagens terapêuticas integradas que considerem a complexidade dessas condições. As técnicas minimamente invasivas, como a ultrassonografia guiada e a artroscopia, associadas a tratamentos biológicos, contribuem para diagnósticos precisos e intervenções menos traumáticas, promovendo melhores resultados funcionais e redução da dor.

A biomecânica canina, especialmente na região do membro torácico, apresenta peculiaridades que devem ser levadas em conta durante a avaliação e o tratamento. Contraturas musculares, desequilíbrios osteoarticulares e alterações do crescimento assíncrono dos ossos longos, como do rádio e da ulna, são fatores que influenciam diretamente o desenvolvimento de patologias ortopédicas e, consequentemente, a abordagem terapêutica. Técnicas cirúrgicas como a osteotomia ulnar proximal de abdução (PAUL) e a osteotomia bi-oblíqua dinâmica têm sido implementadas com sucesso para corrigir deformidades e aliviar o desconforto em cães afetados.

O uso de células progenitoras derivadas do tecido adiposo, associadas ao PRP, também tem sido investigado como uma alternativa eficaz para o tratamento de lesões tendíneas crônicas, proporcionando um estímulo adicional à regeneração e reparo dos tecidos lesionados. A integração dessas terapias com programas de reabilitação, que incluem exercícios específicos e monitoramento contínuo da função articular, potencializa os resultados clínicos e contribui para a recuperação plena da mobilidade.

É fundamental compreender que o sucesso do tratamento depende não apenas da escolha da terapia, mas também da avaliação criteriosa do quadro clínico, da precisão no diagnóstico e da individualização do protocolo terapêutico. A combinação de modalidades terapêuticas, aliada a avanços em técnicas de imagem e procedimentos cirúrgicos, oferece uma abordagem mais completa e eficaz para as disfunções musculoesqueléticas em cães.

Além disso, o papel dos fatores genéticos na predisposição a condições como a displasia do cotovelo e a osteoartrite deve ser considerado na elaboração de estratégias preventivas e terapêuticas. A hereditariedade influencia a resposta aos tratamentos e a evolução das patologias, o que reforça a necessidade de um acompanhamento multidisciplinar, envolvendo veterinários, fisioterapeutas e especialistas em medicina regenerativa.

Outro aspecto importante é a adaptação dos protocolos terapêuticos à capacidade de carga e ao nível de atividade do animal, para evitar recidivas e promover uma recuperação sustentável. A fisioterapia, incluindo técnicas de laserterapia de baixo nível, já comprovada em estudos clínicos, desempenha papel essencial na modulação da inflamação e no estímulo à reparação tecidual, complementando as intervenções clínicas e cirúrgicas.

A integração dos avanços tecnológicos, como o uso de guias de osteotomia impressos em 3D, permite intervenções mais precisas e personalizadas, minimizando riscos e otimizando o alinhamento anatômico pós-cirúrgico. Essa tecnologia representa um salto qualitativo no tratamento de deformidades ósseas complexas, garantindo melhor prognóstico funcional a longo prazo.

A compreensão profunda das inter-relações entre biomecânica, genética, processos inflamatórios e métodos regenerativos é imprescindível para o desenvolvimento de estratégias terapêuticas eficazes. O manejo das disfunções musculoesqueléticas em cães deve, portanto, ser multifatorial, contemplando não apenas o alívio dos sintomas, mas a restauração integral da função articular e a melhoria da qualidade de vida dos pacientes.