A batalha em torno da extração e do consumo de combustíveis fósseis não é apenas um debate técnico ou ambiental; é também uma guerra de narrativas, um conflito onde a verdade, muitas vezes, fica obscurecida por campanhas publicitárias poderosas. Nos últimos anos, a indústria de petróleo tem utilizado estratégias cada vez mais sofisticadas para moldar a opinião pública, muitas das quais beiram os limites da ética e da transparência. Um exemplo claro disso pode ser visto no caso do Canadá e da proposta de expansão da exploração das areias betuminosas. Ao longo desse processo, a indústria petrolífera não só tentou desacreditar os ambientalistas, mas também desviou a atenção do público para os supostos benefícios econômicos que essa exploração traria, enquanto minimizava as consequências ambientais devastadoras.

Organizações como o Sierra Club compararam as areias betuminosas a drogas como a heroína, considerando-as uma "droga" viciante que alimenta regimes autoritários e grupos terroristas. As palavras de protesto eram contundentes: "O petróleo das areias betuminosas é petróleo de sangue". No entanto, em resposta a essas críticas, figuras da indústria, como o jornalista Levant, questionaram a eficácia das campanhas ambientais, sugerindo que, ao fechar a produção de areias betuminosas, estaríamos, na verdade, transferindo bilhões de dólares para países cujos regimes são conhecidos por sua repressão, apoio ao terrorismo e políticas anti-humanitárias, como Arábia Saudita e Irã. A acusação era clara: os ambientalistas estavam, sem saber, fortalecendo os piores regimes do mundo, ao invés de proteger o planeta.

Em meio a isso, o governo canadense, com a aprovação do Bill C-38, um projeto de lei orçamentária de 2012, enfraqueceu significativamente as leis de proteção ambiental, tornando mais fácil a aprovação de novos projetos de petróleo e gás, incluindo a expansão das areias betuminosas e o desenvolvimento de grandes oleodutos. A legislação também retirou o Canadá do Protocolo de Kyoto, desmantelando a estrutura de proteção ambiental que, até então, tentava controlar a emissão de gases de efeito estufa e proteger os ecossistemas canadenses. A perda de áreas protegidas e a diminuição da fiscalização sobre corpos d'água representaram um golpe duríssimo para os ambientalistas, enquanto o governo apontava para o crescimento econômico como a razão para as reformas.

Entretanto, as campanhas de relações públicas (PR) da indústria de petróleo não ficaram restritas ao Canadá. Nos Estados Unidos, a empresa Edelman, uma das maiores do mundo, foi contratada pela TransCanada em 2014 para promover o projeto Energy East, um oleoduto destinado a transportar petróleo das areias betuminosas para refinarias na costa leste do Canadá. A estratégia da Edelman, no entanto, envolvia táticas sujas, como a criação de grupos de defesa falsos para descredibilizar os opositores do projeto. A prática, conhecida como "astroturfing", envolve a criação de movimentos de apoio que, na verdade, são manipulados por grandes corporações. Essa estratégia, amplamente utilizada em campanhas políticas, foi agora adaptada para a indústria do petróleo, com o objetivo de gerar uma aparência de apoio popular, quando, na realidade, o apoio estava sendo orquestrado por interesses empresariais.

A manipulação da opinião pública é um tema recorrente nas campanhas da indústria do petróleo. Por exemplo, o advogado e consultor político Richard Berman, que gerenciou várias campanhas contra ambientalistas, incentivou a exploração de medos e raivas para desacreditar os opositores do petróleo. Em um discurso gravado secretamente, Berman afirmou que o objetivo da indústria não deveria ser agradar as pessoas, mas sim "vencer feio", ou seja, usar qualquer tática, por mais suja que fosse, para atingir seus objetivos. A criação de grupos de fachada e a manipulação de narrativas são apenas algumas das estratégias mais comuns para enganar o público e garantir que os lucros da indústria de petróleo não sejam prejudicados.

É importante compreender que essas campanhas de relações públicas não são apenas uma tentativa de manipulação de uma questão ambiental, mas uma estratégia política de longo prazo que visa alterar a percepção pública sobre as grandes indústrias. Por trás dessas campanhas, está o esforço constante de empresas para manter seu domínio no mercado global, ao mesmo tempo em que desconsideram os impactos ambientais e sociais de suas atividades. As práticas de astroturfing, como o uso de grupos de fachada e a criação de falsos movimentos populares, são parte de um esforço maior para garantir que a exploração de combustíveis fósseis continue a crescer, mesmo que à custa de um planeta em aquecimento.

Entender o papel das relações públicas na indústria do petróleo é crucial para qualquer discussão séria sobre a sustentabilidade e o futuro das energias. A manipulação das narrativas pode ser eficaz, mas, com o tempo, os custos dessa prática se tornam evidentes, não apenas para o meio ambiente, mas também para as sociedades que dependem de recursos naturais finitos e que pagam o preço de decisões tomadas por uma minoria que controla os maiores fluxos de dinheiro do mundo.

Como Defender a Verdade e Promover o Diálogo em Tempos de Polarização

Alex e eu compartilhamos a mesma opinião sobre a futilidade de tentar encontrar um terreno comum com os extremistas. Também concordamos que devemos defender as instituições que trabalham para mediar as versões conflitantes da verdade — através da ciência, universidades, mídia, tribunais e as artes — e é crucial que ajudemos as pessoas a compreender as técnicas de propaganda e manipulação da mídia, para que possam lidar com o aumento dos demagogos. Miles, no entanto, alertou contra a tendência de exagerar o papel negativo do tribalismo. Ele argumentou que devemos reconhecer o que temos em comum — somos todos humanos, todos seres sociais — e que a conexão entre nós é um bem social. Embora tenhamos diferenças de crenças e valores, devemos celebrar essas diferenças. A controvérsia e os desacordos são inevitáveis, e devemos abraçá-los. As comunidades indígenas, por exemplo, suavizam a acrimônia política ao realizar cerimônias que lembram às pessoas que estamos todos juntos nessa jornada.

Esses valores são fundamentais, especialmente em países como o Canadá. Em um discurso proferido por Rosalie Abella, membro da Suprema Corte do Canadá, ela ressaltou: “Integração baseada na diferença, igualdade baseada na inclusão apesar das diferenças, e compaixão baseada no respeito e na justiça: esses são os princípios que agora formam o núcleo moral dos valores nacionais canadenses, os valores que nos tornaram os mais bem-sucedidos praticantes do multiculturalismo no mundo, e os valores que fazem o nosso sistema de justiça nacional democraticamente vibrante e principiado.” Essas palavras sintetizam uma visão sobre a convivência pacífica e o respeito pelas diferenças, pilares essenciais para o desenvolvimento de uma sociedade justa e inclusiva.

Essa conversa com Alex e Miles, e outras semelhantes, me fez perceber que preciso ser mais claro ao explicar a necessidade de equilíbrio entre a defesa de ideais e a colaboração. Aprendi com David Suzuki a nunca temer a controvérsia quando se trata de falar a verdade ou lutar contra a injustiça. Precisamos de mais debates públicos apaixonados, não menos. A verdade, por si só, pode ser polarizadora para grupos que estão do lado errado da questão. Como Marshall Ganz explicou, adotar uma postura conciliatória diante da injustiça compromete os “mecanismos adversariais” dos cidadãos para encontrar a verdade. Vivemos em uma democracia onde figuras públicas são esperadas para elevar o nível do debate em busca da verdade, mas sem esmagar ou demonizar alguém que discorde delas.

Quando fui presidente da David Suzuki Foundation, pedi a Adam Kahane para falar em nosso retiro no Brew Creek Centre, em Whistler. Durante sua fala, ele teve uma breve, mas acalorada, discordância com David Suzuki, que argumentou que, em alguns casos, o diálogo era uma perda de tempo. David falou sobre um CEO de um consórcio de empresas que queria discutir as críticas internacionais sobre as areias betuminosas de Alberta, no Canadá, em relação à sua performance ambiental. David disse que estaria disposto a trabalhar com o CEO, desde que ele primeiro aceitasse alguns princípios básicos: que todos somos animais e precisamos de ar limpo, água limpa, solo limpo, energia limpa e biodiversidade. O CEO recusou. Adam desafiou Suzuki, dizendo que exigir tal acordo antes de um diálogo era irrazoável e improdutivo. Adam, que muito respeita David, não descartou o argumento, mas se viu diante de uma tensão não resolvida que gradualmente alterou sua maneira de pensar sobre advocacia, conflito e diálogo.

Adam escreveu em seu livro, Collaborating with the Enemy: How to Work with People You Don’t Agree with or Like or Trust: “Agora eu via que engajar e afirmar eram maneiras complementares, e não opostas, de fazer progresso em desafios complexos, e que ambas eram legítimas e necessárias.” Para ele, suprimir a afirmação e a defesa, na tentativa de se envolver com um oponente, “sufoca o sistema social com o qual estamos trabalhando”, resultando em uma colaboração fraca. Ele agora está convencido de que uma colaboração saudável precisa incluir “lutas vigorosas”. Em vez de focar na busca pela harmonia quando lidamos com pessoas que possuem opiniões radicalmente conflitantes, podemos abraçar tanto o conflito quanto a conexão.

O livro de Adam reforça minha crença de que influenciar a opinião pública e a política exige tanto defesa quanto colaboração — embora tenha aprendido que ambos têm seus limites. Os defensores tendem a exagerar e, inadvertidamente, fortalecer a resistência que trabalham arduamente para superar. Por outro lado, a colaboração pode criar uma falsa equivalência, minando as preocupações que surgem da ciência real, quando um ponto de vista oposto, frequentemente ideológico, é apresentado como uma alternativa científica, quando claramente não o é. Um exemplo perfeito disso é o debate de longa data entre cientistas climáticos genuínos e negacionistas do clima, muitas vezes sustentados por think tanks financiados por indústrias de direita.

Qualquer esforço para combater problemas ambientais alarmantes, como as mudanças climáticas, a destruição dos ecossistemas marinhos ou a extinção de espécies, é, por sua natureza, difícil e adversarial. Eu disse a Adam que é difícil colaborar com alguém que afirma que os cientistas climáticos têm uma agenda política ou que as mudanças climáticas são um golpe perpetrado pelos chineses, porque engajar-se nesse tipo de argumento fútil apenas rebaixa a conversa para um nível absurdo. Contudo, acredito que nossa capacidade social de pluralismo e diversidade será a chave para sairmos da crise climática. Não resolveremos crises ambientais como as mudanças climáticas se políticas públicas sensatas forem revogadas toda vez que um governo de direita for eleito. Estar certo na ciência ou ser justo nas questões não é suficiente. Precisamos desenvolver nossa capacidade de trabalhar com o inimigo. Devemos buscar ser tão bons em colaboração respeitosa quanto em advocacia, e dar 100% de esforço tanto para falar a verdade quanto para respeitar os outros, mesmo quando sentimos que eles não merecem isso.

É também válido refletir sobre como o verdadeiro respeito pela colaboração não significa concordar ou suavizar as diferenças, mas sim entender que a integridade da troca é vital. Quando Thich Nhat Hanh me aconselhou a “falar a verdade, mas não para punir”, ele não estava dizendo para ser educado ou cortês. Seu conselho era muito mais profundo: ele me desafiava a assumir a responsabilidade de compartilhar os fatos verdadeiros, mas, ao fazer isso, mesmo diante da ignorância deliberada e da corrupção, a intenção não era apenas satisfazer minha raiva, mas lançar luz e mostrar uma saída de uma situação ruim. Muitas pessoas de boa vontade ficam furiosas com a destruição ambiental que vemos ao nosso redor, e isso é perfeitamente compreensível. Mas aprendi que a raiva, embora justificada, não é uma boa estratégia de comunicação. Claro, nunca devemos ceder àqueles que estão irremediavelmente errados ou ao mal, apenas para agradar, mas os fatos e a ciência importam, mesmo que algumas pessoas fortemente discordem.