A correção cirúrgica do pé cavus exige uma compreensão precisa da deformidade tridimensional envolvida, especialmente no que tange à remoção óssea e ao reposicionamento das estruturas do mediopé. No procedimento descrito, a osteotomia é biplanar, com maior remoção óssea na porção dorsal do mediopé em comparação à lateral. Fundamentalmente, não se deve remover uma cunha com base medial que possa induzir ou agravar uma deformidade em aducto; portanto, a cunha é orientada dorsalmente em direção ao cuneiforme medial e médio, enquanto lateralmente se afina até o cuboide, que geralmente não perde volume ósseo significativo.

A correção medial se obtém principalmente pela dorsiflexão, decorrente da ressecção da cunha, enquanto a correção lateral, que envolve o cuboide, se dá por uma combinação de translação dorsal e rotação, ajustando a posição do quinto metatarso e do cuboide para desrotacionar a supinação do mediopé. Um aspecto crucial é a possibilidade de se associar à osteotomia a translação dorsal adicional do antepé, particularmente medindo a resistência dos tecidos moles plantares e o tamanho da cunha retirada. Tal manobra reduz deformidades residuais do antepé e a incidência de metatarsalgia, preservando o comprimento do pé ao evitar cunhas excessivamente grandes na porção medial.

O primeiro metatarso apresenta declinação plantar maior que o quinto, razão pela qual a cunha deve ser biplanar, com maior remoção óssea dorsal. Se a correção de aducto for necessária além do cavus, uma osteotomia biplanar com maior remoção óssea lateral, especialmente no cuboide, é preferível. A técnica consiste em cortes osteotômicos que formam uma cunha com aproximadamente 8 mm na base medial, com ângulo entre 15 e 20 graus em relação ao plano dorsal do mediopé, e cortes laterais menores, com ápice no cuboide, preservando sua integridade. A translação dorsal e a rotação do cuboide promovem elevação da base do quinto metatarso, corrigindo o eixo lateral.

A fixação do mediopé corrigido pode ser realizada com múltiplos pinos de Steinmann de 3 mm, inseridos de medial para lateral e distal para proximal. Essa técnica é preferida em relação a placas ou parafusos devido à anatomia complexa da região e à fragmentação óssea. Os pinos permanecem fixos por 4 a 6 semanas em crianças e até 8 semanas em adultos, período após o qual a mobilidade e a deambulação são progressivamente restauradas.

A estabilização óssea permite a realização de transferências tendíneas, comumente do tendão tibial posterior para o cuneiforme lateral, embora em casos severos de aducto, especialmente com força residual do músculo tibial anterior, a inserção no cuboide possa ser necessária para otimizar a biomecânica do pé.

No que diz respeito à correção do equino do antepé, é importante reconhecer que o ápice da deformidade cavus nunca reside no primeiro metatarso, mas sim em articulações proximais como a TMT (articulação tarso-metatarsiana), o complexo cuneiforme-navicular ou a articulação talonavicular. A realização frequente de osteotomia dorsiflexora no primeiro metatarso, apesar de tecnicamente simples, é inadequada por elevar o primeiro metatarso para corrigir sobrecarga distal sem abordar a raiz da deformidade. A abordagem correta é realizar a osteotomia ou artrodese no verdadeiro ápice da deformidade, garantindo correção anatômica e funcional.

A atenção rigorosa à localização da incisão, cuidado com a retração do tendão tibial anterior para evitar lesões durante o corte ósseo, e avaliação intraoperatória da posição dos pinos e dos cortes osteotômicos sob fluoroscopia são essenciais para o sucesso do procedimento. A compreensão tridimensional da deformidade permite combinar dorsiflexão, elevação, translação e rotação, resultando em restauração do alinhamento, função do pé e diminuição de complicações associadas, como a metatarsalgia.

Além disso, a importância de um exame clínico detalhado, avaliação do estado dos tecidos moles plantares, função muscular, e o grau de rigidez ou flexibilidade da deformidade são fatores que determinam a escolha e extensão das técnicas cirúrgicas a serem aplicadas. A adaptação da técnica ao paciente individual é crucial para resultados duradouros.

Como Realizar a Redução Anatômica das Fraturas do Calcâneo com Abordagem Sinus Tarsi: Passos e Estratégias

A fratura do calcâneo, em especial as fraturas intra-articulares, representa um desafio significativo tanto para o diagnóstico quanto para o tratamento. A abordagem mais eficaz para a redução dessas fraturas depende do tipo específico de lesão, do grau de fragmentação e da exatidão na visualização das articulações envolvidas. Uma das técnicas comumente empregadas é a redução anatômica das fraturas utilizando a abordagem sinus tarsi, que proporciona uma visão mais direta e controlada das superfícies articulares, especialmente da articulação subtalar.

No início do procedimento, uma incisão é feita para permitir a elevação dos tendões peroniais, que são cuidadosamente descolados da parede lateral do calcâneo, e sua mobilização dentro da bainha até a articulação. A remoção do tecido adiposo no sulco tarsal facilita a visualização adequada da articulação subtalar, essencial para a realização da redução articular. A cápsula lateral da articulação subtalar é incisa, caso ainda esteja íntegra, proporcionando uma melhor visualização das superfícies articulares.

A introdução de um distrator colinear entre o tendão da fíbula distal e o tubérculo do calcâneo ajuda a melhorar a visualização e a manipulação dos fragmentos articulares. Esse método pode ser aprimorado com o uso de um parafuso Schanz de 4,5 mm, que é inserido via incisão em stab no tubérculo posterior, permitindo que os fragmentos intra-articulares sejam cuidadosamente aliviados e realinhados. A fragmentação superolateral da articulação deve ser manejada com extrema cautela, para que o contato com o corpo do calcâneo seja restaurado de maneira eficaz. Após a elevação do fragmento articular, é necessário remover qualquer hematoma residual, detritos ou fragmentos intercalários que possam interferir na redução articular.

A redução do fragmento principal do tubérculo, um dos passos cruciais da cirurgia, deve ser realizada com um elevador posicionado na região do sinus tarsi. Esse movimento é essencial para restaurar a parede medial da articulação e criar espaço para os fragmentos articulares laterais. Após essa manobra, um ou dois fios de Kirschner (K-wire) são inseridos do tubérculo até a parede medial, permitindo que a redução seja controlada através de raios-X axiais. Caso a altura do tubérculo não seja adequadamente restaurada, uma redução anatômica completa dos fragmentos articulares laterais será extremamente difícil.

Com a redução das fraturas principais, a congruência da articulação subtalar é restaurada progressivamente, começando com o fragmento sustentacular. Em muitos casos, esse fragmento está deslocado medialmente ou angulado, mas a integridade dos ligamentos talocalcâneos médios contribui para a correta reposição do fragmento sustentacular. Quando necessário, uma abordagem medial direta pode ser empregada para reduzir de forma anatômica a faceta medial da articulação. No caso das fraturas do tipo Sanders II, os fragmentos laterais da articulação podem ser levados à posição com o uso de um osteótomo ou elevador, alinhando-os adequadamente com o fragmento medial sob visão direta.

No tratamento de fraturas mais complexas, como as do tipo Sanders III e IV, a redução dos fragmentos intermediários da articulação é realizada de forma semelhante, utilizando K-wires que são introduzidos de lateral para medial e fixados de forma temporária até que a redução anatômica seja confirmada. Para garantir a estabilidade da articulação, um ou dois parafusos independentes são inseridos da parede lateral para o sustentáculo, estabilizando as superfícies articulares.

Além disso, em alguns casos, a artroscopia da subtalar, realizada de maneira "seca" (sem irrigação), pode ser uma ferramenta adicional útil. Com a artroscopia, a visualização da articulação é aprimorada, permitindo uma redução ainda mais precisa dos fragmentos articulares. Esse método é particularmente útil em casos de fraturas com múltiplos fragmentos ou fraturas que se estendem mais medialmente, dificultando a visualização pela abordagem convencional.

Importante lembrar que, ao se realizar a redução anatômica de uma fratura do calcâneo, a atenção deve ser voltada não apenas para o alinhamento dos fragmentos, mas também para a preservação das estruturas vasculares e nervosas da região. A lesão do nervo sural e outras complicações relacionadas à abordagem do quinto metatarsal devem ser evitadas, uma vez que podem resultar em sérios efeitos adversos para a função do pé. A escolha da técnica de fixação e o tipo de parafuso utilizado também devem ser avaliados com cuidado, dependendo do grau de fratura e das características específicas de cada caso.