Entre os povos mesoamericanos, a religião nunca foi um domínio abstrato ou separado da política, da guerra e da vida social — era a própria estrutura do mundo. Entre os astecas, a figura de Uitzilopochtli exemplifica esse entrelaçamento de fé, poder e sangue. Inicialmente uma divindade tribal dos tenochcas de Tenochtitlán, Uitzilopochtli tinha raízes totemistas ligadas ao beija-flor, símbolo aparentemente inofensivo que contradizia a essência brutal e bélica do deus. À medida que os tenochcas ascenderam ao domínio do império asteca, Uitzilopochtli foi elevado à posição de deus supremo da guerra. Seu culto impunha sacrifícios humanos em larga escala, com vítimas oriundas tanto das elites quanto dos cativos de guerra.
Essa prática sangrenta não era eventual, mas sistemática. Estados vizinhos, como Tlaxcala, estabeleciam acordos formais com os astecas para manter guerras periódicas cujo único propósito era capturar prisioneiros para o sacrifício ritual. Era uma guerra litúrgica, a serviço dos deuses, e uma das raras ocasiões históricas em que estados formalizaram a guerra como expressão religiosa contínua. A escala dos sacrifícios humanos refletia não apenas a intensidade do culto, mas também um estágio arcaico nas relações de classe: o prisioneiro ainda era mais valioso como oferenda divina do que como força de trabalho.
Apesar da predominância da violência sacrificial, o culto de Uitzilopochtli também preservava traços de antigos ritos agrários. Durante celebrações bianuais, era confeccionado um boneco gigante da divindade com massa de farinha e mel. Após os ritos, a figura era despedaçada e devorada pelos participantes, um eco de antigas práticas agrícolas de assimilação ritual do deus comestível — uma tradição que ressoa, em forma residual, na eucaristia cristã.
A sofisticação ritual atingia seu ápice nas cerimônias em honra a Tezcatlipoca. Segundo relatos de cronistas espanhóis do século XVI, o prisioneiro mais belo, sem defeitos físicos, era escolhido para representar o deus. Durante um ano, vivia com luxo e honra, cercado por mulheres que simbolizavam deusas. Mas, no clímax da festa, era conduzido ao topo do templo, onde seu coração era arrancado ainda pulsante como oferenda ao sol. O ápice da devoção era o sacrifício da perfeição.
Na cosmogonia asteca, o universo era cíclico. Quatro eras precederam a atual, cada uma encerrada por uma catástrofe cósmica — fogo, dilúvio, furacões, fome. O mundo vigente estava destinado a ruir igualmente. Essas visões não eram apenas mitos: fundamentavam a urgência do sacrifício, a necessidade de sustentar o sol e adiar o fim.
Entre os maias, as práticas religiosas apresentavam nuances distintas. Embora partilhassem elementos estruturais com os astecas, seu universo simbólico era menos centrado no sacrifício sangrento e mais voltado a narrativas cosmogônicas de caráter intricado, registradas nos códices de Dresden, Madri e Paris, agora parcialmente decifrados. Itzamna, deus do céu, fundador mítico de cidades e criador da escrita e do saber, encarnava um perfil mais civilizador. Kukulcán, serpente emplumada, era simultaneamente divindade e ancestral dinástico, reminiscente do Quetzalcoatl mexicano. Hurakan, deus do vento, era uma força primordial da criação.
O Popol Vuh, principal texto cosmogônico dos quichés, relata a gênese da humanidade em três falhas: homens de barro, de madeira e, finalmente, de milho — único material digno de gerar os seres humanos verdadeiros. O milho, alimento sagrado, era o próprio corpo da humanidade. A sacralidade do número quatro (quatro homens, quatro mulheres, quatro direções) estruturava o cosmos maia. A narrativa inclui ainda o mito dos gêmeos divinos, concebidos milagrosamente por uma virgem a partir do crânio decapitado de um deus, elementos que evidenciam uma teologia profundamente simbólica e ritualizada.
O Livro de Chilam Balam, de Chumayel, traz mitos escatológicos, descrições de eras cósmicas e relatos de dilúvios, sugerindo uma visão cíclica do tempo semelhante à dos astecas. As cidades-estado maias, como Chichén Itzá e Mayapán, eram centros religiosos com templos-pirâmides imponentes. O sacrifício humano era praticado, mas com menor proeminência, sendo provavelmente amplificado apenas após a influência asteca.
Para além das elites sacerdotais, as crenças populares maias persistiam em formas animistas. Os Chacs, espíritos da chuva, fertilidade e colheita, associados às quatro direções do mundo, eram centrais no imaginário campesino. Outra crença duradoura era o Nagualismo — a ideia de que cada pessoa possuía um duplo animal na floresta. A morte do animal implicava a morte do humano. Esse vínculo entre identidade e natureza reflete resquícios do totemismo e aproximações com cultos de espíritos guardiões encontrados entre povos indígenas do norte.
No território hoje correspondente à Colômbia central, os chibchas (ou muiscas) desenvolveram uma cultura avançada com sacerdócio hereditário e centros cerimoniais. O lago Guatavita era sagrado, e nele se realizavam oferendas de ouro e esmeraldas. Nessas cerimônias, o governante navegava até o centro do lago e lançava seus tesouros às águas — prática que inspirou a lenda de El Dorado. A guerra tinha igualmente função ritual, e os guerreiros mais bravos eram considerados sagrados. Após a morte, seus corpos eram mumificados e levados em combate para inspirar as tropas — uma fusão singular entre ancestralidade, guerra e fé.
Entre os chibchas, o herói cultural Bochica, descrito como um velho branco com barba, recorda em aparência e função figuras como Quetzalcoatl ou Kukulcán, revelando uma convergência mítica panamericana. A religião, portanto, operava como uma gramática do poder, da ordem natural e do destino humano. Não era mero culto, mas um sistema de legitimação cósmica das estruturas sociais e políticas.
A compreensão desses sistemas religiosos exige mais do que análise do ritual — é necessário ler a teologia implícita em cada prática, em cada sacrifício, em cada mito de criação. O sacrifício humano não era expressão de crueldade gratuita, mas um mecanismo de regulação cósmica. O mundo estava constantemente ameaçado pelo caos, e o sangue — sobretudo o nobre ou o guerreiro — era a energia que sustentava a harmonia universal.
Como surgiu o sistema de castas na Índia antiga e qual era seu fundamento religioso?
A religião do período védico na Índia era notavelmente descomplicada, voltada inteiramente para o presente — o aqui e o agora — e não para o além. O cerne da prática religiosa era o sacrifício. A multiplicidade de deuses presentes nesse contexto não implicava um politeísmo clássico no sentido ocidental, pois as divindades frequentemente se sobrepunham ou fundiam-se, sendo apenas diferentes manifestações de fenômenos naturais específicos — o fogo, o vento, a tempestade, a aurora. Muitos desses deuses tinham origens tribais. O ritual era sempre direcionado a um único deus por vez, e não havia representação visual ou imagens dos deuses. Não se faziam menções a templos ou santuários; os sacrifícios ocorriam em casa ou em altares abertos, reforçando o caráter prático e transitório de uma religião que refletia diretamente a sociedade tribal e clânica da época.
Essa religião simples era expressão direta de uma estrutura social ainda em transição. Mas, com o avanço dos arianos para as bacias dos rios Indo e Ganges, e a consequente fundação de reinos despóticos baseados em trabalho agrícola sedentário, profundas transformações sociais começaram a ocorrer. A influência das populações locais — dravidianos e mundas — foi decisiva. A cultura dos mundas, em particular, teve impacto considerável, inclusive na transformação religiosa posterior.
Com o agravamento das contradições sociais entre conquistadores e conquistados, assim como entre os próprios dominadores, e com a ascensão do reino de Magadha no baixo Ganges por volta do meio do primeiro milênio a.C., estruturou-se gradualmente o sistema de castas — uma organização social que marcaria profundamente a Índia até os tempos modernos.
No início, estabeleceu-se a divisão em quatro varnas (literalmente, "cores"): brâmanes, kshatriyas, vaishyas e sudras. Os brâmanes tornaram-se a casta sacerdotal hereditária, detentora do saber védico e monopolizadora dos rituais sacrificiais. No período védico inicial, essa casta ainda não existia como classe separada; sua formação é concomitante ao aprofundamento da estratificação social. A autoridade dos brâmanes derivava de sua relação com os textos sagrados, e sua sacralização os colocava acima de todas as outras castas.
A segunda casta era composta pelos kshatriyas, guerreiros e governantes. Dela provinham reis e príncipes. A terceira, os vaishyas, reunia agricultores, pastores e comerciantes — homens livres, em geral de origem ariana. Estas três castas superiores eram consideradas nobres e arianas, e denominadas “duas vezes nascidas” devido a um ritual iniciático exclusivo, o upanayana.
A quarta casta, os sudras, era formada por servos e descendentes da população conquistada. Eram excluídos dos ritos iniciáticos e considerados alheios à sociedade ariana. A ausência de rito de iniciação para os sudras simbolizava sua exclusão espiritual, consolidando a cisão entre dominadores e dominados.
O código legal que consolidou essa estrutura foi o Manu Smriti — As Leis de Manu — redigido por volta do século V a.C. Embora escrito posteriormente, ele reflete uma organização social já firmemente estabelecida. As Leis de Manu não apenas definem a estrutura das castas, mas também a justificam como ordem divina e imutável. Segundo esse texto, os brâmanes são os senhores naturais da terra, superiores a todos os seres humanos por sua origem sagrada. Toda a propriedade do mundo seria, por direito, sua. Apenas os brâmanes são autorizados a ensinar e interpretar os Vedas. Um brâmane ignorante dos Vedas é comparado a um eunuco estéril.
A vida de um brâmane, conforme as Leis de Manu, divide-se em quatro fases: o estudo com o mestre, o casamento e a vida doméstica, o retiro como eremita e, por fim, a renúncia total na vida ascética. Essa trajetória simboliza a progressão espiritual ideal e reflete a centralidade do saber sagrado na legitimação de sua superioridade.
A fundamentação religiosa da divisão social atinge seu auge com o surgimento do mito de Brahma. Nesse período, um novo deus — Brahma — emerge como criador da ordem social. Segundo o mito, as castas nasceram de partes distintas do corpo de Brahma: os brâmanes da boca, os kshatriyas dos braços, os vaishyas das coxas e os sudras dos pés. Cada grupo recebeu ocupações específicas: ensinar e estudar os Vedas, realizar sacrifícios e dar esmolas (brâmanes); proteger o povo e lutar (kshatriyas); cuidar do comércio, da agricultura e da criação de gado (vaishyas); servir os demais (sudras).
A realeza também recebeu fundamentação divina. O rei, segundo as Leis de Manu, foi criado a partir de partículas dos principais deuses — Indra, Vento, Yama, Sol, Fogo, Varuna, Lua e Kubera — e por isso sua autoridade era sagrada. Seu dever maior era proteger a ordem de castas e zelar pelos privilégios dos brâmanes. O rei ideal era aquele que reverenciava os brâmanes instruídos e seguia seus conselhos; sua felicidade dependia de proteger o povo, lutar com coragem e honrar os sacerdotes.
A sacralização do sistema social consolidava não apenas o domínio dos arianos sobre os povos locais, mas também a hierarquia interna entre os próprios arian
O que revela o totemismo australiano sobre a relação entre homem, território e mito?
Entre os povos indígenas da Austrália Central, o totemismo constitui não apenas uma cosmogonia, mas um sistema total de organização social, espiritual e territorial. Os mitos totemistas relatam as jornadas de ancestrais femininas errantes que deixaram marcas sagradas — os totens — em todos os lugares por onde passaram. Tais narrativas apontam para uma estrutura social matrilinear, refletindo, possivelmente, uma configuração tribal mais antiga em que a linhagem era determinada pelas mulheres.
Os mitos são inseparáveis dos rituais. Funcionam como libretos sagrados segundo os quais se encenam as cerimônias totêmicas em territórios específicos. Mais do que encenações simbólicas, esses rituais são interpretações religiosas da paisagem: contam como se formaram pedras, desfiladeiros, rochas e outros acidentes geográficos, ancorando o mito no espaço físico e, assim, legitimando o direito de posse do clã sobre o território. O mito totemista é, ao mesmo tempo, história sagrada e documento fundacional da terra ocupada.
O vínculo entre o ser humano e o totem vai além da metáfora. Entre certas tribos do centro australiano, acredita-se que o homem encarna um ser sobrenatural associado ao totem, e não o animal em si. Essa entidade sobrenatural, denominada ratapa (feto), teria sido deixada pelas ancestrais míticas em locais específicos da paisagem — rochas, árvores, pedras. Se uma mulher grávida ou casada passar por um desses lugares, voluntária ou acidentalmente, o ratapa pode penetrar seu corpo e fecundá-la. A criança que nascer será, portanto, do totem vinculado àquele local, dissociando completamente a herança totêmica da descendência sanguínea.
A identidade do indivíduo, nesse contexto, se ancora na geografia sagrada, e não na genealogia biológica. Nenhum grupo aborígene australiano acredita que o animal totêmico é literalmente transformado no homem ou que a alma do morto se converte nesse animal — uma ideia que, por outro lado, aparece em culturas mais tardias. O que se personifica não é o animal, mas a entidade mítica que o representa.
O sistema totêmico também se manifesta por meio de emblemas materiais carregados de poder sobrenatural. Os churingas — placas ovais de pedra ou madeira, gravadas com representações simbólicas — são objetos de culto secreto, guardados com zelo em locais inacessíveis aos não iniciados. Cada churinga está misteriosamente ligado a um totem, a um ancestral e a um membro específico do grupo. Em paralelo, estruturas chamadas vaningas, feitas de paus, cruzes ou formas losangulares, são construídas para cerimônias. Mesmo que sua forma seja genérica, uma vez usada num ritual, a vaninga passa a estar irrevogavelmente associada àquele totem específico.
O centro sagrado do totemismo está nos chamados centros totêmicos: marcos geográficos — rios, rochas, árvores — dentro dos territórios de caça dos clãs. É ali que se conservam os objetos sagrados e se realizam os rituais. Esses lugares são invioláveis; o acesso era tão restrito que, no passado, transgredi-lo podia significar a morte. A relação mágica entre o homem e o totem se expressa numa dependência mútua: o totem protege o homem, mas o homem também pode influenciar o destino do totem.
No sudeste australiano, há crença de que o totem pode salvar seu humano de perigos ou, inversamente, que matar o totem de alguém pode ser suficiente para matá-lo. Já nas tribos centrais, manifesta-se com mais clareza a ideia de que o homem detém poder mágico sobre seu totem, especialmente por meio dos chamados ritos de aumento. Trata-se de rituais realizados anualmente, antes da estação chuvosa, nos quais membros do grupo realizam práticas para forçar a multiplicação dos seres totêmicos.
Essas cerimônias incluem o derramamento de sangue no solo, cantos mágicos, fricções rituais com pedras, gordura ou ocre, e, por fim, a ingestão da carne do totem. Tudo isso ocorre nos centros totêmicos, locais impregnados de sentido mítico, onde pedras e rochas são consideradas materializações das lendas ancestrais. O ritual não apenas celebra a fertilidade da natureza, mas também reforça a coesão espiritual e a continuidade da comunidade.
O totemismo, nesse contexto, constitui a forma religiosa primordial das comunidades clânicas de caçadores. Onde as relações de sangue são os únicos vínculos possíveis entre indivíduos, o totemismo projeta esses laços para o mundo natural. Animais e plantas do cotidiano se tornam objetos de reverência, de afeição supersticiosa, como se compartilhassem de um parentesco com o homem.
É por meio dessa lógica que o clã se sente indissociável do território que habita. Cada canto da terra é habitado por memórias sagradas, cada rocha guarda a presença dos ancestrais. O território deixa de ser mera paisagem: torna-se corpo mítico da tribo, extensão espiritual da comunidade.
Outro aspecto relevante do pensamento mágico australiano se manifesta na crença no feitiço. Doenças, acidentes ou mortes são atribuídas à bruxaria de inimigos, mesmo quando há causas evidentes. Após cada morte, realizava-se um ritual de adivinhação para identificar o autor do feitiço. O clã enviava vingadores para assassinar o suposto culpado ou um de seus parentes. A prática da maldição também era conhecida: o inimigo lançava um osso ou bastão afiado em direção à vítima, acompanhando o gesto de palavras mágicas. A arma não precisava atingir fisicamente o alvo: bastava o gesto e a intenção. Ao encontrar o objeto lançado, a vítima reconhecia o feitiço e, vencida pela crença, adoecia e morria. O medo mágico era suficiente para matar, perpetuando o ciclo da superstição.
O que importa compreender é que o totemismo não é uma simples crença em símbolos animais. Ele é a linguagem através da qual se articulam os vínculos sociais, a memória ancestral, o direito à terra e o lugar do homem na ordem natural. É um sistema que unifica cosmogonia, geografia e estrutura social. Sem entender esse entrelaçamento profundo, corre-se o risco de reduzir o totemismo a folclore, quando na verdade ele expressa uma forma de pensamento que organiza o mundo inteiro.
Como a Religião Babilônica Influenciou a Cultura e a Espiritualidade Ocidental
Os sacerdotes babilônios desempenharam um papel fundamental no desenvolvimento de um sistema de calendário de doze meses, que mais tarde seria adotado por outras civilizações, incluindo os europeus. No cerne dessa criação estava a atribuição de significados sagrados a certos números, segmentos de tempo e espaço. Esses números - como o 3, 7, 12 e 60 (5 x 12) - estavam profundamente enraizados nas crenças babilônicas e foram incorporados por diversas culturas ao longo dos séculos. Este simbolismo numérico acabou por moldar o entendimento do tempo e do cosmos, influenciando, por exemplo, o modelo de calendário que hoje utilizamos.
Nos primeiros períodos da história babilônica, os mitos cosmogônicos, que narram a origem do mundo, já estavam sendo formulados. Um dos textos mitológicos mais intrigantes sobre esse tema foi escrito em uma série de sete tábuas de argila. Conhecido por suas palavras iniciais, que significam literalmente "quando acima", esse mito descreve o surgimento do mundo e a luta dos deuses para dar forma a ele. Nele, Apsu, personificação masculina do abismo subterrâneo e das águas profundas, representa o caos primordial, enquanto Tiamat, a personificação feminina do mesmo abismo ou oceano primordial, é retratada como um monstro alado de quatro patas.
A batalha entre os deuses recém-nascidos e as forças do caos ocupa o centro deste mito. Tiamat, liderando seus exércitos monstruosos, ameaça destruir a ordem emergente do mundo. Por medo, os deuses hesitam em enfrentá-la, até que Marduk, corajoso, desafia Tiamat, mas somente se for reconhecido como superior a todos os outros deuses. Após uma luta feroz, Marduk triunfa, matando Tiamat e dividindo seu corpo para formar o céu e a terra. Assim, Marduk se estabelece como o deus supremo, justificando a superioridade do deus babilônico sobre os deuses das cidades subordinadas.
Além dessa narrativa cosmogônica, outros mitos babilônicos abordam temas como a origem do homem, com destaque para a história de Adapa, o primeiro homem criado por Ea, e sua perda da imortalidade. Ea desejava conceder a Adapa a vida eterna, mas uma falha de julgamento de Adapa impediu isso, resultando na introdução da morte no mundo. Esse mito reflete a visão babilônica sobre a mortalidade humana e o papel dos deuses em moldar o destino dos homens.
O "Épico de Gilgamesh", uma das obras literárias mais antigas conhecidas pela humanidade, também contém importantes elementos mitológicos que revelam aspectos da cosmogonia babilônica. Em um dos episódios, Gilgamesh encontra seu ancestral Utnapishtim, que lhe narra a história de um grande dilúvio enviado pelos deuses. Somente Utnapishtim, sua família e os animais sobreviveram, pois ele seguiu o conselho de Ea e construiu uma arca. Este tema do dilúvio é notavelmente semelhante ao relato bíblico, sugerindo que a história dos judeus foi fortemente influenciada pelas tradições babilônicas.
Além de adorar deuses celestiais e heróis culturais, os babilônios acreditavam em uma vasta gama de espíritos, muitos dos quais eram considerados malignos e destrutivos. Esses espíritos estavam ligados a diferentes elementos da natureza, como a terra, o ar e a água, e eram conhecidos como os Anunnaki e Igigi. Essas entidades personificavam doenças e infortúnios que afligiam os seres humanos. Para combater essas forças malignas, os sacerdotes babilônios criaram numerosos feitiços e encantamentos, incluindo amuletos e talismãs que poderiam afastar os espíritos malignos. Um desses amuletos era, por exemplo, uma imagem da própria pessoa, projetada para ser tão aterrorizante que espantaria qualquer espírito.
Rituais mágicos e divinatórios também eram amplamente praticados na Babilônia. Os sacerdotes especializados em adivinhação, conhecidos como baru, eram consultados não apenas por cidadãos comuns, mas também por reis, para prever o futuro. A interpretação de sonhos, a observação do voo de aves e até mesmo a análise das manchas de óleo sobre a água eram formas de divinação, mas a hepatoscopia, a leitura dos órgãos internos de animais sacrificados, era de longe a mais comum. Essa técnica, que envolvia a interpretação detalhada do fígado de um animal sacrificado, foi altamente desenvolvida pelos babilônios e influenciou outras culturas, como os romanos, através dos hititas e etruscos.
A religião babilônica, no entanto, não oferecia uma visão clara sobre a vida após a morte. Os babilônios acreditavam que as almas dos mortos iam para um mundo subterrâneo onde viviam uma existência sem alegria, sem esperança de retribuição ou recompensa. Ao contrário dos egípcios, que acreditavam em uma vida após a morte que poderia ser mais bem ou mal vivida dependendo do comportamento na Terra, os babilônios não concebiam um destino diferente para as almas após a morte. Isso reflete uma visão religiosa focada na vida terrena, em vez de promessas de recompensa ou consolo após a morte.
Durante o império assírio, que floresceu entre os séculos VIII e VII a.C., a religião mesopotâmica permaneceu amplamente inalterada. Os assírios, em grande parte, adotaram as crenças babilônicas, preservando os mesmos deuses e rituais. No entanto, introduziram suas próprias divindades nacionais, como Ashur, o deus tribal dos assírios, que se tornou o patrono oficial do estado. O culto de Ashur, embora importante para a identidade nacional assíria, nunca teve a mesma influência ou o mesmo poder que o sacerdócio babilônico. Isso se deve em parte ao fato de que os sacerdotes assírios nunca desfrutaram do mesmo prestígio e poder que seus colegas babilônios, e o culto de Ashur era essencialmente estatal, não popular.
A grande influência da religião babilônica, entretanto, não foi limitada ao território da Mesopotâmia. Seus conceitos religiosos e mitológicos, incluindo o simbolismo numérico e astronômico, espalharam-se para além das fronteiras do Império Babilônico, influenciando profundamente as religiões do Ocidente, incluindo o judaísmo, o neoplatonismo e até os primeiros cristãos. A sabedoria dos sacerdotes babilônios, especialmente nas áreas de astronomia, calendário e metrologia, foi amplamente respeitada e imitada. Sua demonologia e mitologia, especialmente a ideia de espíritos malignos, foram fundamentais para o desenvolvimento das fantasias europeias sobre o mal, que culminaram na caça às bruxas medieval.
Como a Diáspora Judaica Moldou a Religião e Cultura Judaica
A diáspora judaica, que começou após a destruição do Segundo Templo em Jerusalém, teve um impacto profundo na evolução da religião e cultura judaica, transformando profundamente as práticas religiosas e a relação do povo judeu com o mundo exterior. Com a dispersão dos judeus, a língua hebraica foi gradualmente substituída pelo grego e, em algumas regiões, pelo aramaico. O hebraico, que antes era usado no cotidiano, passou a ser mantido apenas como uma língua escrita e clerical a partir do século III a.C.
Durante esse período, as escrituras judaicas foram traduzidas para o grego, o que culminou na famosa Septuaginta, uma tradução do Antigo Testamento que ajudou a tornar a religião judaica mais acessível à crescente comunidade judaica na diáspora. Essa tradução foi uma tentativa do faraó Ptolemeu II do Egito de criar uma versão das escrituras judaicas para os judeus que já não falavam hebraico e para aqueles não-judeus interessados nas ideias religiosas judaicas. Com a disseminação do texto grego, uma fusão das filosofias religiosas judaicas e helenísticas ocorreu, contribuindo para o surgimento de sistemas sincréticos que influenciaram a formação da doutrina cristã, como evidenciado nas obras de Filon de Alexandria e, mais tarde, no gnosticismo.
À medida que os judeus se espalhavam pelo Império Romano, suas ideias religiosas se tornaram mais abertas, refletindo uma aproximação com povos de outras culturas. A figura de Yahweh, o Deus nacionalista dos judeus, começou a perder suas características exclusivas, dando lugar ao conceito de um Deus universal, que passou a ser adorado também por gentios. Isso gerou a presença dos chamados "prosélitos" - gentios que se convertiam ao judaísmo e passavam a ser circuncidados, um novo fenômeno religioso da época. Essa nova forma de judaísmo não apenas abria a porta para a conversão, mas também refletia as mudanças políticas e sociais do momento.
Durante esse período, os judeus viveram sob o domínio de várias potências estrangeiras. O sentimento de opressão crescente levou ao desenvolvimento de uma crença mais forte na intervenção divina que, acreditava-se, traria a liberdade do domínio estrangeiro. O conceito de um Messias, um líder que salvaria o povo judeu, ganhou força, principalmente durante o domínio romano. A ideia de um salvador nacional foi uma característica notável da época, distinta das interpretações anteriores, nas quais apenas os reis, judeus ou de outras nações, eram chamados de Messias ou "Ungidos do Senhor".
Além disso, com o agravamento da opressão externa, surgiram novas doutrinas escatológicas, como a de Olam Haba ("o mundo vindouro"), um conceito que descrevia uma recompensa pós-vida para os justos, uma ideia que não existia anteriormente. A crença na ressurreição dos mortos e no julgamento final começou a ganhar terreno, possivelmente influenciada por doutrinas do mazdeísmo, uma religião persa que os judeus encontraram durante seus períodos de cativeiro.
O período da diáspora também viu o surgimento de diversas seitas judaicas, refletindo a diversidade de pensamentos dentro da sociedade judaica. As seitas mais conhecidas foram os saduceus, fariseus e essênios. Os saduceus, associados à elite sacerdotal de Jerusalém, acreditavam na observância rigorosa das tradições, mas negavam a existência de vida após a morte. Já os fariseus, que tinham maior influência nas comunidades mais amplas, acreditavam no conceito de vida após a morte e na ressurreição. A última seita, os essênios, formada principalmente por camponeses e artesãos, era uma comunidade ascética que rejeitava os rituais tradicionais e promovia uma forma de comunismo primitivo.
Com a derrota final dos judeus durante a revolta de Bar Kokhba (132-135 d.C.), os judeus foram definitivamente dispersos do território palestino, e sua relação com o resto da população romana foi alterada novamente. O comércio e a circulação monetária começaram a declinar, prejudicando a influência dos judeus no império e reduzindo a capacidade de disseminação de sua religião. Isso resultou em um período de maior isolamento, no qual o judaísmo se afastou ainda mais da filosofia helenística e da influência das outras culturas.
Foi nesse contexto que o Talmude, um monumental compêndio de leis e tradições judaicas, foi compilado entre os séculos III e V d.C. O Talmude é uma coleção de interpretações da Torá, dividida em duas partes principais: a Mishná (compilação de leis) e a Gemará (comentário sobre as leis). A Mishná foi escrita em hebraico, enquanto a Gemará foi escrita em aramaico, refletindo as mudanças linguísticas da época. O Talmude foi preservado em duas versões: a de Jerusalém e a de Babilônia. Juntas, essas duas versões do Talmude formaram a base da vida religiosa, legal e social dos judeus, uma vez que eles estavam sem um estado próprio.
Nos primeiros séculos da Era Comum, o Talmude tornou-se central não apenas para questões religiosas, mas também para todas as decisões jurídicas e sociais nas comunidades judaicas. Com a ausência de um governo secular e devido à dispersão, os rabinos passaram a ser os líderes das comunidades, oferecendo orientações baseadas nas escrituras para todos os aspectos da vida cotidiana. Essa adaptação à vida em exílio levou à consolidação de uma nova identidade judaica, que seria determinante para o desenvolvimento do judaísmo ao longo dos séculos.
Além disso, a criação do Talmude e a ascensão do poder dos rabinos também refletem as divisões internas nas comunidades judaicas. As classes mais altas, composta por comerciantes e proprietários de escravos, estavam distantes das classes mais baixas, como camponeses e artesãos, o que se refletia nas discrepâncias de entendimento e aplicação das leis religiosas. Essa divisão social foi, de certa forma, minimizada pelas possibilidades de ascensão social através do estudo das escrituras, mas também criou um sistema de desigualdade dentro das comunidades judaicas.
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