O diagnóstico precoce das doenças reumáticas que afetam os pés é essencial para um tratamento eficaz, evitando a progressão das deformidades e o comprometimento funcional. O processo de avaliação geralmente começa com a realização de radiografias do pé e tornozelo, nas projeções anteroposterior (AP), lateral (L) e oblíqua (O), com o paciente em carga. Os achados radiológicos variam desde alterações mínimas ou ausentes nos estágios iniciais da doença até erosões articulares, perda de arco, colapso articular e deslocamentos nas fases mais avançadas. Nos estágios mais graves, é comum observar o deslocamento das articulações metatarsofalângicas (MTP) 1 a 5, sendo o antepé a região mais afetada pela doença.

A destruição radiológica é progressiva e geralmente mais severa e precoce nas articulações MTP1, MTP5 e tálonavicular (TN), mas à medida que a doença avança, o comprometimento de todo o pé se torna evidente. A classificação radiológica proposta por Larsen, amplamente utilizada na literatura, é baseada nas radiografias e descreve a progressão do dano esquelético, proporcionando uma visão clara da evolução da doença. Nessa classificação, as imagens são divididas em cinco graus, variando de uma radiologia normal (grau 0) até alterações mutilantes graves (grau V), caracterizadas pela destruição e deformidade acentuada das articulações que suportam peso, como as articulações subtalar e tálonavicular.

A ultrassonografia (US), quando realizada por profissionais experientes, é eficaz no diagnóstico precoce das alterações nos tecidos moles, como sinovite e tenossinovite, sendo mais precisa do que a avaliação clínica especializada. O diagnóstico precoce da artrite reumatoide (AR) tem um impacto direto no prognóstico do paciente, especialmente com a introdução das terapias biológicas, que modificam a evolução da doença. A US tem mostrado ser mais sensível do que as diretrizes tradicionais para avaliação da atividade da AR, permitindo um diagnóstico preciso e um controle objetivo da atividade da doença em pacientes ativos ou inativos.

Já a ressonância magnética (RM) é mais sensível na detecção de erosões ósseas precoces, sendo particularmente útil para a avaliação do pé reumático, especialmente em casos que afetam a articulação MTP5, que frequentemente apresenta comprometimento ósseo e de tecidos moles de forma precoce. Além disso, a RM pode revelar alterações que não são visíveis nas radiografias, proporcionando uma visão mais detalhada do estado das articulações e ajudando na decisão sobre o tipo de tratamento a ser adotado.

O tratamento conservador é a abordagem inicial para muitos pacientes, especialmente aqueles que ainda não apresentam deformidades significativas ou limitações funcionais. Para os pacientes assintomáticos, a educação preventiva é fundamental, abordando o controle médico adequado, a prática regular de atividade física, o uso de calçados apropriados e o conhecimento dos sinais de alerta para complicações. Quando surgem sintomas como metatarsalgia, dor no arco medial ou dor no médio pé, o uso de palmilhas ortopédicas pode ser necessário para proporcionar alívio, sendo que as palmilhas podem inicialmente ser do tipo genérico, mas com o tempo, as palmilhas moldadas sob medida (como as de tipo UCBL) podem ser mais indicadas, já que a AR é uma doença progressiva. Para pacientes que não são candidatos a cirurgia ou que optam por não se submeter a procedimentos cirúrgicos, o uso de órteses estabilizadoras do retropé, associadas às palmilhas personalizadas, pode melhorar os sintomas e recuperar parcialmente a função do pé.

Quando o tratamento conservador não é suficiente e as deformidades se tornam incapacitantes, a cirurgia torna-se uma opção. A decisão cirúrgica depende de vários fatores, incluindo a gravidade das deformidades, o estado geral de saúde do paciente e suas expectativas em relação ao tratamento. A abordagem cirúrgica pode variar entre a preservação da articulação e a artroplastia, dependendo da extensão do dano articular, com a classificação de Larsen sendo uma ferramenta importante para orientar essa decisão. Nos estágios iniciais (graus II e III), técnicas de preservação articular podem ser eficazes, enquanto nos estágios avançados (graus IV e V), as técnicas de resecção ou artrodese são mais indicadas.

A articulação metatarsofalângica (MTP) 1 é frequentemente uma das primeiras a ser afetada pela artrite reumatoide, e o tratamento cirúrgico deve considerar a magnitude da destruição articular e a estabilidade da articulação. Quando a destruição articular é moderada, a preservação da articulação pode ser realizada por meio de osteotomias, como a osteotomia de Chevron, que permite a correção do desvio e a melhoria da capacidade de suportar peso. Quando a destruição é mais severa, a artrodesse da articulação MTP1 pode ser necessária para aliviar a dor e melhorar a função. A artrodesse é realizada com o objetivo de unir os ossos da articulação de forma estável, alinhando o hallux com 5° de valgo, 5° de extensão dorsal e sem rotação.

Além disso, ao considerar o tratamento cirúrgico, é crucial que o cirurgião avalie o impacto das deformidades nas articulações adjacentes, já que as alterações no antepé podem afetar as articulações distais e proximais, gerando um efeito em cadeia no funcionamento do pé. A abordagem multidisciplinar, envolvendo ortopedistas, reumatologistas e fisioterapeutas, é fundamental para otimizar o tratamento e garantir a melhor qualidade de vida possível para os pacientes com AR avançada.

Como Avaliar Deformidades Pediátricas no Pé: Princípios e Desafios no Diagnóstico e Tratamento

A avaliação das deformidades nos pés de crianças envolve uma análise complexa e detalhada, já que estas podem evoluir de forma imprevisível. Muitas vezes, as deformidades do pé em crianças não se apresentam de maneira linear, seja pelo fato de o desequilíbrio muscular ser estático ou progressivo, ou ainda devido à dificuldade de se prever a velocidade dessa progressão. Quando o tratamento é adiado, a complexidade da reconstrução tende a aumentar. Contudo, o maior desafio reside no fato de que o diagnóstico, baseado apenas na observação clínica, pode ser falho se não forem consideradas todas as variáveis possíveis.

Ao se tratar de crianças, a avaliação histórica de dor ou disfunção relacionada à deformidade pode ser particularmente difícil, pois muitas vezes as crianças são incapazes de descrever com precisão os sintomas. Isso se deve à sua pouca idade, dificuldades cognitivas ou, em alguns casos, limitações neurológicas. Portanto, uma análise precisa e detalhada dos sintomas é fundamental. É importante diferenciar entre variações anatômicas normais do pé infantil, que podem ser vistas radiograficamente, e patologias reais que causam dor. Se o padrão de dor não corresponder ao padrão típico de uma deformidade ou condição conhecida, é possível que os dois fenômenos não estejam relacionados.

A avaliação da dor deve ser específica e detalhada. Saber onde, quando e qual a intensidade da dor é essencial, uma vez que muitas variações anatômicas do pé não causam dor. Um exemplo disso são as coalizões tarsais ou o navicular acessório, que podem ser identificados em radiografias, mas não são, por si só, responsáveis por dor. A dor deve ser avaliada não apenas pela localização, mas também pelo padrão de manifestação ao longo do tempo e pelas atividades que a desencadeiam ou aliviam. A gravidade da dor deve ser quantificada com precisão. Ferramentas como a escala visual analógica de dor têm se mostrado confiáveis até mesmo para crianças muito pequenas.

Quando a dor é uma queixa, é importante que a criança aponte exatamente onde sente a dor. Isso pode ajudar a iniciar o exame físico em áreas que não causam dor, permitindo uma avaliação mais abrangente sem gerar desconforto adicional. A localização precisa da dor também ajuda a validar o diagnóstico preliminar antes de um exame físico mais aprofundado.

A avaliação física do pé infantil começa com um exame físico geral da criança, o que inclui uma análise cuidadosa dos quadris e da coluna, especialmente em recém-nascidos. Para crianças mais velhas e adolescentes, a análise da marcha e a avaliação do perfil torsional, bem como a análise do alinhamento angular, são cruciais. A marcha deve ser observada enquanto a criança anda, corre, caminha nas pontas dos pés, caminha com os calcanhares, faz agachamentos, fica em pé e salta sobre cada pé. Essas observações ajudam a avaliar simetria, força, coordenação e conforto.

Outro aspecto essencial da avaliação é a observação do pé em carga. A deformidade do pé pode se manifestar de forma muito diferente quando a criança está em pé e quando está deitada. Por exemplo, um pé plano pode parecer menos comprometido quando a criança não está carregando peso, enquanto um pé cavovaro pode parecer mais grave. A dor e a incapacidade geralmente se tornam evidentes durante a carga. Portanto, a observação do pé durante a marcha e a análise de como ele reage ao peso do corpo ajudam a compreender melhor o padrão de dor e a incapacidade da criança.

Cada deformidade segmentar do pé e tornozelo deve ser avaliada de maneira detalhada antes do planejamento do tratamento. Os segmentos que precisam ser observados incluem o antepé, o médio pé, o retropé e o tornozelo. Cada um desses segmentos pode apresentar diferentes tipos de deformidade, que variam de pronação ou supinação do antepé até deformidades de alinhamento no retropé, como o varo ou o valgus. Para um tratamento eficaz, é crucial determinar a flexibilidade de cada segmento, já que a perda de flexibilidade pode agravar a deformidade com o tempo.

Um aspecto frequentemente esquecido na avaliação é a integridade da pele, pois áreas de pressão excessiva podem indicar problemas sérios, como úlceras de pressão ou alterações na biomecânica do pé. Em casos de pé cavovaro, por exemplo, as pressões são frequentemente observadas na base do quinto metatarso e sob as cabeças do primeiro e quinto metatarsos. Já no pé plano, as pressões exacerbadas são mais comuns na região medial do médio pé, especialmente quando a deformidade é associada a contraturas musculares, como no caso da gastrocnemius.

A avaliação do movimento subtalar é particularmente desafiadora, pois não existe uma forma amplamente validada de avaliar a mobilidade dessa articulação, especialmente em pés pequenos ou volumosos. A prática constante e a observação durante operações de correção de deformidades são maneiras eficazes de aprimorar a técnica de avaliação do movimento subtalar.

É igualmente importante observar que deformidades no tornozelo podem coexistir com deformidades no pé ou ocorrer de forma isolada. O tornozelo nas crianças normalmente apresenta uma orientação em valgo em relação ao eixo anatômico da tíbia. Contudo, essa orientação muda espontaneamente para uma posição neutra entre os três e quatro anos de idade, o que deve ser considerado ao se avaliar as deformidades do tornozelo.

É fundamental que qualquer plano de tratamento para deformidades pediátricas nos pés leve em conta a individualidade de cada caso, levando em consideração tanto as variações anatômicas normais quanto as deformidades patológicas. O diagnóstico cuidadoso e o acompanhamento contínuo são essenciais para um tratamento eficaz e para a prevenção de complicações a longo prazo.